A introdução da leguminosa teve o mesmo impacto da aplicação anual de 150 quilos de fertilizante nitrogenado por hectare na pastagem. Estudo feito ao longo de quatro anos mostra que o uso do Desmodium ovalifolium pode reduzir em 30% o tempo de abate do animal. A redução do tempo de abate representa menor custo ao produtor e menos emissões de gases de efeito estufa (GEE). Leguminosa melhora digestão bovina reduzindo emissões de metano. Estudo realizado por quatro anos revela que o uso consorciado de Brachiaria brizantha, também conhecida como capim-marandu, com a leguminosa forrageira Desmodium ovalifolium (desmódio) aumenta em 60% o peso do animal no pasto se comparado a uma pastagem sem uso de nitrogênio. “A introdução da leguminosa teve o mesmo impacto da aplicação de 150 quilos de fertilizante nitrogenado por hectare ao ano na pastagem”, explica Robert Boddey, pesquisador da Embrapa Agrobiologia (RJ). Recém-publicado no periódico Grass & Forage Science, um dos mais importantes da área de forragicultura, o estudo aponta ainda que o uso do Desmodium ovalifolium pode reduzir em 30% o tempo de abate do animal, o que representa menos custo para o criador. “Reduzir o tempo de abate significa também menos emissões de metano entérico (arroto do boi) para a atmosfera”, complementa Boddey. Um animal adulto no pasto emite entre 50 e 60 quilos de metano por ano. O uso do desmódio na pastagem não reduz apenas a emissão de metano entérico, mas também de óxido nitroso ao permitir a redução do uso de fertilizantes nitrogenados no pasto. O óxido nitroso é o mais potente gás de efeito estufa. Segundo pesquisas, cada quilo de nitrogênio aplicado no campo emite óxido nitroso equivalente a pelo menos quatro quilos de CO2. Conheça o desmódio O desmódio (Desmodium ovalifolium) é uma leguminosa forrageira perene, originária da Ásia. A planta é um subarbusto que pode atingir até um metro de altura. O caule se apresenta praticamente livre de pelos, exceto nas extremidades, onde ocorre uma pilosidade fina e sedosa. Os nós inferiores do caule, quando em contato com o solo, enraízam-se facilmente. As folhas são trifoliadas, com folíolos ovais, sendo o terminal maior que os laterais. As flores são púrpuras ou rosa-escuro, tornando-se azuladas após a completa abertura. Saiba mais sobre o seu manejo aqui. A redução do uso de fertilizante nitrogenado na pastagem possibilita ainda eliminar as emissões de CO2 fóssil resultante da fabricação, transporte e aplicação no campo. Calcula-se que para cada 100 quilos de nitrogênio fertilizante ocorra a emissão de 450 quilos de CO2 equivalente. “Além desse ganho para o meio ambiente, há a possibilidade de reduzir o gasto com o fertilizante, que atualmente está em torno de 300 dólares por hectare de pastagem”, lembra o cientista. O pesquisador Segundo Urquiaga, também da Embrapa, salienta que os resultados obtidos com o desmódio ganham especial importância porque o custo alto dos fertilizantes faz com que as pastagens no País tenham uma adoção limitada de adubos nitrogenados. “Atualmente, estima-se que menos de 5% das pastagens brasileiras recebam algum tipo de adubo nitrogenado”, enfatiza Urquiaga. Resistência ao uso de leguminosas O uso de leguminosas nas pastagens não é uma opção muito adotada pelos criadores. “Há uma resistência entre os produtores porque além das sementes serem caras, as espécies utilizadas até então, em especial o estilosantes, não apresentam boa persistência associada com a braquiária”, explica Boddey. Depois de algum tempo no campo a leguminosa diminui ou morre, sendo necessária a renovação do pasto, o que significa custo e trabalho. O pesquisador da Embrapa afirma que com o desmódio isso não ocorre sendo possível manter a leguminosa no pasto por mais de nove anos. “Como é uma planta estolonífera, ou seja, suas raízes ou colmos crescem rente ao solo e dão origem a uma nova planta, não é necessário ficar renovando o pasto”, esclarece Boddey. Segundo ele, se as leguminosas que se reproduzem a partir de seus estolões forem manejadas adequadamente na pastagem, elas persistirão no pasto. “No caso do desmódio, a solução é entrar com o gado quando a altura estiver chegando a 30 centímetros e retirar os animais quando a altura média for de 15 centímetros”, recomenda. Próximos passos Os cientistas explicam que uma das principais fontes de emissão de gás metano para a atmosfera é o “arroto do boi” e, dependendo da alimentação do gado, ele pode ser mais ou menos intenso. Com o desmódio, por se tratar de uma espécie com alto teor de tanino, os pesquisadores entendem que ele pode auxiliar na digestão e ainda contribuir para uma redução da emissão desse gás. O tanino é um composto químico presente principalmente na casca, caule, folhas e sementes das leguminosas. Alguns estudos de emissões de GEE já estão sendo realizados no campo e nos laboratórios. “Avaliar o animal