07/12/21 |   Genetic improvement

Pesquisa desenvolve batatas-doces coloridas e biofortificadas

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Photo: Paula Rodrigues

Paula Rodrigues - As batatas-doces coloridas e biofortificadas desenvolvidas pela Embrapa atendem não somente os agricultores, mas também os consumidores que, cada dia mais, têm buscado uma dieta diversificada e saudável, com base em alimentos funcionais

As batatas-doces coloridas e biofortificadas desenvolvidas pela Embrapa atendem não somente os agricultores, mas também os consumidores que, cada dia mais, têm buscado uma dieta diversificada e saudável, com base em alimentos funcionais

  • Recém-lançadas, três novas variedades de batata-doce apresentam alto teor de compostos bioativos benéficos à saúde como as antocianinas e o betacaroteno.

  • A produtividade média das três cultivares supera 40 toneladas por hectare, o triplo da produtividade média nacional.

  • Elas atendem a uma demanda do setor produtivo: apresentam maiores índices de produtividade, melhor qualidade, resistência a doenças, estabilidade de produção e ampla adaptação às diferentes regiões de cultivo do País.

  • Batata-doce BRS Cotinga é recomendada para processamento industrial na forma de chips, farinha, xarope de amido e outros produtos derivados.

  • BRS Anembé é direcionada ao mercado de mesa, em preparos culinários assados como purês, doces caseiros e pães.

  • E batata-doce CIP BRS Nuti possui dupla aptidão e atende o mercado de mesa e o industrial. Ela foi desenvolvida em parceria com o Centro Internacional de la Papa (CIP) do Peru.

Três novas cultivares de batata-doce, desenvolvidas por pesquisadores da Embrapa Hortaliças (DF), prometem colocar mais cores e nutrientes na dieta dos brasileiros. Em vez da casca rosada e da polpa de cor creme das variedades tradicionalmente plantadas e consumidas no País, as novas cultivares destacam-se pelos tons de roxo e de laranja, que são indicativos do alto teor de compostos bioativos benéficos para a saúde como as antocianinas e o betacaroteno, respectivamente.

Duas das novas cultivares possuem a casca e a polpa roxas e diferenciam-se quanto à destinação: a batata-doce BRS Cotinga é recomendada para processamento industrial na forma de chips, farinha, xarope de amido e outros produtos derivados, e a batata-doce BRS Anembé para o mercado de mesa, em preparos culinários assados como purês, doces caseiros e pães. Já a batata-doce CIP BRS Nuti, desenvolvida em parceria com o Centro Internacional de la Papa (CIP) do Peru, tem casca e polpa alaranjadas e possui dupla aptidão, podendo atender ambas as finalidades.

Segundo a pesquisadora Larissa Vendrame, coordenadora do programa de melhoramento genético de batata-doce da Embrapa, atualmente, essa cadeia produtiva carece de oferta de cultivares de polpa colorida com alto teor nutritivo, e os poucos materiais disponíveis aos agricultores têm limitação geográfica para o plantio, além de baixa estabilidade de produção e pouca qualidade de raízes. “Por isso, as novas cultivares disponibilizadas pela pesquisa pública brasileira atendem a uma demanda do setor produtivo, entregando maiores índices de produtividade, melhor qualidade, resistência a doenças, estabilidade de produção e ampla adaptação às diferentes regiões de cultivo do País”, enumera.

Mais cor para mais saúde

As batatas-doces coloridas e biofortificadas desenvolvidas pela Embrapa, atendem não somente os agricultores, mas também os consumidores que, cada dia mais, têm buscado uma dieta diversificada e saudável, com base em alimentos funcionais. Além disso, a batata-doce é um alimento que está entre as principais fontes de carboidratos complexos e de baixa caloria da dieta do brasileiro.

A coloração arroxeada das batatas-doces BRS Cotinga e BRS Anembé (foto abaixo) deriva do alto teor de antocianinas, que são pigmentos naturais responsáveis pelos tons de azul, roxo e vermelho em alimentos como frutas, raízes e folhas. As antocianinas e demais compostos fenólicos presentes na batata-doce de polpa roxa são substâncias bioativas associadas à redução do risco de doenças degenerativas, uma vez que possuem ação antioxidante e anti-inflamatória no organismo.

