Manejo de irrigação

Conteúdo atualizado em: 30/11/2023

Autor

Luís Fernando Stone - Embrapa Arroz e Feijão

Pedro Marques da Silveira - Embrapa Arroz e Feijão

 

O rendimento do feijoeiro é bastante afetado pela condição hídrica do solo. Deficiências ou excessos de água, nas diferentes fases do ciclo da cultura, causam redução na produtividade em diferentes proporções. As fases de floração e de desenvolvimento da vagem são as mais sensíveis à deficiência hídrica. A redução na produtividade sob estresse hídrico deve-se à baixa porcentagem de vingamento das flores, quando o estresse ocorre na fase da sua abertura, e ao abortamento de óvulos, produzindo vagens chochas, se ocorrer estresse na fase de sua formação. Em condições de excesso de água no solo, o desenvolvimento vegetativo e a produtividade são bastante prejudicados. A fase de início da frutificação é a mais sensível à má aeração do solo.

A irrigação por aspersão, nos sistemas convencional, autopropelido e pivô central (Figura 1), tem sido o método mais utilizado na cultura do feijoeiro. Em menor escala, também têm sido utilizadas a irrigação por sulcos e a subirrigação em solos de várzeas. Considerando-se o método de irrigação por aspersão, o sistema pivô central é o mais apropriado para irrigar áreas individuais maiores e, por isso mesmo, é o mais usado na cultura do feijoeiro em terras altas na região dos Cerrados, visto que a lucratividade final obtida com essa cultura depende, dentre muitos fatores, do tamanho da área plantada.

Foto: Luis Fernando Stone
Figura 1. Irrigação por aspersão no sistema pivô central.

 

A irrigação por sulcos pode ser usada na cultura do feijoeiro, tanto em terras altas como em várzeas sistematizadas e drenadas. Os sulcos normalmente apresentam a forma de V, com 0,15 m a 0,20 m de profundidade e 0,25 m a 0,30 m de largura. O espaçamento entre sulcos depende da textura do solo e do perfil de umedecimento. Geralmente é utilizado o espaçamento de 0,9 m a 1,2 m, com duas linhas de plantas entre os sulcos.

A subirrigação é mais apropriada para terras baixas ou solos de várzeas e, por isso mesmo, funciona como uma drenagem controlada. Na subirrigação, a umidade atinge as raízes das plantas por meio da ascensão capilar (movimento ascendente da água através dos poros). Em várzeas, o lençol freático deve ser mantido a uma profundidade tal que permita obter a melhor combinação entre água e ar na zona radicular.

O manejo da irrigação do feijoeiro pode ser feito pelos seguintes métodos: tensiômetro (Figura 2), turno de rega (intervalo entre irrigações), dados climáticos, irrigâmetro e software irrigaFeijão.
 

Ilustração: Sebastião Araújo Foto: Pedro Marques da Silveira Foto: Sebastião Araújo
Figura 2. Tensiômetro.

 

Os tensiômetros são aparelhos que medem a tensão da água do solo. Para seu uso, é necessária também a determinação da curva de retenção de água, que é uma propriedade físico-hídrica do solo determinada em laboratório. Ela relaciona o conteúdo de água do solo com a força com que ela está retida por ele. O tensiômetro deve ser instalado entre as fileiras de plantas de feijão e em duas profundidades, uma a 15 cm e outra a 30 cm, lado a lado, cujo conjunto forma uma bateria. A leitura do tensiômetro de 15 cm representa a tensão média de um perfil de solo de 0–30 cm de espessura, que engloba a quase totalidade das raízes do feijoeiro. Esse tensiômetro é chamado de tensiômetro de decisão, porque indica o momento da irrigação (quando irrigar). Já o tensiômetro instalado a 30 cm é chamado de tensiômetro de controle, porque verifica se a irrigação está sendo bem feita, para que não haja excesso ou falta de água. Nos sistemas convencional e autopropelido, o tensiômetro se presta, principalmente, ao acompanhamento da tensão da água do solo e como instrumento de validação do turno de rega implantado. Já o sistema pivô central constitui o instrumento mais prático para indicar o momento da irrigação. Nesse sistema, as baterias devem ser instaladas a 4/10, 7/10 e 9/10 do raio do pivô, em linha reta a partir da base.

A irrigação deve ser feita toda vez que a média das três baterias dos tensiômetros de decisão, instalados a 15 cm de profundidade, alcançar a faixa de 30 kPa–40 kPa (0,3–0,4 bar). As irrigações baseadas nas leituras dos tensiômetros devem iniciar 15 a 20 dias após a emergência das plantas. Logo após a semeadura, devem-se fazer irrigações mais frequentes para manter a camada superficial do solo úmida, favorecendo a germinação e o desenvolvimento inicial das plantas e recarregando de água o perfil do solo abrangido pelo tensiômetro de decisão. A irrigação deve ser suspensa quando as folhas da planta de feijão vão se tornando amareladas pelo amadurecimento.

O procedimento para determinação da quantidade de água a ser aplicada é o seguinte: de posse da curva de retenção de água, verifica-se quanto 30 kPa–40 kPa corresponde em conteúdo de água no solo, dado em cm3 de água/cm3 de solo. Em seguida, calcula-se a diferença entre o conteúdo de umidade a 6 kPa (capacidade de campo) e a 30 kPa–40 kPa. Essa diferença, multiplicada pela profundidade de 30 cm, indicará a lâmina líquida de irrigação (quantidade de água de irrigação).

