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Abelhas nativas devem ser consideradas na avaliação de riscos de plantas transgênicas no Brasil
Procedimentos de biossegurança adotados hoje no País abrangem apenas a espécie europeia Apis melífera.
A inserção de espécies nativas de abelhas nos procedimentos de biossegurança no Brasil é uma das recomendações que a pesquisadora da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia Carmen Pires vai sugerir durante a sua apresentação no Simpósio sobre Perda de Abelhas no Brasil, que acontece de 16 a 18 de outubro de 2017, em Teresina, PI. Carmen vai falar sobre a avaliação do possível impacto das plantas geneticamente modificadas nas populações de abelhas e esta será uma das principais orientações nesse sentido. Estima-se que no Brasil existam cerca de 1.700 espécies de abelhas. Boa parte dessa fauna atua na polinização de 89% da flora nativa e, por isso, é fundamental que sejam inseridas nas análises de biossegurança, que hoje só consideram a espécie Apis melífera, também conhecida como abelha europeia, por ser a de maior incidência no Brasil e no mundo.
As abelhas desempenham papel muito importante na produção de alimentos. Cerca de 70% das plantas utilizadas no consumo humano dependem em certo grau da polinização. No Brasil, das 141 espécies de plantas cultivadas para uso na alimentação humana, produção animal, biodiesel e fibras, aproximadamente 60%, ou seja, 85 espécies necessitam em diferentes graus dos serviços prestados pelos agentes polinizadores.
Plantas GM não representam riscos às abelhas no Brasil, mas medidas preventivas devem ser adotadas
Carmen tem participado de diversos estudos nacionais e internacionais em prol da preservação das abelhas e afirma que hoje as plantas geneticamente modificadas não figuram entre as principais ameaças a esses polinizadores nem no Brasil nem no mundo. A perda de colônias de abelhas, conhecida mundialmente como síndrome de distúrbio do colapso das colônias (CCD, sigla em inglês) está associada a quatro fatores principais: redução dos habitats, uso excessivo de agrotóxicos, diminuição de alimentos como consequência de grandes áreas de monocultura e ataques de pragas.
Entretanto, ações de prevenção são fundamentais e fazem parte da análise de risco ambiental (ARA), que será o tema apresentado pela pesquisadora no evento em Teresina. Trata-se de um processo que utiliza a informação e os dados disponíveis para estimar a probabilidade que um fator de estresse resulte em um evento ecológico indesejado. Para isso, é fundamental caracterizar as ameaças atuais e futuras nos ecossistemas.
Segundo Carmen, existem hoje 75 produtos transgênicos liberados para cultivo no Brasil. Desses, 44 são de milho, 15 de algodão, 13 de soja, um de cana de açúcar, um de feijão e um de eucalipto. Grande parte foi desenvolvido a partir da introdução de genes oriundos da bactéria Bacillus thruringiensis (Bt), que confere resistência a pragas agrícolas. Essa bactéria é usada há mais de quatro décadas no controle biológico de insetos em nível global sem nenhum registro de danos à saúde humana, de animais ou ao meio ambiente.
Mesmo assim, as análises de biossegurança exigidas pela CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) no Brasil, que são bastante rigorosas, pressupõem a realização de testes com abelhas. Análises realizadas desde 1996 até os dias de hoje comprovaram que os genes oriundos da bactéria Bt não afetam abelhas da espécie Apis melífera. “Mas, reitero que é importante estender essas avaliações para abelhas nativas, especialmente se considerarmos a riqueza da fauna brasileira”, insiste a pesquisadora.
