Doenças viróticas

Conteúdo migrado na íntegra em: 09/10/2021

Autor

Josias Correa de Faria - Embrapa Arroz e Feijão

 

Mosaico-comum do feijoeiro (Bean common mosaic virus - BCMV e Bean common mosaic necrosis virus – BCMNV)

O mosaico-comum do feijoeiro foi uma doença amplamente disseminada em todas as regiões produtoras dessa leguminosa, e os danos provocados em cultivares suscetíveis podem ser superiores a 90% se as infecções ocorrerem nos primeiros estádios vegetativos das plantas. Porém sua importância tem diminuído como consequência do uso de cultivares resistentes. É causado pelos vírus Bean common mosaic virus (BCMV) e Bean common mosaic necrosis virus (BCMNV), antigamente considerado sorotipo A do BCMV.

Os sintomas produzidos por esses vírus podem ser divididos em três classes: mosaico, necrose sistêmica ou lesões locais, dependendo da cultivar, da estirpe do vírus e das condições ambientais. Os sintomas em forma de mosaico são, sem dúvida, os mais frequentes em nossas condições, manifestando-se, em cultivares infectadas sistematicamente, sob a forma de moteado verde-claro/verde-escuro (Figura 1), na maioria das vezes apresentando rugosidades, empolamento e/ou enrolamento das folhas.

Fotos: Josias Correa de Faria
Figura 1. Sintomas de infestação pelo vírus do mosaico-comum.

 

Essas folhas, frequentemente, são menores que as folhas sadias. Os folíolos das plantas podem apresentar-se com formato mais alongado que o das plantas normais. As plantas infectadas apresentam crescimento reduzido e, às vezes, atrofiamento com deformações nas vagens e nos botões florais. As vagens podem, ainda, apresentar manchas de coloração verde-escura (Figura 2).

Foto: Josias Correa de Faria
Figura 2. Sintoma do mosaico-comum. Folhas com lesões necróticas, individuais e coalescentes (superior); morte apical; necrose das nervuras no limbo foliar; necrose nas vagens (em cultivar com o gene I, e estirpe NL3 do vírus), mosaico nas vagens, cultivar suscetível.

 

O sintoma conhecido como necrose sistêmica manifesta-se inicialmente nas folhas ou no meristema apical da planta. As folhas novas murcham, tornando-se de cor verde-opaca, e em pouco tempo enegrecem. Pode-se, também, observar uma necrose vascular de coloração café-avermelhado a negra, nas raízes, nas folhas, nos talos e nas vagens. As lesões locais podem ser identificadas como manchas necróticas de cor avermelhada a café-escuro (Figura 2)

O vírus do mosaico-comum pode ser transmitido, mecanicamente, por afídios ou, internamente, pela semente.

O controle pode ser conseguido por meio do uso de sementes de boa qualidade, pelo controle do inseto vetor com inseticidas e, principalmente, por meio do uso de cultivares resistentes.

Mosaico-dourado do feijoeiro (Bean golden mosaic virus – BGMV)

O mosaico-dourado é, sem dúvida, a principal virose que afeta o feijão-comum. É causado pelo vírus Bean golden mosaic virus (BGMV), encontrado em vários estados brasileiros. É economicamente importante no Sul de Goiás, em Minas Gerais, em algumas regiões de São Paulo, no Norte do Paraná e em Mato Grosso do Sul, com significativas perdas devido ao clima favorável à ocorrência de Bemisia tabaci biótipo B, que dissemina o vírus com relativa facilidade. Não são raros os relatos de incidências de 100% da doença na cultura, levando a perdas de 40% a 100% na produção. Entretanto, isso depende da idade da planta no momento da inoculação, do grau de tolerância da cultivar se houver.

Os sintomas tornam-se evidentes quando as plantas apresentam de duas a quatro folhas trifolioladas (Figura 3), manifestando-se por um intenso amarelo foliar brilhante ou dourado, delimitado pela coloração verde das nervuras, dando um aspecto de mosaico. Em cultivares suscetíveis, as folhas novas apresentam-se fortemente deformadas, enroladas, encarquilhadas e rugosas e, se a infecção ocorrer no estádio de plântula, pode produzir uma forte redução dos internódios e, consequentemente, da planta. O aparecimento de folhas enroladas, encarquilhadas, rugosas e de tamanho reduzido nas cultivares mais suscetíveis é frequente. As vagens das plantas infectadas podem apresentar-se deformadas e manchadas.

As principais medidas de controle da doença adotadas em larga escala consistem no controle indireto via uso de inseticidas de contato e sistêmicos para controlar as populações de mosca-branca, principal agente de disseminação do vírus. Porém, há relatos de casos de resistência de mosca-branca a muitos dos inseticidas usados, o que diminui a eficiência desse método. Como medida complementar, os estados de Goiás e Minas Gerais, bem como o Distrito Federal, têm decretado desde 2013 o vazio sanitário, período no qual é proibido o cultivo de Phaseolus vulgaris por 30 dias, a fim de promover a diminuição dos níveis populacionais de mosca-branca.

