Cenoura
Plantas espontâneas
Autor
Welington Pereira - Consultor autônomo
A interferência exercida pelas plantas daninhas constitui um dos fatores que mais limitam a produtividade da cultura da cenoura. A intensidade da interferência normalmente é avaliada por meio de decréscimos de produção e/ou pela redução no crescimento da planta cultivada, como respostas à competição pelos recursos de crescimento disponíveis no ambiente (CO2, água, luz e nutrientes) e à aleloquímicos. Nessas condições, o conhecimento dos aspectos gerais da biologia das plantas daninhas, tais como origem e distribuição, espécies, ciclo de vida, importância econômica, reprodução, dormência das sementes ou propágulos vegetativos e a interferência que elas causam na cultura da cenoura é essencial para definir medidas de prevenção e estratégias de controle. Práticas inadequadas de manejo de plantas daninhas tendem a aumentar o banco de sementes do solo agravando ainda mais o problema nos cultivos subsequentes.
Em geral, devido a sua rusticidade, as plantas daninhas adaptam-se melhor ao meio ambiente do que as plantas de cenoura, crescendo mais vigorosas, principalmente nos primeiros estádios de desenvolvimento. Assim, é necessário manter as áreas de cultivo livres da interferência proporcionada pelas plantas daninhas, pelo menos até que a cultura se desenvolva, cubra suficientemente a superfície do solo e não sofra mais a interferência negativa delas.
O período crítico de prevenção à interferência (PCPI) de plantas daninhas na cultura ocorre, em geral, da terceira até a sexta semana após a emergência, variando basicamente de acordo com o banco de sementes do solo, condições edafoclimáticas e o sistema de cultivo. Em trabalho recente realizado com a cultivar de cenoura Brasília, constatou-se que os PCPIs foram de 19 a 36 e 18 a 42 dias após emergência da cultura, respectivamente para os espaçamentos de 15 x 6 cm e 20 x 6 cm entre fileiras. Esses resultados apontaram que o menor espaçamento entre fileiras resultou na redução do período crítico de prevenção à interferência das plantas daninhas em sete dias. A interferência das plantas daninhas durante todo o ciclo reduziu a produtividade de cenoura em até 96%.
O manejo das plantas daninhas pode ser realizado por meio de vários métodos de controle: cultural, manual, mecânico e químico (com o uso de herbicidas), sendo o método cultural o mais importante. Nesse método, são adotadas práticas que proporcionem vantagem competitiva para a cultura em relação às plantas daninhas. Dessa forma, o controle cultural pode ser conseguido por meio da semeadura de cultivares adaptadas às condições de clima e solo; uso de sementes tratadas de boa qualidade; semeadura em época recomendada, utilizando espaçamentos e arranjos de plantas adequados para as diferentes cultivares; adequado preparo do solo; e adubações de base e formação balanceadas. Entretanto, a melhor estratégia a ser seguida é a combinação dos métodos de controle, em que um método tende a complementar possíveis falhas dos demais, caracterizando o que é se chama de manejo integrado de plantas daninhas.
As plantas daninhas podem ser eliminadas de forma manual ou mecanicamente por ocasião do desbaste, com o emprego de sacho ou enxada estreita entre as linhas de cultivo. Entretanto, o cultivo mecânico apresenta o inconveniente de não eliminar as plantas daninhas na linha de semeadura e, muitas vezes, danificar as raízes da cenoura.
O controle químico de plantas daninhas destaca-se como o método de controle mais eficaz, possibilitando cultivar áreas extensas com gasto reduzido de mão-de-obra. Nesse contexto, vários herbicidas podem ser utilizados e a sua escolha deve ser feita de acordo com as espécies de plantas daninhas presentes e as características do herbicida (ingrediente ativo, seletividade, época de aplicação e atividade residual). Diante disso, há uma tendência por parte dos produtores de se adotar apenas o controle químico devido a sua praticidade e eficiência, porém, se empregado isoladamente e de maneira inadequada, pode trazer uma série de consequências indesejáveis. Pode-se citar como exemplo, a seleção de espécies infestantes tolerantes ou resistentes aos herbicidas, que pode inviabilizar o controle químico de plantas daninhas, ainda mais para a cenoura, que apresenta poucos herbicidas registrados (Tabela 1), principalmente para espécies dicotiledôneas. Algumas das espécies de plantas daninhas comuns em plantações de cenoura e suas susceptibilidades aos herbicidas registrados para a cultura são apresentadas na Tabela 2.
Na implantação da cultura da cenoura, o preparo do solo deve ser bem feito, livre de torrões e de resíduos dos restos culturais do cultivo anterior, facilitando, desse modo, o controle das plantas daninhas, além de promover a germinação e o crescimento vigoroso das plantas de cenoura. Irrigações por ocasião da aração facilitam o preparo e promovem a germinação das plantas daninhas, as quais são eliminadas durante o preparo final (cerca de 15 dias após a aração) do leito de plantio. Adicionalmente, o bom preparo do solo melhora o comportamento dos herbicidas de pré-emergência (linuron e trifluralin).
