22/07/16 |   Agroenergia  Biodiversidade

Pesquisa explora potencial biotecnológico de novas enzimas

Informe múltiplos e-mails separados por vírgula.

Foto: Daniela Collares

Daniela Collares - A pesquisadora Léia Fávaro, no Laboratório de Genética e Biotecnologia da Embrapa Agroenergia

A pesquisadora Léia Fávaro, no Laboratório de Genética e Biotecnologia da Embrapa Agroenergia

A Embrapa está investindo em pesquisas com proteínas que revolucionaram o conceito clássico de decomposição da celulose das plantas. Trata-se das monoxigenases de polissacarídeos, enzimas produzidas apenas por fungos e algumas bactérias, que atuam como auxiliares das proteínas já conhecidas por promover a desconstrução da celulose. Um projeto de pesquisa liderado pela Embrapa Agroenergia (Brasília, DF) está estudando não apenas as monoxigenases, mas também outro grupo de proteínas chamadas de expansinas. A expectativa é que a caracterização de novas proteínas desses dois tipos permita, em futuro próximo, aplicá-las para tornar mais eficientes os processos industriais que utilizam biomassa vegetal para obter açúcares e, a partir deles, produzir combustíveis, polímeros e produtos químicos de origem renovável.

Até pouco tempo, acreditava-se que a decomposição da celulose por microrganismos na natureza ficava a cargo de diversas enzimas do tipo celulase, que "quebram" as cadeias de celulose até chegar a simples moléculas de açúcar, por meio de reações químicas que geram água e, por isso, são chamadas de hidrólise. Na última década, contudo, descobriu-se que as celulases não realizam sozinhas aquele trabalho de "quebra". Muitos fungos e algumas bactérias produzem as monoxigenases de polissacarídeos, enzimas que também rompem as cadeias de celulose, porém por meio de reações químicas diferentes, de oxidação. Além delas, também têm papel importante as expansinas, que são tipicamente encontradas em plantas, mas também ocorrem em microrganismos e até mesmo em alguns animais. Essas proteínas são capazes de afrouxar as fibras sem rompê-las, facilitando o acesso de enzimas à celulose.

Para a pesquisadora Léia Fávaro, da Embrapa Agroenergia, há um potencial biotecnológico muito grande a ser explorado com as expansinas e monoxigenases. Enzimas são peças-chave no contexto da Bioeconomia para países que pretendem se tornar menos dependentes do petróleo. Este foi o entendimento de 195 países durante a Conferência das Partes (COP-21), que aconteceu em dezembro de 2015. Produzidas principalmente por microrganismos, elas agem sobre a biomassa (partes de plantas ou resíduos de sua exploração, como o bagaço de cana, por exemplo), promovendo as transformações necessárias para que delas sejam obtidas moléculas de origem renovável para a indústria química, entre outros.

Economia verde
Nessa lógica, um produto em evidência é o etanol de segunda geração (2G), cuja produção está começando em duas usinas no Brasil. Diferente do etanol convencional, o 2G não é obtido do caldo, mas do bagaço e da palha da cana ou de qualquer outro material vegetal que contenha celulose. Só que esses materiais não podem ir diretamente para a fermentação como o caldo de cana, rico em sacarose. Antes é preciso fazer um pré-tratamento para liberar a celulose dos outros componentes da biomassa e, então, promover um processo de hidrólise para gerar açúcar – neste caso, a glicose – que pode ser fermentada a etanol. É durante a hidrólise que a enzima atua, ou melhor, dezenas delas, em verdadeiros coquetéis enzimáticos, para realizar sucessivas quebras nas longas cadeias de moléculas de celulose até transformá-las em simples açúcares.

Aumentar a eficiência e reduzir o custo desses coquetéis é um dos grandes desafios para alavancar a indústria do etanol e outros combustíveis de segunda geração (2G), além da obtenção de diversos produtos químicos e biomateriais a partir dos mesmos processos. Até o momento, o desenvolvimento tecnológico para compor esses insumos esteve muito focado nas celulases. A pesquisa em andamento na Embrapa vai fazer diferente e realizar testes para medir a quantidade de açúcar gerado aumentando ou reduzindo a quantidade de expansinas e monoxigenases de polissacarídeos nos coquetéis.

