Embrapa, Mapa e FAO preparam Observatório das Mulheres Rurais do Brasil
Embrapa, Mapa e FAO preparam Observatório das Mulheres Rurais do Brasil
Foto: Imagem: Elvis Freitas
Integrantes da Associação dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais em Regime Familiar do PA Nova Amazônia e PA Nova Amazônia I, de Boa Vista (RR)
O Observatório das Mulheres Rurais do Brasil, uma iniciativa voltada exclusivamente ao universo das mulheres que se dedicam ao agro no Brasil, está em fase final de preparação. A expectativa é de que seja lançado oficialmente até o final de abril, como parte das comemorações do Dia Internacional e do Dia Nacional da Mulher (30 de abril).
Resultado da parceria entre a Embrapa, a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), o Observatório será a primeira plataforma destinada a reunir dados, estudos, artigos, publicações, eventos e conteúdos de interesse de um dos segmentos mais significativos do agro nacional, presente em todas as cadeias produtivas.
Segundo a pesquisadora Cristina Arzabe, coordenadora do projeto, um dos principais objetivos é - a partir da compilação e reunião de informações relevantes em um único local - capturar e prospectar tendências e identificar futuros possíveis, elaborando cenários que permitam às mulheres do agro se preparar diante de potenciais desafios e oportunidades, conforme já vem sendo feito em outros observatórios temáticos e centros de inteligência do programa Agropensa, da Embrapa.
“Para isso, além de estarmos trabalhando de forma muito próxima com o Mapa e a FAO, também formamos uma rede interna de representantes nas unidades descentralizadas em todo o Brasil que irão contribuir com a estruturação e manutenção do observatório”, explica. “É um esforço conjunto que visa obter uma visão sistêmica das condições das mulheres rurais e periurbanas, uma vez que temos diferentes realidades no nosso país devido às suas dimensões continentais”.
“A Embrapa tem uma capacidade muito grande para contribuir com o cenário em que a mulher rural está inserida”, diz Rita Milagres, secretária de Inteligência e Relações Estratégicas (Sire), da Embrapa. “A partir da formação da rede e da organização do observatório exclusivamente para isso, será possível antecipar demandas que beneficiem esse segmento tão importante e ainda com tão pouca visibilidade, se considerarmos a importância delas no contexto social, econômico e ambiental brasileiro”, completa.
Intercâmbio de informações
Para a pesquisadora Virginia Nogueira, da Sire, que faz parte do projeto, com a organização do conteúdo do Observatório das Mulheres Rurais do Brasil será possível contribuir com plataformas semelhantes mas que englobam territórios mais amplos, a exemplo da coordenada pelo Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), voltada às mulheres rurais da América Latina e Caribe.
“A agregação de informações qualificadas sobre as mulheres rurais do Brasil neste observatório vai ajudar a delinear políticas públicas mais direcionadas e de mais impacto e será útil para alimentar plataformas existentes de âmbito continental ou global”, destaca.
Também integrante do projeto, a pesquisadora Helena Maria Alves, da Embrapa Café, lembra da importância de dar visibilidade às mulheres indígenas e afrodescendentes que vivem e trabalham num contexto de desigualdades estruturais e desafios sociais, econômicos e ambientais, agravado pelo impacto da pandemia.
Segundo Helena, “na cadeia produtiva do café, especialmente no setor dedicado aos especiais, as mulheres que apanham o café são parte importante, senão fundamental, do processo produtivo e também precisam ser contempladas.”
De acordo com Ermano da Silva Júnior, analista da Sire, os dados quantitativos serão transformados em informação visual para facilitar a compreensão dos conteúdos. “Atualmente há pouco tempo para leituras mais longas, e o observatório pretende ajudar o entendimento das diversas realidades desta parte da população rural, a partir da disponibilização de dados e infográficos de simples compreensão”, explica.
Para a Embrapa, a iniciativa se insere no âmbito da inteligência estratégica, um importante recurso para apoiar a tomada de decisão e a orientação da estratégia corporativa, na Rede Observatórios da Embrapa. Além disso, faz parte dos esforços da Empresa para o alcance da Agenda 2030, mais especificamente dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 2 e 5.
Para a FAO, o tema é essencial
Segundo Úrsula Zacarias, ponto focal de gênero da FAO no Brasil, a igualdade é essencial para alcançar a segurança alimentar e nutricional, e para que os ODS sejam atingidos. “Por isso promovemos ações que tenham um impacto real e significativo, como a inclusão produtiva com enfoque de gênero, a melhoria da qualidade e disponibilidade de estatísticas oficiais desagregadas por sexo, ou o combate às lacunas entre mulheres e homens em sua resiliência e capacidade de adaptação às mudanças climáticas, entre outras iniciativas”, explica, referindo-se à campanha #MulheresRurais, Mulheres com Direitos.