Sempre que o solo for revolvido e submetido à umidade favorável (chuva ou irrigação) as sementes das plantas são estimuladas a germinar, desenvolvendo-se rapidamente. Recomenda-se fazer o preparo do solo em duas a três semanas antes da semeadura para permitir a germinação, o crescimento e o controle em pós-emergência das plantas daninhas na área. Esse controle seria realizado pela aplicação de herbicidas não seletivos de ação de contato como diquat e paraquat ou sistêmica como glyphosate, podendo ser realizada antes ou após a semeadura.
Na aplicação feita sobre as plantas daninhas emergidas (4 a 6 folhas definitivas) e após o plantio, obrigatoriamente antes da emergência da cenoura, pode-se combinar com a aplicação do herbicida linuron, que possui atividade residual, em pré-emergência, melhorando assim o espectro de controle e o tempo em que a área permanece livre da infestação por plantas daninhas. Dentro desse contexto, as plantas emergidas são eliminadas pelos herbicidas de contato ou sistêmico e aquelas em processo de germinação pelo linuron. Em áreas com baixa infestação, podem-se aplicar herbicidas pós-emergentes como clethodim, clethodim+fenoxaprop-p-ethyl, fenoxaprop-p-ethyl ou fluazipfop-p, para o controle de gramíneas, e linuron, para o controle de dicotiledôneas, dispensando, assim, a aplicação de herbicidas dessecantes antes da semeadura.
Para sua melhor eficácia, o herbicida trifluralin deve ser aplicado com o solo seco, bem preparado e livre de plantas daninhas, e incorporado até 10 cm de profundidade. Por outro lado, o herbicida linuron deve ser aplicado com umidade do solo próxima da capacidade de campo, estando o solo bem preparado e livre de plantas daninhas. Já os herbicidas pós-emergentes devem ser aplicados quando as plantas daninhas estiverem no início do desenvolvimento, em condições de temperatura inferior a 30 ºC, umidade relativa do ar maior que 55% e ausência de orvalho. Adicionalmente, a textura do solo e o teor de matéria orgânica são fatores que devem ser levados em consideração para a definição da dose do herbicida a ser aplicada em pré-emergência. Em solos arenosos e com baixos teores de matéria orgânica, recomenda-se usar a menor dosagem registrada no rótulo da embalagem. Na Figura 1 pode-se observar a condição de uma lavoura de cenoura manejada com o herbicida trifluralin (controle de gramíneas e algumas dicotiledôneas) em pré-emergência e linuron (controle de dicotiledôneas) em pós-emergência.
Foto: Sidnei Douglas Cavalieri
Figura 1. Lavoura de cenoura sob pivô-central manejada com os herbicidas trifluralin em pré-emergência e linuron em pós-emergência.
É importante ressaltar que quando a infestação de plantas daninhas é muito intensa, aplicações sequenciais em pós-emergência, tanto de linuron quanto dos herbicidas graminicidas, apresentam maior possibilidade de sucesso no controle das infestantes. Uma alternativa seria a aplicação da metade da dose recomendada dos herbicidas quando as plantas daninhas dicotiledôneas estiverem no estádio cotiledonar ou com até duas folhas definitivas e no estádio de 1-2 folhas para gramíneas, repetindo tal procedimento quando um novo fluxo de emergência se apresentar no mesmo estádio. Nessas condições, além do controle desse fluxo de emergência, a segunda aplicação controlaria possíveis espécies suscetíveis que, eventualmente, não tenham sido controladas na primeira aplicação.
Tabela 1. Herbicidas registrados para a cultura da cenoura no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA.
Ação1/ | Herbicida2/ | Dose (kg ou 1 ha-1) | Modalidade de aplicação3/ | Classificação Toxicológica4/ | Classificação Ambiental5/ | ||
Nome comum | Nome comercial | Ingrediente ativo | Nome comercial | ||||
Folhas Largas | Linuron | Afalon | 0,72-0,99 | 1,6-2,2 | PRE/POS | III | II |
Afalon 450 SC | 0,72-0,99 | 1,6-2,2 | PRE/POS | III | II | ||
Linurex Agricur 500 WP | 0,5-1,0 | 1,0-2,0 | PRE | I | II | ||
Folhas Estreitas | Clethodim | Select 240 EC | 0,084-1,8 | 0,35-0,45 | POS | I | III |
Lord | 0,084-1,8 | 0,35-0,45 | POS | I | III | ||
Fenoxaprop-p-ethyl | Podium EW | 0,083 | 0,75 | POS | III | II | |
Clethodim - