Termina Workshop sobre Desenvolvimento Sustentável em Ambientes de Montanha
Termina Workshop sobre Desenvolvimento Sustentável em Ambientes de Montanha
Após dois dias de discussões, chegou ao fim em Nova Friburgo o III Workshop sobre Desenvolvimento Sustentável em Ambientes de Montanha – evento integrante do Mountains 2018. Os debates englobaram desde produção agrícola e pagamento de serviços ambientais até turismo ecológico e mudanças climáticas, culminando na apresentação da chamada Carta de Nova Friburgo, uma iniciativa dos participantes para alertar a sociedade e o poder público sobre a importância de ações focadas nos ambientes de montanha. “Essa carta traz para a Embrapa a responsabilidade de, enquanto empresa pública, atuar nesse contexto, com novas propostas e projetos de pesquisa”, afirma Fernando Teixeira Silva, chefe-adjunto de Transferência de Tecnologia da Embrapa Agroindústria de Alimentos.
A necessidade de implementação de políticas públicas específicas, inclusive, foi um dos fatores mais destacados pelos palestrantes e organizadores do evento. “O Brasil tem 16% de seu território em áreas de 600 metros ou mais de altitude. Somos signatários de vários documentos importantes e não temos políticas públicas para as montanhas. Esperamos contribuir para a criação de normas que diferenciem o uso de ambientes planos de outros montanhosos”, afirma a pesquisadora da Embrapa Agrobiologia Adriana Aquino, presidente da comissão organizadora do Mountains.
O diretor de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa, Celso Moretti, reafirmou a importância do debate, destacando que o evento constitui-se em um excelente momento para a formulação de políticas públicas, de manejo do solo, da água, da biodiversidade, da relação entre agroturismo e agricultura e do nexo da produção de alimentos com a gastronomia. “Esta é uma amostra de que continuamos acreditando que investir em ciência e tecnologia gera renda, emprego e desenvolvimento. Hoje somos um dos países que mais produzem com sustentabilidade, sendo que 25% do nosso território estão preservados dentro das propriedades rurais. Ao todo, temos 66% do território formado por florestas e matas nativas”, destaca.
Entretanto, as montanhas são muito mais do que áreas florestais ou econômicas. São também espaços de expressão cultural. É o que afirma o professor Martin Price, da University of Highlands and Islands, da Escócia, que ministrou palestra sobre a importância dos ambientes montanhosos para o desenvolvimento sustentável. Segundo ele, esses são espaços de recreação e turismo, fonte de recursos minerais ou biológicos, berço de boa parte da água destinada à irrigação, energia, abastecimento urbano, e até mesmo locais tidos como sagrados.
Sustentabilidade, pagamento por serviços ambientais e turismo ecológico
As inúmeras possibilidades que os ambientes montanhosos oferecem para as comunidades neles inseridas são potencializadas quando instituições governamentais, associações e cooperativas atuam para promover a sustentabilidade e o turismo responsável. O pagamento por serviços ambientais (PSA), por exemplo, é uma das ferramentas que vêm sendo implementadas com sucesso em recentes experiências nas regiões serranas da Mata Atlântica e da bacia do Rio Paraíba do Sul, entre São Paulo e Rio de janeiro.
“Precisamos valorizar o capital humano e ambiental das propriedades para efetivamente termos benefícios ambientais. A visão, hoje, ruma para a compatibilidade entre ações ambientais e produtivas”, afirma o biólogo Gilberto Pereira, coordenador-executivo do projeto Conexão Mata Atlântica, que abriu uma mesa-redonda sobre PSA, ao lado do engenheiro florestal Flávio Monteiro, da Associação Pró-Gestão das Águas da Bacia hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (Agevap), e do professor João Azevedo, do Centro de Pesquisa de Montanhas do Instituto Politécnico de Bragança.
Outra perspectiva é incentivar a produção sustentável de artigos artesanais, manufaturados e locais, como destaca o diretor-executivo da Fundação ProYungas, da Argentina, Sebastián Malizia. “Nosso foco é na produção ambiental e socialmente responsável. Os princípios são: trabalhar com sustentabilidade, com respeito aos direitos da comunidade e conservando a biodiversidade”, conta.
No que se refere ao turismo, por sua vez, as montanhas têm atraído cada vez mais visitantes em todo o mundo – e conciliar isso à preservação ambiental e à produção rural é um desafio. Mas, segundo especialistas, é uma tarefa possível. “A visitação nesses espaços não é antagônica à conservação. É preciso mudar essa visão e entender que elas andam juntas”, opina a escaladora e montanhista Kika Bradford, presidente da Confederação Brasileira de Montanhismo e Escalada (CBME).
