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Sistema Erva 20 inspira políticas públicas em municípios no Paraná
Após três anos de seu lançamento, o Erva 20, sistema desenvolvido pela Embrapa Florestas, tem servido de base para fomentar programas municipais que estimulam a adoção de boas práticas nos cultivos da erva-mate
Com tecnologias e recomendações compiladas sobre como plantar, controlar pragas, doenças e plantas daninhas, realizar adubação e podas, o sistema de produção Erva 20, lançado pela Embrapa Florestas há três anos, vem gerando resultados cada vez mais concretos. “O sistema não é fruto do trabalho de uma pessoa só, mas de diversas pesquisas conduzidas pela Embrapa Florestas e parceiros em mais de 30 anos, o que demonstra que o trabalho em parceria traz frutos importantes às cadeias produtivas”, avalia Ives Goulart, engenheiro agrônomo e analista da Embrapa Florestas.
Estima-se que, atualmente, cerca de 1.200 produtores já adotam o Erva 20, porém esse número pode ser muito maior, segundo Goulart. Só o manual do Sistema Erva 20 já foi distribuído para mais de 17.000 pessoas, somando-se as versões impressa e digital. O sistema, inclusive, tem servido de inspiração e estímulo para o fomento de políticas públicas em municípios paranaenses, como o recém lançado em Mallet, e o Ecomate, programa que já existe em Turvo desde 2018.
Apesar de já haver muito conhecimento para elevar a produção nos ervais, esta cultura ainda preserva alguns preceitos de sua origem extrativista, que se baseia na colheita da erva-mate em florestas naturais, sem reposição nutricional ou adoção de tecnologias de cultivo. A baixa adoção tecnológica é, inclusive, um forte entrave para o crescimento do setor ervateiro, cuja produtividade média tem sido em torno de 7.700 kg/ha. O baixo desempenho desestimula ainda mais a busca por melhorias, e ocorre, principalmente, entre os pequenos produtores, para os quais a erva-mate tem significado uma importante fonte de renda.
Com o intuito de fomentar o cultivo da erva-mate, no início de março, durante o 2º Encontro Regional da Erva-mate, em Mallet/PR, pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento do município, foi lançado um programa para estimular a produção local da erva-mate. Localizada no centro-sul do estado, a 200 km de Curitiba, Mallet se situa no maior polo de produção de erva-mate paranaense.
Inspiração
De acordo com Margareth Maksemovicz, secretária de agricultura e abastecimento de Mallet, o programa foi inspirado nas recomendações do Sistema Erva 20. “A ideia do programa de fomento à erva-mate em Mallet nasceu após assistirmos a uma palestra sobre o Sistema, com um técnico da Embrapa Florestas, em Irati”, conta. Além disso, Maksemovicz é engenheira agrônoma de formação e, por isso mesmo, está ciente da importância do uso de tecnologias e do manejo correto nos ervais, como em qualquer cultura comercial.
Segundo a secretária, o programa visa oferecer um aporte inicial de mudas de erva-mate, em parceria com o Instituto Água e Terra (IAT), além de assistência técnica aos produtores cadastrados e assessoria em projetos para obtenção de cartas de crédito voltadas para investimentos na produção.
O programa ainda não foi oficialmente publicado, pois a listagem de produtores interessados está em finalização, como informou a secretária. Com o pontapé inicial do poder público e a depender do engajamento e investimento de cada produtor, com o programa, “espera-se que, em curto prazo, a produtividade dos ervais aumente em 20%, e a médio e longo prazo, em até 70%”, prevê a secretária de agricultura.
Mallet tem uma produção de 5.200 toneladas anuais, por hectare (PEVS e PAM-IBGE, 2020). Estima-se que três mil produtores trabalhem com a erva-mate em suas propriedades, segundo os dados do Cadastro de Produtores Rurais - CAD/PRO. “Nosso objetivo é capacitar o produtor rural para ele buscar novas técnicas, pois ela é o quarto produto de maior arrecadação do município (R$ 7 milhões). Sabemos da potencialidade que o município tem na questão da produtividade”, diz.
