O pesquisador Luiz Carlos Hermes da Embrapa Meio Ambiente (Jaguariúna, SP), juntamente com diversos especialistas de todo o mundo se reuniram em São Paulo (SP), para mais uma edição do Congresso Mundial de Dessalinização. Promovido a cada dois anos pela Associação Internacional de Dessalinização (IDA), essa foi a primeira vez que o evento aconteceu na América Latina. O objetivo foi discutir as tecnologias de dessalinização e reuso da água, uma vez que essas aplicações são capazes de contribuir com as comunidades com algum tipo de dificuldade de acesso à água. O PAD é uma ação do Governo Federal coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente, em parceria com instituições federais, estaduais, municipais e sociedade civil. É o promotor de uma política pública de acesso à água para o consumo humano, disciplinando a implantação de aparelhos de dessalinização socialmente sustentáveis para atender, prioritariamente, as populações de baixa renda em comunidades difusas da região do semiárido brasileiro. A Embrapa integra o Programa Água Doce desde o seu nascedouro, projeto que também conta com a participação de pesquisadores da Embrapa Semiárido (Petrolina, PE) e consultores do Programa Água Doce. Elaborado durante o ano de 2003, com uma visão abrangente e integrada, com ampla participação social, está estruturado desde o seu lançamento em 2004, em seis vertentes: gestão, pesquisa, sistemas de dessalinização, sustentabilidade ambiental, mobilização social e sistemas de produção. A pesquisa é direcionada ao melhoramento dos sistemas de produção, com o aprofundamento dos conhecimentos em plantas halófitas, ou seja, plantas que acumulam grande quantidade de sal, e plantas tolerantes à concentração salina, além de nutrição animal e piscicultura. Conforme ressaltou Hermes, após a realização do Congresso em São Paulo, líderes da IDA visitaram uma comunidade localizada no Rio Grande do Norte, assistida pelo Programa Água Doce, em que foram instalados sistemas fotovoltaicos para fornecimento de energia ao dessalinizador, com o objetivo de formar parcerias com o Programa, na implantação deste tipo de energia como alternativa de funcionamento dos sistemas de dessalinização em comunidades em que o acesso a ela é problemático. Água Doce no Semiárido O sertanejo que habita o semiárido já não depende só das chuvas esporádicas para conseguir água doce para beber. O projeto Água Doce garante água de boa qualidade por meio dos equipamentos de dessalinização de águas salobras provenientes de poços abertos em comunidades atendidas pelo Programa. O semiárido possui área aproximada de 940.000 Km², onde 70% do território são terrenos cristalinos, compostos por rochas fraturadas, onde ocorre o armazenamento das águas das chuvas no subsolo. Nas áreas de cristalino, as condições de armazenamento em fraturas rochosas pode contribuir para tornar as águas mais salinas por simples solubilidade dos sais presentes nas rochas. Essas características dificultam o acúmulo do líquido no subsolo e contribuem com a salinização da água, por isso, são impróprias para o consumo humano sem que haja algum tipo de tratamento. Como solução, o Programa Água Doce instala nas comunidades equipamentos de dessalinização que transformam a água imprópria em água potável. Estima-se que em todo o semiárido existam mais de 200 mil poços perfurados, a maioria salinos e de baixa vazão, com água imprópria para o consumo. O funcionamento do sistema é simples: a água é captada por meio de poços tubulares e armazenada em um reservatório, passando pelo dessanilizador, um potente filtro, que retira da água os tipos de sais e microrganismos indesejados. A parte dessanilizada é armazenada em caixas para distribuição. Já o concentrado, armazenado em reservatório para ser encaminhado aos tanques de evaporação. Subproduto da dessalinização viabilizando a produção agropecuária O subproduto dos dessalinizadores, que antes era lançado diretamente no solo e que acelerava o processo de desertificação, agora é destinado para tanques de evaporação. A Embrapa busca um uso mais nobre para essa água, tratada como um recurso escasso em um ambiente de secas severas. Realiza pesquisas e testes para viabilizar, quando possível, o aproveitamento da água com alta concentração de sais para utilização em atividades produtivas. Conforme Hermes, a Embrapa Semiárido em parceria com a Embrapa Meio Ambiente e instituições de ensino, procuram, por meio de pesquisas, utilizar o concentrado salino, considerado um rejeito, para usá-lo como recurso de culturas específicas, que se adequem ao ambiente semiárido e apresentem resistência a diferentes níveis de salinidade, bem como possuam valor proteico e forrageiro para o trato animal ou culturas comerciais com alto valor agregado. Há, segundo o pesquisador, experiências bem concretas utilizando a erva-sal (Atriplex numulária), e atualmente realiza pesquisa com outras culturas utilizando a água residual da dessalinização ou de poços que apresentem água salobra, como o capim-elefante, palma forrageira, gliricídia sépium, sorgo forrageiro, entre outras. Como novidade, para o evento Semiárido Show 2017, organizado pela Embrapa Semiárido, a ser realizado em Petrolina, PE, de 7 a 9 de novembro, será apresentada aos produtores mais uma alternativa bastante promissora e já amplamente avaliada em várias partes do mundo. Trata-se da quinoa (Chenopodium quinoa Willd), uma planta halófita altamente resistente às variações climáticas, edáficas e ambientes salinos, sento tratada mundialmente como "cash crop" devido as suas múltiplas funções como alimento humano. A variedade quinoa BRS Piaburu (entre outras variedades), cedida pela Embrapa Cerrados deverão passar por vários estudos científicos para avaliação de suas propriedades em ambiente semiárido irrigado com água salobra. “A quinoa é uma cultura de alto valor agregado, capaz de viabilizar uma economia agrícola nessas comunidades atendidas, promovendo renda, bem estar social e ambiental. É uma opção que pode mudar a realidade do agricultor familiar dessa região”, disse Hermes. O PAD como programa vital Por reduzir as instabilidades ao acesso à água no Semiárido, o Programa Água Doce é considerado uma medida de adaptação às mudanças climáticas. Estudos indicam que a alteração climática na região tende a aumentar, tornando comum a eventos climáticos extremos, como estiagens bastante prolongadas. Como consequência, a diminuição da disponibilidade hídrica na região e avanço da desertificação do solo. Assim, iniciativas como o Programa Água Doce, ao promover o uso sustentável da água, contribui diretamente para o enfrentamento dos efeitos das mudanças climáticas. É um esforço do poder público em internalizar tais preocupações, disseminando boas práticas de uso sustentável da água, com alcance na melhor cobertura do solo, que reduz a evaporação. Em 2009, o Tribunal de Contas da União - TCU, em uma auditoria operacional sobre políticas públicas e mudanças climáticas, identificou o Programa como uma iniciativa a ser ampliada, pelo amplo e destacado viés de melhorias da qualidade de vida da população da região do Semiárido.