Nematoides

Conteúdo atualizado em: 23/02/2022

Autor

Jadir Borges Pinheiro - Embrapa Hortaliças

 

Os nematoides constituem um sério problema para o cultivo da cenoura em praticamente todas as regiões do mundo. As perdas variam de 20% até 100%, dependendo da densidade populacional, suscetibilidade da cultivar, espécie de nematoide, tipo de solo e condições ambientais (temperatura e umidade relativa). No Brasil, os danos mais significativos são resultantes do ataque dos nematoide-das-galhas, geralmente Meloidogyne incognita e Meloidogyne javanica, que são as espécies com maior distribuição. A espécie Meloidogyne incognita possui quatro raças (1, 2, 3 e 4), que são caracterizadas por atacar diferentes espécies de plantas. Embora outras espécies do nematoide-das-galhas, como Meloidogyne hapla e Meloidogyne arenaria, sejam observadas em áreas isoladas do país, os maiores problemas ocorrem em regiões tropicais e subtropicais.

Os nematoides causam grandes perdas, pois reduzem a quantidade e a qualidade do produto colhido. Em geral, estes dois tipos de perdas estão associados à cultura da cenoura. Em certas circunstâncias, a perda de peso nas raízes não é tão significativa quanto às alterações no formato, visto que esta parte da planta sofre alterações físicas e químicas em resposta ao ataque dos nematoides, com interferência direta na classificação comercial do produto. 

 

Manejo dos nematoides

A prevenção é sempre a melhor forma de controle destes organismos e a principal medida de prevenção é evitar a introdução dos nematoides na área de cultivo. Depois de constatada a presença dos nematoides na área de cultivo, o produtor terá que conviver com o problema por um longo período já que sua erradicação é praticamente impossível.

Os danos causados pelos nematoides serão maiores quanto mais elevados forem os níveis populacionais no solo antes do plantio. Desta maneira, qualquer método de controle que reduza esta população inicial pode ser vantajoso.

Deste modo, a cada plantio de cenoura ou de outras culturas suscetíveis, ocorre um aumento da quantidade de nematoides no solo de cultivo e, consequentemente isto leva o produtor a ter que adotar medidas de controle em sua propriedade.

O controle prático do nematoide-das-galhas envolve a integração de várias medidas de manejo. Dentre estas, as principais são rotação de culturas, alqueive, uso de plantas antagonistas, utilização de matéria orgânica, variedades resistentes e, em último caso, o controle químico.

A rotação de culturas é uma das práticas mais importantes e efetivas na redução dos nematoides em uma propriedade. A rotação de cultivos de cenoura com culturas que não hospedam o nematoide-das-galhas contribui para morte destes organismos por falta de alimento.

Uma excelente opção para utilizar em rotação de culturas com a cenoura é o cultivo do capim elefante (Pennisetum purpureum), mamona (Ricinus communis) e braquiárias (Brachiaria decumbens e B. ruziziensis). No caso de alta infestação e da disponibilidade de mais área para o plantio, fazer a rotação com gramíneas por no mínimo 2 anos enquanto utilizam outra área para o plantio.
A rotação com plantas antagonistas também é uma prática que tem mostrado resultados expressivos na redução dos níveis populacionais de nematoides em diferentes culturas. As crotalárias, especialmente Crotalaria spectabilis e C. breviflora, e o cravo-de-defunto (Tagetes patula, Tagetes minuta, Tagetes erecta) (Figura 1), são exemplos de plantas antagonistas que são utilizadas em rotação de culturas com sucesso no controle dos nematoides-das-galhas.

Foto: Jadir Borges Pinheiro
Cravo de defunto
Figura 1. Cravo de defunto, exemplo de planta antagonista com sucesso na redução de nematoides em pequenas áreas de cultivo 
 

As plantas antagonistas podem sofrer a invasão destes organismos, porém não permitem seu desenvolvimento até a fase adulta. É o caso das Crotalárias, que em um primeiro momento funciona como hospedeira atraindo os nematoides para as raízes e posteriormente repelem os que penetram ou que estão nas proximidades das mesmas. As crotalárias também podem produzir substâncias que são tóxicas, pois inibem o movimento dos nematoides juvenis. É recomendável seu cultivo até aproximadamente 80 dias seguindo da incorporação da massa verde, pois se deve evitar o início da floração para não dificultar o processo de decomposição pela formação de alto volume de materiais fibrosos. No caso do cravo-de-defunto, ocorre liberação de substâncias radiculares também com ação tóxica sobre os nematoides. Estas plantas podem ser utilizadas como cultura de cobertura ou serem incorporadas ao solo na forma de adubo verde, com melhoria também nas condições físicas e químicas do solo por torná-lo mais descompactado estruturalmente e pela incorporação de fertilizantes naturais.