“Trata-se de uma iniciativa conjunta, de âmbito internacional e intersetorial, que tem como objetivo dar visibilidade às mulheres rurais, indígenas e afrodescendentes que vivem e trabalham em um contexto de desigualdades estruturais e desafios sociais, econômicos e ambientais”.
Ela opina que o observatório será um espaço relevante para a organização de dados e informações conjunturais e para a fundamentação de estudos prospectivos que apoiam a tomada de decisão e construção de ações estratégicas. “Iniciativas inovadoras como esta, principalmente as que envolvem o desenvolvimento tecnológico, serão essenciais para impactar de maneira positiva as condições de vida dessas mulheres rurais rumo a sistemas agroalimentares mais eficientes, inclusivos, resilientes e sustentáveis, com melhor produção, nutrição, ambiente e qualidade de vida".
Sobre o desconhecimento da situação em que as mulheres rurais vivem e estão inseridas, Úrsula diz que ainda existem poucos dados e estatísticas organizados, tanto no Brasil, quanto na América Latina e Caribe. Segundo a representante da FAO, “as brechas” de gênero na alimentação e na agricultura permanecem abertas.
“As mulheres, como consumidoras, tendem a ter menos segurança alimentar do que os homens em todas as regiões do mundo. Como produtoras, as mulheres rurais enfrentam mais obstáculos que os homens no acesso a recursos e serviços produtivos, tecnologia, mercado e insumos financeiros”, comenta.
“Elas estão sub-representadas nas instituições locais e em mecanismos de governança e têm menos poder de decisão, sem contar os estereótipos de gênero e a discriminação que fazem com que as mulheres tenham uma carga de trabalho excessiva, e grande parte de seu trabalho não seja reconhecida e nem remunerada”.
Parceria com o Ministério da Agricultura
Para Fabiana Durgant, coordenadora-geral de Cooperativismo da Secretaria de Agricultura Familiar e Cooperativismo, do Ministério da Agricultura, a concepção do Observatório das Mulheres Rurais do Brasil, com dados dos censos agropecuários, reforça a importância de um espaço com informações que contribuam para criar e melhorar as políticas para as mulheres. “Assim será possível ajudar no cumprimento de acordos internacionais, como os previstos na Agenda 2030”, afirma.
Durgant destacou ainda que o Brasil e o Mundo reconhecem a necessidade da busca pela igualdade de gênero e a importância das mulheres rurais para o desenvolvimento sustentável. “Por isso, os censos agropecuários são uma ferramenta vital para contribuir com dados fidedignos relacionados às questões de gênero na agropecuária”, explicou, ressaltando que a parceira Embrapa, FAO, Mapa, com dados do IBGE, irá viabilizar informações ligadas à produção, à economia e ao desenvolvimento do País.
Segundo ela, com as informações do observatório, será possível consolidar o cenário agropecuário para elaborar políticas públicas e programas. “Também será possível ter uma visão mais clara da participação e da organização das mulheres no agro e como elas contribuem para o desenvolvimento sustentável”, comentou.
Ela citou ainda o que disse a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, durante o Fórum de Ministras e Vice-Ministras de Agricultura das Américas, no ano passado, na Itália, sobre a melhoria de políticas públicas e promoção de direitos das mulheres no continente. “A fala dela à época corrobora a ideia de criação do Observatório das Mulheres Rurais, como espaço para além da pesquisa, voltado à implementação e ao aprimoramento de políticas públicas”, concluiu.
Participação das UDs
Para reunir as estratégias de ação realizadas e em desenvolvimento nas diversas regiões, representantes de UDs também estão envolvidos na iniciativa, para identificação de entidades parceiras e meios de colaboração que permitam arranjos institucionais para realização de capacitações e atualização tecnológica de agentes multiplicadoras, além de estudos socioeconômicos, prospectivos e de avaliação de impacto que viabilizem a sustentabilidade e que tenham como temática a mulher rural e periurbana. Além disso, também serão prospectados novos estudos e tecnologias que possam beneficiar este grupo em particular.
“A Embrapa Pecuária Sul, desde 2018, está encarregada de recorrer aos relatórios de impacto de suas tecnologias para identificar situações relacionadas à equidade de gênero no mundo rural”, explica o pesquisador Jorge Santanna. Segundo ele, o objetivo é saber como a Embrapa tem contribuído para que as mulheres possam ter oportunidade de crescimento pessoal e profissional, dentro das unidades de produção agropecuária.
