17/04/25 |   Biotechnology and biosafety

Mapeamento genético de microrganismos associados a velózias dos campos rupestres está disponível

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Photo: Rafael Souza

Rafael Souza -

Estudo identificou mais de 257 mil microrganismos associados às velózias — plantas que se desenvolvem em ambientes extremos de seca, calor e solo pobre — e compartilha os dados para apoiar novas pesquisas sobre interações planta-microrganismo.

Pesquisadores do Centro de Pesquisa em Genômica Aplicada às Mudanças Climáticas (GCCRC) — uma parceria entre Embrapa, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) — disponibilizaram um conjunto inédito e abrangente de dados sobre microrganismos associados às plantas da família Velloziaceae nos campos rupestres brasileiros. O conjunto de dados, publicado na revista Scientific Data no dia 16 de abril, identificou mais de 257 mil bactérias e arqueias — um dos maiores esforços já realizados de caracterização do microbioma de espécies de Vellozia, incluindo vários tecidos vegetais de quatro espécies diferentes, solos e estações do ano.

Os dados genéticos e seus metadados estão disponíveis em plataformas de acesso aberto: JGI GOLD, GenBank, do National Center for Biotechnology Information (NCBI), e European Nucleotide Archive (ENA). Esses dados devem impulsionar pesquisas sobre interações planta-microrganismo e inspirar soluções biotecnológicas para a agricultura em cenários de mudanças climáticas.

Os campos rupestres são ecossistemas singulares da região central do Brasil, caracterizados por condições extremas, como solos pobres em nutrientes e períodos de seca severa. Nesse ambiente desafiador, plantas da família Velloziaceae — muitas delas exclusivas desses locais — desenvolveram estratégias adaptativas distintas para lidar com a escassez hídrica. Há espécies de velózias do tipo ressurgente, que toleram a dessecação e se reidratam após a chuva. Outras são sempre-verdes, mantendo-se hidratadas mesmo durante a seca. O estudo investigou duas espécies ressurgentes, Vellozia nivea e Vellozia tubiflora, e duas espécies sempre-verdes, Vellozia intermedia e Vellozia peripherica.

“Quando pensamos nas estratégias das velózias para lidar com a seca, percebemos que seria importante olhar além da planta em si e investigar também os microrganismos associados a ela — tanto os que estão na superfície dos tecidos quanto os que vivem em seu interior. Acreditamos que essa interação pode desempenhar um papel fundamental na adaptação das espécies a condições tão extremas”, explica Isabel Gerhardt, pesquisadora principal do GCCRC, da Embrapa Agricultura Digital e autora do artigo.

Segundo Bárbara Biazotti, doutoranda no GCCRC e autora do estudo, o trabalho é pioneiro ao investigar as comunidades microbianas — em especial as bactérias — relacionadas a diferentes estratégias de tolerância à seca. “Ao investigar os microrganismos associados às plantas de Vellozia, identificamos uma excelente oportunidade de explorar a rica diversidade microbiana do Brasil, com potencial valioso para o desenvolvimento de novas tecnologias e produtos voltados à agricultura”, destaca.

O artigo descreve como os cientistas sequenciaram 374 amostras de folhas, bainhas secas, raízes aéreas e subterrâneas, além do solo. O foco foi identificar a diversidade microbiana em cada uma dessas partes. “Fizemos um esforço amostral abrangente para identificar todas as bactérias presentes nas diferentes partes das velózias e no solo”, explica Otávio Pinto, bioinformata do GCCRC. Os pesquisadores também realizaram análises metagenômicas do solo em diferentes períodos (chuvoso e seco), considerando ambas as estratégias adaptativas das plantas.

Os resultados sugerem que há mais de 257 mil diferentes bactérias no microambiente das velózias. “Parte desse número elevado de microrganismos identificados também é resultado do nosso esforço amostral abrangente, ao coletar material de diferentes partes das quatro espécies e em diferentes épocas do ano”, complementa Gerhardt.

A descrição completa dos perfis sazonais das bactérias associadas às velózias possibilitará investigar se há diferenças significativas entre os períodos seco e chuvoso, ou entre as espécies sempre-verdes e ressurgentes. Este é o próximo passo dos cientistas do GCCRC.

 

Ciência aberta e os artigos de dados

O estudo foi publicado como um artigo do tipo "descritor de dados", um formato que prioriza o compartilhamento detalhado de conjuntos de dados para uso amplo pela comunidade científica. "Nosso objetivo foi disponibilizar os dados de forma organizada, em um padrão reconhecido internacionalmente, em um repositório aberto, para que outros pesquisadores possam testar suas hipóteses e realizar comparações entre diferentes estudos", explica Ricardo Dante, pesquisador principal do GCCRC, da Embrapa Agricultura Digital e autor do artigo.

"A ampla disseminação desses dados pode beneficiar não apenas a ecologia e a microbiologia, mas também estudos aplicados, como estratégias de conservação e biotecnologia para o manejo de solos em condições áridas", conclui Gerhardt.

O conjunto de dados está disponível para acesso público (JGI GOLD, GenBank e ENA), permitindo que pesquisadores de diversas áreas possam explorá-lo e contribuir para a compreensão das adaptações das plantas e dos microrganismos nos campos rupestres.

Microrganismos que ajudam a captar fósforo em ambientes extremos

Além de abrigarem uma flora altamente adaptada à escassez de água, os campos rupestres também são habitat para bactérias capazes de tornar nutrientes escassos mais disponíveis para as plantas. Em estudo anterior conduzido por pesquisadores do GCCRC, foi identificado que microrganismos associados às raízes de espécies da famíia Velloziaceae (Vellozia epidendroides e Barbacenia macranta) possuem maior número de genes relacionados à solubilização de fósforo quando comparados a outras espécies de plantas e ambientes (leia mais aqui). O fósforo é um nutriente essencial à sobrevivência vegetal, mas de difícil acesso em solos tropicais altamente intemperizados.

Essas bactérias funcionam como aliadas silenciosas das plantas, transformando compostos insolúveis de fósforo em formas absorvíveis, o que pode ser crucial para a persistência da vegetação em ambientes com solos pobres em nutrientes. O conhecimento dessas interações pode, futuramente, contribuir para o desenvolvimento de tecnologias sustentáveis voltadas à agricultura, como biofertilizantes que aumentem a eficiência do uso de fósforo em cultivos agrícolas.

 

Sobre o GCCRC

O Centro de Pesquisa em Genômica Aplicada às Mudanças Climáticas (GCCRC) é um centro de pesquisa conjunto Embrapa/Unicamp, cuja missão principal é a criação de ativos biotecnológicos por meio da genômica aplicada à adaptação de cultivos aos estresses associados às mudanças climáticas. O GCCRC construiu e expandiu a Unidade Mista de Pesquisa em Genômica Aplicada à Mudança do Clima (UMiP GenClima), uma iniciativa entre Embrapa e Unicamp, estabelecida em 2012. O GCCRC reúne cientistas em laboratórios de ponta, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) por meio do programa Centros de Pesquisa em Engenharia (CPE).

 

Paula Drummond de Castro
Centro de Pesquisa em Genômica para Mudanças Climáticas (GCCRC)

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Graziella Galinari (Colaboração)
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