Plantas espontâneas

Conteúdo atualizado em: 23/02/2022

Autor

Welington Pereira - Consultor autônomo

 

A interferência exercida pelas plantas daninhas constitui um dos fatores que mais limitam a produtividade da cultura da cenoura. A intensidade da interferência normalmente é avaliada por meio de decréscimos de produção e/ou pela redução no crescimento da planta cultivada, como respostas à competição pelos recursos de crescimento disponíveis no ambiente (CO2, água, luz e nutrientes) e à aleloquímicos. Nessas condições, o conhecimento dos aspectos gerais da biologia das plantas daninhas, tais como origem e distribuição, espécies, ciclo de vida, importância econômica, reprodução, dormência das sementes ou propágulos vegetativos e a interferência que elas causam na cultura da cenoura é essencial para definir medidas de prevenção e estratégias de controle. Práticas inadequadas de manejo de plantas daninhas tendem a aumentar o banco de sementes do solo agravando ainda mais o problema nos cultivos subsequentes.

Em geral, devido a sua rusticidade, as plantas daninhas adaptam-se melhor ao meio ambiente do que as plantas de cenoura, crescendo mais vigorosas, principalmente nos primeiros estádios de desenvolvimento. Assim, é necessário manter as áreas de cultivo livres da interferência proporcionada pelas plantas daninhas, pelo menos até que a cultura se desenvolva, cubra suficientemente a superfície do solo e não sofra mais a interferência negativa delas.

O período crítico de prevenção à interferência (PCPI) de plantas daninhas na cultura ocorre, em geral, da terceira até a sexta semana após a emergência, variando basicamente de acordo com o banco de sementes do solo, condições edafoclimáticas e o sistema de cultivo. Em trabalho recente realizado com a cultivar de cenoura Brasília, constatou-se que os PCPIs foram de 19 a 36 e 18 a 42 dias após emergência da cultura, respectivamente para os espaçamentos de 15 x 6 cm e 20 x 6 cm entre fileiras. Esses resultados apontaram que o menor espaçamento entre fileiras resultou na redução do período crítico de prevenção à interferência das plantas daninhas em sete dias. A interferência das plantas daninhas durante todo o ciclo reduziu a produtividade de cenoura em até 96%.

O manejo das plantas daninhas pode ser realizado por meio de vários métodos de controle: cultural, manual, mecânico e químico (com o uso de herbicidas), sendo o método cultural o mais importante. Nesse método, são adotadas práticas que proporcionem vantagem competitiva para a cultura em relação às plantas daninhas. Dessa forma, o controle cultural pode ser conseguido por meio da semeadura de cultivares adaptadas às condições de clima e solo; uso de sementes tratadas de boa qualidade; semeadura em época recomendada, utilizando espaçamentos e arranjos de plantas adequados para as diferentes cultivares; adequado preparo do solo; e adubações de base e formação balanceadas. Entretanto, a melhor estratégia a ser seguida é a combinação dos métodos de controle, em que um método tende a complementar possíveis falhas dos demais, caracterizando o que é se chama de manejo integrado de plantas daninhas.

As plantas daninhas podem ser eliminadas de forma manual ou mecanicamente por ocasião do desbaste, com o emprego de sacho ou enxada estreita entre as linhas de cultivo. Entretanto, o cultivo mecânico apresenta o inconveniente de não eliminar as plantas daninhas na linha de semeadura e, muitas vezes, danificar as raízes da cenoura.

O controle químico de plantas daninhas destaca-se como o método de controle mais eficaz, possibilitando cultivar áreas extensas com gasto reduzido de mão-de-obra. Nesse contexto, vários herbicidas podem ser utilizados e a sua escolha deve ser feita de acordo com as espécies de plantas daninhas presentes e as características do herbicida (ingrediente ativo, seletividade, época de aplicação e atividade residual). Diante disso, há uma tendência por parte dos produtores de se adotar apenas o controle químico devido a sua praticidade e eficiência, porém, se empregado isoladamente e de maneira inadequada, pode trazer uma série de consequências indesejáveis. Pode-se citar como exemplo, a seleção de espécies infestantes tolerantes ou resistentes aos herbicidas, que pode inviabilizar o controle químico de plantas daninhas, ainda mais para a cenoura, que apresenta poucos herbicidas registrados (Tabela 1), principalmente para espécies dicotiledôneas. Algumas das espécies de plantas daninhas comuns em plantações de cenoura e suas susceptibilidades aos herbicidas registrados para a cultura são apresentadas na Tabela 2.

