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Manejo de castanhais: pesquisas apontam rumos para sustentabilidade

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Photo: Gabriel Faria

Gabriel Faria -

A redução da cobertura florestal mundial e o reconhecimento da importância ecológica e econômica da Floresta Amazônica, como o habitat de maior biodiversidade do planeta, reguladora do clima local e regional e como fornecedora de produtos florestais madeireiros e não madeireiros têm levado a grandes esforços no sentido de reduzir o desflorestamento na região. Neste contexto, o uso sustentável das florestas pelo extrativismo deve ser considerado como alternativa de renda, por conciliar a valorização da floresta em pé, a conservação dos ecossistemas florestais e o sustento de milhares de pessoas economicamente dependentes destes recursos e, que normalmente, representam as parcelas mais pobres da população.

A partir do ano de 1.800, após o declínio do extrativismo da borracha, a castanha-do-brasil tornou-se o principal produto extrativista da região norte do Brasil. Porém, apesar do longo histórico de extração ainda pouco se conhece em relação a sua real importância socioeconômica, causas e magnitudes das variações de produção em diferentes regiões da Amazônia, diversidade genética e manejo em populações naturais.

Entre as maiores dificuldades ao pleno desenvolvimento da cadeia produtiva da castanheira-do-brasil em Mato Grosso, pode-se destacar: a baixa qualidade das castanhas (devido ao manejo inadequado no processo de coleta) e a alta suscetibilidade a contaminação por bactérias e por fungos produtores de aflatoxinas, baixo nível tecnológico no processo produtivo, o baixo poder de barganha por parte dos produtores, inexistência de índices técnicos e socioeconômicos para a atividade, falta de políticas públicas de proteção e fomento ao setor e a inexistência de informações científicas locais que possibilitem a implementação e a regulamentação de planos de manejo para a extração em florestas nativas.

Apesar da declarada importância, ainda não se dispõe de dados precisos sobre a importância socioeconômica do extrativismo da castanha-do-brasil na Amazônia brasileira. Isso se constitui em um entrave na orientação e fortalecimento de políticas públicas que visem o desenvolvimento e a proteção do setor. Para isto, é fundamental o conhecimento detalhado das etapas e custos envolvidos no sistema extrativista e as suas variações regionais.

Neste contexto, em parceria com o grupo Dal Pai, a Prefeitura Municipal de Itaúba e o CNPq, a Embrapa Agrossilvipastoril desenvolveu o projeto de pesquisa “Manejo, pós-colheita e diversidade genética da castanheira-do-brasil em floresta nativa do Mato Grosso” com o objetivo de gerar informações e tecnologias para subsidiar a conservação da castanheira-do-brasil, a elaboração, execução e o controle de planos de manejo florestal e as boas práticas para o manejo de frutos e sementes.

A análise de todas as etapas e custos envolvidos no extrativismo da castanha-do-brasil em Itaúba (MT) mostrou que a atividade é rentável, com receita superior ao salário mínimo praticado na época do levantamento e remunerando a mão-de-obra familiar com o dobro da média da diária praticada na região em 99,5%. Uma vez que a produção de amêndoas e o custo dos insumos não podem ser controlados diretamente pelo extrativista, a otimização da mão-de-obra, o aumento da produtividade (maior rendimento operacional) e a agregação de valor mediante a adoção de boas práticas de coleta são formas viáveis de aumentar a rentabilidade do sistema extrativista.

Características biológicas

Com a pesquisa foi obtida uma série de dados de longa duração em 320 árvores nativas, o que possibilitará modelar a produção de frutos em função das características das árvores, solo e clima. Estes dados já compõem o banco de dados da Embrapa e permitirão prognosticar a produção em função de variáveis locais e globais para a Amazônia brasileira.