Pouco conhecimento da fauna de abelhas também é risco
O pouco conhecimento sobre a diversidade de abelhas em áreas de produção agrícola também é um fator de risco a ser considerado. “Hoje sabemos que cerca de 1.700 espécies de abelhas agem como polinizadores na flora nativa, mas não temos dados precisos em relação às áreas agrícolas”, destaca Carmen. As informações disponíveis apontam que 13 espécies de abelhas, incluindo Apis mellifera, visitam os cultivos de soja; apenas três os de milho e uma os de trigo. Segundo Carmen, “essa quantidade de espécies de abelhas é muito pequena e com certeza é o resultado dos pouquíssimos levantamentos realizados nessas culturas”.
Existem culturas 100% dependentes da visitação de abelhas, como é o caso do maracujá e abóbora, entre outras. Mas, mesmo as que não são totalmente dependentes, se beneficiam em algum grau dos serviços de polinização, como o café, algodão, além de muitas espécies de frutas.
Um trabalho capitaneado pelo Ministério do Meio Ambiente, do qual Carmen participou comprovou a importância da polinização feita por abelhas na cultura de algodão. O projeto denominado “Rede de Pesquisa dos Polinizadores do Algodoeiro (PoAL)”, executado em parceria entre a Embrapa, Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade de Brasília e o Projeto Dom Helder Câmara da Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário, avaliou a importância desses polinizadores para a cotonicultura em três biomas, nos quais o algodão tem grande expressão econômica e social: o Cerrado, o sul da região Amazônica e a Caatinga durante três anos: 2010 a 2012.
O projeto resultou num inventário das espécies de abelhas que visitam os cultivos de algodão e identificou mais de 100 espécies nativas ainda não registradas no algodoeiro no Brasil. Dessas, dez podem ser novas.
O projeto com o algodão foi uma das sete iniciativas em rede voltadas também ao monitoramento da ação de abelhas nas culturas de: melão, castanha do Brasil, tomate, caju, maçã e canola. Dessas, três foram coordenadas pela Embrapa: algodão, melão e castanha do Brasil. O objetivo foi avaliar a relação entre polinização e segurança alimentar.
“Antes de iniciar o projeto, não esperávamos que houvesse uma diversidade tão grande de abelhas nos cultivos de algodão. É preciso que esse conhecimento se expanda para as outras culturas agrícolas de importância para o País. O conhecimento facilita a conservação”, enfatiza Carmen.
Precaução com OGMs é recomendação internacional
Carmen fez parte também de um estudo internacional coordenado pela Plataforma Intergovernamental para Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES, sigla em inglês) que reuniu especialistas de sete países – Reino Unido, Brasil, Suécia, México, Austrália, Argentina e Japão – para avaliar o declínio das populações de abelhas no mundo. O estudo, publicado na Revista Science, aponta 10 diretrizes para auxiliar os governantes mundiais na elaboração de políticas públicas em prol da preservação de abelhas. Uma delas defende a inclusão de efeitos indiretos e subletais na avaliação de riscos de culturas geneticamente modificadas. As outras são:
- Aprimorar os padrões regulatórios de pesticidas.
- Promover o manejo integrado de pragas (MIP).
- Regular o movimento dos polinizadores manejados entre os países.
- Desenvolver incentivos, tais como seguros, para incentivar os agricultores a utilizar serviços ecossistêmicos, como polinização, ao invés de agroquímicos.
- Reconhecer a polinização como um insumo agrícola nos serviços de extensão.
- Apoiar sistemas agrícolas diversificados.
– Conservar e restaurar os habitats de polinizadores nas paisagens agrícolas e urbanas.
- Desenvolver o monitoramento de polinizadores a longo prazo
- Financiar pesquisas participativas para intensificar o uso de práticas de agricultura orgânica, diversificada e ecologicamente correta.
O Simpósio sobre Perda de Abelhas no Brasil é uma promoção da Embrapa Meio-Norte e reúne especialistas de diversas instituições de pesquisa e ensino brasileiras em Teresina, PI, entre os dias 16 e 18 de outubro de 2017. Confira mais informações no endereço: https://www.embrapa.br/meio-norte/simposio-perda-abelhas.
Fernanda Diniz (MTb 4685/DF)
Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia
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