Comunidades tradicionais e agricultores familiares são capacitados em apicultura e meliponicultura
Comunidades tradicionais e agricultores familiares são capacitados em apicultura e meliponicultura
Foto: Fernando Curado
Capacitação busca promover o diálogo entre produtores e técnicos visando à expansão e fortalecimento das atividades produtivas
O manejo de abelhas (Apis e Melíponas) para produção orgânica de mel foi tema de uma capacitação coordenada pela Embrapa Alimentos e Territórios, para agricultores familiares e membros de comunidades tradicionais, incluindo assentados da reforma agrária e povos indígenas, além de técnicos de assistência técnica e extensão rural. O curso de Apicultura e Meliponicultura na Produção Orgânica foi realizado em março, em parceria com a Associação de Agricultores Alternativos (Aagra) e Embrapa Meio-Norte.
A capacitação buscou promover o diálogo entre produtores e técnicos visando à expansão e fortalecimento dessas atividades produtivas e ao estímulo à formação de uma rede de apicultores e meliponicultores em Alagoas. As discussões envolveram aspectos relativos à segurança alimentar e à geração de renda nas duas cadeias produtivas, abrangendo questões sobre a biologia desses animais, desde sua evolução até a relação desses polinizadores com as plantas e os aspectos diferenciados da biologia reprodutiva e de desenvolvimento dessas diferentes espécies.
Além disso, foram abordadas questões que envolvem mais diretamente os aspectos inerentes à criação racional e tecnificada dessas diferentes abelhas, com ênfase na temática das boas práticas de produção e extração do mel. “Para que o agricultor venha a se tornar realmente um criador de abelhas, é preciso conhecer melhor esses animais e seus diferentes comportamentos e necessidades”, alerta o biólogo Ricardo Camargo, pesquisador da Embrapa Meio-Norte, que conduziu a discussão técnica.
“Eventos como esse são dinamizadores de processos, pois promovem a reunião de grupos de agricultores de diferentes localidades e realidades, que, a partir dessa troca de conhecimentos e experiências, geram sinergia e criam novas percepções”, aponta Camargo. “A ideia era ter um olhar geral, um bom entendimento das inter-relações, das questões biológicas e ambientais, além das produtivas, econômicas e até mesmo sociais e culturais, que envolvem essas relações com as abelhas”, destaca o pesquisador.
Para ele, é importante conhecer, refletir e promover mudanças, não apenas em relação às abelhas, pois essas cadeias produtivas transcendem os seus próprios interesses, já que afetam e são afetadas por outras atividades produtivas e pelas ações humanas, que impactam o equilíbrio ambiental. Assim, conforme Camargo, “é preciso entender também o entorno, em uma visão mais ampla, considerando aspectos como a conservação dos recursos naturais e os impactos relacionados com os sistemas de cultivo dependentes da aplicação de agrotóxicos, questão muito delicada e impactante quando se considera seus efeitos negativos à conservação desses polinizadores e à própria viabilidade dessas cadeias produtivas”.
Equilíbrio do ecossistema e resgate cultural da atividade
O pesquisador explica que a meliponicultura – criação de abelhas-sem-ferrão –, baseia-se na domesticação e manejo de diferentes espécies nativas de abelhas sociais dos biomas brasileiros. “Mesmo que possa parecer relativamente nova, essa é uma atividade ancestral e ligada diretamente aos povos originários das Américas e posteriormente com as comunidades indígenas e tradicionais”, observa. “É uma das poucas atividades zootécnicas (criação de animais), que não visa ao abate dos animais, como geração de renda e sim sua conservação, ampliação para a comercialização de uma ampla variedade de produtos e até mesmo de prestação de serviços, como o da polinização dirigida”, afirma.
Além disso, deve-se considerar o declínio de polinizadores, já amplamente identificado, e os altos riscos de conservação que esses polinizadores nativos enfrentam. “São aspectos importantes, que devem ser considerados para o estímulo e fomento à prática e expansão da atividade e assim da necessidade de apoio pelo poder público”, salienta. “Além de todos os aspectos culturais e sociais envolvidos, a partir do resgate cultural dessa relação do homem com esse grupo especial de abelhas, inclusive junto às comunidades indígenas, aspecto pouco conhecido e valorizado pela sociedade em geral e pelo poder público”, reforça Camargo.
Por favorecerem a polinização de diversas culturas agrícolas, essas atividades têm um papel relevante no fortalecimento da produção agropecuária na região, representada, principalmente, por pequenos agricultores e comunidades tradicionais. Mas, além dos produtores, é preciso que a sociedade valorize a tradição e que isso se reflita nas ações de consumo desses produtos. “A percepção quanto à importância desses alimentos, por suas características nutricionais, também pode contribuir no desenvolvimento das cadeias produtivas”, enfatiza Fernando Curado, pesquisador da Embrapa Alimentos e Territórios.
A capacitação está relacionada com as ações de produção orgânica e agroecológica no Sistema Participativo de Garantia (SPG) Bem Viver, voltado para a comercialização dos produtos da agricultura familiar em municípios alagoanos. Essas ações também se inserem no projeto Segurança Alimentar e Nutricional e de geração de renda para agricultores familiares, povos e comunidades tradicionais do Semiárido brasileiro, no âmbito do Projeto Dom Hélder Câmara, coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar e cofinanciado pelo Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida).
Os participantes foram definidos atendendo, inicialmente, ao critério de compor os membros fornecedores do SPG Bem Viver, assim como do SPG Flor de Caraibeira com alguma experiência ou interesses na apicultura e meliponicultura. “Abarcadas essas representações, buscou-se a identificação e convite aos apicultores e apicultoras do Sertão e Agreste alagoanos, organizados em associações e grupos informais de apicultura, interessados na temática para o aprimoramento dos seus conhecimentos sobre a atividade”, contou Curado.
Para o agricultor Fábio dos Santos Silva, da etnia Koiupanká, comunidade Baixa do Galo em Inhapi, é fundamental "saber manusear corretamente esses pequenos animais, o que é vital para a mãe natureza e sua biodiversidade”. Ele ainda manifestou a expectativa de ter mais momentos como esse para compartilharem experiências, além de visitas a locais que já criam abelhas, com ou sem-ferrão.
Participaram da capacitação presencial em Igaci cerca de 70 pessoas deste município e de Maceió, Delmiro Gouveia, Mata Grande, Inhapi, Piranhas, Olho D’Água do Casado, União dos Palmares, Senador Rui Palmeira, São José da Tapera, Messias, Flexeiras, Estrela de Alagoas, Arapiraca, Feira Grande e Craíbas, em Alagoas, e do município pernambucano de Buíque. O público abrangeu, ainda, quatro etnias de povos indígenas: Tingui Botó, Xucuru Kariri, e Koiupanká, de Alagoas, e Kapinawá, de Pernambuco.
Nadir Rodrigues (MTb 26.948/SP)
Embrapa Alimentos e Territórios
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