Indústria do pescado vai se beneficiar com material produzido pela Embrapa
Indústria do pescado vai se beneficiar com material produzido pela Embrapa
A qualidade da carne da tilápia e da ração oferecida a peixes cultivados no Brasil poderá ser aferida com mais exatidão a partir de materiais de referência para laboratórios produzidos na Embrapa Pecuária Sudeste, em São Carlos (SP). Esses materiais devem auxiliar os laboratórios a fornecerem dados confiáveis para facilitar a aplicação da legislação brasileira sobre os limites máximos de contaminantes inorgânicos em alimentos e favorecer as exportações da indústria do pescado.
A pesquisa que resultou na criação dos dois materiais – de ração e de tecido de peixe – foi tema da tese de doutorado em química analítica de Mayumi Silva Kawamoto, recém-defendida na USP (Universidade de São Paulo). Ela foi orientada pela pesquisadora Ana Rita Nogueira, da Embrapa Pecuária Sudeste. Tanto a ração quanto o tecido de peixe foram fornecidos por produtores comerciais. Os pellets da ração foram doados pelo Grupo Matsuda e os filets de peixe pelos grupos Ambar Amaral e Netuno. A doação foi intermediada pela PeixeBR (Associação Brasileira de Piscicultura).
Os resultados fazem parte do BRS Aqua, o maior projeto de pesquisa em aquicultura já desenvolvido no país. A iniciativa envolve mais de 20 centros de pesquisa da Embrapa, cerca de 270 empregados da empresa e recursos financeiros da ordem de quase R$ 45 milhões do Fundo Tecnológico do BNDES/Funtec, R$ 6 milhões da Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca (que estão sendo executados pelo CNPq) e, como contrapartida, R$ 6 milhões da própria Embrapa.
O centro de pesquisa de São Carlos recebeu a doação de 150 quilos de tecido de tilápia, que foram liofilizados (desidratados a baixas temperaturas, sem perda das propriedades do produto original), moídos e homogeneizados, pesando no final aproximadamente 30 quilos, que foram envasados em 600 frascos.
A irradiação do material – processo que aumenta o tempo de vida – foi feita no Ipen (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares), em São Paulo. A equipe de Ana Rita verificou a homogeneidade dentro dos frascos e entre os frascos e a estabilidade a curto e a longo período. Em seguida, amostras foram distribuídas a alguns laboratórios aptos a realizar análises semelhantes.
Com a avaliação estatística dos resultados, foi elaborada uma carta controle com os valores definidos, por exemplo, de cálcio, fósforo, magnésio, potássio, cobre, ferro, manganês e zinco e suas incertezas associadas. A amostra produzida e respectiva carta controle estão sendo distribuídas para os Laboratórios Nacionais Agropecuários e outros laboratórios interessados.
Para o material de referência de ração, 40 quilos de material doado por fabricantes também foram moídos, homogeneizados, peneirados e envasados, seguindo o mesmo caminho do tecido de tilápia.
A indústria do pescado poderá utilizar esses materiais para controle de qualidade em seus laboratórios, tanto na calibração de instrumentos quanto para diagnosticar problemas com os métodos utilizados. Ana Rita disse que o trabalho não envolve a identificação de resíduos de medicamentos nos peixes – essa ação exigiria outro processo, que já vem sendo conduzido por outra Unidade da Embrapa.
Veja, abaixo, uma entrevista com Mayumi Kawamoto e Ana Rita Nogueira, sobre os dois materiais de referência:
Embrapa: Já existia algum tipo de material nessa linha para os laboratórios?
Mayumi Kawamoto: Material de referência de ração para peixe não há, nem nos principais produtores no mundo. Existem alguns outros materiais que são insumos para ração. Inclusive, um que é de milho e que antes era produzido pelo Nist, nos Estados Unidos, e agora é produzido pela NRC no Canadá, que se chama Corn Bran e tem validade de dez anos. Alguns materiais de referência de peixe são disponibilizados pelos principais produtores mundiais, como Nist e NRC, porém nenhum específico da tilápia. No Brasil alguns materiais de outros tipos de peixe já foram produzidos pela USP, pela UFABC (Universidade Federal do ABC) e pelo Ipen, mas não com a mesma quantidade de elementos que estamos analisando. Além disso, esses materiais não estão disponíveis no mercado, pois foram produzidos somente para pesquisa. A intenção do nosso trabalho é produzir material suficiente para distribuição aos laboratórios que realizam análises com este tipo de material.
