Artigo: Como as doenças de plantas funcionam
Artigo: Como as doenças de plantas funcionam
A especialização da produção vegetal, com o cultivo em larga escala de espécies isoladas ou em sistemas pouco diversificados, ainda que plenamente justificado diante da necessidade de produção de alimentos, tem feito com que a exceção (plantas doentes) se torne importante diante da regra geral da natureza, que é a resistência das plantas às doenças. Assim, o desafio de controlar doenças em cultivos anuais tem sido maior a cada ano. E isso justifica, sem nenhuma dúvida, intensificar os estudos necessários para o controle dessas doenças.
Dentre as formas de manejo, o controle químico normalmente é o que promove um resultado mais imediato, mas muitas outras estratégias podem ser empregadas, inclusive para aumentar a eficiência do químico. Para que seja possível empregar eficientemente técnicas de controle de doenças, é fundamental entender como as doenças funcionam. O conhecimento do ciclo de cada doença e seus requisitos epidemiológicos permite entender como e quando cada um dos princípios de controle pode ser aplicado, integrando estratégias de manejo para aumentar a sustentabilidade dos cultivos e reduzir a necessidade de uso de fungicidas.
Ciclo das doenças – Ao pensar em culturas anuais, que permanecem no campo por quatro a cinco meses, aproximadamente, a primeira pergunta que se deve fazer é: como as doenças dessas culturas sobrevivem na entressafra? Diversos patógenos sobrevivem em restos culturais, mas não todos, como as ferrugens e oídios. Alguns sobrevivem no solo, como os causadores de murchas e tombamentos, sendo impossível eliminá-los. Muitos patógenos têm diversos hospedeiros alternativos, tanto plantas cultivadas como daninhas, como a mancha-alvo e o mofo-branco da soja e a helmintosporiose do milho. Mas alguns têm número limitado de hospedeiros, como a cercosporiose do milho e a mancha-parda da soja, e por isso são mais eficientemente controlados com a rotação de culturas.
Esse conhecimento sobre o modo de sobrevivência dos patógenos na entressafra é fundamental para compreender quais estratégias podem ser adotadas para dificultar a sobrevivência do patógeno e assim reduzir a quantidade de inóculo inicial da doença e atrasar ou reduzir a incidência e severidade destas.
As perguntas seguintes, quando as culturas voltam ao campo, estão relacionadas à forma de disseminação dos patógenos (vento, respingos de chuva, sementes infectadas, etc.) e como essa disseminação pode ser evitada ou reduzida. Devemos também nos perguntar como os patógenos penetram nas plantas, a fim de imunizá-las ou protegê-las. E, finalmente, é preciso saber qual é a melhor forma de tratar das plantas quando elas adoecem, quando o tratamento for possível.
Requisitos epidemiológicos – Os microrganismos (fungos, bactérias, nematoides, vírus, etc.) que provocam doenças são seres vivos e apresentam requisitos (limites mínimo e máximo) e condições ótimas para sua sobrevivência e multiplicação. Isso pode ser entendido como requisitos epidemiológicos, ou seja, requisitos para que as epidemias aconteçam.
Microrganismos diferentes têm requisitos diferentes de temperatura, umidade do ar, horas de molhamento foliar, tipo de solo, etc., para se desenvolverem bem. Isso ajuda a explicar porque algumas doenças surgem antes que outras na lavoura, e outras não são importantes em todos os anos. E, como as condições de solo são conhecidas ou podem ser diagnosticadas, e as condições climáticas podem ser acompanhadas e previstas, é possível prever também, com algum nível de acerto, quais doenças serão mais ou menos importantes em determinada área e ano agrícola.
Por exemplo, a mancha-parda requer menor número de horas de molhamento foliar e tolera temperaturas mais baixas que a mancha-alvo, e por isso é comum ver folhas com mancha-parda no início do ciclo da soja, ainda antes do fechamento das entrelinhas, enquanto a mancha-alvo ocorre quando as plantas já estão mais desenvolvidas, juntamente com a ferrugem.
Princípios gerais de controle – A fitopatologia (ciência que estuda a doença das plantas) trabalha com sete princípios gerais de controle de doenças de plantas. Dois deles são focados no patógeno: Exclusão (prevenir a entrada do patógeno na área) e erradicação (eliminar o patógeno). Três princípios são focados na planta hospedeira: proteção (impedir o contato do patógeno com a planta), imunização (resistência da planta) e terapia (recuperar as plantas doentes). E dois outros princípios de controle são direcionados ao ambiente: evasão (escapar, fugir da doença) e regulação (do ambiente).
Assim, os três componentes básicos necessários para que ocorram doenças (hospedeiro suscetível, patógeno virulento e ambiente favorável) são contemplados nesses princípios gerais de controle. Conhecer esses princípios é fundamental para agir preventivamente, manejando os sistemas de produção para evitar as doenças.
Integração de estratégias – Ao observar os requisitos dos patógenos e qual princípio de controle pode ser aplicado em cada uma das fases do ciclo da doença, é possível ter um olhar abrangente para as doenças no contexto do sistema de produção. Isso permite a integração de estratégias de manejo de doenças, o que é diferente do conceito clássico de manejo integrado, que está baseado no limiar de dano provocado pelas pragas (ou doenças). Estimar o limiar de dano provocado por doenças, para subsidiar o emprego de estratégias de controle, é extremamente difícil e envolve riscos que provavelmente o agricultor não esteja disposto a assumir.
No entanto, com a compreensão dos princípios gerais de controle e de como as doenças se desenvolvem, é possível integrar estratégias de manejo (a maioria preventivas), dentro de diferentes princípios, aumentando as chances de sucesso no controle. O resultado será um sistema de produção mais sustentável, mais resiliente e com menor dependência de terapias químicas (aplicação de fungicidas).
Alexandre Dinnys Roese (Doutor em agronomia/fitopatologia e analista de apoio à pesquisa)
Embrapa Agropecuária Oeste
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