Pesquisa promove agregação de valor às fruteiras da Caatinga
Pesquisa promove agregação de valor às fruteiras da Caatinga
Para atender um crescente mercado voltado para alimentos naturais, orgânicos e socialmente responsáveis, uma equipe de pesquisadores da Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ) desenvolveu três novos produtos com frutas da Caatinga: geleia mista de umbu, cajá e mamão; fruta laminada de umbu e manga; chutney de maracujá do mato e manga. O trabalho contou com a parceria da Embrapa Semiárido (PE) e da Cooperativa de Agropecuária Familiar de Canudos, Uauá e Curaçá (Coopercuc), com sede no município de Uauá, no sertão da Bahia. As tecnologias incluem tanto o processamento para a produção em agroindústrias familiares, quanto ações de manejo dos pomares das fruteiras nativas ameaçadas de extinção.
O umbu e o maracujá do mato são fruteiras nativas que se destacam no bioma Caatinga, pois são utilizadas tradicionalmente na alimentação da população do semiárido brasileiro. O desafio enfrentado pela equipe de pesquisa foi o desenvolvimento de novos produtos agroindustriais com redução de açúcar e sem o uso de aditivos químicos, para produção em pequena escala pelos agricultores familiares. "Testamos as frutas da Caatinga, avaliamos cada uma delas, e percebemos que o maracujá do mato, por exemplo, é uma fruta muito ácida, então identificamos um potencial para a elaboração de um produto com característica de um produto salgado, o molho chutney, que já existe no mercado, principalmente no mercado internacional, porém sem adição de sal", conta a pesquisadora Renata Torrezan.
Originário da Índia, o chutney leva gengibre e pimenta dedo de moça em sua formulação e costuma ser consumido com carnes e alimentos salgados. Apesar de pouco conhecido e consumido pelo público nacional, a avaliação da aceitação do chutney de maracujá do mato e manga realizada em um supermercado da cidade do Rio de Janeiro reforçou seu potencial de mercado. No teste efetuado com 80 consumidores, cerca de 73% disseram que utilizariam o molho desenvolvido pela Embrapa em suas refeições.
Além do molho chutney, foram elaboradas, pela equipe de pesquisa, a fruta laminada de umbu e manga e a geleia mista de umbu, cajá e mamão. A fruta laminada é um produto inédito no mercado nacional, que foi aprovada por 89% dos 100 provadores em análise sensorial realizada na Embrapa Agroindústria de Alimentos. "É um produto saboroso, prático, leve, fácil de transportar, que fornece energia e nutrientes provenientes das frutas, que pode ser consumido como lanches por pessoas de todas as faixas etárias, substituindo outros potenciais lanches menos saudáveis", conta a pesquisadora da Embrapa Virgínia da Matta.
Já a geleia mista de umbu, cajá e mamão possui redução de 30% de açúcar, sendo, portanto um produto que pode ser denominado como light. A geleia também foi submetida à avaliação de aceitação com 100 consumidores. Destes, 83% disseram ter gostado do produto. "O mercado consumidor potencial desses produtos é daquelas pessoas que buscam alimentos sem edulcorantes ou quaisquer outros aditivos, com pouco açúcar adicionado, que sejam provenientes de produções sustentáveis, ou seja, o chamado consumo consciente", afirma a pesquisadora da Embrapa Agroindústria de Alimentos, líder do projeto.
Estratégias de agregação de valor às frutas da caatinga
O desenvolvimento desses novos produtos foi precedido de um diagnóstico participativo do sistema agroalimentar de produtos processados a partir de fruteiras nativas da Caatinga, realizado pela Embrapa Agroindústria de Alimentos em conjunto com a Embrapa Semiárido. A equipe de pesquisadores visitou a estrutura central da Coopercuc e seis mini fábricas de processamento de alimentos, onde se produzem geleias, compotas, sucos e polpas de frutas nativas. Mesmo com as dificuldades relacionadas ao longo período de seca, que diminuiu a produção de matéria-prima, foi possível fazer o levantamento. "Realizamos um estudo exploratório sobre as condições de beneficiamento das frutas nas pequenas agroindústrias, incluindo boas práticas de fabricação, necessidade de melhorias e treinamentos, além de demanda por novos produtos", conta Rodrigo Paranhos, pesquisador da área de Transferência de Tecnologia da Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ), responsável pela ação.
Os dados obtidos pelo diagnóstico subsidiaram atividades de pesquisa, transferência de tecnologia e de capacitação para os agricultores familiares da cooperativa. "Há um grande potencial de agregação de valor aos frutos nativos da Caatinga, que se encontram disponíveis na região. A aceitação dos novos produtos desenvolvidos na Embrapa foi ótima entre os agricultores familiares. Começamos a abrir um canal e a fortalecer a parceria entre a área de pesquisa e o setor produtivo", destaca Rodrigo.