Preservação de remanescentes florestais
O viés conservacionista, intrínseco à cultura de erva-mate sombreada, foi a base para um outro exemplo de política pública, um pouco mais antiga, que existe em Turvo, na região Central do Paraná. Intitulado Ecomate, o programa foi implementado há quatro anos, com o objetivo de levar conhecimento técnico aos produtores de erva-mate, aliado à educação ambiental.
Segundo o secretário de Agricultura e Pecuária de Turvo-PR, Flávio Luiz de Oliveira, o programa Ecomate surgiu antes do Sistema Erva 20, mas, posteriormente, teve seus princípios incorporados ao programa, com a colaboração da Embrapa Florestas. A produção anual de Turvo é de 11.500 quilos por hectare ao ano (PEVS e PAM-IBGE, 2020).
Havia, segundo Oliveira, a necessidade de criar uma política de governo que auxiliasse o produtor de erva-mate com mudas e assistência técnica e que também o despertasse a fortalecer o pensamento conservacionista dos remanescentes florestais do município. Segundo conta o secretário de agricultura de Turvo, o apoio da Embrapa Florestas, por meio dos conhecimentos do Erva 20, tem sido muito importante nesse trabalho.
“Iniciamos um projeto piloto com 10 produtores, em 2018, e no ano seguinte fizemos o acréscimo de mais 24 produtores. Hoje, contamos com uma lista de espera de mais de 60 produtores, todos provenientes de pequenas propriedades e que têm a erva-mate como mais uma fonte de renda dentro da sua economia. Observamos uma melhor condução da atividade e uma mudança de pensamento, de que a área de mata pode gerar renda e não prejuízo para a propriedade”, diz o secretário de Agricultura de Turvo-PR.
Propagando conhecimento
Um dos grandes parceiros neste trabalho de divulgação das tecnologias e recomendações do Erva 20 tem sido o Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR). Encontros regionais, como o ocorrido em Mallet em março deste ano na Ervateira Sokolowski, têm atraído produtores de várias regiões. Neste segundo evento, promovido pela indústria da família na região, em parceria com o IDR, Prefeitura de Mallet e Embrapa Florestas, compareceram 160 pessoas, de 23 municípios.
De acordo com Juliano de Lima Souza, engenheiro agrônomo, extensionista do IDR em Mallet e organizador do evento, o Sistema Erva 20 tem sido um importante aliado para qualificar os produtores de erva-mate da região. “Pouco tempo atrás, os produtores não investiam na cultura, não adotavam práticas como calagem, adubação e isso causava uma produtividade muito baixa por área. As informações do Erva 20 vêm para profissionalizar o produtor e deixar a atividade mais atrativa”, afirma.
Alvim Sokolowski, produtor e sócio da ervateira, diz que a família trabalha com a cultura há 22 anos, e assume já ter cometido muitos erros com os ervais. Mas, garante que muitos destes erros ficaram para trás, graças ao empenho da família em investir em conhecimento e se atualizar. A ervateira Sokolowski recebe uma média de 100 toneladas de matéria-prima por semana, advinda de cerca de mil produtores. Portanto, receber um produto de qualidade dos fornecedores do entorno é algo essencial para o sucesso dos negócios.
“A produtividade dos nossos ervais aumentou bastante desde a adoção das tecnologias, algo que ocorreu há cerca de oito anos. Após a adoção do Sistema Erva 20 nosso conhecimento aumentou mais e, por isso, objetivamos, com o evento, propagar aos produtores tudo isso que o Sistema traz, pois tem muita gente que ainda vive naquele modo antigo de extrativismo, considera a planta como nativa e acha que não precisa de cuidados especiais, como nutrição, por exemplo”, enfatiza Alvim Sokolowski.
