22/01/25 |   Convivência com a Seca  Manejo de Recursos Hídricos

Produtor deve adotar práticas agrícolas para minimizar adversidades climáticas

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Foto: Sílvia Zoche Borges/Embrapa

Sílvia Zoche Borges/Embrapa - Soja em área com solo coberto com palha resiste ao calor

Soja em área com solo coberto com palha resiste ao calor

Em Mato Grosso do Sul, especialmente na região sul do estado, as culturas da safra de verão – especialmente a da soja – estão sofrendo com o veranico, em que a quantidade de chuva não tem sido suficiente durante o período de desenvolvimento das plantas, aliado ao calor intenso. Somado a isso, algumas práticas agrícolas têm sido deixadas de lado, o que intensificou os problemas na agricultura de sequeiro especialmente. Isso é o que explica o pesquisador Fernando Mendes Lamas, da Embrapa Agropecuária Oeste (Dourados, MS). “Agora vai começar o momento da colheita da soja e é a oportunidade ideal para o produtor colocar em prática alguns processos que vão minimizar sobremaneira os efeitos de futuras estiagens e vão proporcionar que a água da chuva não escorra superficialmente, mas sim infiltre e seja armazenada no solo”.

Para iniciar, o pesquisador observou que um desses princípios agrícolas não tem sido adotado, que é o terraceamento, prática mecânica de conservação de solo e água que tem como objetivo fundamental evitar o escorrimento da água, ou seja, a prática permite que a água infiltre no solo e seja armazenada para estar disponível posteriormente pela planta.

Em um outro momento, o produtor pode utilizar uma série de tecnologias que já foram desenvolvidas, e estão sendo aprimoradas, por exemplo, a época de semeadura. “Hoje o produtor dispõe de uma ferramenta extremamente interessante, que é o Zonamento Agrícola de Risco Climático, conhecido também como ZARC”, cita o pesquisador. O ZARC é produto de pesquisa da Embrapa e seus parceiros, que se transformou em uma ferramenta de política pública que está à disposição do produtor. Lamas ressalta que as informações disponibilizadas pelo ZARC, independentemente se o produtor vai financiar e/ou fazer seguro agrícola, trazem sugestões de época de semeadura em que os riscos são menores, especialmente riscos decorrentes de déficit hídrico.

Outro fator importante é o manejo adequado do solo para que esteja estruturado e, assim, permita que a água permaneça no solo e chegue às camadas mais profundas. Para isso, o solo não deve estar compactado. “Hoje, infelizmente, muitos agricultores usam uma prática mecânica para romper camada compactada, que é o escarificador. Não temos a menor dúvida de que o escarificador sozinho não resolve o problema de compactação. Há necessidade de associar a prática mecânica que é o escarificador com práticas culturais ou vegetativas que é o cultivo de plantas de cobertura”, ressalta o pesquisador.

O sistema radicular das plantas de cobertura forma canalículos que permitirão uma boa estruturação do solo que se torna mais poroso, permitindo que a água penetre no solo e forme uma reserva na área onde estão as culturas. As plantas de cobertura também formam uma barreira na superfície do solo por meio da palhada, o que evita o aquecimento do solo, consequentemente, diminui a perda de água por evaporação. Além disso, as plantas de cobertura auxiliam o controle de plantas daninhas.

“Nós estamos vivendo um momento em que as questões de mudanças climáticas não são mais uma hipótese. É algo que está acontecendo no mundo. E o produtor precisa utilizar essas práticas que estão à sua disposição. Quando somamos tudo, o produtor deixa de perder, e mais importante que deixar de perder, ele ganha”, enfatiza Fernando Lamas, que completa: “Quando o produtor rural não adota nada disso, dependendo do estágio vegetativo da planta, as plantas vão morrer depois de uma semana a dez dias sem chuva. Adotando essas práticas, o efeito do estresse hídrico diminui, e o teor de matéria orgânica e a disponibilidade de nutrientes melhoram”.

 

Quais plantas de cobertura?

Segundo o pesquisador Lamas, a principal espécie de planta de cobertura são as braquiárias, como a Brachiaria ruzizienses para produção de forragem ou a Brachiaria brizantha por exemplo, a BRS Piatã, para uso na Integração Lavoura-Pecuária (ILP). Em alguns casos, podem ser utilizadas plantas do gênero Panicum, porém, esta exige mais cuidado no manejo para não haver problema como entouceiramento que dificulta a semeadura.