é bastante complicado, porque é preciso avaliar também o consumo de forragem e o desempenho animal”, relata Boddey. Para isso, os pesquisadores utilizam uma espécie de coletor acoplado ao animal, que recolhe durante um período o gás emitido, que depois é avaliado em laboratório. Dados preliminares mostram que a redução pode ser maior que 10%. A pesquisa Durante quatro anos, esse estudo foi realizado, pela Embrapa Agrobiologia, na Estação Experimental de Zootecnia da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), no município de Itabela, sul da Bahia. Foram comparadas três áreas de pastagens, sendo uma mista com desmódio e braquiária (capim-marandu) sem a aplicação de fertilizante nitrogenado, outra com monocultura de braquiária com aplicação de 150 kg de nitrogênio por hectare ao ano (pasto adubado), e uma terceira área com monocultura de braquiária sem adubação nitrogenada. O uso do desmódio nas pastagens nesta região da Mata Atlântica vem sendo avaliado desde 2009 pela Embrapa. O objetivo das pesquisas é verificar a capacidade de incorporação de nitrogênio ao sistema, reduzir as emissões de gases de efeito estufa, assim como tornar os pastos brasileiros mais produtivos. “É importante destacar que os resultados obtidos com o desmodium ovalifolium são para esse bioma”, complementa o pesquisador. Sementes na alimentação do gado Segundo a pesquisadora da Ceplac Cláudia de Paula Rezende, o manejo do desmódio exige tanto quanto outras espécies. A zootecnista trabalha há mais de duas décadas avaliando o uso dessa e de outras espécies de leguminosas nas pastagens. “O produtor precisa ver o pasto como uma lavoura para a qual ele deve fornecer nutrientes suficientes para que ela se torne perene e possa dar resultados tanto no animal como no sistema todo”, comenta a pesquisadora. Rezende explica que o desmódio pode ser introduzido no pasto na época do plantio do capim com alguns cuidados. “Não se pode plantar junto porque a semente dessa leguminosa é muito pequena e na hora que você coloca na máquina junto com a semente de capim esta cai primeiro”, ressalta. No entanto, a forma que ela considera mais fácil é adicionar sementes do desmódio na alimentação do boi. “Nós adicionamos em torno de 100 gramas de sementes não escarificadas, o boi vai ingerir, vai defecar no pasto e as sementes se estabelecem e se desenvolvem”, explica a zootecnista.
Foto: Cláudia Rezende
O desmódio (Desmodium ovalifolium) é uma leguminosa forrageira perene, originária da Ásia. Na foto, a flor do desmódio.
Estudo realizado por quatro anos revela que o uso consorciado de Brachiaria brizantha, também conhecida como capim-marandu, com a leguminosa forrageira Desmodium ovalifolium (desmódio) aumenta em 60% o peso do animal no pasto se comparado a uma pastagem sem uso de nitrogênio. “A introdução da leguminosa teve o mesmo impacto da aplicação de 150 quilos de fertilizante nitrogenado por hectare ao ano na pastagem”, explica Robert Boddey, pesquisador da Embrapa Agrobiologia (RJ).
Recém-publicado no periódico Grass & Forage Science, um dos mais importantes da área de forragicultura, o estudo aponta ainda que o uso do Desmodium ovalifolium pode reduzir em 30% o tempo de abate do animal, o que representa menos custo para o criador. “Reduzir o tempo de abate significa também menos emissões de metano entérico (arroto do boi) para a atmosfera”, complementa Boddey. Um animal adulto no pasto emite entre 50 e 60 quilos de metano por ano.
O uso do desmódio na pastagem não reduz apenas a emissão de metano entérico, mas também de óxido nitroso ao permitir a redução do uso de fertilizantes nitrogenados no pasto. O óxido nitroso é o mais potente gás de efeito estufa. Segundo pesquisas, cada quilo de nitrogênio aplicado no campo emite óxido nitroso equivalente a pelo menos quatro quilos de CO2.
Conheça o desmódio O desmódio (Desmodium ovalifolium) é uma leguminosa forrageira perene, originária da Ásia. A planta é um subarbusto que pode atingir até um metro de altura. O caule se apresenta praticamente livre de pelos, exceto nas extremidades, onde ocorre uma pilosidade fina e sedosa. Os nós inferiores do caule, quando em contato com o solo, enraízam-se facilmente. As folhas são trifoliadas, com folíolos ovais, sendo o terminal maior que os laterais. As flores são púrpuras ou rosa-escuro, tornando-se azuladas após a completa abertura. Saiba mais sobre o seu manejo aqui. |
A redução do uso de fertilizante nitrogenado na pastagem possibilita ainda eliminar as emissões de CO2 fóssil resultante da fabricação, transporte e aplicação no campo. Calcula-se que para cada 100 quilos de nitrogênio fertilizante ocorra a emissão de 450 quilos de CO2 equivalente. “Além desse ganho para o meio ambiente, há a possibilidade de reduzir o gasto com o fertilizante, que atualmente está em torno de 300 dólares por hectare de pastagem”, lembra o cientista.
