19/07/23 |   Biodiversidade  Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação  Gestão ambiental e territorial

Áreas de terra firme na Amazônia brasileira são pouco conhecidas pela ciência

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Foto: Marizilda Cruppe

Marizilda Cruppe - Trabalho reuniu estudos de comunidades ecológicas coletadas em diferentes tipos de ecossistemas, incluindo florestas de terra firme, florestas alagáveis e ambientes aquáticos

Trabalho reuniu estudos de comunidades ecológicas coletadas em diferentes tipos de ecossistemas, incluindo florestas de terra firme, florestas alagáveis e ambientes aquáticos

  • Publicado na revista internacional Current Biology, estudo mostra que mais da metade das áreas de terra firme na Amazônia brasileira é pouco estudada pela ciência.
  • Trabalho reuniu estudos de comunidades ecológicas coletadas em mais de 7 mil locais em diferentes tipos de ecossistemas, incluindo florestas de terra firme, florestas alagáveis e em ambientes aquáticos, como igarapés, rios e lagos.
  • Ao compilar várias bases de dados sobre a biodiversidade na região, os cientistas revelam onde as pesquisas ecológicas estão localizadas e evidenciam as áreas pouco estudadas da região.
  • Vazios de conhecimento encontrados na Amazônia correspondem a 54,1% das áreas de terra firme, 27,3% dos habitats aquáticos e 17,3% das áreas úmidas (várzeas).
  • A probabilidade de pesquisa diminuiu em áreas degradadas e em Terras Indígenas.

Mais da metade das áreas de terra firme na Amazônia brasileira ainda é pouco estudada pela ciência. Os vazios de conhecimento sobre a biodiversidade nessas áreas correspondem a 54% e é menor em relação às zonas úmidas e aos ecossistemas aquáticos da região. Essa lacuna de conhecimento sobre a biodiversidade amazônica é um dos principais resultados de um mapeamento da pesquisa ecológica em toda a Amazônia brasileira realizada por cientistas de instituições do Brasil e de outros países que integram e sintetizam informações sobre estudos da biodiversidade amazônica.

O trabalho está no artigo “Pervasive gaps in amazonian ecological research” (Lacunas persistentes na investigação ecológica da Amazônia), publicado nesta quarta (19/7), na revista Current Biology, e reúne estudos de comunidades ecológicas coletadas em mais de 7 mil locais para nove grupos de organismos da biodiversidade terrestre e aquática.  A partir da compilação de várias bases de dados e do conhecimento disponível sobre a biodiversidade na região, os cientistas revelam onde as pesquisas ecológicas estão localizadas e evidenciam as áreas da região com baixa probabilidade de serem estudadas.

A análise considerou diferentes ecossistemas, incluindo florestas de terra firme, florestas alagáveis e em ambientes aquáticos, como igarapés, rios e lagos. Os resultados mostram que os vazios de conhecimento cobrem 54,1% das áreas de terra firme; 27,3% dos habitats aquáticos; e 17,3% das áreas alagáveis (várzeas e igapós).

Isso significa que a biodiversidade nas áreas de terra firme da Amazônia brasileira é menos estudada pela ciência em relação às zonas úmidas e aos ecossistemas aquáticos. “Vimos que alguns fatores, principalmente a distância dos grandes centros onde estão localizadas as estruturas de pesquisa explicam esse cenário”, comenta a bióloga Raquel Carvalho, que foi pesquisadora de pós-doutorado associada à Embrapa Amazônia Oriental durante o estudo.

Em nove grupos de organismos da biodiversidade terrestre e aquática – invertebrados bentônicos, heterópteros, odonatas, peixes, macrófitas, aves, vegetação lenhosa, formigas e besouros rola-bosta – a pesquisa ecológica foi distribuída de forma desigual nos três tipos de habitat investigados em 7.694 pontos de coletas de dados. “Nossos resultados comprovam que vastas áreas da Amazônia permanecem pouco estudadas, elas correspondem a verdadeiros vazios de conhecimento da sua biodiversidade”, afirma a bióloga Joice Ferreira, pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental.

Apesar de o trabalho evidenciar que há menos investigação sobre a biodiversidade das florestas de terra firme, os cientistas estimam que entre 15% e 18% das áreas sem estudo sofrerão mudanças severas no clima ou estarão sujeitas a desmatamentos e degradação até 2050. “Esse cenário preocupa, pois o uso sustentável da biodiversidade e o desenvolvimento pleno da sociobioeconomia demandam que compreendamos bem a distribuição da riqueza da região” acrescenta a cientista.