Ilustração: Sebastião Araújo
Figura 3. Curva de retenção da água.

 

Na subirrigação, pelas leituras dos tensiômetros, sabe-se a necessidade ou não de se movimentar o lençol freático. Se as leituras indicarem baixa tensão de água, ou seja, alta umidade do solo, a profundidade do lençol freático deve ser rebaixada e vice-versa.

O método do turno de rega (TR) é o mais utilizado pelos irrigantes. São levados em consideração fatores do solo, como capacidade de campo, ponto de murcha permanente, densidade do solo, e fatores da planta, como profundidade efetiva das raízes, fator de disponibilidade de água e evapotranspiração (evaporação do solo mais transpiração da planta) da cultura, para calcular o intervalo entre duas irrigações sucessivas. O TR é determinado segundo a equação:

TR = LL / ETc = AD x f / ETc = (0,1(CC - PM) x Ds x Pe x f) / ETc

em que: TR = turno de rega, em dia; LL = lâmina líquida de irrigação, em mm; ETc = evapotranspiração da cultura, em mm/dia; AD = água disponível do solo, em mm; f = fator de disponibilidade de água, adimensional; CC = capacidade de campo do solo, % em peso; PM = ponto de murcha permanente, % em peso; Ds = densidade do solo, em g/cm3; Pe = profundidade efetiva das raízes da planta, em cm.

Tanto o valor de Pe como o de ETc variam ao longo do ciclo do feijoeiro, podendo ser determinados dois ou mais turnos de rega. O método do TR, como critério de quando irrigar, é o mais apropriado para ser empregado quando se utilizam os sistemas de aspersão convencional, autopropelido ou por sulcos.

Quando se utilizam os dados climáticos para manejar a irrigação do feijoeiro, é necessário estimar a evapotranspiração de referência (ETo).

Existem diversos métodos para a estimativa da ETo, os quais, na sua maioria, são baseados em equações matemáticas empíricas e/ou com fundamentação física. Várias dessas equações estão detalhadas em Stone e Silveira (1995). A utilização de uma ou outra equação depende da dificuldade de obtenção dos elementos meteorológicos necessários para o cálculo da ETo. Internacionalmente, o método Penman-Monteith-FAO (PM-FAO) é considerado o mais apropriado para a estimativa da ETo, sendo adotado como padrão. Esse método utiliza quase todos os elementos meteorológicos observados em estações meteorológicas de superfície. Na página da Embrapa Arroz e Feijão na internet, em Produtos, pode ser encontrado o software intitulado INFOCLIMA - Informações Climáticas (https://www.cnpaf.embrapa.br/infoclima), que fornece a evapotranspiração de referência para diversas localidades do país. Além das equações matemáticas, outros métodos têm sido usados para a estimativa da ETo, como o uso de redes neurais e imagens de satélites.

Uma vez conhecida a ETo, a ETc pode ser estimada utilizando coeficientes de cultura (Kc), segundo a equação:

ETc = ETo x Kc

Assim, o momento de irrigar corresponde ao momento em que a soma dos valores de ETc alcançar o valor da lâmina líquida de irrigação, previamente determinada, a ser aplicada à cultura.

O valor de Kc aumenta desde a emergência até a cobertura total do solo, decrescendo depois até a maturação e colheita. Existem, na literatura, algumas variações entre os valores de Kc devido, possivelmente, à cultivar utilizada e às práticas culturais.

 

 

 

O irrigâmetro é um instrumento idealizado e desenvolvido por professores da Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG, lançado no mercado, para manejo de água de irrigação. É um instrumento de grande versatilidade que pode ser ajustado para fornecer diretamente a evapotranspiração da cultura, em qualquer estádio do seu desenvolvimento.

O irrigâmetro contém um evaporímetro, que é um recipiente de seção cônica, de cor verde, que mantém uma superfície de água exposta à atmosfera. A altura do nível de água no seu interior pode ser modificada para que a área da superfície exposta à atmosfera seja alterada, permitindo estimar diretamente a evapotranspiração da cultura. Para que o irrigâmetro funcione de maneira adequada, ele deve ser previamente ajustado para o tipo de solo e de cultura e para as características do equipamento de irrigação existente na propriedade agrícola.

Recentemente, a Embrapa Arroz e Feijão lançou o software de manejo da irrigação do feijão sob pivô central, o irrigaFeijao (https://www.cnpaf.embrapa.br/irrigaFeijao/) (https://www.cnpaf.embrapa.br/irrigaFeijao). Inicialmente, o programa foi feito para quatro regiões produtoras, Goiás e alguns municípios de São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso. O software fornece um calendário de irrigação a partir da data de semeadura, com as respectivas lâminas, frequência de irrigação e velocidade de deslocamento do equipamento, baseado nas normais climatológicas da região e em coeficientes de cultivo (kc) da cultura, determinados pela pesquisa. Por ser muito prático e embasado cientificamente, entende-se que é de grande utilidade para os produtores de feijão irrigado, no manejo da água de irrigação da cultura.