10/02/17 |   Estudos socioeconômicos e ambientais

Gasto maior com produção menor: a receita do prejuízo

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Foto: Henrique Carvalho

Henrique Carvalho -

Estudos realizados com dados do Censo Agrícola de 2006 mostram, com detalhes precisos e contundentes, que decisões gerenciais equivocadas afetaram a rentabilidade das propriedades rurais, determinando que mais da metade dos fazendeiros brasileiros, de todas as faixas de renda, tivessem prejuízos. 

Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores Daniela Rocha, Eliseu Alves e Geraldo Souza separaram quem teve renda líquida positiva de quem teve renda negativa e calcularam, para cada grupo, em cada faixa de renda, a despesa média por hectare, verificada em cada tipo de estabelecimento rural.

Calcularam também duas medidas de produtividade: o rendimento médio obtido em cada hectare, dividindo a renda bruta média pela área explorada, e a produtividade total do fatores (ptf) de produção, dividindo a renda bruta média das propriedades pela despesa total média. 

A tabela 8, do estudo publicado na Revista de Política Agrícola, mostra, na coluna Dispêndio, para a maioria das faixas de renda consideradas, que os produtores com renda líquida negativa (rl<0) tiveram, em média, uma despesa por hectare muito maior do que os produtores de renda líquida positiva (rl>=0), o que já sugere algum descontrole contábil. A única exceção a essa regra foram os produtores com renda mensal entre 10 e 200 salários mínimos, faixa de renda na qual os mal sucedidos gastaram um pouco menos que os bem sucedidos. 

Tabela 8. Classes de renda bruta em salário mínimo mensal e de renda líquida, Dispêndio por hectare, Rendimento (renda bruta por hectare) e ptf (renda bruta por dispêndio total).

Classes slm

R. líquida

Dispêndio (R$/ha)

Rendimento (R$/ha)

Ptf(rb/disp. total)

(0 a 2]

rl >=0

133,83

262,65

1,96

rl<0

242,34

42,97

0,18

(2 a 10)

rl >=0

345,57

685,41

1,97

rl<0

388,68

144,47

0,37

(10 a 200]

rl >=0

551,35

1.385,13

2,51

rl<0

540,28

219,52

0,41

Mais de 200

rl >=0

660,92

2.450,50

3,71

rl<0

1.537,68

478,19

0,31

Fonte: ALVES et al, Lucratividade da agricultura. Revista de Política Agrícola, ano 21, n. 2, p. 45-63, abr./maio/jun. 2012.

Legenda - >=0: maior ou igual a zero; <0: menor que zero.

 

Mas, o que realmente diferenciou os dois grupos foi o rendimento obtido, ou seja, a renda bruta gerada em cada hectare: enquanto os bem-sucedidos conseguiram, como retorno do seu investimento, o dobro, o triplo e até mesmo quase o quádruplo do dispêndio realizado, os mal-sucedidos não obtiveram, como renda bruta, nem mesmo a metade do que gastaram. Ou seja, tiveram uma taxa de retorno negativa.

Os pesquisadores observam que esta situação pode acontecer quando se tem uma quebra significativa na produção, em razão de problemas tais como seca prolongada, excesso de chuvas, geadas ou intenso ataque de pragas. Nessas situações, os efeitos de fatores como sementes e animais melhorados ou adubação são bloqueados, não gerando os ganhos de produção esperados. Mas, essas catástrofes normalmente são ocasionais e confinadas em determinados pontos do território. Não ocorrem em todo o país, e muito menos para um número tão grande de produtores ao mesmo tempo.

Mas, os erros de administração e de gestão tecnológica podem ser constantes e generalizados em todas as regiões, e afetam, de maneira negativa, a eficiência de qualquer dos fatores envolvidos na produção, quais sejam, o capital (recursos financeiros, máquinas e equipamentos), o trabalho (mão de obra, empreitas, etc.), e a terra (corretivos, fertilizantes, defensivos, plantas e animais melhorados, etc.), gerando renda líquida negativa. 

A questão crucial é que os fatores estão interligados e o baixo desempenho de um fator afeta a eficiência do outro, prejudicando a rentabilidade. Os fazendeiros estão sempre muito atentos à questão da produtividade da terra, melhorando a correção e adubação do solo, usando sementes mais produtivas. Mas, o baixo uso de mecanização ou a falta de irrigação deixa terra sem ser cultivada ou prejudica o efeito de sementes e adubos. E aí, usando a melhor tecnologia, às vezes o produtor está tendo prejuízos. 

Por isso, o indicador mais efetivo para a rentabilidade é o cálculo da produtividade total dos fatores (ptf). A ptf é o resultado da divisão da renda bruta, obtida pela venda da produção, pela despesa total, realizada nessa produção. Se o resultado dessa divisão for 1, a renda bruta foi igual à despesa: não houve lucro. Se o resultado da divisão for menor que 1, é prejuízo: a renda bruta não foi suficiente para pagar a despesa.


Lucro, ou renda líquida, só existe quando o resultado da divisão for maior que 1: a renda bruta foi suficiente para pagar toda a despesa e ainda sobrou alguma renda. Ou seja, o que superar 1 é o lucro do fazendeiro. A taxa de retorno é igual a (ptf-1). O interessante de trabalhar com a ptf é que não importa que tecnologia o fazendeiro está usando; importa a rentabilidade que está tendo.

A tabela 8 informa que, em 2006, a ptf para os bem-sucedidos, foi respectivamente 1,96, 1,97, 2,51 e 3,71. Logo, suas taxas de retorno foram 96%, 97%, 151% e 271%. Já para os mal-sucedidos, a ptf  foi respectivamente 0,18, 0,37, 0,41 e 0,31: a taxa de retorno dos empreendimentos foi negativa, de (-82%), (-63%), (-59%) e (-69%). 

Taxas de retorno quando negativas significam que o produtor, ao vender a produção, não recuperou sequer o que gastou para produzir. É perda. Perdas tão grandes indicam que esses produtores cometeram erros gravíssimos nas decisões na aquisição de insumos e de serviços, na operação de produção e e na sua comercialização. 

 

Renato Cruz Silva (MTb 610/04/97v/DF)
Secretaria de Inteligência e Macroestratégia

Telefone: (61) 3448-2087

Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/

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