27/07/16 |

Regiões produtoras de água

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De acordo com a pesquisadora Rachel Bardy Prado, da Embrapa Solos, há dois aspectos que caracterizam as áreas sob relevo montanhoso, no que se relaciona à água. Um é o difícil acesso, o que faz com que sofram menos pressão antrópica e favorece a presença de fragmentos florestais preservados e de nascentes de bacias hidrográficas. Muitos deles estão em Áreas de Preservação Permanente (APP), nas quais a vegetação natural deve ser obrigatoriamente preservada por Lei. "Assim, áreas sob relevo montanhoso podem ser consideradas regiões produtoras de água, pois são responsáveis por grande parte do suprimento hídrico da população", lembra a pesquisadora. Outro aspecto é o fato de essas áreas serem mais suscetíveis a processos erosivos, o que exige da pesquisa um olhar atento ao comprometimento dos serviços ecossistêmicos hídricos.
 
A pesquisadora cita um conjunto de projetos que vem sendo conduzido pela Embrapa no âmbito de uma rede denominada "Serviços Ambientais na Paisagem Rural". O objetivo principal da rede, segundo ela, é gerar conhecimento e desenvolver ferramentas para subsidiar ações e políticas de restauração, manutenção e ampliação dos serviços ambientais e fortalecer sistemas de produção com base sustentável em paisagens rurais. Estão incluídos estudos relativos aos serviços ecossistêmicos hídricos em áreas montanhosas, nos diferentes biomas brasileiros. 
 
No caso da Embrapa Solos, estudos interdisciplinares têm como foco o bioma Mata Atlântica no Rio de Janeiro. A ideia é fornecer subsídios à gestão de recursos hídricos e à melhoria da provisão de serviços ecossistêmicos em bacias hidrográficas do bioma. "Exemplo é a bacia Guapi-Macacu que abastece mais de dois milhões de habitantes, onde a pesquisa, em parceria com a Embrapa Agrobiologia e instituições locais, vem sendo realizada de forma participativa", diz Rachel Bardy Prado (veja referência sobre esse trabalho em  ‹ navegue › no final desta matéria). Algumas dessas ações estão vinculadas à outra rede de pesquisa da Embrapa denominada Agrohidro, com foco no uso eficiente da água na agricultura. Outras regiões montanhosas do Estado do Rio de Janeiro têm sido também estudadas com este mesmo enfoque. 
 
Serviços ambientais
 
O Pagamento por Serviços Ambientais Hídricos (PSA), em expansão no Brasil, é um exemplo de compensação por serviços ambientais. Pode ser viabilizado por meio de uma política pública voltada à conservação dos recursos hídricos, bastante adequada para implantação em áreas montanhosas. Rachel Bardy Prado explica: "o produtor, por meio de ação voluntária recebe do usuário/pagador uma compensação financeira por preservar ou recuperar as áreas de florestas, bem como por desenvolver ações conservacionistas em sua propriedade, favoráveis à provisão de serviços ecossistêmicos hídricos". 
 
A pesquisadora cita como exemplo de sucesso o Programa Produtor de Água. Menciona também o projeto "Fortalecimento do conhecimento, organização da informação e elaboração de instrumentos de apoio aos Programas de Pagamentos por Serviços Ambientais Hídricos no meio rural", que vem sendo desenvolvido por equipe da Embrapa Solos, em parceria com outros centros de pesquisa da Empresa e instituições externas como a ANA e a The Nature Conservancy (TNC).
 
Hortaliças na palha
 
Por Paula Rodrigues
 
A maioria das espécies de hortaliças está mais bem adaptada a regiões de clima ameno. Por isso, em países de clima tropical, elas são cultivadas em regiões de altitude mais elevada, como as áreas altas e planas do Planalto Central brasileiro e, principalmente, as regiões serranas do Sul e do Sudeste do País. Nesse último caso, devido à declividade dos terrenos, as hortaliças estão inseridas no contexto da agricultura de montanha.
 
Com a produção concentrada nesse ambiente, graças ao fator climático, os produtores de hortaliças acabam ocupando áreas muito íngremes que exigem uma agricultura específica para preservar recursos como água e solo. "No geral, o que vemos são as mesmas práticas agrícolas utilizadas em áreas planas sendo replicadas em terrenos acidentados", observa o pesquisador Nuno Madeira, da Embrapa Hortaliças. Tais práticas desestruturam o solo com reflexos no agravamento do processo erosivo, no aumento dos custos de produção, no mau uso da água, no esgotamento da fertilidade do solo e, em última instância, nas frustações de safra, pondera o pesquisador. 
 
A tecnologia disponível para minimizar os danos, e apontada como o caminho possível para manter a viabilidade da olericultura nas regiões serranas nas próximas décadas, é o sistema de plantio direto em hortaliças (SPDH), que melhora a sustentabilidade do sistema produtivo e reduz os custos de produção. Os princípios básicos do SPDH envolvem três pontos principais: o revolvimento localizado do solo, restrito às covas ou sulcos de plantio; a rotação de culturas, com a inclusão de plantas de cobertura para a produção de palhada; e, por último, a cobertura permanente do solo. "Esse sistema conservacionista é especialmente recomendado para as áreas com declividade porque minimiza a erosão", enumera Madeira. 
 