Estudos dendrocronológicos, que estimam a idade provável das árvores com base em seu crescimento, permitiram observar que as árvores atingiram a plena produção de frutos (maturidade) no momento em que os indivíduos alcançaram diâmetros entre 60 e 70 cm, o que ocorreu a uma idade relativa entre 63 e 72 anos. Tratamentos silviculturais simples, como o desbaste de liberação de árvores jovens, permitindo maior acesso à luz, mostraram-se efetivos e podem reduzir a idade para que uma árvore alcance a idade de maturidade de produção de frutos e, consequentemente, aumentem a produtividade, a rentabilidade e a sustentabilidade da atividade extrativista.

Não houve efeito da taxa de coleta sobre a regeneração natural da espécie, indicando que eventos passados, como a abertura de clareiras propiciadas pela exploração madeireira, podem ter tido maior impacto no estabelecimento e desenvolvimento da regeneração natural da castanheira. Isso tornaria pouco eficazes, ou mesmo desnecessárias, medidas de restrição de coleta para garantir a regeneração natural, especialmente, em áreas sob influência da exploração madeireira. Ou seja, mesmo sob altas taxas de coleta de sementes, a espécie consegue regenerar de forma satisfatória em áreas sujeitas a aberturas periódicas do dossel.

O estudo da relação entre o tempo de coleta dos frutos e a contaminação por aflatoxinas indicou que desde o momento da queda do fruto das árvores existem condições propícias ao desenvolvimento de fungos produtores de toxinas nas sementes. Entretanto, não foi detectada a presença de aflatoxinas nas castanhas logo após a queda dos frutos.  É importante observar, porém, que o teor de aflatoxinas aumenta com o tempo de permanência dos frutos na mata sendo que os níveis de aflatoxinas totais apresentaram-se dentro do limite máximo tolerado até 100 dias após a queda. Quando se faz uso do girau durante o período de coleta, o nível de aflatoxinas manteve-se dentro do limite por até 150 dias. Isso indica que após estes períodos os frutos não devem ser coletados para a alimentação humana. Portanto, o manejo dos frutos durante o período de coleta mostra-se fundamental para garantir a qualidade das castanhas e a segurança para os consumidores.

Outro resultado importante deste trabalho de pesquisa foi o estudo genético que propiciou avaliar o fluxo de pólen e sementes dentro da população, ou seja, as distâncias percorridas pelo pólen, através do principal polinizador, que são as abelhas de grande porte, dos gêneros Bombus, Centris, Epicharis, Eulaema e Xylocopa, que asseguram a produção dos frutos; e as distâncias percorridas pelas sementes, que são as distâncias em que são levadas as sementes pelo principal dispersor, conhecido como cutia (Dasyprocta spp.) e asseguram a regeneração da espécie. A cutia consegue abrir o fruto, denominado ouriço, com seus dentes afiados e enterra algumas sementes para se alimentar posteriormente possibilitando a germinação delas.   Neste estudo foi observado que as abelhas transportaram o pólen por até 950 m, enquanto os roedores transportaram as sementes por até 650 m, mostrando que o pólen percorre maiores distâncias, se comparado com as sementes, enfatizando a importância das abelhas na manutenção da diversidade genética e na conservação da espécie.

Portanto, os resultados deste trabalho pioneiro em Mato Grosso associados aos desenvolvidos pela Embrapa e outras instituições de pesquisa na Amazônia já permitem diversas recomendações técnicas para manejar os castanhais, monitorar a sustentabilidade da atividade extrativista e assegurar a qualidade do produto. A sua efetiva implementação passa a ser o grande desafio.

Helio Tonini (Pesquisador da Embrapa Agrossilvipastoril)
Embrapa Agrossilvipastoril

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Aisy Botega Baldoni (Pesquisadora da Embrapa Agrossilvipastoril)
Embrapa Agrossilvipastoril

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Sílvia Campos Botelho (Pesquisadora da Embrapa Agrossilvipastoril)
Embrapa Agrossilvipastoril

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