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Especialistas discutem novas perspectivas para os pagamentos por serviços ambientais
O “I Fórum sobre Serviços Ambientais na paisagem rural: novas perspectivas para os PSAs” reuniu especialistas de diversas instituições para discutir questões específicas da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais e da sua implementação prática, com enfoque no seu potencial para implementar soluções para problemas ambientais. O evento on-line foi transmitido pelo canal da Embrapa no YouTube, nas tardes dos dias 23, 24 e 25 de maio.
O Fórum, organizado no âmbito do Portfólio Serviços Ambientais da Embrapa, com apoio da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Instituto Estadual do Ambiente (INEA, RJ) e da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), teve como objetivo principal identificar projetos e ações de pagamentos por serviços ambientais no meio rural que alinhem produtores e organizações privadas e governamentais, com objetivos sociais e ambientais, levantando debates sobre como engajar a sociedade nesse sentido. O evento registou 1405 inscritos e, até esta segunda-feira (29/5), os vídeos dos três dias de evento somavam 5,7 mil visualizações - assista a cada um deles ao final da matéria.
A abertura do evento teve a participação de representantes das instituições organizadoras. A pesquisadora Fabia de Mello Pereira, da Embrapa Meio-Norte, presidente do Portfólio Serviços Ambientais da Embrapa, explicou que a empresa tem atualmente 36 projetos de pesquisa e inovação no tema, e em 2023 irá gerar 34 resultados que vão contribuir para o desenvolvimento de uma agricultura nacional mais sustentável e para formação de políticas públicas. São 39 unidades da Embrapa e 55 instituições nacionais e internacionais envolvidas. “Toda essa rede de pesquisadores se empenha para gerar pesquisa em todos os biomas brasileiros e está sempre atenta às necessidades dos produtores. E foi justamente por notar uma demanda por informações que organizamos esse evento.”
O reitor da UFAM, Sylvio Puga Ferreira, destacou que a temática do fórum é uma agenda de futuro muito importante para a Amazônia e para o País, destacando que a universidade tem estudos na área em diversos programas de mestrado e doutorado, especialmente no Centro de Ciências do Ambiente (CCA). Ferreira lembrou, ainda, do programa Guardiões da Floresta, do governo do estado do Amazonas, que possui trabalhos importantes em andamento.
Marie Ikemoto, subsecretária de Conservação da Biodiversidade e Mudanças do Clima da Secretaria de Estado do Ambiente e Sustentabilidade do RJ (SEAS/INEA, RJ), ressaltou a importância de discutir o tema Serviços Ambientais no mês em que se celebra o Dia Internacional da Biodiversidade, deixando clara a importância das áreas rurais tanto para a conservação dos remanescentes florestais como por serem áreas estratégicas para os mananciais de abastecimento.
Já o diretor da ANA, Maurício Abijaodi, destacou o programa Produtor de Águas, idealizado há 20 anos e que atualmente apoia em torno de 60 projetos. “A ANA sempre será parceira de iniciativas que busquem trazer o ideal de racionalidade para o uso de recursos hídricos. A grande questão em torno dos PSAs é o engajamento de toda a sociedade, especialmente dos órgãos envolvidos com questões ambientais e de recursos hídricos, das universidades, dos órgãos de pesquisa e, especialmente, dos beneficiários desse produto essencial, no caso os produtores rurais, em prol de um objetivo comum. A integração e o engajamento é o que vai levar essa forma de incentivo e fazer com que a lei de pagamento por serviços ambientais cumpra seu papel com eficiência.”
A diretora-executiva de Negócios da Embrapa, Ana Euler, lembrou que Serviços Ambientais é um dos temas de pesquisa prioritários da Empresa, que possui um portfólio de projetos na área que busca gerar soluções inovadoras para viabilizar a sustentabilidade dos sistemas agropecuários e florestais, mantendo e ampliando os serviços ecossistêmicos de todos os biomas. “Estamos olhando para os mercados verdes, o desenvolvimento de modelagens de contratos de créditos de carbono, o pagamento por serviços ambientais, para a área da Bioeconomia e a agregação de valor de tantos produtos da sociobiodiversidade brasileira”, citou.