O pesquisador Segundo Urquiaga, também da Embrapa, salienta que os resultados obtidos com o desmódio ganham especial importância porque o custo alto dos fertilizantes faz com que as pastagens no País tenham uma adoção limitada de adubos nitrogenados. “Atualmente, estima-se que menos de 5% das pastagens brasileiras recebam algum tipo de adubo nitrogenado”, enfatiza Urquiaga.
Resistência ao uso de leguminosas
O uso de leguminosas nas pastagens não é uma opção muito adotada pelos criadores. “Há uma resistência entre os produtores porque além das sementes serem caras, as espécies utilizadas até então, em especial o estilosantes, não apresentam boa persistência associada com a braquiária”, explica Boddey. Depois de algum tempo no campo a leguminosa diminui ou morre, sendo necessária a renovação do pasto, o que significa custo e trabalho.
O pesquisador da Embrapa afirma que com o desmódio isso não ocorre sendo possível manter a leguminosa no pasto por mais de nove anos. “Como é uma planta estolonífera, ou seja, suas raízes ou colmos crescem rente ao solo e dão origem a uma nova planta, não é necessário ficar renovando o pasto”, esclarece Boddey.
Segundo ele, se as leguminosas que se reproduzem a partir de seus estolões forem manejadas adequadamente na pastagem, elas persistirão no pasto. “No caso do desmódio, a solução é entrar com o gado quando a altura estiver chegando a 30 centímetros e retirar os animais quando a altura média for de 15 centímetros”, recomenda.
Próximos passos
Os cientistas explicam que uma das principais fontes de emissão de gás metano para a atmosfera é o “arroto do boi” e, dependendo da alimentação do gado, ele pode ser mais ou menos intenso. Com o desmódio, por se tratar de uma espécie com alto teor de tanino, os pesquisadores entendem que ele pode auxiliar na digestão e ainda contribuir para uma redução da emissão desse gás. O tanino é um composto químico presente principalmente na casca, caule, folhas e sementes das leguminosas.
Alguns estudos de emissões de GEE já estão sendo realizados no campo e nos laboratórios. “Avaliar o animal é bastante complicado, porque é preciso avaliar também o consumo de forragem e o desempenho animal”, relata Boddey. Para isso, os pesquisadores utilizam uma espécie de coletor acoplado ao animal, que recolhe durante um período o gás emitido, que depois é avaliado em laboratório. Dados preliminares mostram que a redução pode ser maior que 10%.
A pesquisa Durante quatro anos, esse estudo foi realizado, pela Embrapa Agrobiologia, na Estação Experimental de Zootecnia da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), no município de Itabela, sul da Bahia. Foram comparadas três áreas de pastagens, sendo uma mista com desmódio e braquiária (capim-marandu) sem a aplicação de fertilizante nitrogenado, outra com monocultura de braquiária com aplicação de 150 kg de nitrogênio por hectare ao ano (pasto adubado), e uma terceira área com monocultura de braquiária sem adubação nitrogenada. O uso do desmódio nas pastagens nesta região da Mata Atlântica vem sendo avaliado desde 2009 pela Embrapa. O objetivo das pesquisas é verificar a capacidade de incorporação de nitrogênio ao sistema, reduzir as emissões de gases de efeito estufa, assim como tornar os pastos brasileiros mais produtivos. “É importante destacar que os resultados obtidos com o desmodium ovalifolium são para esse bioma”, complementa o pesquisador. |
Sementes na alimentação do gado Segundo a pesquisadora da Ceplac Cláudia de Paula Rezende, o manejo do desmódio exige tanto quanto outras espécies. A zootecnista trabalha há mais de duas décadas avaliando o uso dessa e de outras espécies de leguminosas nas pastagens. “O produtor precisa ver o pasto como uma lavoura para a qual ele deve fornecer nutrientes suficientes para que ela se torne perene e possa dar resultados tanto no animal como no sistema todo”, comenta a pesquisadora. Rezende explica que o desmódio pode ser introduzido no pasto na época do plantio do capim com alguns cuidados. “Não se pode plantar junto porque a semente dessa leguminosa é muito pequena e na hora que você coloca na máquina junto com a semente de capim esta cai primeiro”, ressalta. No entanto, a forma que ela considera mais fácil é adicionar sementes do desmódio na alimentação do boi. “Nós adicionamos em torno de 100 gramas de sementes não escarificadas, o boi vai ingerir, vai defecar no pasto e as sementes se estabelecem e se desenvolvem”, explica a zootecnista. |
Ana Lucia Ferreira (MTb 16913/RJ)
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