A estratégia de agregação de valor a frutos da Caatinga para o fortalecimento das bases econômicas da agricultura familiar no semiárido nordestino envolveu também práticas de manejo do polo extrativista de umbu na região de Uauá (BA). O diagnóstico realizado levantou informações sobre as práticas adotadas pelas comunidades locais, relacionadas ao manejo das plantas, tratamento e destinação dos frutos do umbuzeiro.
A partir desse diagnóstico e buscando a estabilidade ou aumento da capacidade produtiva do umbu em sistemas de produção de base familiar, a equipe de pesquisa da Embrapa propôs duas formas de manejo que foram implantadas na região como Unidades Práticas de Aprendizagem Tecnológica (Upat). Em primeiro lugar, recomendou-se fazer a utilização do umbuzeiro como porta-enxerto associado ao maracujá do mato em áreas em processo de degradação e desprovidas de vegetação; em seguida, o enriquecimento da Caatinga, pelo aumento da densidade de plantas de umbu gigante enxertadas e cultivadas em trilhas em meio à vegetação nativa e em áreas cercadas. "Os modelos propostos corresponderam às expectativas das comunidades, uma vez que diversos agricultores se mostraram dispostos a replicá-los em suas propriedades em função do reconhecimento das vantagens observadas nas Unidades experimentais implantadas", informa o pesquisador Francisco Araújo, da Embrapa Semiárido.
A publicação recém-lançada pela Embrapa Extrativismo do Umbu e Alternativas para a Manutenção de Áreas Preservadas por Agricultores Familiares em Uauá, BA detalha as formas de manejo validadas.
Nova variedade de maracujá do mato ou da Caatinga
Mais de 12 anos de pesquisa resultaram na primeira variedade de maracujá nativo da Caatinga recomendado para cultivo comercial: o BRS Sertão Forte, uma variação da espécie Passiflora cincinnata. Fruto do trabalho de melhoramento genético tradicional realizado na Embrapa Semiárido (PE), em parceria com a Embrapa Cerrados (DF), essa variedade é decorrente da seleção de mais de 50 tipos de maracujazeiros silvestres coletados em diferentes áreas de Caatinga. Em comparação com as plantas nativas, ela apresenta maior produtividade e maior tamanho e rendimento dos frutos.
"O maracujá do mato é a segunda principal fruta do bioma, vindo logo depois do umbu. É uma espécie silvestre, de ampla distribuição geográfica, tolerante a doenças e resistente às pragas, e muito adaptada às condições climáticas adversas da região", conta Francisco Araújo. Os frutos do BRS Sertão Forte, quando maduros, têm coloração verde-clara e pesam de 109 g a 212 g. A polpa é bastante ácida, sendo recomendada para processamento agroindustrial e elaboração de doces, geleias, sorvetes e mousses, por exemplo. Apresenta como característica de destaque maior tolerância ao estresse hídrico e longo ciclo produtivo, sendo uma alternativa viável para a agricultura familiar da região. Além disso, sua flor exuberante, arroxeada, evidencia também seu potencial ornamental para paisagismo de grandes áreas, como muros e pérgulas.
Recentemente, o maracujá do mato ou maracujá da Caatinga entrou para a Arca do Gosto do movimento Slow Food. O umbu já integra a Arca do Gosto desde 2007, que é um catálogo mundial que identifica, localiza, descreve e divulga sabores de uma região, ligados à memória, à identidade de uma comunidade e ao conhecimento tradicional local. Reúne alimentos esquecidos ou ameaçados de extinção, com potenciais produtivos e comerciais. A nutricionista Neide Rigo, que faz parte do movimento e integrou a equipe de avaliadores Arca do Gosto do Slow Food, conta: "O maracujá da Caatinga estava sendo preterido por aqueles maracujás maiores e mais suculentos. Era destinado apenas à alimentação dos animais ou à brincadeira de criança".
Para valorizar as frutas do bioma, como o maracujá do mato, ela acaba de lançar o livro Mesa farta no Semiárido: Receitas com Produtos da Agricultura Familiar, em conjunto com a Coopercuc. "A ideia é mostrar como os produtos cultivados atualmente no Semiárido podem ser preparados, incentivando o uso deles na merenda escolar e na casa dos agricultores. São receitas simples, saudáveis, com o mínimo de ingredientes processados que atendam não só a adultos, mas crianças pequenas e em idade escolar", revela. Receitas com abóbora, mandioca, umbu, maracujá do mato e outros frutos são formas novas e criativas de valorizar a biodiversidade nacional.
Aline Bastos (MTB 31.779/RJ)
Embrapa Agroindústria de Alimentos
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