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A pesquisa com hortaliças e os mecanismos adaptativos às mudanças climáticas
A maior parte do aumento da temperatura terrestre observada entre 1951 e 2010 foi decorrente do aumento da concentração atmosférica de gases de efeito estufa (GEEs), segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). As projeções climáticas elaboradas por esse órgão apontam para o aumento da temperatura média do planeta, até o fim do século XXI, de 0,3 a 1,7ºC no cenário mais otimista - com redução significativa das emissões atmosféricas de GEEs pela ação humana, e de 2,6 a 4,8ºC no cenário mais pessimista - com continuidade dos incrementos das emissões de GEEs.
Ainda segundo o IPCC, esse aumento na temperatura média do planeta deve influenciar alterações climáticas que podem variar de acordo com a região do globo. Todavia, são esperados eventos como: menor ocorrência de dias e noites frios; maior ocorrência e duração de ondas de calor; maior ocorrência, intensidade e quantidade de chuvas intensas; e aumento da intensidade e duração de secas.
Para o Brasil, algumas projeções climáticas apontam para o aumento generalizado da temperatura média em todas as regiões e estações do ano. Porém, com relação a alterações nos regimes de precipitação, a análise é mais complexa, visto que os modelos atualmente disponíveis e utilizados por especialistas têm apresentado resultados contraditórios o que, por si só, não permite inferir com precisão sobre as alterações. Entretanto, é possível vislumbrar uma tendência de aumento da ocorrência de eventos climáticos extremos.
Outra questão que chama a atenção é a possibilidade de aumento da ocorrência de eventos de seca em regiões atualmente consideradas polos agrícolas, como o Sudeste, o Centro-Oeste e parte da região Norte. Na região Nordeste, trabalhos apontam para um possível agravamento da aridez em parte da região atualmente semiárida.
Os trabalhos atualmente disponíveis permitem inferir sobre possíveis prejuízos das mudanças climáticas, em diferentes escalas, para diversas culturas agrícolas, inclusive commodities como soja, algodão e café. A potencialização do déficit hídrico também deve ser um fator limitante à produção agrícola, assim como o comportamento de pragas e doenças num cenário futuro de mudanças climáticas. É possível que estresses bióticos comumente observados atualmente percam força no futuro e que outros menos importantes hoje em dia ganhem relevância.
Especificamente para as hortaliças, têm sido lançadas hipóteses de prejuízos a culturas originárias de regiões com clima ameno ou frio, por exemplo, espinafre, batata, brócolos, alface, cenoura, couve-flor, cebola, alho e tomate. Por outro lado, têm sido postuladas possibilidades de ocorrência de impactos menos significativos para hortaliças originárias de clima quente como quiabo, batata-doce, jiló, melão, melancia, etc. Porém, essa visão se restringe a uma análise dos impactos da temperatura. Quando associada a outros fenômenos, como déficit hídrico, perda de qualidade de solo, pressão de pragas e doenças, concentração de chuvas, entre outros, torna-se difícil prever os reais impactos das mudanças climáticas nos sistemas de produção de hortaliças.
A pesquisa visa interceder no desempenho das plantas diante das adversidades climáticas, principalmente com programas de melhoramento genético que buscam genótipos tolerantes ao calor e ao déficit hídrico, mais eficazes no uso de nutrientes e tolerantes e/ou resistentes a pragas e doenças. Pode-se inferir que existe uma maior certeza com relação ao comportamento da temperatura e, por isso, é possível que se trabalhe com projeções razoáveis na busca por genótipos adaptados a essas novas condições. Outra questão chave é o desenvolvimento de genótipos efetivos no uso da água e nutrientes, visto que o aumento dos eventos de seca, assim como uma pior distribuição das chuvas, pode levar ao déficit hídrico em dadas regiões, tornando premente a busca por alternativas que maximizem a eficiência do uso da água.
Além disso, quando se consideram caminhos para mitigar os impactos das atividades agrícolas sobre a emissão de GEEs, bem como promover a adaptação às mudanças climáticas projetadas, aparecem como alternativas os sistemas de plantio direto, sistemas agroflorestais, a integração lavoura-pecuária-floresta e o cultivo em ambiente protegido, entre outros. Pode-se tornar necessária também a busca por genótipos adaptados a esses sistemas.
É importante deixar claro que a adaptação dos sistemas agrícolas às mudanças climáticas não se restringe ao desenvolvimento de cultivares adaptadas, mas abrange também ações planejadas em diversas outras áreas do conhecimento. São necessários, por exemplo, a definição de regiões mais aptas ao cultivo, a compreensão do comportamento de pragas e doenças e o desenvolvimento de sistemas produtivos que mitiguem os impactos negativos.
É necessária uma imediata intensificação de ações dos diversos setores da sociedade com o objetivo de promover tal adaptação, em suas diferentes esferas. Não se pode perder de vista, porém, que grande esforço tem sido despendido ao longo das últimas décadas na busca de cultivares adaptadas ao clima tropical. Sem dúvida, isso pode alavancar as pesquisas com vistas à adaptação da agricultura brasileira às mudanças climáticas, uma vez que boa parte desses programas já busca adaptação ao clima quente, chuvas intensas e, por vezes, ao déficit hídrico. As instituições de pesquisa agrícola brasileiras tiveram papel fundamental na tropicalização de espécies exóticas e possivelmente terão igual importância no desenvolvimento de mecanismos adaptativos às mudanças climáticas.
Carlos Eduardo Pacheco Lima
Pesquisador da Embrapa Hortaliças
Embrapa Hortaliças
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