Trabalho em parceria muda a realidade da pecuária em Alta Floresta
Trabalho em parceria muda a realidade da pecuária em Alta Floresta
Deixar de constar na lista de municípios desmatadores da Amazônia e se tornar referência em produção sustentável. Esse salto foi dado por Alta Floresta nos últimos anos. Grande parte da responsabilidade vem de uma parceria entre o Instituto Centro de Vida (ICV), a Embrapa, a prefeitura local e outras entidades públicas e privadas.
Com uso de tecnologias de boas práticas agropecuárias recomendadas pela Embrapa, o ICV conduziu inicialmente o projeto piloto de Pecuária Integrada de Baixo Carbono e na sequência ampliou a iniciativa com o Novo Campo. Nesses trabalhos, pecuaristas da região tiveram acesso à assistência técnica e puderam adotar uma série de procedimentos que impactaram no manejo e na gestão das fazendas, na sustentabilidade da atividade e na geração de renda.
Para participar do projeto, as fazendas foram orientadas a seguir procedimentos que constam no programa de Boas Práticas Agropecuárias (BPA) desenvolvido pela Embrapa Gado de Corte. Pelo BPA, são verificadas questões como gestão ambiental, recursos humanos, bem estar animal, instalações rurais, nutrição, manejo sanitário e reprodutivo, gestão, entre outros itens. De acordo com a conformidade com os preceitos do programa e com o atendimento parcial ou integral das condições, as propriedades são classificadas em ouro, prata ou bronze.
O pesquisador da Embrapa Agrossilvipastoril Luciano Lopes explica que nesse projeto o BPA foi adaptado. Ele não fez a classificação das propriedades, como de costume, e sim foi um norteador para a melhoria das práticas agropecuárias.
“Foi feita uma inversão. Primeiramente as fazendas foram adequadas e implantaram os procedimentos previstos no BPA. Depois, num segundo momento, é que elas passarão pelo check list do BPA para receberem as respectivas classificações”, explica Luciano.
De acordo com o coordenador de iniciativa de pecuária sustentável do ICV, Francisco Beduschi, o programa BPA foi fundamental para a viabilidade do projeto, uma vez que permitiu a aproximação com o produtor e o convenceu a participar do projeto.
“O foco do ICV é conservação ambiental, a preservação das APPs e o desmatamento zero. O BPA foi essencial por mostrar que estávamos sim preocupados com a questão ambiental, mas também estávamos preocupados na parte produtiva, em possibilitar uma produção sustentável”, afirma Francisco Beduschi.
Assistência técnica
Além de fornecer o programa que norteou o projeto, a Embrapa capacitou profissionais de assistência técnica por meio de programas de capacitação continuada conduzidos pela Embrapa Agrossilvipastoril.
Esses técnicos foram responsáveis pelo acompanhamento das fazendas. Cabia a eles fazer o diagnóstico da propriedade e, ao lado do produtor, elaborar um plano de trabalho de acordo com as características e objetivos do empreendimento. Em cada fazenda foi escolhida uma área de 10 a 15% do total da área de pastagens para ser conduzida de maneira intensificada.
Ações como a recuperação de pastagens em degradação, divisão em piquetes menores para pastejo rotacionado, diversificação de cultivares de capim e fornecimento de sombra com o plantio de árvores, foram feitas ao mesmo tempo em que áreas de preservação permanente foram isoladas e bebedouros foram instalados de modo a impedir o acesso do gado aos cursos d’água.
Orientações sobre manjo sanitário, nutricional e reprodutivo dos rebanhos e sobre a gestão da propriedade também foram passadas aos produtores.
Os resultados não demoraram a aparecer. Entre as seis fazendas de pecuária de corte que participaram da primeira fase do projeto, a média de produção por hectare nas áreas intensificadas foi de 20,75 arrobas por ano. O número é o dobro da média das demais áreas das mesmas propriedades e quatro vezes maior do que a média da região de Alta Floresta.
A taxa de lotação também aumentou. Nas áreas intensificadas ficou em 2,71 ua/ha (unidade animal por hectare), acima dos 1,6 ua/ha da média geral das seis fazendas e dos 1,22 ua./ha da região.
O pecuarista Francisco Militão, da Fazenda São Mateus, confessa que no início houve certa desconfiança. Porém, acreditou no projeto e não se arrependeu. Para ele, esse trabalho mudou completamente a forma se fazer a pecuária.
“Mesmo que a gente saísse do projeto esse processo de mudança não tem volta. A gente não voltaria a ser aquele pecuarista tradicional. Vimos que é possível fazer boas práticas na pecuária, melhorar a gestão e adequar ambientalmente, tudo de uma forma harmônica. É possível produzir bem em uma área menor e o lucro vai aparecendo. E você aos poucos vai melhorando sua estrutura, seu maquinário, valoriza seus funcionários...”, conta o pecuarista que motivado pelos bons resultados do projeto tem ampliado a área intensificada em sua propriedade.
Mercado
A mudança não foi sentida pelos produtores somente da porteira para dentro. Novas portas também foram abertas para a carne produzida em Alta Floresta. Primeiramente uma grande rede de frigoríficos tornou-se parceira do projeto, incentivando a produção de carne sustentável na Amazônia.
Em 2016, foi a vez de uma rede mundial de fast food anunciar que voltaria a comprar carne produzida da Amazônia em projetos de pecuária sustentável, como o implantado em Alta Floresta. Essa carne, inclusive foi utilizada pela empresa em seus restaurantes montados dentro da Vila Olímpica durante as Olimpíadas do Rio de Janeiro.
Continuidade
Hoje, com dezenas de produtores adotando as boas práticas agropecuárias em Alta Floresta e região, os conceitos de produção sustentável e intensificação da produção estão disseminados na região. Uma empresa de consultoria e assistência técnica surgida por intermédio do projeto é a grande responsável por viabilizar a continuidade das iniciativas.
De acordo com o coordenador do ICV Francisco Beduschi, um protocolo de produção sustentável foi estabelecido na região e é o principal legado do trabalho. Agora, o foco da ONG está mais na disseminação desse protocolo, levando-o a outras regiões da Amazônia, dentro e fora do Brasil.
“Recebemos muitas visitas de pessoas interessadas no trabalho que foi feito em Alta Floresta. Inicialmente era um público mais técnico, hoje são produtores interessados em adotar as práticas em suas propriedades”, afirma, exemplificando com um grupo de colombianos que visitou a região recentemente.
Gabriel Faria (mtb 15.624 MG JP)
Embrapa Agrossilvipastoril
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