Nas regiões serranas, o SPDH pode ser adotado para diferentes famílias de hortaliças, tais como brássicas (couve-flor, repolho, brócolis), solanáceas (tomate, berinjela, pimentão) e cucurbitáceas (maxixe, abobrinha, chuchu). Contudo, a dinâmica intensiva da produção de hortaliças, somada à pressão do mercado por escala e prazos, tem dificultado a adoção massiva por parte dos agricultores. 
 
"Desde quando iniciamos os trabalhos, em 2009, algumas microbacias como Barracão dos Mendes, em Nova Friburgo (RJ), avançaram muito, principalmente com o apoio de associações de produtores", comenta o pesquisador, que estima uma adoção de, pelo menos, 20% na área daquela microbacia. Entretanto, ele afirma que, quando se pensa em termos de município, a adoção ainda é baixa. "Todos os agricultores concordam que o SPDH é a solução, mas poucos conseguem modificar o fluxo de trabalho e adotar o novo sistema, que exige planejamento no uso da propriedade e um intervalo de dois a três meses para plantio das plantas de cobertura", explica Madeira. 
 
Em sua opinião, a atuação na região serrana, produtora de hortaliças, deve ser permanente. A perspectiva é dialogar com órgãos de extensão rural e organizações de agricultores para incentivar a adoção da tecnologia. Espera-se, no futuro, estreitar o diálogo com secretarias municipais de modo a subsidiar normativas sobre o uso da terra e o zoneamento em função da declividade e do sistema de plantio empregado.
 
A assistência técnica dos estados da região serrana está capacitada e a pesquisa tem publicado diversos documentos para orientar os agricultores. "O sistema de plantio direto em hortaliças é uma mudança de paradigma. Quem adota, vê os diversos benefícios. É uma tecnologia pronta para adoção em agricultura de montanha, temática ainda em fase embrionária no Brasil, sobre a qual, em outros países, muito se dialoga", sublinha.
 

Benefícios do SPDH

 
Para hortaliças, recomenda-se uma sucessão de plantio que intercale as plantas de cobertura com o cultivo das espécies escolhidas. As plantas de cobertura, que vão gerar a palhada sobre o solo, são o ponto-chave para o sucesso do SPDH. Confira os benefícios da palhada, de acordo com o pesquisador Nuno Madeira:
 
- garante o conforto térmico das plantas, uma vez que funciona como isolante e reduz os extremos de temperatura no solo. Em lavouras de brócolis e couve-flor, já foi observada uma diferença média de 4ºC e extrema de 10º C entre o canteiro descoberto e o canteiro com palhada. 
 
- protege o solo da radiação e diminui a evapotranspiração, reduzindo em até 30% a necessidade de irrigação, o que resulta em economia de água. "Devemos lembrar que as regiões serranas são produtoras de água, por abrigar nossas nascentes, por isso, um sistema que economiza água está, na verdade, disponibilizando o que foi poupado para outros usos e atividades", analisa o agrônomo. 
 
- reduz plantas espontâneas. A densa cobertura do solo em SPDH minimiza em até 80% a infestação por plantas espontâneas, diminuindo a necessidade de capina na lavoura, uma vez que a palhada funciona como barreira física. No caso de hortaliças, isso é ainda mais relevante, visto que poucas espécies possuem herbicidas registrados para uso e, assim, a capina deve ser manual. 
 
- quanto à dispersão de doenças, especialmente fungos de solo, a palhada diminui em até 90% o escorrimento superficial e os respingos, o que dissemina os esporos do fungo. Doenças ocorrem, mas dispersam menos e encontram plantas mais robustas para resistir a um ataque. Madeira já visitou parcelas vizinhas que sofriam com hérnia das crucíferas – doença fúngica de brássicas – e a parcela com solo revolvido apresentava uma incidência de 70% enquanto a parcela com palhada indicava cerca de 10% de infestação. 
 
Pós-colheita em Nova Friburgo
 
Por Aline Bastos
 
As tecnologias de pós-colheita da Embrapa Agroindústria de Alimentos são passíveis de adoção e adaptação para as condições particulares da agricultura de montanha. Nos últimos anos, pesquisadores vêm realizando capacitações para produtores rurais na região de Nova Friburgo, que incluem orientações pós-colheita no cultivo de frutas, especialmente de banana e caqui, buscando preservar a qualidade do alimento pelo manejo correto. "Às vezes, as soluções requisitadas pelos produtores são simples, mas geram um grande impacto na produção e na redução das perdas", conta o pesquisador Marcos Fonseca, daquele centro de pesquisa. A equipe da área de pós-colheita também desenvolveu revestimentos filmogênicos, que aumentam a vida útil de frutas; elaborou embalagens articuladas, que evitam perdas e aprimorou o processamento mínimo de hortaliças e vegetais, que preservam as características de alimento vivo e fresco. 
 
 
 
 

Carlos Dias
Embrapa Solos

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