19/01/23 |   Segurança alimentar, nutrição e saúde

Paisagens alimentares é tema de palestra de especialista internacional na Embrapa Alimentos e Territórios

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Foto: Elias Rodrigues

Elias Rodrigues - Conceito de paisagens alimentares está em construção, segundo Francisco Sarmento

Conceito de paisagens alimentares está em construção, segundo Francisco Sarmento

Paisagens alimentares foi o tema da palestra do especialista internacional em sistemas alimentares e desenvolvimento territorial Francisco Sarmento, promovida na manhã desta terça-feira, 17/1, na Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação (Secti), em Maceió. Ligado à rede Foodzscapes, criada para promover o intercâmbio de conhecimentos e a oferta de experiências únicas sobre a gastronomia e culinária tradicionais e populares, Sarmento veio de Portugal a convite da Embrapa Alimentos e Territórios, que desenvolve projetos associados à temática.

Entre eles está o projeto “Paisagens Alimentares”, financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), cujo objetivo principal é promover a inclusão socioprodutiva de comunidades do Nordeste, afetadas pela pandemia da Covid-19, a partir das conexões dos sistemas agroalimentares com a paisagem, com o turismo e a gastronomia. O tema alinha-se, também, ao projeto “Boleiras das Alagoas”, que busca valorizar o patrimônio alimentar regional materializado nos bolos à base da mandioca.

Na abertura, o chefe-geral da Embrapa Alimentos e Territórios, João Flávio Veloso, falou sobre a importância das paisagens alimentares, que, segundo ele, “pressupõem o envolvimento de pessoas, algo central para o nosso trabalho”, disse. Sarmento, que atuou como coordenador da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) para os países de língua portuguesa, iniciou a palestra falando sobre a trajetória histórica dos sistemas alimentares e as mudanças ocorridas nos últimos 50 anos.

Segundo ele, a inserção das temáticas da agricultura e alimentação na Organização Mundial do Comércio (OMC), na década de 1980, acelerou a produção de conhecimento sobre o tema e a criação de instrumentos normativos e políticas públicas. O conceito de paisagens alimentares teria surgido a partir da trajetória dos sistemas agrícolas, quando foi amplificado para incorporar outros aspectos. “A história passou a ter um peso fundamental, a diversidade de atores envolvidos e as relações de poder foram os fundamentos para a criação dos sistemas e cadeias alimentares”, afirmou o especialista.

Quanto ao conceito de paisagem alimentar, Sarmento esclareceu que ainda não há uma definição consensual, mas que o importante é saber relacionar os vários conceitos existentes e usar a abordagem mais apropriada para o que se pretende. “A discussão do conceito de paisagens alimentares está no início, o que é uma vantagem, pois ainda pode ser ajustado”, afirmou.

Três pilares das paisagens alimentares - Embora  existam diversos conceitos, Sarmento explicou que, ao pensar em paisagens alimentares, é preciso considerar três pilares: território, sistemas alimentares e paisagem. Sobre o território, a compreensão é de que se trata de um espaço socialmente construído a partir das relações entre os atores, onde existe uma interdependência e governança estabelecida. “Neste quesito, o sonho seria que todos os países tivessem um sistema de governança participativo e inclusivo”, destacou.

Quanto aos sistemas alimentares, Sarmento frisou que não há uma única definição consensuada. “O que importa é a visão sistêmica, quer seja da perspectiva de cadeia, quer seja de uma perspectiva horizontal, onde a governança tem papel importante. É a relação entre vários domínios, como saúde e meio ambiente”, disse, destacando a importância do alimento e da alimentação, na lógica da segurança nutricional e alimentar das comunidades que compõem esses sistemas.

O último aspecto a ser considerado quando se fala de paisagens alimentares seria a própria paisagem, que, apesar de não ser isenta de vários “vieses”, pode ser entendida, segundo o especialista, como um complexo de sensações (visão, odores, sabores), uma leitura a ser feita através dos sentidos.