Mostra de vídeos enriqueceu o evento
O Fórum abriu uma seleção de vídeos sobre PSAs, com o objetivo de oferecer aos participantes a oportunidade de compartilhar suas soluções sobre pagamentos de serviços ambientais.
Vinte vídeos foram selecionados pela comissão organizadora para compor a playlist “Vitrine de iniciativas de PSAs no Brasil”, publicada no canal da Embrapa no YouTube - acesse aqui e assista.
Alguns vídeos foram apresentados ao longo dos três dias de evento.
Implementação da Lei de PSA, desafios de governança e mecanismos de financiamento
Os principais assuntos debatidos no primeiro dia do evento foram aspectos sobre a regulamentação da Lei 14.119/21, que institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (PNPSA), e como ela está sendo encaminhada para destravar os instrumentos necessários para sua implementação. E também como alguns estados e municípios avançaram na política de PSA mesmo antes de ter o arcabouço nacional, apontando ações com potencial para serem replicadas, envolvendo diversos setores da sociedade e agregando novos componentes ao pagamento por serviços ambientais, como as práticas agroflorestais e agropecuárias sustentáveis.
O deputado federal Arnaldo Jardim lembrou do apoio da Embrapa na sua relatoria da PNPSA na Câmara dos Deputados, ressaltando que o desafio agora é a implementação dessa política. O parlamentar ressaltou que a PNPSA não é para controlar, mas sim estimular, reconhecer e premiar boas práticas adotadas pelos produtores rurais, e apontou princípios básicos colocados na Lei, que estabelecem premissas para os contratos de PSA, como a isenção de impostos para os contratantes e o estabelecimento do cadastro nacional por serviços ambientais, o que garante credibilidade aos contratos. Jardim afirmou que certificação e credibilidade são muito importantes, especialmente agora que estão sendo estabelecidos mercados de créditos de carbono. Por fim, o deputado disse esperar da Embrapa e de seus parceiros o estabelecimento das métricas para a regulamentação da política.
Marie Ikemoto, da SEAS/INEA RJ, elencou os principais desafios de governança dos programas de PSA e citou várias iniciativas, projetos e programas estaduais e municipais que antecederam a PNPSA, ressaltando que essa Política trouxe muito mais segurança jurídica para os empreendimentos. Marie apontou que os principais desafios para a implementação da PNPSA são fortalecer capacidades institucionais, definindo áreas prioritárias, metodologias de PSA, gestão de contratos PSA e arranjo institucional entre agente técnico e financeiro; sensibilizar gestores e tomadores de decisões; viabilizar o financiamento das iniciativas; promover a integração e articulação institucional; e garantir o ganho de escala.
Thiago Valente, da Fundação Grupo Boticário, apresentou o modelo de governança do projeto Oasis, uma iniciativa de PSA multisetorial para áreas conservadas e áreas produtivas. Valente também apresentou uma metodologia para valoração dos serviços ambientais prestados, que considera o custo de oportunidade de uso da terra, a qualidade ambiental – que estimula boas práticas de uso do solo – e o percentual de remanescentes de área natural.
Esse primeiro painel foi mediado por Marcia Silva Stanton, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
O segundo painel do primeiro dia do fórum foi uma roda de conversa entre dois gestores experientes na condução de projetos com PSA: Helena Carrascosa, que coordena o projeto Conexão Mata Atlântica, no estado de São Paulo; e Marcos Sossai, que lidera o projeto Reflorestar, no estado do Espírito Santo. O professor Henrique Pereira, da UFAM, mediou a conversa.
Os especialistas levantaram questões relevantes a partir de suas experiências nos dois estados, que implementaram ações de pagamento por serviços ambientais muito antes da promulgação da lei que instituiu a PNPSA. Entre os pontos debatidos estiveram a dificuldade para a adesão dos produtores aos programas de PSA; a importância de pensar nas propriedades como um todo, e não somente nas áreas conservadas, para a formulação de políticas públicas; a importância do estímulo à restauração florestal e conservação do solo como um meio de ter água em quantidade e qualidade; fontes de recursos para suporte técnico e financiamento dos programas etc.