Na implantação da cultura da cenoura, o preparo do solo deve ser bem feito, livre de torrões e de resíduos dos restos culturais do cultivo anterior, facilitando, desse modo, o controle das plantas daninhas, além de promover a germinação e o crescimento vigoroso das plantas de cenoura. Irrigações por ocasião da aração facilitam o preparo e promovem a germinação das plantas daninhas, as quais são eliminadas durante o preparo final (cerca de 15 dias após a aração) do leito de plantio. Adicionalmente, o bom preparo do solo melhora o comportamento dos herbicidas de pré-emergência (linuron e trifluralin).

Sempre que o solo for revolvido e submetido à umidade favorável (chuva ou irrigação) as sementes das plantas são estimuladas a germinar, desenvolvendo-se rapidamente. Recomenda-se fazer o preparo do solo em duas a três semanas antes da semeadura para permitir a germinação, o crescimento e o controle em pós-emergência das plantas daninhas na área. Esse controle seria realizado pela aplicação de herbicidas não seletivos de ação de contato como diquat e paraquat ou sistêmica como glyphosate, podendo ser realizada antes ou após a semeadura.

Na aplicação feita sobre as plantas daninhas emergidas (4 a 6 folhas definitivas) e após o plantio, obrigatoriamente antes da emergência da cenoura, pode-se combinar com a aplicação do herbicida linuron, que possui atividade residual, em pré-emergência, melhorando assim o espectro de controle e o tempo em que a área permanece livre da infestação por plantas daninhas. Dentro desse contexto, as plantas emergidas são eliminadas pelos herbicidas de contato ou sistêmico e aquelas em processo de germinação pelo linuron. Em áreas com baixa infestação, podem-se aplicar herbicidas pós-emergentes como clethodim, clethodim+fenoxaprop-p-ethyl, fenoxaprop-p-ethyl ou fluazipfop-p, para o controle de gramíneas, e linuron, para o controle de dicotiledôneas, dispensando, assim, a aplicação de herbicidas dessecantes antes da semeadura.

Para sua melhor eficácia, o herbicida trifluralin deve ser aplicado com o solo seco, bem preparado e livre de plantas daninhas, e incorporado até 10 cm de profundidade. Por outro lado, o herbicida linuron deve ser aplicado com umidade do solo próxima da capacidade de campo, estando o solo bem preparado e livre de plantas daninhas. Já os herbicidas pós-emergentes devem ser aplicados quando as plantas daninhas estiverem no início do desenvolvimento, em condições de temperatura inferior a 30 ºC, umidade relativa do ar maior que 55% e ausência de orvalho. Adicionalmente, a textura do solo e o teor de matéria orgânica são fatores que devem ser levados em consideração para a definição da dose do herbicida a ser aplicada em pré-emergência. Em solos arenosos e com baixos teores de matéria orgânica, recomenda-se usar a menor dosagem registrada no rótulo da embalagem. Na Figura 1 pode-se observar a condição de uma lavoura de cenoura manejada com o herbicida trifluralin (controle de gramíneas e algumas dicotiledôneas) em pré-emergência e linuron (controle de dicotiledôneas) em pós-emergência.

Foto: Sidnei Douglas Cavalieri
Lavoura de cenoura sob pivô-central manejada com os herbicidas trifluralin em pré-emergência e linuron em pós-emergência.
Figura 1. Lavoura de cenoura sob pivô-central manejada com os herbicidas trifluralin em pré-emergência e linuron em pós-emergência.

 

É importante ressaltar que quando a infestação de plantas daninhas é muito intensa, aplicações sequenciais em pós-emergência, tanto de linuron quanto dos herbicidas graminicidas, apresentam maior possibilidade de sucesso no controle das infestantes. Uma alternativa seria a aplicação da metade da dose recomendada dos herbicidas quando as plantas daninhas dicotiledôneas estiverem no estádio cotiledonar ou com até duas folhas definitivas e no estádio de 1-2 folhas para gramíneas, repetindo tal procedimento quando um novo fluxo de emergência se apresentar no mesmo estádio. Nessas condições, além do controle desse fluxo de emergência, a segunda aplicação controlaria possíveis espécies suscetíveis que, eventualmente, não tenham sido controladas na primeira aplicação.

Tabela 1. Herbicidas registrados para a cultura da cenoura no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA.

