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21/08/17 |   Agroenergia  Mudanças climáticas

Evento reúne cientistas, representantes do setor energético e de governo para definição dos novos rumos dos biocombustíveis no Brasil

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Foto: Marcos Vicente.

Marcos Vicente. -

O Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE), em parceria com a Embrapa Meio Ambiente (Jaguariúna, SP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Agroicone promoveram em 18 de agosto, em Campinas (SP), um workshop para discutir as estratégias do Programa RenovaBio e, com isso nortear os caminhos dos biocombustíveis no Brasil.

O RenovaBio é um programa de Estado que pretende fomentar o aumento da produção e uso dos biocombustíveis no País, em padrões mais sustentáveis, por meio de ganhos de eficiência e redução de emissões em processos produtivos, contribuindo para o atingimento de metas de descarbonização da economia brasileira.

A sua criação está diretamente relacionada aos compromissos assumidos pelo Brasil na COP-21 em Paris, que fixou metas de redução de emissões de poluentes aos países signatários.

Atualmente, o Programa está em fase de análise na Casa Civil e possivelmente será tramitado como Medida Provisória. Para o Brasil a meta é reduzir as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) em 37% abaixo dos níveis de 2005, até 2025; e 43% abaixo dos níveis de 2005, em 2030. No setor de energia a meta é ampliar para 18% a participação das bioenergias na matriz energética brasileira, com robusta participação dos biocombustíveis para seu atingimento.
Na pauta do evento, análises das cadeias produtivas de biocombustíveis e consequências para os setores petroquímicos e de distribuição foram amplamente discutidas.

Um tema de destaque foi a apresentação da metodologia e da ferramenta de cálculo das emissões de CO2 dos biocombustíveis, a RenovaCalc, e dos mecanismos de mercado, por meio dos quais será possível transformar índices de reduções de intensidade de carbono em títulos de ativos financeiros, valorizando empresas que optarem por investimentos em processos mais limpos.

A participação plural da sociedade no evento demonstrou a capacidade de mobilização e força do programa. A organização recebeu inscrições oriundas de 51 empresas de setores diversos, 10 associações de classe, seis ministérios, cinco instituições públicas e oito universidades, conferindo representatividade a membros da cadeia produtiva dos biocombustíveis e outras partes interessadas.

O Programa e a RenovaCalc

Conforme explicou a pesquisadora da Embrapa Meio Ambiente Marília Folegatti, a Embrapa em parceria com a Unicamp, o CTBE e a Agroicone, por demanda do Ministério de Minas e Energia (MME), desenvolveram o protocolo de avaliação de desempenho ambiental de biocombustíveis para o RenovaBio. A RenovaCalc é uma ferramenta que contabiliza as emissões de GEE a partir das informações da fase agrícola e industrial fornecidas pelos produtores dos biocombustíveis, gerando o índice de intensidade de carbono do biocombustível (em g CO2eq/MJ), confirmado por processo de certificação.

A partir deste índice calcula-se a Nota de Eficiência Energético-Ambiental do biocombustível, definida em função da diferença entre sua intensidade de carbono e a intensidade de carbono de seu combustível fóssil substituto.

O estímulo do programa se traduzirá na concessão de Créditos de Descarbonização aos distribuidores, em função das Notas de Eficiência Energético-Ambiental associadas aos biocombustíveis que comercializam.

Marília, que coordenou os trabalhos, ressalta que a base da RenovaCalc é a metodologia de Avaliação do Ciclo de Vida (ACV), centrada na categoria de impacto “Mudanças Climáticas”.

Nesta primeira etapa do RenovaBio, estão contemplados na RenovaCalc: etanol de cana-de-açúcar de primeira e de segunda gerações, etanol de milho, biodiesel de soja, biodiesel de gordura bovina, bioquerosene de HEFA (“Hydro-processed Esters and Fatty Acids”), bioquerosene de SIP (“Synthesized Iso-Paraffin”) de cana-de-açúcar, biometano de resíduos da agroindústria de cana-de-açúcar, biometano de resíduos de agroindústria de processamento de carne, e biometano de lixo urbano.

Havendo demanda, nas revisões do protocolo, poderão ser incluídos novos biocombustíveis. A base da ferramenta que estima o desempenho ambiental é comum a todos os biocombustíveis, embora haja requisitos adicionais específicos para cada tipo de biocombustível.

A pesquisadora ressalta que os próximos passos serão a validação da ferramenta junto ao setor produtivo e o desenvolvimento do protocolo de certificação.