PSAs Hídricos, quantificação de carbono no solo, biodiversidade e serviços ecossistêmicos
Para abrir a sessão de palestras do segundo dia do fórum, Henrique Pinheiro Veiga, superintendente adjunto de planos, programas e projetos na Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), falou sobre PSAs Hídricos e o programa Produtor de Água, desenvolvido pela Agência. Esse programa é um excelente exemplo de parceria de longo prazo entre múltiplas instituições em prol de resolver problemas comuns no nível das bacias hidrográficas, no contexto rural, como secas e cheias extremas. Por meio do programa, várias intervenções são adotadas, visando à melhoria do conjunto de serviços ecossistêmicos, como, por exemplo, melhoria de pastagens, implantação de bacias de contenção, restauração florestal, dentre outros. “O programa Produtor de Águas se materializa no desenvolvimento da implementação de projetos locais de conservação de água e solo no meio rural, a exemplo do Projeto de Ubá”, disse.
Veiga também discorreu sobre os serviços ecossistêmicos exercidos pelo ecossistema aquático, que servem como habitat a toda biodiversidade; barreira dos fluxos de energia, matéria e biodiversidade; bem como filtro, fonte, condutores e sumidouro, sem deixar de mencionar os benefícios para toda a sociedade, como geração de energia elétrica, atenuação de cheias, abastecimento de água, controle do processo de sedimentação, transporte, entre outras vantagens. O palestrante abordou também as ameaças e causas da degradação dos ecossistemas das bacias hidrográficas que impactam no fornecimento destes serviços, como mudança do clima, operação dos reservatórios ocasionada pelo processo de urbanização, construção de barramento, práticas de manejo agropecuário inadequado, dentre outros.
Na segunda palestra do dia, Ladislau Martin Neto, pesquisador da Embrapa Instrumentação Agropecuária (SP), falou sobre a quantificação de carbono no solo. Martin enfatizou o papel fundamental que os solos e as técnicas de manejo agrícola exercem para acumulação/sequestro de carbono e mitigação das mudanças climáticas. O pesquisador apresentou exemplos de parcerias internacionais para “recarbonizar o solo”, constituindo um importante serviço ambiental. Além disso, mostrou o potencial de novas e avançadas tecnologias em desenvolvimento, por instituições como a Embrapa, para simplificar, reduzir custos e dar escala aos métodos de quantificação de carbono nos solos.
Para encerrar as apresentações, teve a fala Cecilia Vieira, especialista em biodiversidade do projeto Conexão Mata Atlântica, e que atua também na coordenação-geral de ecossistemas e biodiversidade, Departamento para Clima e Sustentabilidade, Secretaria de Políticas e Programas Estratégicos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), em Brasília/DF. Cecília Vieira apresentou a experiência do projeto Conexão Mata Atlântica, que utiliza técnicas também bastante modernas para monitorar os impactos das práticas sobre serviços ecossistêmicos e a biodiversidade, a exemplo do DNA ambiental e metabarcoding.
Apesar da relevância e andamento das experiências mostradas pelos palestrantes, foi marcante o fato de que há grandes desafios e gargalos para implementar o PSA. Cadu Young, moderador das perguntas após as palestras, citou como principais problemas a baixa perenidade dos projetos de PSA ao longo dos anos e a escala reduzida de área implantada. Para encerrar o segundo dia do Fórum, na roda de conversa, estiveram presentes os agricultores Marcos e Matheus Koehler, da propriedade famíliar Koehler, participante do Programa Protetor das Águas de Vera Cruz (RS), e Fátima Cabral, da propriedade Pé na Terra, com produção de alimentos orgânicos e participante do Produtor de Água do Pipiripau (DF). Esses agricultores foram pioneiros em aderir aos respectivos projetos. A mediação da roda foi de André Luiz Furtado, pesquisador da Embrapa Territorial (SP).