Arte: Sabrina Morais / Ian Santos

Falta de infraestrutura e acessibilidade

Ao utilizar modelo de aprendizado de máquina, a pesquisa mapeou a probabilidade de pesquisa na Amazônia brasileira, entre 2010 e 2020; e identificou a vulnerabilidade do bioma às mudanças decorrentes da ação humana, como o desmatamento e a degradação florestal. “Usamos cinco fatores de análise para as lacunas de conhecimento: acessibilidade, distância das instalações de pesquisas, posse de terra, degradação, e duração da estação seca”, explica a engenheira-florestal Angélica Faria de Resende, que foi pesquisadora de pós-doutorado associada à Embrapa Amazônia Oriental durante o estudo. 

A logística, principalmente a acessibilidade e a distância dos centros de pesquisa, e os fatores de influência humana representam 64% da probabilidade para a existência dos estudos ecológicos. Os vazios de conhecimento da biodiversidade na região são afetados pela falta de infraestrutura distribuída em diferentes localidades da Amazônia. “Há uma concentração de estruturas e investimentos nos grandes centros urbanos da região”, afirma Joice Ferreira, da Embrapa.

Arte: Sabrina Morais / Ian Santos

Para o pesquisador Jos Barlow, da Universidade de Lancaster, Reino Unido, ao quantificar o cenário da pesquisa ecológica na Amazônia brasileira, o trabalho mostra a importância de ir além das áreas acessíveis e próximas a bases de pesquisa, e expandir para regiões que provavelmente serão afetadas pelas alterações climáticas ou pelos desmatamentos. “Fazer isso não será fácil, e a ecologia sozinha não resolverá as crises ambientais que o mundo enfrenta. Necessitamos de muita cooperação de pesquisa entre países, incluindo os países amazônicos” ressalta Barlow.

Outros pontos de destaque no estudo foram os fatores de degradação da floresta e a destinação das áreas. Os cientistas atestaram que a probabilidade de pesquisa diminuiu em áreas mais degradadas e em Terras Indígenas (TIs). “Vimos que o esforço de pesquisa é mais limitado em Terras Indígenas, o que preocupa, pois elas representam cerca de 23% da Amazônia brasileira”, alerta Raquel Carvalho.

Rede de pesquisa

O trabalho resulta de uma grande rede de pesquisa consolidada no âmbito do Synergize, projeto que integra informações de diferentes disciplinas para gerar conhecimento. “É a chamada ciência de síntese, ou seja, não se coleta dados novos, mas junta-se tudo o que existe para responder questões em um escopo maior”, explica Joice Ferreira.

O projeto, que faz parte do Centro de Síntese em Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (SinBiose), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), reúne 29 pesquisadores de 12 instituições nacionais e internacionais e é coordenado pela Embrapa e pela Universidade de Bristol, no Reino Unido. O artigo publicado na revista Current Biology, por exemplo, reuniu dados de cerca de 600 colaboradores de mais de cem instituições de ensino e pesquisa.

Para compreender melhor a situação das pesquisas ecológicas na Amazônia brasileira e fazer recomendações a tomadores de decisão, o grupo de pesquisadores do Synergize realizou um estudo adicional sobre investimentos em pesquisas na região. As recomendações estão organizadas em um sumário para políticas (policy brief) intitulado Como superar os desafios que limitam as pesquisas ecológicas na Amazônia e disponível no website do Centro SinBiose.

“Os resultados desse estudo são importantes para orientar ações mais estratégicas de fomento às pesquisas na Amazônia, especialmente neste momento em que a reunião dos chefes de Estado da Amazônia Legal – a Cúpula da Amazônia – se aproxima. Nossos estudos apontam que não basta apenas aumentar os recursos disponíveis; é necessário uma alocação bastante estratégica por parte dos tomadores de decisão”, finaliza Joice Ferreira.

 

Cúpula da Amazônia

Nos dias 8 e 9 de agosto de 2023. em Belém (PA), chefes de Estado dos oito países integrantes da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA): Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela estarão reunidos para inaugurar uma nova etapa na cooperação pelo Bioma. A Cúpula deverá definir um compromisso de cooperação pelo desenvolvimento sustentável da Amazônia entre esses países, por meio da retomada do diálogo regional e do fortalecimento das relações entre as entidades governamentais e civis das nações participantes. Saiba mais aqui.

 

Ana Laura Lima (MTb 1.268/PA)
Embrapa Amazônia Oriental

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Telefone: (91) 3204-1060

Colaboração: Ascom Universidade Federal do Pará (UFPA)

Tradução em inglês: Mariana Medeiros (13044/DF)
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