As plantas de cobertura podem ser cultivadas isoladamente ou em consórcio com leguminosas, a exemplo do feijão guandu e das crotalárias, que têm a capacidade de fixar nitrogênio no solo. O produtor também pode escolher pelo cultivo isolado das leguminosas, como Crotalaria ochroleuca, Crotolaria spectabillis e Crotalaria juncea, guandu e estilosantes, sendo que para cada situação haverá uma melhor indicação. Na safrinha, estas leguminosas podem ser cultivadas junto ao milho – no caso das crotalárias, se o foco for os ruminates, não utilizar a C. spectabilis por ser tóxica aos animais. Lamas lembra que a Embrapa possui variedades de guandu (BRS Guatã e BRS Mandarim) adequadas ao consórcio devido a seu porte e a rapidez de crescimento.

“Agora é o momento adequado para os produtores plantarem milho safrinha de forma consorciada. E, se não quiserem plantar milho safrinha, cultivarem somente a espécie de planta de cobertura, seja uma leguminosa ou uma gramínea e colher as melhorias no sistema de produção”, indica Lamas.

 

Irrigação como estratégia associada

Aliado às práticas agrícolas recomendadas acima para convivência da agricultura em períodos de intenso calor e pouca oferta de chuvas, a irrigação é uma estratégia para superar o problema de déficit hídrico. “A irrigação vem para satisfazer a necessidade hídrica da cultura. Fazendo isso, conseguimos fazer frente ao problema e superá-lo”, diz o pesquisador Danilton Luiz Flumignan, da Embrapa Agropecuária Oeste, mas ele pondera: “É um erro achar que somente o fator água [da irrigação] vai resolver o problema. Na agricultura irrigada, temos que considerar que as outras estratégias para a convivência com a seca já estão sendo bem aplicadas pelo produtor”.

Os produtores irrigantes conseguem monitorar a ocorrência dos problemas causados por eventos de deficiência hídrica e, a partir de então, tomar a decisão de quando irrigar e quanto de água aplicar, a fim de satisfazer as necessidades hídricas da cultura.

“O momento no estado de Mato Grosso do Sul está muito favorável para essa temática de agricultura irrigada”, afirma Flumignan. O governo do estado lançou recentemente, em 2024, um programa estadual de irrigação (MS Irriga) como estímulo aos produtores rurais. Além disso, o Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional instituiu o Polo de Agricultura Irrigada do Centro-Sul de Mato Grosso do Sul, que engloba 26 municípios. Segundo Flumignan, “estes são sinais claros de que a federação e o estado entendem que esta prática precisa e pode ser induzida”.

Para dar suporte à tomada de decisão dos produtores, inclusive os produtores irrigantes, a Embrapa Agropecuária Oeste possui estações de monitoramento climático que fornecem diariamente dados de chuva, temperatura, radiação solar, vento, umidade e, principalmente, o dado da evapotranspiração de referência. “Nós fornecemos os dados e os produtores podem se apropriar deles para tomada de decisão. Isso é uma boa prática na agricultura irrigada”, explica o pesquisador.

O Centro de Pesquisa da Embrapa está realizando pesquisa, ainda em fase de experimentação, que está no quarto ano, com competição de cultivares de soja e de híbridos de milho em área irrigada e de sequeiro a fim de identificar padrões nestes materiais genéticos que agreguem valor na água que é aplicada.

Flumignan também conta que foram realizadas simulações computacionais para estudar diferentes estratégias de manejo de irrigação e selecionar a melhor, amparadas em vários anos de pesquisa em lisímetros de pesagem e na série histórica de mais de 40 anos dados da estação meteorológica da Embrapa Agropecuária Oeste. “A melhor estratégia de irrigação, via de regra, tem resultado para a soja e para milho (comparado ao sequeiro, que é a nossa referência) em aumentos de produtividade significativos e redução no consumo de água comparada a estratégias convencionais de irrigação”, explica Flumignan.

Em números, somando os últimos três anos de safra, a cultura da soja irrigada rendeu 172 sacas por hectare, enquanto a soja no sequeiro resultou em 134 sacas. O rendimento do milho foi ainda maior: 407 sacas de milho com irrigação e 253 sacas sem irrigação. “Nós da Embrapa estamos preocupados em obter produção máxima utilizando o mínimo do recurso natural, assegurando que esse recurso esteja disponível para outros usos também”, assegura Flumignan.

O pesquisador lembra que a gestão dos recursos hídricos é feita pelo Imasul em Mato Grosso do Sul, que é responsável por gerenciar o potencial de cada corpo hídrico para fornecer água a diferentes usuários – restaurantes, indústrias, comércio, casas, irrigação, etc.. “A gestão hídrica assegura que a água para irrigação seja captada sem ferir os direitos de outros usuários nem da segurança ambiental”, explica e completa: “Mato Grosso do Sul tem grande potencial para agricultura irrigada. Somos extremamente ricos em águas superficiais e ainda utilizamos pouquíssimo da nossa água”.

Sílvia Zoche Borges (DRT-MG 08223)
Embrapa Agropecuária Oeste

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