No Brasil, o montanhismo e o trekking vêm ganhando cada vez mais adeptos – e especialmente no Rio de Janeiro isso foi ainda mais estimulado com a inauguração, em 2017, da trilha Transcarioca, com 200 quilômetros de extensão. Trata-se da primeira trilha de longo curso no Brasil e o maior percurso urbano da América Latina. De acordo com o coordenador-geral de Uso Público e Negócios do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Pedro Menezes, as trilhas de longo curso asseguram o uso público do meio ambiente como direito inalienável da sociedade, geram emprego e renda, e ainda estimulam a conservação ambiental.
Mudanças climáticas e montanhas
Outro desafio que se mostra ainda maior nas regiões montanhosas é a adaptação às transformações climáticas. De acordo com Martin Price, as mudanças no clima vêm se intensificando e são grandes responsáveis pela redução das geleiras, pela migração de espécies vegetais para locais mais altos, pelo risco de extinção de anfíbios, pelo aumento no número de deslizamentos e também pelo aumento de períodos de secas e de incidência de doenças.
Após as fortes chuvas que atingiram o município de Nova Friburgo em janeiro de 2011, provocando uma das maiores tragédias ambientais do Brasil, o mapeamento e a gestão de riscos tornaram-se ferramentas cada vez mais importantes para antever situações e prevenir novos desastres. “Temos trabalhado com pesquisas fundamentais para entender como se dão os movimentos de massa, pesquisas aplicadas para transferir o conhecimento às comunidades locais, e também com extensão, buscando a integração entre a Universidade e as comunidades em risco”, informa o professor Leonardo Freitas, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Segundo ele, há uma propensão de ocorrer desastres na região serrana do Rio de Janeiro – e em toda a Serra do Mar –, especialmente devido às condições de clima e relevo locais, com encostas muito íngremes. O geógrafo Pedro Higgens, assessor técnico da Secretaria de Meio Ambiente de Nova Friburgo, também citou as características de relevo e latitude do município como causadoras de uma dinâmica climática bem específica e destacou que hoje o município integra um projeto-piloto de Gestão Integrada de Riscos em Desastres Naturais (Gides). “Hoje vemos que há melhoria de redes de radares, instalação de pluviômetros em áreas de risco e equipamentos de alerta para as comunidades. Dentro do projeto Gides, estamos atuando principalmente no eixo de mapeamento de perigo e risco a movimentos gravitacionais de massa”, informa.
Além de aumentar as chances de desastres, as mudanças climáticas afetam as populações de montanhas também de outras formas. É o que afirma a pesquisadora Sarah-Lan Mathez-Stiefel, do Centre for Development and Environment (CDE) e do World Agroforestry Centre (ICRAF), no Peru. Segundo ela, os Andes peruanos apresentam grande vulnerabilidade e vêm sofrendo com o aumento das temperaturas, o aumento do degelo dos glaciares e, paralelamente, com a grande pobreza e dependência de recursos naturais por parte das comunidades ali inseridas. “São fatores que aumentam os desafios de encarar as mudanças climáticas”, traduz.
Além dessas discussões, o Workshop envolveu uma sessão de pôsteres e outra oral com relatos de experiências diversas relacionadas às muitas possibilidades de atividades econômicas e de conservação ou recuperação ambiental que circundam o ambiente montanhoso. Outras duas mesas-redondas também ampliaram a discussão: uma falando sobre os desafios para ação e manejo sustentável dessas áreas e outra com experiências de políticas nacionais para regiões de montanha.
Sobre o Mountains
O Mountains 2018 é um evento organizado conjuntamente pela Embrapa, pela ONG Crescente Fértil, pelo Centro de Investigação de Montanha, pelo Instituto Politécnico de Bragança, pela Universidade Federal do Ceará, pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, pela Unesco, pelo Mountain Partnership e pela University of Highlands and Islands. Esta é a segunda edição do encontro – a primeira foi em 2016, em Bragança, Portugal.
A programação do Mountains envolve ainda a II Conferência Internacional sobre Pesquisa para o Desenvolvimento Sustentável em Regiões de Montanhas, que começa nesta quinta-feira, também em Nova Friburgo. Entre o workshop e a conferência, os participantes puderam conhecer de perto algumas experiências bem-sucedidas em regiões de montanhas, durante excursões técnicas temáticas. “Buscamos oferecer oportunidades para que conheçam atividades e experiências, produtos e serviços de qualidade e ambientalmente sustentáveis”, explica o pesquisador Mauro Vianello, da Embrapa Agroindústria de Alimentos e membro do comitê organizador do Mountains.
Agricultura orgânica, socioagrobiodiversidade, educação do campo, turismo sustentável, agricultura familiar, sistemas agroflorestais, fruticultura orgânica, pecuária leiteira, cafeicultura, produção animal, serviços ecossistêmicos, artesanato, gestão de áreas de risco ambiental, recuperação de áreas degradadas e visitação em área de proteção ambiental são alguns dos temas abordados nas excursões, realizadas nesta quarta-feira.
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Liliane Bello (MTb 01799/RJ)
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