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01/03/13 |

Produção de hortaliças versus mudanças climáticas: projetos incorporam tecnologias para o enfrentamento de novos cenários agrícolas

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Foto: Leandro Lobo

Leandro Lobo -

A preocupação sobre os possíveis efeitos das mudanças do clima sobre o cultivo de hortaliças já está na ordem do dia em algumas das linhas de pesquisa desenvolvidas pela Embrapa Hortaliças. Ao antecipar alguns cenários que sinalizam dificuldades em manter a produção de olerícolas em meio a eventos climáticos extremos, como chuvas mais torrenciais ou secas prolongadas, projetos em andamento alinham tecnologias já consolidadas, com outras como o desenvolvimento de cultivares resistentes a temperaturas mais elevadas, ao estresse hídrico e ao ataque de microorganismos que provocam doenças e pragas – decorrentes do aumento dos níveis de CO2 do ar.

Uma das tecnologias apontadas como promissoras é o Sistema Plantio Direto (SPD), recomendado pelo Plano ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono), idealizado pelo Governo Federal e executado através dos ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento Agrário. Dois projetos sobre o tema estão em andamento na Unidade: "Cultivo de Hortaliças em Sistema Plantio Direto – Fase II", coordenado pelo pesquisador Nuno Madeira, num trabalho conjunto com a Embrapa Solos, a Embrapa Agrobiologia (RJ) e a Embrapa Pecuária Sul (Bagé-RS), que contempla ações na região serrana fluminense; e o projeto liderado pelo pesquisador Carlos Pacheco – "Transferência da Tecnologia Sistema Plantio Direto de Hortaliças para Multiplicadores e Produtores de Regiões Serranas do Sudeste Brasileiro" que amplia as atividades do primeiro: além do Rio de Janeiro, estão incluídos os Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo.

"Os dois projetos atuam de forma conjunta com a ideia de tornar mais intensivo o uso da tecnologia do plantio direto na região, aliada a outras técnicas de manejo – terraceamento, plantio em curvas de nível, entre outras – que possam atuar de maneira satisfatória contra diversas questões ambientais preocupantes, tais como: processos erosivos; uso excessivo de agroquímicos e consequente deterioração do solo e corpos d'água; aumento dos estoques de Carbono, Nitrogênio e outros nutrientes em solos; manutenção da qualidade do solo, etc", explica Pacheco. Segundo ele, as atividades previstas para o Sudeste levaram em consideração o fato de que em boa parte dessa região as hortaliças são plantadas em áreas declivosas, com manejo de solos feito de maneira não sustentável, em alguns casos "morro abaixo", o que torna o cultivo exposto a desmoronamentos, erosão acentuada, perdas do solo, de construções e também de vidas. Outra questão importante é que tais sistemas de manejo têm provocado uma acentuada perda da fertilidade dos solos, prejudicando os cultivos.

Além das ações em curso, outras iniciativas dão o tom da importância atribuída pela Unidade de pesquisa ao tema das mudanças climáticas. Um exemplo disso é a discussão, no âmbito do corpo técnico e administrativo, sobre a possibilidade de estruturação de um laboratório de geoprocessamento, com o objetivo de atuar com o zoneamento em áreas de possível risco futuro para algumas hortaliças como batata, tomate, cebola e cenoura, pela importância econômica dessas olerícolas dentro da cadeia produtiva. Uma empreitada e tanto, já que o geoprocessamento abrange uma série de tecnologias que lidam com imagens de satélites, mapas digitais, sistemas de informação geográfica e banco de dados, entre outras, voltadas à interpretação e ao monitoramento de fenômenos diversos.

O compartilhamento de ações com outras Unidades da Embrapa e instituições parceiras é ponto pacífico nos dois projetos que têm o Sistema Plantio Direto como mola propulsora. Nesse sentido, estão sendo desenvolvidas atividades conjuntas com a Embrapa Agroindústria Tropical (Fortaleza-CE), em um trabalho de simulação de cenários e avaliação sobre os efeitos de gases de efeito estufa envolvendo o cultivo de melão e melancia, sob a coordenação do pesquisador Godim.  "Por ora, estamos na fase de avaliação dos efeitos desses gases no sistema produtivo de melancia, e avaliação dos estoques de Carbono e  da estabilidade da matéria orgânica em melão cultivado em plantio direto", informa Pacheco. 

Desafios à frente

Na opinião do pesquisador, no contexto das mudanças climáticas o que predomina hoje com relação às hortaliças não são expectativas, mas desafios, tendo em vista a diversidade de espécies abrangidas por esse grupo e, claro, com características também diversas que as levam a comportamentos distintos quando submetidas a estresses ocasionados pelas mudanças do clima.
Pacheco aponta como primeiro desafio uma possível mudança da geografia de produção. "Com um aumento significativo de temperatura, uma determinada hortaliça pode não apresentar no futuro condições favoráveis para continuar produzindo, a não ser que sejam  desenvolvidos materiais resistentes a altas temperaturas. Ainda assim, podem existir outras limitações geográficas ao cultivo como maior pressão de pragas e doenças, ocorrência de eventos climáticos extremos, alterações no regime hídrico local e/ou regional, entre outros", avalia.

A mitigação dos impactos das mudanças climáticas sobre os sistemas de produção é outro desafio "desafiante" na visão de Pacheco. "Algumas áreas de produção de hortaliças estão situadas em ambientes altos e declivosos, onde a possibilidade de ocorrência de erosão é muito maior. Essas áreas têm que receber uma atenção especial, com a aplicação de um sistema de produção mais conservacionista, com manejo adequado do sistema produtivo."