Feijão RMD. Trata-se do feijão geneticamente modificado para resistência ao mosaico dourado, como ferramenta adicional de convivência com a mosca-branca. O feijão RMD é completamente resistente ao mosaico dourado, mas há outras doenças transmitidas pela mosca-branca, como se verá mais adiante, cujos agentes causais infectam o feijão.

O monitoramento da população do inseto vetor e o manejo da época de plantio são medidas recomendadas para evitar coincidência do início do ciclo da cultura com altas populações de B. tabaci. Outras práticas de manejo preconizadas são as seguintes: plantios distantes de outras espécies hospedeiras da mosca-branca e do vírus e eliminação de espécies hospedeiras do vírus e da mosca-branca remanescentes nas proximidades da área de plantio.

Fotos: Josias Correa de Faria
Figura 3. Sintomas de infestação pelo vírus do mosaico-dourado.

 

Mosqueado suave do caupi, ou Mosaico angular do feijoeiro Jalo (Cowpea mild mottle virus- CPMMV) (Carlavirus)

Em 1983 foi relatado no estado de São Paulo a presença de um vírus transmitido de modo não persistente (semipersistente) por mosca-branca (Bemisia tabaci) que recebeu a denominação de vírus do mosaico angular do feijoeiro Jalo (VMAFJ). Poucos estudos foram conduzidos com a virose, provavelmente porque não sobressaía em função da difícil distinção da sua sintomatologia quando o mosaico dourado está presente, sendo ambos transmitidos pelo mesmo vetor. A partir de 2013, em experimentos de Valor de Cultivo e Uso conduzidos pela Embrapa Arroz e Feijão com as linhagens transgênicas resistentes ao mosaico dourado em vários locais do País, notou-se a presença do CPMMV em até 100% das plantas, considerando que ao se manterem livres do mosaico dourado foi possível observar os sintomas desta virose. Dependendo da cultivar os sintomas variaram em severidade. Como o Cowpea mild mottle virus pertence a um gênero de vírus com o nome Carlavirus popularizou se chamar a doença pelo nome de “carlavirus” ou “carlavirose”.

Os sintomas consistem da presença de clorose das nervuras de trifólios novos ou internerval, que pode ser acompanhada por faixa verde-escuro das nervuras e mosqueado fraco. Em folhas mais velhas o mosqueado se torna mais proeminente e pode adquirir a configuração de manchas angulares limitadas pelas nervuras, derivando o nome mosaico angular, especialmente na cultivar Jalo. Com o desenvolvimento das plantas observa-se que pode aparecer um mosaico ou mosqueado cobrindo todo o trifólio. Algumas cultivares desenvolvem um tipo de rugosidade das folhas, ou o sintoma de encarquilhamento (“leaf crinckling”) variável em intensidade; na face abaxial do folíolo com o sintoma de encarquilhamento nota-se a formação de necrose da nervura. O sintoma de mosaico angular é observado principalmente em cultivares andinos, e algumas vezes de modo transiente nas folhas da parte inferior da planta em outras cultivares (Figura 4).

O controle é realizado usando cultivares que apresentam tolerância à virose, como BRS Ametista e BRS Sublime, que podem ser considerados como tolerantes, no que se refere à sintomatologia.
 

Fotos: Josias Correa de Faria
Figura 4. Sintomas de infecção pelo CPMMV.

 

Mosaico Rugoso do Feijoeiro ou Bean rugose mosaic vírus (BRMV) ou mosaico em desenho

O agente causal do mosaico rugoso é o Bean rugose mosaic virus (BRMV); é conhecido também como vírus do mosaico em desenho. Embora os sintomas variam com a cultivar do feijoeiro utilizado, na maioria causa sintomas de mosaico em faixa nas nervuras, formando desenhos simétricos em cada lado do folíolo, donde foi dado o nome mosaico em desenho (Figura 5). Esse vírus é transmitido naturalmente por besouros crisomelídeos conhecidos popularmente como vaquinhas do feijoeiro. Por isto, e com as condições atuais de uso intensivo de inseticidas tanto nas lavouras de soja como de feijoeiro para o controle de outras pragas, a doença é infrequente e, provavelmente não sejam necessárias recomendações específicas.

Fotos: Josias Correa de Faria
Figura 5. Feijoeiro cultivar Pérola infectado com vírus do mosaico em desenho

 

OUTRAS VIROSES

Recentemente foram relatadas infecções mistas de vírus em amostras de feijoeiro coletadas no Brasil Central, que inclui um cytorhabdovirus (Bean associated rhabdovirus – BAR), o qual foi completamente caracterizado molecularmente, via sequenciamento do seu genoma. É transmitido pela mosca-branca, provavelmente em conjunto com o BGMV e CPMMV. Não se sabe sobre os danos que causa, mas pode ser parte de um complexo em conjunto com o BGMV, BRMV, e CPMMV.