Para o chefe-geral da Embrapa Meio Ambiente, Marcelo Morandi, que integrou o grupo de pesquisadores responsáveis pela criação do protocolo de avaliação de desempenho ambiental, "a RenovaCalc é uma ferramenta capaz de dar suporte técnico ao ambicioso programa RenovaBio". Segundo ele, o Programa está se configurando como uma política pública que trará previsibilidade e estabilidade ao setor, o que redundará em fomento a toda a cadeia, desde a produção da matéria-prima até o uso do biocombustível, com forte impacto no setor de energia e transporte no país.

Assim, o programa vai além de cumprir as metas da NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada, na sigla em inglês) e pode se tornar em um modelo de mecanismo de descarbonização da economia sem paralelo atualmente em outros países.

Ainda segundo Morandi, o RenovaBio induzirá incrementos tecnológicos na cadeia de biocombustíveis, o que demandará das instituições de pesquisa investimentos no desenvolvimento de novas tecnologias: “A Embrapa já está se preparando para isto,” disse.

Desafio e mercados

O objetivo do Programa é promover avanços dos biocombustíveis. Para o etanol, a previsão é que o Brasil possa produzir 54 bilhões de litros em 2030, com forte avanço do etanol 2G e do etanol de milho. Pretende-se também alavancar o aumento da produção de biodiesel e de biometano, assim como incentivar a produção de bioquerosene de aviação, hoje ainda incipiente no Brasil.

Durante o evento, no bloco de análises de cadeias produtivas, o consultor técnico da Associação Nacional das Empresas Aéreas – Abear, Rogério Benevides de Carvalho, falou sobre a perspectiva de mercado de uma das novas rotas previstas no Renovabio, o bioquerosene de aviação. Segundo Carvalho, a aviação civil responde por apenas 2% das emissões de GEE, uma conquista do setor, que já convive com a política de crescimento zero nas emissões, apesar da previsão do crescimento da demanda por voos. “A solução para a manutenção dessa política aponta para a bioquerosene. Nesse sentido, o mercado para este biocombustível, por demanda, já está posto”, explicou ele.

Na mesma linha, o presidente-executivo da Associação Brasileira de Biogás e Biometano – Abiogás, Alessandro Gardemann, ressaltou que a produção do biogás usa resíduos que são passivos ambientais, transformando-os em ativos energéticos. Conforme destacou, o biogás se traduz em uma receita adicional ao produtor agroindustrial, reduzindo custos de aquisição de combustíveis e energia elétrica. “O biogás já se apresenta competitivo, havendo diversos casos de sucesso no Brasil em escala comercial que demonstram isso”, finalizou.

Transição

Para o diretor do CTBE, Gonçalo Pereira, o Renovabio é talvez o mais importante programa de agroenergia do País, pois consegue criar os drivers de interesse comum entre a economia e a ciência e tecnologia. Segundo ele, o evento demonstrou à sociedade o cerne do Programa.  

Gonçalo não vê competição entre o uso de combustíveis fósseis e biocombustíveis. Para ele, o petróleo é uma fonte energética fantástica, que possibilitou abrigar a população atual no planeta, mas é um recurso finito em 50 ou 100 anos  – um curto espaço de tempo, se comparado à história da civilização. Por outro lado, "existe a questão das emissões de CO2, gás que retorna ao meio ambiente com o uso de combustíveis fósseis", destaca ele. “O que prevejo é que os mesmos atores que hoje veem o petróleo como um dos grandes negócios o farão em relação aos biocombustíveis, na medida em que estes forem capazes de gerar riqueza – e o Renovabio vai promover essa ponte. Veremos essa transição ocorrer naturalmente”, disse Gonçalo.

Financiamento

Os técnicos e especialistas concordam que sem políticas públicas e financiamento adequado a produção dos biocombustíveis no país tende à estagnação. Sobre isso, o gerente setorial do Complexo Agroalimentar e Biocombustíveis do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Artur Milanez, afirmou que os biocombustíveis continuam sendo uma prioridade para o banco.

Nos projetos para o etanol 2G e biogás, as unidades pioneiras, cujas tecnologias só foram testadas em escala demonstrativa e passam a ser testadas em escala comercial, são consideradas inovadoras e, portanto, recebem uma participação maior de recursos do Banco, de até 70%.

“O banco acompanha detidamente o desenrolar do Renovabio, que acredita vai impulsionar o consumo de biocombustíveis e, com isso, trazer novas demandas para investimentos na produção, gerando emprego, renda e movimentando a economia, tudo isso com responsabilidade ambiental”, disse.

Marcos Vicente (MTB 19.027/MG)
Embrapa Meio Ambiente

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