27/04/17 |   Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação

Estereótipos de gênero inibem ingresso de mulheres na ciência

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Foto: Elvis Costa

Elvis Costa -

As mulheres têm produzido ciência de alto impacto no Brasil, mas estereótipos de gênero dificultam seu ingresso, formação e aproveitamento nas chamadas “ciências duras”, como física, química, matemática e computação. O diagnóstico foi feito nesta 4ª feira, 26 de abril, durante a 41ª Pauta Feminina, que discutiu “As mulheres na Ciência”.


Escolhido em parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), como parte da comemoração dos 44 anos da empresa, o tema levou gestores, pesquisadores e a própria presidente da Sociedade Brasileira do Progresso da Ciência (SBPC) a cobrarem políticas públicas e iniciativas legislativas.


“Ignorante é a sociedade que não aproveita a capacidade da mulher”, disse a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM). Procuradora Especial da Mulher do Senado, ela destacou o grande débito que setor primário brasileiro tem com a Embrapa, cujas tecnologias já valeram até a indicação de uma pesquisadora ao Prêmio Nobel, em 2007.


“O trabalho de fixação biológica do nitrogênio, realizado por Johanna Döbereiner, poupa ao Brasil bilhões de dólares”, destacou Vania Beatriz Rodrigues Castiglioni, diretora da Embrapa.


Pró-Equidade
Signatária desde 2005 do Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça, a Embrapa lançou, no início da Pauta Feminina, o vídeo “Mulheres na Ciência” (https://www.youtube.com/watch?v=9QReY268NXU), no qual nove biólogas, químicas, farmacêuticas e engenheiras agrônomas falam do trabalho na Embrapa Agroenergia.


De acordo com Vânia, dos 9.636 empregados da empresa, 30,31% são mulheres. Nas carreiras da Embrapa, as mulheres se distinguem como pesquisadoras (34,15%), analistas (47%), técnicas de laboratório (37%), trabalhos de campo (8,6%). Nos cargos de gestão, são 31%.


Impacto
 “A mulher brasileira está fazendo pesquisa de alto impacto social e internacional”, disse Helena Nader, biomédica, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.


Ela destacou pesquisa da base de periódicos Elsevier, divulgada no dia 8 de março, segundo a qual hoje, as mulheres brasileiras publicam quase metade dos artigos científicos do país.


A presidente da SBPC alertou que o Brasil está entrando, porém numa era de grande obscurantismo e que “há várias coisas acontecendo que transcendem a pauta de gênero – que hoje não diz respeito só a homem e mulher”, frisou.


Distribuição desigual
Maria Emília Walter, decana de Pesquisa e Inovação da Universidade de Brasília (UnB), trouxe dados que mostram a distribuição desigual de mulheres.


Nos cursos de Saúde, as mulheres estão presentes em 77%, na Educação, 73%, mas nas áreas de ciência, matemática e computação, o número cai para 30%.


Professora da área de computação, Maria Emília acha que seriam necessárias iniciativas legislativas para atrair as mulheres para os cursos das ciências duras. “Mas o que podemos esperar de bancadas com 90% de homens, como acontece na Câmara e no Senado?”, questionou.


Gestão
Para Maria Emília, é muito importante que as mulheres abracem o desafio dos cargos de gestão. “A ocupação de cargos de liderança nos permite participar mais de reuniões, articulações discussões públicas, como essa aqui”, disse.


A reitora Márcia Abrahão designou sete mulheres para ocupação dos oito decanatos. Tradicionalmente, as mulheres ficavam com decanatos como “assuntos comunitários” ou “graduação”, raramente “inovação e pesquisa”.


“Batalhas”
Janice Zanella, médica veterinária, chefe-geral da Embrapa Suínos e Aves, lembrou das restrições que lhe fizeram, quando pleiteou uma chefia. “Você pode ajudar mais na pesquisa do que na gestão”, me diziam.


Segundo ela, as mulheres enfrentam “uma batalha externa e interna”, por investir seu tempo na realização profissional e não no papel tradicional de mãe. “A culpa é pior quanto mais você gosta de seu trabalho”, afirmou. Ela defende que as mulheres se apoiem mais, sabedoras dos desafios comuns. “O pior machismo é o que vem da gente”, disse


“Os homens são promovidos pelo potencial, enquanto as mulheres têm que justificar porque estão ali”, disse. Para ela, esses padrões são estimulados desde cedo. “As meninas quando querem organizar, são chamadas de mandonas; já o menino “é um líder nato”.


Socialização
Marília Regini Nutti, engenheira de alimentos e pesquisadora da Embrapa Agroindústria de Alimentos, enfatizou a importância da educação desde a educação primária.


“Os meus pais queriam muito um Marcelo, mas vieram três mulheres, Marilda, Marília e Miriam”. Porém, meu pai sempre nos encorajou, de andar de carrinho de rolimã e jogar futebol a escolher engenharia mecânica”.


Para ela, as mulheres não podem ser egoístas na questão da igualdade de gênero. Precisamos considerar também as pessoas LBT e outros gêneros, para que não cometamos com outros o mesmo que cometeram conosco”.


Primeira escola
Marcia Barbosa, física e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, laureada em 2015 com o Prêmio L’Oreal/Unesco Por Mulheres na Ciência, disse que é fundamental que se discuta gênero na primeira escola.


De acordo com ela, pesquisa publicada na Revista Science, em 2013, mostra que crianças de 5 anos de idade respondem que meninos e meninas são igualmente inteligentes e simpáticos; mas aos 6, 7 anos, começam a achar que os meninos são mais inteligentes e as meninas mais simpáticas. “E na hora de escolher brincar, os meninos preferem os jogos difíceis e as meninas os jogos de esforço”, disse.


Para Márcia, as mulheres enfrentam obstáculo reais, como os preconceitos em relação a ter filhos e a criminalização da decisão de não ter os filhos.
Além disso, “há avaliações diferentes, caso o trabalho seja assinado por João ou por Jenifer – isso até quando feita por mulheres”.


Publicação
A deputada Jô Moraes, 2ª Procuradora Adjunta da Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados, destacou a importância da mobilização da sociedade na Marcha pela Ciência no dia 22 de março e sugeriu que o conteúdo da Pauta Feminina fosse transformado em publicação para servir como referência parlamentar.


Um levantamento sobre as iniciativas legislativas, realizado em março de 2017, a pedido da Procuradoria Da Mulher do Senado, concluiu que “a promoção da mulher à condição de sujeito da produção científica não foi ainda alçada à condição de problema legislativo”.


Os consultores afirmam, no documento, que “é provável que o problema seja antes o do estabelecimento de metas de socialização de incentivo a práticas científicas por parte das mulheres do que a demolição de barreiras nas instituições de pesquisas, pois parece que não as há”.


Quem participou do evento pôde, ao final, conhecer produtos da pesquisa da Embrapa, desenvolvidos com participação de mulheres. Foram oferecidos para degustação: antepasto de cogumelos (Embrapa Agroenergia), biscoito de soja (Embrapa Soja), bolo e pães de farinha de batata-doce fortificada (Embrapa Agroindústria de Alimentos / Hortaliças), bolo de macaúba (Embrapa Agroenergia), caldo de feijão (Embrapa Produtos e Mercado), café arábica e canéfora (Embrapa Rondônia) embutidos de carne suína (Embrapa Suínos e Aves / BRF) e maracujás (Embrapa Cerrados). As debatedoras receberam, como lembrança, livros doados pela Embrapa Informação Tecnológica.

Lunde Braghini Júnior (Senado Federal)
Embrapa Agroenergia

Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/

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