Um dos produtores que estiveram neste evento foi o Marcos Kamikoga, de Ponta Grossa. Este é o terceiro evento sobre o tema do qual participa e considera fundamental conhecer o que há de tecnologia para melhoria da produção. Além de pecuária de corte, Kamikoga planta soja e, há três anos, vem cultivando a erva-mate no sistema sombreado, como forma de incrementar as plantas nativas que encontrou na propriedade.
“Ao me aposentar, decidi tocar a propriedade de uma maneira mais tecnificada e busquei um curso sobre erva-mate. Além de informações no Senar, tive acesso ao Erva 20, e comecei a ler e aprender e, qualquer dúvida, eu ia no Manual. A primeira coisa que busquei foi adquirir mudas de linhagens selecionadas, e também faço calagem, adubação orgânica e química e plantio de cobertura vegetal com amendoim forrageiro, principalmente. Hoje, a área para plantio está estagnada e a gente tem que se aprofundar cada vez mais, para aumentar a nossa produtividade. Eventos como este são um estímulo para o produtor familiar. Tenho 10 mil plantas de erva-mate e quero chegar a 15 mil esse ano, pois, mesmo estando distante da região produtora, acho que vai valer a pena”, diz, otimista.
O Sistema Erva 20
Em 2019, a Embrapa iniciou o projeto intitulado “Disponibilização e inserção de tecnologias do Sistema Erva 20 e prospecção de fatores limitantes à adoção tecnológica no setor ervateiro”, cujo objetivo era realizar a transferência das tecnologias para produção de erva-mate.
“Estas foram compiladas e geraram o Sistema Erva 20 e dentre as atividades do projeto, estavam diversas ações de transferência de tecnologia realizadas em parcerias institucionais, como cursos presenciais e a distância, palestras, divulgações na mídia, a criação dos aplicativos, entre outros. O projeto encerrou em fevereiro de 2022, e a sensação é de ter atingido o objetivo com sucesso”, conta Ives Goulart, um dos autores da publicação, juntamente com o analista aposentado da Embrapa Florestas Joel Ferreira Penteado Júnior.
Desde 2019, quando a Embrapa lançou o Sistema Erva 20, este vem sendo divulgado por meio de palestras e cursos em várias cidades do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul. A Embrapa também oferece gratuitamente o Manual do Sistema Erva 20, que apresenta o passo a passo para plantar, manejar e colher e, assim, estabelecer um erval com capacidade de alcançar seu potencial produtivo, mantendo a qualidade da matéria-prima e a sustentabilidade ambiental.
“Com o Manual, qualquer profissional pode trabalhar com o Erva 20, como já existem alguns consultores no mercado que o utilizam. Isso nos traz satisfação, ao saber que o Erva 20 gera negócios, riquezas e melhora a produtividade da erva-mate nas propriedades”, diz Goulart.
Ferramentas agregadas
Outras ferramentas foram agregadas, como os aplicativos Matte, que podem ser usadas de forma independente. É o caso do aplicativo Manejo-Matte que faz o diagnóstico dos ervais, e apresenta o que é preciso fazer para melhorar o erval, com recomendações. Se no diagnóstico for detectado que é preciso fazer adubação, pode-se lançar mão do aplicativo Ferti-Matte, que calcula as doses dos adubos recomendados para erva-mate, de acordo com a análise de solo. Os cálculos são baseados nos parâmetros que estão no próprio Manual do Erva 20 e na publicação Propagação e Nutrição de erva-mate (Ivar Wendling e Delmar Santin, 2015).
O terceiro recurso é o Planin-Matte, um software para computador que faz a análise econômica, permitindo calcular quanto vai custar todo o erval. Além disso, o Planin-matte gera parâmetros econômicos que permitem ao usuário comparar a atividade ervateira com outras, com indicadores adequados para este fim. Os três aplicativos têm manuais publicados.