Embrapa: Como os laboratórios vão utilizar esses materiais de referência?
Mayumi: Esses materiais serão utilizados para que os laboratórios possam avaliar os teores de nutrientes e possíveis contaminantes no músculo e na ração do peixe. O material de referência de ração de peixe que já foi distribuído aos laboratórios está sendo empregado para treinamento, na avaliação da precisão da exatidão e no controle de qualidade das análises de rotina. Não são certificados, mas foram produzidos de acordo com as normas internacionais. O mais interessante do trabalho é que, além de a ração para peixe ser um material novo, ele é fornecido por um produtor nacional, então é compatível com o tipo de ração usado nos cultivos no país. Tem 32% de proteína bruta, é uma ração utilizada para a fase de crescimento e engorda de peixe, inclusive é utilizada para a tilápia, que é o peixe que usamos para fazer o material de referência de peixe. A tilápia no Brasil hoje tem uma representatividade muito alta para o cultivo. Por isso foi escolhida dentro do projeto BRS Aqua para ser a espécie alvo do trabalho.
Embrapa: Todos os produtores de peixe devem providenciar a análise?
Mayumi: Todas as indústrias que trabalham com exportação de peixe têm que fazer, inclusive o Ministério da Agricultura faz essas análises. E é muito importante que se tenha um material de referência que o laboratório possa usar para o controle de qualidade e que seja compatível com a qualidade do pescado nacional, tenha a mesma faixa de concentração. Esse foi um dos principais motivos para a gente desenvolver esse material. Os materiais de referência de peixe que existem no mercado, além de serem muito caros – chegam a custar até R$ 10 mil, porque são importados –, nem sempre têm a concentração compatível com um produto que é cultivado no Brasil. Os laboratórios precisam desse material para fornecer resultados confiáveis para os produtores, evitando desperdícios e proporcionando melhoria da qualidade dos peixes cultivados no Brasil. É necessário atestar sua qualidade mesmo para o pescado que é capturado.
Embrapa: Como vai funcionar na prática?
Ana Rita Nogueira: O produto servirá para avaliar o resultado da análise. O produtor ou os órgãos fiscalizadores solicitam uma análise em qualquer laboratório. Para que o laboratório saiba se o resultado que ele obteve está correto ele faz uma comparação. Por exemplo, a amostra que a Mayumi está produzindo, quando distribuída aos laboratórios, vai acompanhada de um documento em que estão descritas as quantidades dos elementos - cálcio, cobre, magnésio, etc.- que têm naquela amostra. O analista faz a análise na amostra comercial que o laboratório recebeu e também na amostra que a Embrapa forneceu, que tem resultados conhecidos. Se os resultados obtidos com a amostra fornecida pela Embrapa estiverem iguais aos valores que constam do documento, ele sabe que o resultado está correto e, portanto, o resultado que se obteve com a amostra desconhecida pode ser liberado, pois é confiável. É uma forma de avaliar a exatidão do procedimento.
Embrapa: A pesquisa está concluída?
Mayumi: O tecido de peixe será finalizado até o meio do ano (2019). A ração já foi finalizada com a emissão do documento de análise e distribuição aos principais laboratórios, principalmente os que participaram do ensaio colaborativo que contribuiu para a definição dos resultados finais. Os laboratórios participantes – cada um levou um frasco – fizeram as análises e, para a caracterização desse material, foram feitas análises estatísticas com os dados fornecidos por eles.
Embrapa: Esse resultado influencia o mercado?
Mayumi: O material de referência para o peixe é muito importante porque a gente tem a questão de legislação no país. A última foi a RDC (Resolução da Diretoria Colegiada) nº 42 da Anvisa, que estabelece limites para alguns desses elementos – tanto os macro e micronutrientes quanto alguns contaminantes. Para alguns existem limites estabelecidos que precisam ser atendidos pelos laboratórios e indústrias de pescado. Por isso é importante ter um material que tenha a concentração definida desses elementos e dos contaminantes, para que eles possam garantir a qualidade da análise.
O nome oficial do projeto BRS Aqua é “Ações estruturantes e inovação para o fortalecimento das cadeias produtivas da aquicultura no Brasil” Conheça mais sobre essa iniciativa aqui.
Ana Maio (Mtb 21.928)
Embrapa Pecuária Sudeste
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