Léia, da Embrapa Agroenergia, explica que esses produtos já contêm enzimas acessórias ou auxiliares, tais como as expansinas e monoxigenases de polissacarídeos. Afinal, são produzidos por microrganismos que naturalmente geram essas proteínas junto com as celulases. Só que muito pouco se sabe sobre o papel delas na desconstrução da biomassa no ambiente industrial. Para começar, pouco se sabe sobre quem são elas. Por isso, o primeiro e mais significativo trabalho do grupo de cientistas liderado pela Embrapa será a formação de um banco de dados com a caraterização bioquímica de novas expansinas e monoxigenases. Para tanto, estão sendo realizadas buscas em duas fontes principais: bancos de dados públicos que disponibilizam as sequências genômicas completas de microrganismos e as coleções de fungos e bactérias da Embrapa Agroenergia, que contêm estirpes da biodiversidade brasileira. "Há espécies raras e pouco estudadas de diferentes biomas. Boa parte delas consome celulose e, por isso, sabemos que há grande potencial", explica Léia.

Já foi feita a maior parte do trabalho de buscas, que contou com a colaboração da Universidade de Brasília. Agora, o grupo está focado na caracterização bioquímica das enzimas e seleção de candidatos para a etapa posterior, quando investirá na otimização do processo de produção delas em biorreatores. O maior desafio deve ser a quantificação das enzimas produzidas, prevê a pesquisadora Sílvia Belém, da Embrapa Agroenergia.

Testes em biomassa
Com o material obtido nos reatores, serão realizados os testes, adicionando as novas proteínas a coquetéis enzimáticos comerciais e previamente desenvolvidos pela Embrapa e aplicando-os em biomassa de cana-de-açúcar e sorgo. O caldo do sorgo sacarino tem sido utilizado por algumas usinas para produzir etanol na entressafra da cana e o bagaço também poderia ser empregado como matéria-prima para o biocombustível 2G. O que se espera nos testes é obter mais glicose em menos tempo, com a adição das expansinas e das monoxigenases. A pesquisadora Dasciana Rodrigues, da Embrapa Agroenergia, explica que um dos trabalhos será ajustar as condições de pré-tratamento da biomassa, de tal maneira que se possa avaliar o impacto da ação delas. Ajustes da quantidade ideal de proteínas será outro desafio.

Além da Embrapa Agroenergia, serão feitos testes na Embrapa Instrumentação (São Carlos/SP), onde cientistas também buscam formas de otimizar a produção de enzimas. Eles desenvolveram um método de cultivo de microrganismos produtores dessas proteínas chamado fermentação sequencial, uma combinação dos métodos tradicionais. A pesquisadora Cristiane Farinas, do centro de pesquisa no interior paulista, diz que resultados promissores estão sendo obtidos, com produção maior de enzimas, que apresentam características diferenciadas. As monoxigenases e expansinas que serão geradas na Embrapa Agroenergia serão testadas nos coquetéis em desenvolvimento em São Carlos. Cristiane espera que os experimentos com esse material permitam avaliar a eficiência das novas proteínas.

Líder do projeto, a pesquisadora Léia acredita que a exploração do potencial biotecnológico das expansinas e monoxigenases é especialmente importante para o próximo passo a ser dado pelo mercado de produção de enzimas: a customização dos coquetéis para desconstrução da celulose. Até o momento, tem se utilizado produtos genéricos, que consigam o melhor desempenho com diferentes biomassas. A tendência, no entanto, é que sejam desenvolvidos insumos específicos para cada matéria-prima e até para cada condição de processo adotada. "Um aspecto importante da customização provavelmente será o uso de enzimas auxiliares ou acessórias como aditivos", conclui.

Vivian Chies (MTB 42.643/SP)
Embrapa Agroenergia

Contatos para a imprensa

Telefone: (61) 3448-2264

Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/

Encontre mais notícias sobre:

microrganismosetanolenzimasbiomassabioeconomia