As cultivares BRS Cotinga e BRS Anembé apresentam, respectivamente, teores de 154 mg/100g e 184,8 mg/100g de antocianinas, que são valores semelhantes aos encontrados em frutas de cor arroxeada. “A produção de batata-doce de polpa roxa vem ganhando espaço, o que é uma vantagem para os agricultores – visto que essa cultura apresenta ampla adaptação em todo o território brasileiro e um elevado rendimento de raízes por área, bem como para os consumidores, pois a batata-doce roxa tem um preço mais acessível do que outras fontes importantes de antocianinas como uva, amora, açaí e mirtilo”, compara o agrônomo Raphael Melo, pesquisador da área de Fitotecnia da Embrapa Hortaliças.

O produtor rural Flávio Roberto Marchesin, de São Carlos (SP), que participou da etapa de validação das cultivares BRS Anembé e BRS Cotinga, aposta no apelo da cor e do valor nutricional para obter maior valor agregado na comercialização. “São detalhes que chamam atenção dos consumidores”, opina.

Já o betacaroteno, presente na batata-doce CIP BRS Nuti (foto à direita), é o pigmento natural associado às cores laranja e amarela nos alimentos, que funciona como um precursor de vitamina A, ou seja, se transforma em vitamina A no organismo, uma substância muito importante para a saúde, já que previne distúrbios oculares e doenças da pele, auxilia no crescimento e no desenvolvimento e fortalece a defesa do corpo contra infecções. Também age como antioxidante, ou seja, combate os radicais livres que aceleram o envelhecimento e ocasionam diversas doenças.

Enquanto em variedades de polpa branca ou creme, a concentração de betacaroteno é irrisória, na cultivar CIP BRS Nuti, o teor de betacaroteno pode alcançar 150 mg/kg, sendo superior à outra cultivar de batata-doce recomendada pela Embrapa, a batata-doce Beauregard, que atinge 115 mg/kg. “A batata-doce CIP BRS Nuti não pretende substituir a cultivar Beauregard, mas sim ofertar mais opções de raízes de polpa alaranjada aos produtores. Ela tem a parte aérea mais robusta e vigorosa, o que facilita o plantio, o pegamento das mudas e o controle de plantas daninhas”, elucida o pesquisador da Embrapa Alexandre Mello, responsável pelo processo de seleção e caracterização da cultivar nas condições brasileiras.

A produtora rural Lucy Mara Rocha, com propriedade sediada em Pirapozinho/SP, atua há dez anos no mercado de batata-doce e participou dos experimentos de validação da cultivar CIP BRS Nuti. Em sua opinião, os principais diferenciais em relação à cultivar Beauregard, que ela também produz, são: padronização das raízes – que são mais lisas, coloração intensa da polpa, maior vida útil após a colheita e maior resistência a insetos sugadores.

“Meu grande desejo é que as batatas-doces coloridas sejam comercializadas em maior quantidade para o consumidor final, muito embora isso seja uma questão cultural do mercado brasileiro, que prefere as raízes de polpa branca. Nos Estados Unidos, por exemplo, a predominância é da batata-doce alaranjada. Mas eu acredito que as batatas-doces coloridas irão ganhar escala no consumo nacional a partir do trabalho da pesquisa, dos produtores e da divulgação para alcançar novos públicos”, projeta.

Três vezes mais produtivas

As maiores vantagens competitivas das novas cultivares é a estabilidade de produção e a ampla adaptação a diferentes regiões de cultivo, ou seja, elas apresentam comportamento regular e alcançam seu potencial produtivo mesmo em condições adversas de produção. Essa característica é comprovada pelos altos índices de produtividade obtidos nas áreas validadas que vão de estados do Nordeste até do Centro-Sul do País.

“Houve casos de as cultivares produzirem muito bem mesmo após cinco geadas, em áreas de validação do interior de São Paulo, ou sendo plantadas sem qualquer irrigação, mas durante a época de chuva, em Uruana (GO)”, exemplifica Vendrame.