Abrangência do Erva 20
Segundo Ives Goulart, o número de adotantes do Erva 20 e o nível de adoção do Sistema são variáveis. “Por ser um sistema de produção, dificilmente vai ter um produtor que adote 100%, o que é comum na agricultura, então existem níveis de adoção diferentes. Mas entre os produtores que adotam algum dos aspectos, estima-se que haja cerca de 1500 hectares com algum nível de adoção, pelo menos. Já com adoção plena do Erva 20, foi estimado que ela ocorre em cerca de 400 hectares. Em termo de produtores, pode-se estimar um número de 700 a 1.200 produtores. Porém, este dado pode ser bem maior, pois só dos aplicativos Matte, nós já temos 1.700 usuários, e o manual do Erva 20 já foi distribuído para mais de 17.000 pessoas”, explica Ives Goulart. Tais dados relacionados à adoção do Erva 20 nos ervais foram avaliados em sua tese de doutorado, publicada em 2020.
“Já com relação ao sistema de adubação, pode-se dizer que todo o Rio Grande do Sul, com o trabalho da Emater-RS, já trabalha com a nova recomendação de adubação. Em Santa Catarina, há vários profissionais que usam o sistema para suas consultorias. Aqui no Paraná, o IDR trabalha com o Ferti-Matte, recomendando também o sistema de adubação. Sem deixar de mencionar as dezenas de capacitações com o Erva 20, nas quais temos tido muito retorno e a demonstração de que os produtores já estão usando o Sistema e testando as tecnologias. O futuro é promissor”, comemora.
Este conteúdo está alinhado com os ODS 2, 8, 12, 15 e 17 nas seguintes metas:
-ODS 2
2.4 até 2030, garantir sistemas sustentáveis de produção de alimentos e implementar práticas agrícolas resilientes, que aumentem a produtividade e a produção, que ajudem a manter os ecossistemas, que fortaleçam a capacidade de adaptação às mudança do clima, às condições meteorológicas extremas, secas, inundações e outros desastres, e que melhorem progressivamente a qualidade da terra e do solo;
2.5 até 2020, manter a diversidade genética de sementes, plantas cultivadas, animais de criação e domesticados e suas respectivas espécies selvagens, inclusive por meio de bancos de sementes e plantas diversificados e adequadamente geridos em nível;
-ODS 8
8.2 atingir níveis mais elevados de produtividade das economias, por meio da diversificação, modernização tecnológica e inovação, inclusive por meio de um foco em setores de alto valor agregado e intensivos em mão-de-obra;
8.3 promover políticas orientadas para o desenvolvimento, que apoiem as atividades produtivas, geração de emprego decente, empreendedorismo, criatividade e inovação, e incentivar a formalização e o crescimento das micro, pequenas e médias empresas, inclusive por meio do acesso a serviços financeiros;
8.4 melhorar progressivamente, até 2030, a eficiência dos recursos globais no consumo e na produção, e empenhar-se para dissociar o crescimento econômico da degradação ambiental, de acordo com o "Plano Decenal de Programas Sobre Produção e Consumo Sustentáveis”, com os países desenvolvidos assumindo a liderança;
-ODS 12
12.2 até 2030, alcançar gestão sustentável e uso eficiente dos recursos naturais;
-ODS 15
15.1 até 2020, assegurar a conservação, recuperação e uso sustentável de ecossistemas terrestres e de água doce interiores e seus serviços, em especial, florestas, zonas úmidas, montanhas e terras áridas, em conformidade com as obrigações decorrentes dos acordos internacionais;
15.2 até 2020, promover a implementação da gestão sustentável de todos os tipos de florestas, deter o desmatamento, restaurar florestas degradadas e aumentar substancialmente o florestamento e o reflorestamento globalmente;
-ODS 17
17.14 aumentar a coerência das políticas para o desenvolvimento sustentável;
17.17 incentivar e promover parcerias públicas, público-privadas, privadas, e com a sociedade civil eficazes, a partir da experiência das estratégias de mobilização de recursos dessas parcerias.
Manuela Bergamim (MTb 1951-ES)
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