A aração do solo, a eliminação de plantas daninhas hospedeiras como beldroega, caruru de espinho, corda-de-viola, cordão-de-frade, maria-pretinha e melão-de-são-caetano dentre outras e a remoção de restos de culturas de cenoura (Figura 2) ou sua exposição aos raios solares também reduzem consideravelmente a população destes parasitos para os próximos plantios.

Fotos: Jadir B. Pinheiro

Áreas de cultivo com perda total devido ao ataque de Meloidogyne
Figura 2. Áreas de cultivo com perda total devido ao ataque de Meloidogyne. Remover os restos de cultura após a colheita contribui para redução da população de nematoides de uma lavoura, pois os mesmos sobrevivem nestes

 

Outra prática cultural de grande importância é o alqueive, que consiste em manter o terreno limpo sem a presença de cultivos ou plantas daninhas, com arações e gradagens para o revolvimento do solo em períodos de 20 a 30 dias durante três meses (Figura 3). O alqueive reduz a população não só dos nematoides-das-galhas como de outras espécies destes parasitos pela ação dos raios solares. A eficiência do alqueive vai depender de sua duração, da temperatura e da umidade do solo.

Porém é uma prática que possui o inconveniente do custo de manter o solo limpo por determinado tempo, com redução de lucro para o produtor.

 

Foto: Jadir B. Pinheiro
Alqueive
Figura 3. Alqueive: manutenção do terreno limpo antes do plantio com arações e gradagens periódicas 

 

A utilização de matéria orgânica (Figura 4) como, esterco de galinha ou de gado curtido, torta de mamona, palha de café e outras fontes constitui em uma boa medida para redução dos níveis populacionais do nematoide A matéria orgânica funciona como condicionador do solo, favorecendo suas propriedades físicas, além de contribuir com fornecimento de determinados nutrientes, como nitrogênio.

Assim, as plantas se tornam mais vigorosas em relação ao ataque dos nematoides. Além disso, a matéria orgânica estimula o aumento da população de microrganismos de solo, em especial de inimigos naturais dos nematoides como fungos e bactérias, além de liberar substâncias tóxicas com sua decomposição que contribuem para a mortalidade dos mesmos. 

Foto: Jadir B. Pinheiro
Matéria orgânica proveniente de compostagem
Figura 4. Matéria orgânica proveniente de compostagem: medida que auxilia na redução da população do nematoide-das-galhas

A utilização de cultivares tolerantes (Figura 5) constitui, juntamente com as práticas culturais citadas acima, uma medida de grande relevância para o controle de nematoides. Assim, o melhoramento da cenoura, visando à resistência a nematoides, tem papel importantíssimo no seu manejo. A incorporação da resistência apresenta vantagens, como não oferecer riscos à saúde humana, custo relativamente baixo, além de não poluir o ambiente.

No Brasil, avanços significativos têm sido obtidos em relação ao nematoide-das-galhas por pesquisas realizadas pela equipe da Embrapa Hortaliças-DF, lideradas pelo pesquisador Jairo Vidal Vieira. As progênies e cultivares de cenouras desenvolvidas vêm sendo avaliadas para a resistência ao nematoide-das- galhas desde 1978. Neste contexto, em 1981 a Embrapa Hortaliças lançou a cultivar Brasília (figura 5A), que apresenta como uma das principais características a elevada tolerância a Meloidogyne incognita e M. javanica.

Desde então, a Unidade vem trabalhando no intuito de buscar outras fontes de resistência derivadas da cultivar Brasília. Assim, outra cultivar a BRS Planalto (Figura 5B) lançada em 2009 também apresenta também elevado nível de tolerância ao nematoide-das-galhas.

 
Foto: Carlos Solano e Paula Cochrane
Cultivares Brasília e BRS Planalto
Figura 5. Cultivares Brasília (A) e BRS Planalto (B) lançadas pela Embrapa Hortaliças em 1981 e 2009 respectivamente: tolerância ao nematoide-das-galhas
 

Entretanto, não é conhecida ainda fonte de resistência alta ou imunidade em cenoura aos nematoide-das-galhas. Em relação ao controle químico só deve ser utilizado em último caso, em altíssima infestação, por conta do seu alto custo, eficiência relativa e riscos ao meio ambiente. Não deve ser visto como única e nem a mais eficaz medida de redução dos níveis populacionais dos nematoides. Atualmente existem alguns produtos nematicidas registrados para uso em plantio comerciais de cenoura, e informações a respeito de seus registros e características afins encontram-se disponíveis no sistema AGROFIT do site do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).

A utilização de nematicidas depende de um aumento no valor da produção de pelo menos três ou quatro vezes o investimento. Além disso, são produtos altamente tóxicos ao homem e ao ambiente. Porém, em terrenos com alta população de nematoides, após vários ciclos de cultivo de plantas suscetíveis, pode ser necessária a aplicação de nematicidas para reduzir a população em curto prazo.