08/02/17 |   Estudos socioeconômicos e ambientais

Pesquisa revela: maioria das fazendas dá prejuízo

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Foto: Henrique de Oliveira

Henrique de Oliveira -

Mais da metade das fazendas brasileiras opera com prejuízos, revela estudo sobre lucratividade agrícola realizado com os dados do Censo Agrícola de 2006. Os dados mostram que esses fazendeiros gastam muito mais do que arrecadam, levando-os a ter renda líquida negativa. O estudo sugere que isto se deve a erros na administração da propriedade e, sobretudo, erros no uso das tecnologias que adotam.

O estudo é parte de amplo diagnóstico realizado por Eliseu Alves e Geraldo Souza, da Embrapa, e Daniela Rocha, da FGV, sobre o processo de concentração da produção agrícola em um número reduzido fazendas brasileiras, o que as divide em dois grupos: os que se profissionalizaram, e têm lucros, e os que não se profissionalizaram, e têm prejuízos. 

Os dados abaixo, extraídos da tabela 6 do estudo, mostram que, dos 4,4 milhões de estabelecimentos agrícolas analisados, 1,95 milhões (44,36%) foram bem-sucedidos, ou seja, conseguiram pagar todas as suas despesas e até ter lucro. Mas, na maioria (2,45 milhões, 55,64%) das fazendas, os proprietários foram mal-sucedidos, perderam dinheiro e provavelmente consumiram parte do patrimônio para pagar as contas.

Número de estabelecimentos por classes de renda líquida e por classes de renda bruta mensal (slm)

Classes (slm)

rl >= 0

%

rl < 0

%

Total

(0 a 2]

1.010.785

34,80

1.893.984

65,20

2.904.769

(2 a 10]

586.792

58,93

408.958

41,07

995.750

(10 a 200]

332.069

70,25

140.633

29,75

472.702

Mais de 200

22.239

81,44

5.067

18,56

27.306

Total

1.951.885

44,36

2.448.642

55,64

4.400.527

Fonte: ALVES et al. Lucratividade da agricultura. Revista de Política Agrícola, ano 21, n. 2, p. 45-63, abr./maio/jun. 2012.

>= maior ou igual / < menor

 

A maior parte (77,35%) dos mal-sucedidos, como se espera, está no grupo com menor renda, de até dois salários mínimos mensais, os muito pobres. Mas, contrariando essa expectativa, a surpresa agradável é que nesse grupo há mais de um milhão de proprietários que, apesar da renda limitada, foram capazes de pagar todas as suas despesas.

Em outras palavras, mostraram capacidade para avaliar os riscos que poderiam enfrentar, para escolher tecnologias que conseguiriam usar bem e obter melhores resultados, e para manter os gastos dentro das suas possibilidades de renda. Não fossem restrições pessoais ou de mercado, tais como falta de recursos para contratar assistência técnica e adquirir tecnologias mais produtivas, e até mesmo ambientais, como secas recorrentes, teriam prosperado mais.

O reverso dessa situação se verificou nas classes de renda média (acima de 10 até 200 salários mínimos mensais) onde mais de 140 mil (29,75%), num universo de quase 473 mil estabelecimentos, operaram com renda líquida negativa. E, mesmo no grupo de renda alta (mais de 200 salários mínimos mensais), que reúne 27,3 mil propriedades, mais de cinco mil delas (18,56%) delas não produziu renda suficiente para pagar todos os seus dispêndios.

Esses dados agregados sugerem que o fator mais relevante para diferenciar os produtores entre bem sucedidos e mal sucedidos não é o volume de recursos envolvidos no negócio, mas a capacidade gerencial alocada ao empreendimento, seja no que diz respeito à contabilidade, seja no que interessa à escolha e aplicação das tecnologias. 

O pesquisador Eliseu Alves observa que, hoje, o sucesso do negócio depende muito de assessoria contábil tanto quanto de assistência tecnológica contínua e de qualidade. Egresso da antiga ACAR-MG, ele lembra que a extensão rural, quando criada no Brasil em 1948, tinha como tarefas fundamentais ensinar administração rural, para o fazendeiro, e economia doméstica, para a dona de casa, atenta ao fato de que a família podia se tornar importante fonte de despesas para o negócio. 

Com a reforma da pesquisa e da extensão, a partir dos anos 1970, os serviços de assistência técnica e extensão rural foram reorientados para priorizar o ensino de novas tecnologias, diminuindo a ênfase em administração. Impossível não imaginar que a atual insolvência dos fazendeiros seja uma resultante direta dessa decisão. Eliseu Alves defende que assessoria em administração rural, junto à consultoria tecnológica, seja tarefa urgente para a assistência técnica pública e privada.

Os pesquisadores acreditam haver indicações consistentes de que os problemas de rentabilidade se devem mais a condições estruturais – no caso, capacidade de gestão dos fazendeiros – do que a condições conjunturais, tais como clima ou oscilações de mercado. Por isso, aguardam com grande expectativa a realização de um novo censo agrícola para confirmar tais tendências. Eles suspeitam que, de 2006 para cá, os problemas não apenas se mantiveram como se agravaram.

 

Renato Cruz Silva (MTb 610/04/97v/DF)
Secretaria de Inteligência e Macroestratégias

Telefone: (61) 3448-2087

Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/

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