Rede Foodzscapes – Para Sarmento, mais importante que a definição do conceito seria a operacionalização das paisagens alimentares, em que a grande questão não seria a ausência de ferramentas, mas a definição de um método. “O Foodzscapes é uma tentativa de operacionalizar esse método e colocar as paisagens alimentares em diálogo”, explicou.

Rede internacional criada para promover o intercâmbio de conhecimentos, a Foodzscapes tem como um de seus objetivos promover experiências únicas sobre produtos, gastronomia e culinárias tradicionais e populares, mantidas ao longo do tempo por diversas gerações de agricultores, pescadores, coletores e cozinheiros. “É no nível popular que reside a maior parte do patrimônio alimentar”, disse Sarmento.
 A rede também se propõe a promover a inovação e dar suporte à criação de novos negócios e empresas, oportunizando a geração de renda, promoção e comercialização digital de produtos e serviços baseados no patrimônio alimentar territorial.

Por fim, o especialista sugeriu a aplicação de uma metodologia para a realização do diagnóstico de sistemas alimentares, baseada no diagnóstico territorial participativo, na construção de narrativas históricas, identificação de recursos disponíveis e operacionalização. Nesse sentido, a equipe técnica do projeto “Paisagens Alimentares” reforçou a necessidade de fortalecer a parceria com a Rede, a fim de promover ações de capacitação dos pesquisadores na temática.

Sarmento também chamou a atenção para os aspectos críticos para a preservação do conhecimento popular. “Os detentores do conhecimento estão sumindo por conta da transformação dos sistemas alimentares. As mulheres são as principais guardiãs e transmissoras desse conhecimento, que precisa ser transmitido às novas gerações”, concluiu.

Boleiras das Alagoas – No período da tarde, Francisco Sarmento se reuniu com boleiras dos municípios de Santa Luzia do Norte e Coqueiro Seco, na região metropolitana de Maceió. A visita fez parte do projeto Boleiras das Alagoas, que integra o Projeto Dom Helder Câmara (PDHC), coordenado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e cofinanciado pelo Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida).

Liderado pela pesquisadora da Embrapa Alimentos e Territórios Patrícia Bustamante, o projeto “Boleiras das Alagoas” promove o resgate histórico de receitas de bolos e do ofício de boleiras, além de oferecer diversas capacitações a dez boleiras previamente selecionadas. Em parceria com o Instituto Federal de Alagoas (Ifal), o grupo foi capacitado em ergonomia e saúde na produção de bolos; segurança do alimento; ingredientes, equipamentos, embalagem/rotulagem; matemática financeira básica; financiamento da produção/microcrédito; formas de organização: individuais e coletivas; e ampliação de mercado/novas mídias. “Um dos nossos objetivos é inserir os bolos e boleiras das Alagoas em redes de turismo comunitário”, afirma a pesquisadora.

O encontro com as boleiras teve música, poesia e uma roda de conversa onde foram trocadas histórias sobre a mandioca, ingrediente principal do famoso bolo, e sobre a cultura local. “O bolo de vocês carrega uma herança e cultura. É comida de verdade”, disse Sarmento. “Vocês têm que ter muito orgulho do patrimônio acumulado e desenhar um caminho para o futuro no qual esse bolo possa gerar uma renda maior para compensar a dureza do processo”, disse o especialista.

Sarmento finalizou sugerindo os “próximos passos”: uma maior articulação das boleiras com restaurantes, hotéis, secretarias de turismo e pontos turísticos. Segundo ele, o esforço tem que ser para aumentar a demanda por esses bolos, para aumentar o seu valor. “Nesse vosso patrimônio, o bolo é o carro-chefe e poderá no futuro arrastar outros produtos alimentares que fazem parte do dia a dia da comunidade”, concluiu.

Irene Santana (MTb 11.354/DF)
Embrapa Alimentos e Territórios

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Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
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