Santanna explica que a tarefa da UD no projeto do observatório é resgatar nos relatórios de avaliação de cinco tecnologias contextos que deem visibilidade a três pontos: oportunidade de envolvimento e valorização da participação das mulheres; emancipação e reconhecimento das escolhas das mulheres; e recompensa equitativa das atividades produtivas das mulheres.
Pesquisador Jorge Santanna
A pesquisadora Ana Euler, da Embrapa Amapá, pós-doutoranda na área de patrimonialização de sistemas agrícolas tradicionais no Museu de História Natural da França, conhece bem a realidade das mulheres rurais em cadeias de valor da sociobiodiversidade da Amazônia. Envolvida em projetos de desenvolvimento territorial sustentável de povos e comunidades tradicionais relacionados a açaí, cipó-titica, óleos vegetais e madeira, ela ressalta a importância das mulheres como detentoras do conhecimento tradicional por gerações, em especial no uso, coleta e técnicas artesanais de processamento para fabricação de azeites usados na alimentação ou fitoterápicos.
“Temos trabalhado com grupos de mulheres e pensamos na formação de redes de mulheres extratoras de óleos nessa região do estuário do rio Amazonas”, explica. “É extremamente importante ter um recorte pra trabalhar com gênero nas cadeias produtivas, porque hoje as mulheres são invisibilizadas, mesmo sendo alicerces, como mão de obra e no apoio para as famílias”, argumenta.
Para a pesquisadora, o compartilhamento de informações entre instituições e unidades é necessário. “Precisamos de um olhar holístico, que contemple todas as dimensões, e isso a Embrapa não consegue fazer sozinha”, completou. “As parcerias são fundamentais para alcançar os objetivos e a Embrapa, por sua presença na Amazônia e sua capacidade e capilaridade para além da pesquisa, tem um papel muito importante em ajudar a orquestrar iniciativas que contribuam para desenhar uma política de gênero mais clara”.
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“O futuro é coletivo”, diz líder de mulheres cafeicultorasDe acordo com o Censo Agropecuário 2017, 40,3 mil mulheres são dirigentes de estabelecimentos rurais de café, no Brasil. Cintia de Matos Mesquita é uma delas, e também representa o universo feminino rural de quase um milhão de mulheres dirigentes de estabelecimentos rurais, envolvidas nas mais diversas cadeias produtivas. Presidente da Associação de Mulheres do Café da Região das Matas de Minas, gestora de Fortalecimento da Coordenação Latino-Americana e do Caribe de Pequenos Produtores e Trabalhadores do Comércio Justo (CLAC) e eleita no ano passado pela Revista Forbes uma das “100 mulheres poderosas do agro brasileiro”, ela conhece muito bem a realidade do campo. “Não é de hoje que a mulher tem importância no campo, em todas as formas, seja no cuidado com a família, com a própria agricultura, seja com a qualidade. Elas estão sempre inseridas”, diz. “A única coisa que temos que fazer hoje é enfrentar essa corrida para dar visibilidade ao papel que ela já exerce há muitos anos”, completa, ressaltando que o protagonismo apenas da mulher já não é suficiente para que conquistem o espaço que merecem - todos os gêneros precisam entender esse processo. “As mulheres se capacitam, se educam, sabem o seu real lugar, mas é necessário que todos percebam”, afirma. Segundo ela, mesmo parecendo clichê, é fato que para que as mulheres sejam valorizadas e se sintam motivadas, a existência de políticas públicas é fundamental. “E isso o Brasil ainda não tem para a agricultura”, afirma. “A educação é necessária, porque a competência do campo depende de qualquer capacitação, qualquer treinamento, de apoio à pesquisa e mobilizadores, mas para que continue crescendo esse trabalho é preciso participação e união de todos os setores”. Cintia defende que as mulheres têm que perder o medo, ouvir e ver mais, participar mais. “Isso não é cultural, não pode ser cultural - a cultura é a de que somos todos iguais e temos os mesmos direitos”, afirma. Para ela, ainda faltam mais mulheres líderes, incentivando outras mulheres, que realmente saibam o que querem. “Quem andar sozinho vai ficar pra trás, porque a independência tem que ser junto com os outros, com o exemplo dos outros”, conclui. |
Katia Marsicano (MTb DF 3645)
Secretaria de Inteligência e Relações Estratégicas (Sire)
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