Metodologias de PSA com base em carbono florestal, oportunidades e desafios do mercado de carbono e ganho de escala em PSA
No terceiro e último dia do evento, as metodologias para pagamentos por serviços ambientais, as oportunidades do mercado de carbono e o ganho de escala em PSA no Brasil estiveram no centro do debate entre profissionais do mercado, representantes de organizações da sociedade civil e pesquisadores. O papel da iniciativa privada, o protagonismo dos municípios e a governança local são desafios para a ampliação das iniciativas em PSA no meio rural brasileiro, segundo os debatedores.
Victória Bastos, do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia – Idesam (AM), abordou metodologias de pagamentos por serviços ambientais com base em carbono florestal no meio rural. No Brasil, as principais modalidades de serviços ambientais são reflorestamento e redução de emissões por desmatamento e degradação florestal (REDD) e estão localizadas, em sua maioria, na Amazônia.
A palestrante apresentou duas experiências da região que contam com o apoio técnico do Idesam: o Projeto Carbono Reca, desenvolvido pela Cooperativa de Reflorestamento Econômico Consorciado e Adensado (RECA) e pela empresa Natura, em Rondônia; e o Café Apuí, desenvolvido no projeto de assentamento Rio Juma, no sul do Amazonas.
Entre as necessidades fundamentais identificadas por Victória, estão o financiamento inicial dos projetos, a identificação e definição de métricas dos serviços ambientais e a governança local. “Projetos de PSA precisam de parcerias para implementação, precisam de salvaguardas ambientais e do fortalecimento da organização social no território”, acrescentou.
Para Yuri Marinho, da Eccon Soluções Ambientais (SP), que abordou as oportunidades e os desafios do mercado de carbono, em dez anos de REDD no Brasil, o envolvimento da iniciativa privada foi importante para que o PSA ganhasse escala. “Precisamos inovar em todas as iniciativas”, afirmou. Ele citou ainda que é importante criar vantagens tributárias e produtos desejados para que o pagamento por serviços ambientais seja visto como investimento e não como custo.
O protagonismo do poder público municipal e o fortalecimento das organizações locais foram pontos destacados pela terceira palestrante, Adriana Kfouri, da TNC (The Nature Conservancy), que apresentou o Programa Conservador da Mantiqueira e Mata Atlântica. O programa, que trabalha com o serviço ambiental água, tem atuação em 425 municípios nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
“O custo da restauração é o grande desafio. O pagamento precisa envolver os custos do serviço ambiental”, afirmou Adriana. Entre as lições obtidas com o programa, que iniciou em 2005 no município de Extrema (MG), a palestrante destacou o protagonismo do poder público local, a valorização do proprietário rural, a capacitação de secretários municipais, técnicos e produtores que atuam no território e a ampliação da cadeia de restauração florestal, como a coleta de sementes, produção de mudas e assistência técnica. “A governança local é a chave para avançar os projetos”, ressaltou.
O debate, mediado por Erika Pinto, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), trouxe a necessidade de se ampliar as metodologias para PSA, “em especial a redução de custo para que não inviabilize as populações mais vulneráveis”, lembrou a mediadora. “Existem custos operacionais, de deslocamento e certificação do serviço. É preciso simplificar esse processo, usar tecnologia, automatizar, mas sem perder a qualidade”, sugeriu Yuri Marinho, da Eccon.
Os palestrantes reforçaram ainda a importância do engajamento do gestor municipal no processo de implementação do PSA nos territórios. “A partir da leitura que o gestor tem do território, ele pode fazer da floresta um bom negócio para o município”, afirmou Adriano Kfouri, da TNC.
A programação do Fórum encerrou com uma roda de conversa entre Luciano Ferreira da Silva, agricultor do assentamento Dois Riachos, em Ibirapitanga (BA), Gisela Introvini, da Fundação de Apoio à Pesquisa do Corredor de Exportação Norte (Fapcen) e Sandra Paula Bonetti, da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag). Eles abordaram o mercado voluntário de PSA, os benefícios que a certificação das propriedades traz ao produtor rural, a necessidades de ter tecnologias adaptadas à cada região, a importância da comunicação no processo de PSA no município e a relação da agricultura empresarial de commodities com a agricultura familiar e as comunidades locais.
Assista aos três dias de Fórum
Fernando Gregio (MTb 42.280/SP)
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