Palestrantes mostram viabilidade dos sistemas orgânicos de produção animal no Congresso Latino-americano de Agroecologia
Palestrantes mostram viabilidade dos sistemas orgânicos de produção animal no Congresso Latino-americano de Agroecologia
Foto: Breno Lobato
João Paulo Soares apresentou resultados de pesquisas realizadas pela Embrapa Cerrados com produção orgânica de forragem
Os pesquisadores João Paulo Soares, da Embrapa Cerrados (Planaltina, DF) e Jorge Ludke, da Embrapa Suínos e Aves (Concórdia, SC), além do produtor rural e deputado distrital Joe Valle, participaram da mesa “Sistemas Orgânicos de Produção Animal” na tarde da última terça-feira (12), durante o VI Congresso Latino-americano de Agroecologia, X Congresso Brasileiro de Agroecologia e V Seminário de Agroecologia do Distrito Federal e Entorno, evento realizado no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília, nos dias 12 a 15 de setembro. A mesa teve a mediação de Luiz Carlos Ferreira, extensionista rural da Emater-DF.
João Paulo Soares fez palestra sobre produção orgânica animal e apresentou dados de pesquisas sobre manejo agroecológico de pastagens na produção orgânica de leite e carne bovina realizadas nos últimos oito anos na Embrapa Cerrados. Ele destacou a importância da presença do animal nos sistemas orgânicos, sobretudo para a produção de matéria orgânica para a produção agrícola. “Se não tivermos animais no sistema, como teríamos, hoje, um dos principais insumos para a produção de hortaliças orgânicas no Brasil?”, indagou.
O pesquisador mostrou o histórico dos projetos de pesquisa com sistemas orgânicos de produção animal realizadas por ele a partir de 2003 na Embrapa. “Avançamos muito com os resultados de pesquisa, sobretudo porque houve um boom de vários e importantes acontecimentos políticos-institucionais que promoveram esse processo”, disse, citando a implantação, nos últimos anos, do portfólio de projetos de pesquisa sobre agricultura de base ecológica pela Embrapa, da Política Nacional de Agroecologia e dos Planos Nacionais de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo I e II).
Resultados de pesquisa
Em seguida, Soares apresentou os avanços obtidos em algumas tecnologias e pesquisas realizadas em manejo de pastagens, citando um experimento de comparação do manejo orgânico e convencional de pastagens de braquiária (B. brizantha cv. Marandu), comum entre os produtores da região Centro-Oeste, em consórcio com estilosantes (S. guianensis cv. Bela) no Cerrado. Os testes foram realizados em Planaltina (DF) e Unaí (MG).
No primeiro ano de observação em Planaltina, o manejo convencional produziu mais matéria seca de braquiária em consórcio com o estilosantes que no manejo orgânico. Segundo o pesquisador, a liberação mais rápida dos nutrientes pelos insumos convencionais permitiu o crescimento mais acelerado das plantas, enquanto a liberação mais lenta no orgânico resultou em menor crescimento das plantas. Mas a partir do segundo ano, a produção orgânica de matéria seca foi maior na seca e nas águas.
No período das águas, a pastagem consorciada sob manejo orgânico obteve maior teor de proteína bruta, assim como no período de seca. Por outro lado, o teor de fibras foi sempre maior no manejo convencional, que também resultou em digestibilidade menor. O pasto com produção orgânica, usando insumos alternativos, obteve, portanto, melhor qualidade nutricional, apesar de menor produtividade por área. “No manejo orgânico, a liberação lenta de nutrientes faz que haja produtividade adequada para a carga animal que seria utilizada. Ou seja, produz bem e se mantém resiliente, inclusive, no período da seca”, explicou Soares.
Ele acrescentou que a leguminosa do consórcio se desenvolveu melhor sob manejo orgânico, chegando a constituir 28,3% da matéria seca, contra no máximo 12,59% no manejo convencional. “A leguminosa tem uma capacidade natural de fixar o nitrogênio no solo. Mas no manejo convencional é aplicado adubo nitrogenado, e a leguminosa não vai bem”, justificou, acrescentando que em Unaí, apesar do menor volume de chuvas o comportamento observado no experimento foi o mesmo.
O pesquisador também apresentou dados sobre experimentos comparativos entre manejo convencional e orgânico de volumosos como fontes de suplementação a partir capim-elefante BRS Canará, cana-de-açúcar, leucina, além de um experimento de dois anos com banco de proteína de S. guianensis cv. Bela em sistema orgânico.