No geral, a produtividade média das três cultivares superou 40 toneladas por hectare, valor que é o triplo da produtividade média nacional. Os testes de validação indicaram as seguintes produtividades médias: batata-doce BRS Nuti, 40 t/ha; batata-doce BRS Anembé, 42 t/ha; e batata-doce BRS Cotinga, 45 t/ha.

No ano passado, por exemplo, a produtividade média nacional da batata-doce ultrapassou a faixa de 14 t/ha, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), crescendo 30% em comparação aos valores obtidos há uma década. “Embora os números crescentes reflitam a maior adoção de tecnologias pela cadeia produtiva, como plantio de mudas sadias e cultivares com alto potencial produtivo, o Brasil ainda obtém produtividade bem inferior quando comparado aos principais países produtores de batata-doce, a exemplo de Senegal, com produtividade de 35,4 t/ha”, compara a pesquisadora.

Combo de resistências

Apesar de a batata-doce ser uma planta muito rústica, alguns problemas fitossanitários podem comprometer o seu pleno desenvolvimento, por isso, contar com cultivares que possuam uma boa resistência ou tolerância às principais doenças é importante para que o produtor rural não veja seu custo de produção aumentar em função do uso de defensivos agrícolas, como também para garantir maior sustentabilidade para a cultura.

A cultivar de batata-doce roxa BRS Anembé apresenta resistência ao nematoide-das-galhas Meloidogyne javanica, principal espécie de nematoide que ataca a cultura no Brasil, e a insetos-praga de solo como broca-de-raiz, vaquinhas e larva-arame. A batata-doce BRS Cotinga (foto à esquerda) resiste aos danos dos insetos-praga de solo, como também ao nematoide M. javanica. Já a cultivar CIP BRS Nuti possui resistência às três espécies de nematoides-das-galhas: Meloidogine incognita, M. javanica e M. enterolobii.

Panorama da batata-doce no Brasil

O cultivo da batata-doce ocorre de norte a sul do Brasil, é viável ao longo de todo o ano na maior parte do País, já que ela é uma planta exigente em calor, tolerante a baixas temperaturas e sensível a geadas. Logo, em regiões mais frias, deve ser cultivada preferencialmente nos meses de altas temperaturas, que favorecem o crescimento das raízes.

Em 2020, dados do IBGE indicaram que a área plantada com batata-doce no território nacional foi de 59,5 mil hectares e que a produção totalizou 847,9 mil toneladas. Entre os estados, São Paulo é o maior produtor, com 182 mil toneladas e 17% da área nacional de batata-doce, seguido pelo Rio Grande do Sul, que produz 133,6 mil toneladas em 18,6% da área.

Se considerar as regiões geográficas, é o Nordeste que apresenta maior destaque e ocupa a liderança, com 345,7 mil toneladas produzidas ou 40% do total, distribuídas por 47,5% da área colhida do País. Apesar da tendência de aumento da área plantada, o Brasil ocupa apenas a 16ª posição entre os países que mais produzem a raiz, sendo que a liderança absoluta nesse ranking fica com a China, que colhe mais de 53 milhões de toneladas anualmente.

No geral, o mercado brasileiro é voltado, principalmente, para o consumo humano a partir de raízes frescas, mas se observa também um crescimento considerável no processamento industrial das raízes. “A disponibilização de novas cultivares que atendam aos requisitos de qualidade exigidos pelo mercado dialoga com a demanda crescente de raízes com maior rendimento para o processamento industrial, já que a cada ano novas empresas adicionam aos seus portfólios produtos derivados da batata-doce, convencionais ou coloridas”, comenta Raphael Melo.

Para mesa e para indústria

As regiões brasileiras que apresentam o maior consumo per capita de batata-doce são o Nordeste, com 12,9 g/dia, seguido do Sul, com 7,9 g/dia. Pelos hábitos alimentares dos brasileiros, é mais comum o consumo de batata-doce fresca, muito embora, nos últimos anos, tem crescido o mercado de batata-doce processada, em especial na forma de chips.

