24/03/25 |   Biotechnology and biosafety

Pesquisadores solucionam controvérsia genética de vegetação dos Campos Rupestres

Enter multiple e-mails separated by comma.

Photo: Rafael Soares

Rafael Soares -

Combinando técnicas inovadoras, estudo revela novos detalhes sobre a genética das velózias, fornecendo subsídios para sua conservação e aplicações biotecnológicas.

Pesquisadores do Centro de Genômica Aplicada às Mudanças Climáticas (GCCRC) – uma parceria entre a Embrapa, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) – determinaram, com precisão inédita, o número cromossômico das icônicas velózias dos Campos Rupestres – vegetações em áreas rochosas que ocorrem no Cerrado Mata Atlântica e Caatinga – solucionando uma incerteza genética que perdurava há décadas. O estudo foi publicado na revista Brazilian Journal of Botany.

Os Campos Rupestres são um dos ecossistemas mais biodiversos e ameaçados do Brasil, abrigando espécies altamente adaptadas a condições extremas. Entre elas, as espécies do gênero Vellozia se destacam por sua resistência à seca e solos pobres, tornando-as alvos de estudos moleculares para a compreensão dessas características. Esse conhecimento pode levar a inovações biotecnológicas para adaptação de culturas agrícolas aos impactos das mudanças climáticas.

 

Um mistério cromossômico

Desde a década de 80, pesquisadores tentam determinar o número básico de cromossomos das espécies de Vellozia, mas os resultados sempre foram controversos. Alguns estudos apontavam nove, oito e até sete pares cromossômicos, dependendo da espécie. Parte dessa confusão se deve ao fato de que alguns cromossomos eram considerados satélites – pequenas estruturas ligadas aos cromossomos principais, que poderiam ser interpretadas como partes acessórias e não como verdadeiros cromossomos.

Pesquisadores do GCCRC abordaram essa questão de uma maneira inovadora. Utilizando um anticorpo contra uma proteína do centrômero - região mais estreita dos cromossomos e importante para a divisão desses, conseguiram demonstrar que esses supostos satélites eram, na verdade, cromossomos reais. Isso trouxe uma nova perspectiva sobre a organização genômica do gênero e ajudou a resolver um debate de décadas.

“Se há centrômero, há um cromossomo. Essa abordagem confirmou que as espécies analisadas possuem nove pares cromossômicos”, afirma Guilherme Braz, especialista em citogenética e primeiro autor do estudo. Os resultados possibilitaram a determinação inequívoca do número de cromossomos em seis espécies de Vellozia, sendo que, para quatro delas, essa informação era inédita.

 

O desafio da contagem

Determinar o número exato de cromossomos de uma planta pode parecer simples, mas no caso das velózias, há um desafio técnico importante: é extremamente difícil obter células em metáfase, a fase da divisão celular em que os cromossomos estão mais visíveis em microscópios e prontos para serem contados. As velózias apresentam crescimento extremamente lento, o que limita a obtenção dessas células.

Para superar esse obstáculo, os pesquisadores se valeram de uma estratégia inovadora: por meio da aplicação de hormônios em sementes das espécies, geraram uma estrutura denominada calo, que apresenta uma taxa mais alta de divisão celular. Isso permitiu a obtenção de um número muito maior de células em metáfase, facilitando a contagem e confirmando os achados sobre o número de cromossomos do gênero.

“Combinamos a indução de divisão celular e a identificação de uma proteína do centrômero, permitindo uma contagem precisa. Esse método pode futuramente ser aplicado a outras espécies que igualmente têm cromossomos pequenos e baixo número de células em metáfase”, resume Ricardo Dante, pesquisador principal do GCCRC e da Embrapa Agricultura Digital, autor do trabalho.

 

Por que Isso Importa?

“A resolução desse mistério cromossômico não é apenas uma curiosidade acadêmica, ela tem implicações importantes para a evolução, conservação e genética das espécies de Vellozia”, afirma Isabel Gerhardt, pesquisadora principal do GCCRC e da Embrapa Agricultura Digital, autora do trabalho. “O número de cromossomos pode indicar eventos como poliploidia (duplicação do genoma), fusões ou quebras cromossômicas que influenciaram a adaptação dessas plantas ao ambiente extremo dos campos rupestres”, complementa a autora.

Além disso, conhecer o número correto de cromossomos auxilia na definição de espécies e linhagens evolutivas únicas, contribuindo para a preservação de populações ameaçadas. O estudo também pode ter aplicações biotecnológicas, pois compreender a organização genômica e investigar os genes envolvidos na resposta à seca das velózias pode inspirar estratégias agrícolas para minimizar os efeitos das mudanças climáticas.

Os pesquisadores do GCCRC mostraram que contar cromossomos pode ser um verdadeiro quebra-cabeça, mas, ao utilizar ferramentas modernas, conseguiram solucionar um mistério que persistia há décadas. Essa descoberta não apenas redefine o conhecimento sobre o gênero Vellozia, mas também contribui para a valorização da biodiversidade brasileira.

Os Campos Rupestres estão localizados em afloramentos rochosos nas regiões central e leste do Brasil. Apesar do ambiente hostil para o desenvolvimento de plantas, abriga quase 15% da diversidade vegetal brasileira, concentrando muitas espécies de ocorrência única nessa região. Além da necessidade de conservação, esse ecossistema apresenta potencial científico ainda pouco explorado.

Saiba mais em:

Braz, G.T., Riboldi, L.B., Pinto, M.S. et al. Revisiting the cytogenetics of Vellozia Vand.: immunolocalization of KNL1 elucidates the chromosome number for the genus. Braz. J. Bot 48, 6 (2025). https://doi.org/10.1007/s40415-024-01064-1.

 

Paula Drummond de Castro
Centro de Pesquisa em Genômica para Mudanças Climáticas (GCCRC)

Press inquiries

Graziella Galinari (Colaboração)
Embrapa Agricultura Digital

Press inquiries

Further information on the topic
Citizen Attention Service (SAC)
www.embrapa.br/contact-us/sac/

Image gallery

Find more news on:

gccrcbiotecnologiaumip-genclima