Ao final, o pesquisador da Embrapa Cerrados teceu algumas considerações, destacando que os sistemas orgânicos de produção animal são uma técnica economicamente viável, e que existem vários arranjos produtivos para a propriedade leiteira, devendo ser considerados a propriedade, a paisagem e os recursos naturais, mas que necessitam ser equilibrados.
Agroecologia em suínos e aves
O pesquisador Jorge Ludke falou sobre a agroecologia na transformação dos sistemas agroalimentares na América Latina e alimentos alternativos. Ele mostrou alternativas de sistemas integrados de produção de aves com horticultura, fruticultura e pastagens. Segundo o pesquisador, os pontos críticos para a alta produtividade nos sistemas de produção orgânica intensiva são sanidade, instalações, alimentação e manejo.
Ludke falou sobre alimentos que possam ser alternativas à soja e ao milho na nutrição de suínos e aves. Segundo pesquisador, a questão básica da redução do custo e do bem estar das aves e suínos está na produção de forragem de qualidade. Ele citou algumas alternativas, como amendoim forrageiro, cana-de-açúcar, mandioca e guandu, e apontou que a ração com milho ou farelo de soja representa 70% a 80% do custo de produção de suínos e aves.
O pesquisador explicou que as pesquisas sobre produção de alimentos alternativos para suínos e aves têm como premissas o sistema de produção diversificado; autossustentação da unidade de produção; complementariedade das culturas vegetais no espaço e no tempo, aproveitamento integral da produção vegetal; garantia da qualidade da produção; bem como a produção vegetal planejada de acordo com os objetivos.
Entre as alternativas ao milho transgênico, Ludke apontou o milheto, cereal que tem 60% a 70% do preço do milho, composição energética comparável e teor superior de aminoácidos; o sorgo, cujo preço é cerca de 80% do milho; o farelo de arroz, excelente fonte de fósforo; a silagem da filetagem da tilápia, rica em fósforo; o farelo de palma forrageira, rica em cálcio; a mandioca (folhas e raízes) e a farinha de varredura (resíduo da produção); resíduos do processamento da goiaba, do tomate e dos grãos de girassol; a goiaba e o girassol integral. “Além disso, muitos alimentos têm o potencial de oferecer vantagens além da nutrição. Não se pode usar o antibiótico no sistema orgânico, mas você pode usar o alho e a semente de abóbora, que contém princípios bioativos que podem ajudar a enfrentar algumas dificuldades na produção”, afirmou.
Experiência de produtor
Proprietário da Fazenda Malunga, no Distrito Federal, Joe Valle falou sobre a experiência pessoal com produção orgânica de leite e detalhes do sistema desenvolvido na propriedade. A fazenda produz em torno de 1 mil a 1,1 mil litros diários, com expectativa de alcance de pico de 1,2 mil litros/dia até o final deste ano.
Ele destacou que para a produção animal é fundamental a vocação do produtor e a relação homem-animal, e que o principal insumo é o conhecimento dos diferentes aspectos que envolvem a produção, como estrutura do rebanho, manejo, instalações e gestão da propriedade. “Mas a roda começa a girar pelo mercado, por isso é fundamental fazer a sua caracterização. Um dos principais problemas do DF, por exemplo, é que não há venda de animais”, apontou.
Para Valle, o ser humano é fator fundamental na produção. “Como ele entra e entende esse processo? Se não achar caminhos com tecnologia e conhecimento para compreender o mundo em que vivemos, ninguém fica na roça”, declarou, acrescentando que ainda falta aos produtores de leite orgânico uma visão sistêmica na aplicação das tecnologias, que leva em conta alimentação, manejo, sanidade e os recursos humanos.
Segundo o produtor, os principais gargalos da produção orgânica de leite são a falta de maior difusão do conhecimento, a legislação sanitária e a falta de uma cadeia estabelecida. Apesar das dificuldades, a Fazenda Malunga consegue obter 17% de rentabilidade no ciclo completo da atividade, com faturamento bruto mensal de R$ 150 mil. “Produzir leite é: muita persistência, muito suor e muitas lágrimas”, declarou.
O Congresso de Agroecologia 2017 foi promovido pela Sociedade Científica Latino-Americana de Agroecologia (SOCLA) e Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) e organizado em Brasília por uma comissão formada por representantes da Embrapa, Universidade de Brasília, EmaterDF, Secretarias de Estado do GDF (Seagri e Sedestmidh), IBRAM e ISPN. Contou com o apoio de vários ministérios, organizações e movimentos sociais. O evento teve o patrocínio do BNDES, Itaipu Binacional e Fundação Banco do Brasil. Mais informações em www.agroecologia2017.com e nos perfis do Facebook e Instagram.
Breno Lobato (MTb 9417-MG)
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