São os aspectos de qualidade que definem qual o melhor mercado de destinação de uma cultivar de batata-doce, se para mesa ou para indústria. “Enquanto os teores de sólidos solúveis são os responsáveis pelo sabor e estão correlacionados ao total de todos os sólidos dissolvidos na água, como açúcar, sais, proteínas e ácidos presentes nos alimentos, o teor de matéria seca representa todos os sólidos presentes no alimento menos a água. Como os açúcares normalmente são os compostos mais representativos do teor de sólidos solúveis, podemos entender que nos remetem ao gosto doce do produto”, explica a pesquisadora Ana Cristina Krolow, da área de Ciência e Tecnologia de Alimentos, da Embrapa Clima Temperado. Ela acrescenta que teores elevados de matéria seca – acima de 20% – são ideais para processamento industrial, ou seja, produção de chips, pois podem apresentar textura mais crocante.

Foto: Paula Rodrigues

 

“Nosso foco é disponibilizar cultivares mais produtivas e precoces, mas é igualmente importante que elas tenham excelência em qualidade de raiz para atender tanto o mercado in natura quanto a indústria processadora”, pondera Vendrame, ao considerar que os aspectos relacionados à qualidade da batata-doce são determinantes para a adoção bem-sucedida de uma nova cultivar pelos setores produtivo e industrial.

A aparência uniforme da batata-doce de polpa roxa BRS Anembé é o que faz com que ela seja recomendada para o mercado de mesa e uso culinário, porque apresenta raízes com tamanho e formato alinhados ao padrão comercial valorizado pelo consumidor. Por outro lado, a batata-doce BRS Cotinga possui raízes mais irregulares e matéria seca na faixa de 32%, que são características que direcionam essa cultivar para o processo de industrialização na forma de chips e outros produtos como farinhas, féculas, tapiocas ou xarope de amido.

Por fim, a batata-doce de polpa alaranjada CIP BRS Nuti possui dupla aptidão, sendo indicada tanto para preparos cozidos quanto para o uso industrial. “Essa cultivar tem um excelente padrão comercial e teor de matéria seca de 25% - sendo superior à cultivar Beauregard”, comenta Mello, ao completar que a nova cultivar tem paladar menos doce e textura mais firme da polpa.

No geral, os pesquisadores entendem que as novas cultivares são opções mais vantajosas para os produtores rurais que, comumente, plantam variedades sem padronização, qualidade sanitária ou garantia de origem genética. “As novas cultivares têm o potencial de contribuir para a solução de um gargalo importante para a estruturação e profissionalização da cadeia produtiva da batata-doce, uma vez que oferecem estabilidade genética e maior padronização de raiz, fatores que agregam valor ao produto e garantem acesso a mercados mais exigentes, interessados em produtos diferenciados e saudáveis”, conclui.

Licenciamento para produtores

As três novas cultivares de batata-doce coloridas e biofortificadas estão sendo ofertadas pela Embrapa para produtores de mudas de batata-doce inscritos no Registro Nacional de Sementes e Mudas (Renasem).

O edital de oferta pública irá selecionar os interessados no licenciamento não exclusivo para produção e comercialização das mudas das cultivares BRS Anembé, BRS Cotinga e CIP BRS Nuti. 

“A Embrapa aumenta o seu portfólio de soluções para as cadeias produtivas e, com isso, gera incremento em produtividade, lucratividade e agregação de valor para o benefício de produtores e consumidores”, comenta Henrique Carvalho, chefe-adjunto de Transferência de Tecnologia da Embrapa Hortaliças.

Os produtores interessados devem encaminhar a documentação solicitada no Comunicado de Oferta até às 17h do dia 6 de janeiro de 2022 para o e-mail sin.eca@embrapa.br. Os participantes serão classificados por ordem de recebimento do e-mail enquanto houver lotes disponíveis das cultivares ofertadas.

Os produtores contemplados serão comunicados a partir do dia 10 de janeiro de 2022 e, então, chamados à assinatura do contrato de licenciamento, no qual está incluída a licença para uso da marca “Tecnologia Embrapa”. O documento completo pode ser acessado aqui.

Foto: Paula Rodrigues

 

Paula Rodrigues (MTb 61.403/SP)
Embrapa Hortaliças

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