O desenvolvimento e a transferência de tecnologias que mantenham condições ambientais mais favoráveis aos cultivos também é outro desafio. "Sistemas de produção que mantenham temperatura do solo mais amena e reduzam a necessidade hídrica são muito bem vistos no cenário que se desenha", anota o pesquisador.

Outra questão, segundo o pesquisador, de suma importância é o desenvolvimento de cultivares resistentes a estresses bióticos e abióticos (sobretudo alta temperatura, secas prolongadas e chuvas excessivas e concentradas num curto período de tempo).

Workshop

As iniciativas voltadas para a discussão dos desafios para a pesquisa ante a perspectiva do aquecimento global tiveram como marco o workshop "Efeitos das Mudanças Climáticas na Produção de Hortaliças", realizado pela Embrapa Hortaliças, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF), no dia 20 de novembro de 2010. Sob a coordenação do pesquisador Ítalo Guedes, no workshop foram discutidas questões que continuam na pauta, como a necessidade de adoção de práticas agrícolas sustentáveis, como o plantio direto, práticas agroecológicas, rotação de culturas, manejo racional de adubação e irrigação, entre outras.

Para o pesquisador, a importância do evento pode ser medida pelo fato de ter representado o príncipio das discussões sobre o tema e, ao mesmo tempo, oficializado a preocupação do setor com os efeitos do aquecimento global na produção de hortaliças. "As iniciativas com esse viés eram ainda um pouco tímidas, e o workshop estimulou a área de Pesquisa & Desenvolvimento a pensar e trabalhar com a perspectiva dos efeitos das mudanças climáticas, com destaque para as ações proativas voltadas à adaptação de práticas conservacionistas", registra Ítalo, para quem a questão evoluiu dentro da Unidade: "Existe uma consciência maior sobre a necessidade de se preocupar com o assunto".

Para Guedes,  um bom sinal da evolução dessa consciência são as ações incluídas nos projetos de melhoramento de cultivares de hortaliças, a exemplo da avaliação do estresse hídrico, nome dado a uma situação em que a demanda de água por habitante acaba sendo maior que a capacidade de oferta.

Dessa forma, projetos recebem aditivos para o desenvolvimento de variedades resistentes à escassez de água, isto é, plantas mais adaptáveis à redução da oferta de água. Com isso, o que vem sendo proposto são medidas para adaptar o que vem sendo feito no presente ante um horizonte mais adverso no futuro, ou seja, desenvolver novos materiais que apresentem tolerância a condições mais severas de calor e seca, e que possam ser produzidos levando-se em conta um cenário de mudanças de temperatura e de escassez hídrica, que ainda não pode ser dimensionado.
"Não há por enquanto pesquisa suficiente na área para se afirmar categoricamente qual será o principal efeito. O que se teme é que as possíveis novas condições climáticas, representadas pelas mudanças na pressão parcial de dióxido de carbono, temperatura e regime pluvial, afetem tanto os padrões de doenças e pragas quanto a geografia da produção agrícola, com migração de áreas produtoras. Outra grande preocupação diz respeito ao aumento na frequência de extremos climáticos como secas e enchentes, uma resposta da natureza às intervenções humanas", discorre o pesquisador.

Com relação a esses últimos, ele aponta as práticas conservacionistas, como o cultivo protegido, como uma eficiente ferramenta de proteção para as hortaliças. "Em razão de uma área menor e maior intensidade de cultivo, a prática tem apresentado bons resultados, o que tem levado a Embrapa a incentivar o seu uso".

Estresse hídrico na cultura da cebola                             

As hortaliças normalmente são, em geral, sazonais como consequência do clima e, com as projeções em curso sobre as mudanças climáticas, a perspectiva é de uma interferência ainda maior, com os períodos de seca e de chuva registrando oscilações extremas – ou seja, invernos ou verões mais rigorosos do que os comumente vistos. Dentro desse horizonte e visando desenvolver ações ancoradas numa base científica, alguns trabalhos vêm sendo desenvolvidos pela Embrapa Hortaliças com o objetivo de avaliar a tolerância de determinadas hortaliças ao estresse hídrico, a exemplo da cebola, uma das plantas mais cultivadas no mundo.

"Estamos na fase preliminar da pesquisa, mas já foram observadas diferenças marcantes entre algumas cultivares sob condições de baixa disponibilidade de água", informa o pesquisador Valter Rodrigues, que coordena o programa com cebola na Embrapa Hortaliças. Ele acrescenta que serão iniciados, no próximo ano, alguns testes para seleção de materiais que possam se desenvolver sob essa condição.

Em resumo, conforme o pesquisador, a linha de abordagem número um desse trabalho em curso envolve a definição de uma metodologia para ancorar os trabalhos de seleção e melhoramento, visando a tolerância à seca. "Se conseguirmos desenvolver um material que exija menos água sem afetar o nível de produtividade, poderemos reduzir boa parte dos problemas que já vêm sendo enfrentados, por exemplo, pelos produtores da região de Irecê, na Bahia", sublinha Rodrigues.

Segundo ele, por estar localizada em uma região de clima quente e seco, a prática da agricultura ocorre associada à prática da irrigação. No entanto, a falta de chuva nos últimos dois anos agravou a situação dos produtores de cebola e cenoura a ponto de impossibilitar o cultivo dessas hortaliças em boa parte do município. "Além dessa preocupação, em outras regiões existe a questão da cobrança do uso da água pelos Comitês de Bacias Hidrográficas locais, o que deve exigir cada vez mais a adoção de critérios técnicos para definir o momento exato para irrigar e a quantidade de água a ser fornecida na produção agrícola", considera Rodrigues, que compartilha o projeto com o pesquisador Waldir Marouelli e com a Universidade Federal de Goiás (UFG).

Anelise Macedo (2.749/DF)
Embrapa Hortaliças

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