Ação1/ Herbicida2/ Dose (kg ou 1 ha-1) Modalidade
de
aplicação3/  
Classificação
Toxicológica4/
 
Classificação
Ambiental5/
 
Nome comum Nome comercial Ingrediente ativo Nome comercial
Folhas
Largas
Linuron Afalon 0,72-0,99 1,6-2,2 PRE/POS III II
Afalon 450 SC 0,72-0,99 1,6-2,2 PRE/POS III II
Linurex Agricur 500 WP 0,5-1,0 1,0-2,0 PRE I II
Folhas
Estreitas
Clethodim Select 240 EC 0,084-1,8 0,35-0,45 POS I III
Lord 0,084-1,8 0,35-0,45 POS I III
Fenoxaprop-p-ethyl Podium EW 0,083 0,75 POS III II
Clethodim - Fenoxaprop-p-ethyl Podium S 0,05+0,05 1,0 POS II III
Fluazifop-p-butyl Fusilade 250 EW 0,125-0,188 0,5-0,75 POS III II
Trifluralin Premerlin 600 EC 0,534-1,068 0,9-4,0 PRE/PPI I II
Trifularina Nortox 0,546-1,092 1,2-2,4 PPI II

II

1/ Alguns dos produtos têm boa ação em ambos os grupos de plantas;
2/ Ler e seguir as instruções dos rótulos. A inclusão ou exclusão de um produto depende da validade de registro dele junto ao MAPA;
3/ PPI: pré-plantio incorporado entre 5 e 10 cm; PRÉ: pré-emergência; PÓS: pós-emergência;
4/ Classe I - Extremamente tóxico, Classe II - Altamente tóxico, Classe III - Mediamente Tóxico e Classe IV - Pouco ou muito pouco tóxico;
5/ Classe I - Altamente perigoso, Classe II - Muito perigoso, Classe III - Perigoso e Classe IV - Pouco Perigoso.
Fonte: Agrofit (2011) e Rodrigues e Almeida (2011).



Tabela 2. Susceptibilidade de algumas espécies de plantas daninhas aos herbicidas registrados para a cultura da cenoura.

Espécie Herbicida1/
Nome comum Nome científico 12/ 2 3 4 5 6
Leiteiro Euphorbia heterophylla T T T T T T
Ançarinha-branca Chenopodium album S S T T T T
Apaga-fogo Alternanthera tenella M M T T T T
Azevém Lolium multiflorum S M S S S S
Beldroega Portulaca oleracea M S T T T T
Botão-de-ouro Galinsoga parviflora T S T T T T
Capim-amargoso Digitaria insularis S S S S S S
Capim-arroz Echinochloa crusgalli S M S S S S
Capim-carrapicho Cenchrus echinatus S T S S - S
Capim-colchão Digitaria  horizontalis S - S S S S
Capim-coloninho Echinochloa colonum M T S S S S
Capim-colonião Panicum maximum S T S S - S
Capim-favorito Rhynchelytrum repens A T S S - -
Capim-Kikuyo Pennisetum clandestinum T - - - - S
Capim-marmelada Brachiaria plantaginea S T S S S S
Capim-maçambará Sorghum halepense S T S S - S
Capim-oferecido Pennisetum setosum S T S S - S
Capim-pé-de-galinha Eleusine indica S M S S S S
Capim-rabo-de-raposa Setaria geniculata S T S S - S
Caruru Amaranthus hybridus var. paniculatus M S T T T T
Carrapicho-de-carneiro Acanthospermum hispidum T M T T T T
Carrapicho-rasteiro Acanthospermum australe T M T T T T
Corda-de-viola Ipomoea triloba T T T T T T
Erva-de-santa-maria Chenopodium ambrosioides M S T T T T
Falsa-serralha Oxalis latifolia T M T T T T
Fedegoso Commelina benghalensis T M T T T T
Grama-seda Cyperus rotundus T T S S - S
Guanxuma Cyperus esculentus T M T T T T
Joá-bravo Sonchus oleraceus T T T T T T
Joá-de-capote Richardia brasiliensis T M T T T T
Maria-pretinha Bidens pilosa T M T T T T
Mentrasto Raphanus raphanistrum T S T T T T
Mentruz Sinapis arvensis M M T T T T
Mostarda Lepidium virginicum M - T T T T
Nabiça Ageratum conyzoides T M T T T T
Picão-preto Solanum americanum T M T T T T
Poaia-branca Nicandra physaloides S M T T T T
Serralha Solanum sisymbriifolium T M T T T T
Tiririca-amarela Sida rhombifolia T T T T - M
Tiririca-roxa Cynodon dactylon T T T T - T
Trapoeraba Senna obtusifolia T M T T - T
Trevo Emilia fosbergii M T T T T T

1/T: Tolerante; S: Susceptível; M: Moderadamente susceptível; -: sem informação.
2/A suscetibilidade das plantas daninhas aos herbicidas pode variar conforme a modalidade de aplicação e estádio de desenvolvimento das espécies. De forma geral, deve-se evitar a aplicação de herbicidas em plantas em estádio avançado de desenvolvimento por apresentarem maior tolerância aos herbicidas. 1: trifluralin; 2: linuron; 3: clethodim; 4: fenoxaprop-p-ethyl; 5: clethodim+fenoxaprop-p-ethyl; 6: fluazifop-p-butyl.
Fonte: Adaptado de Lorenzi (2006).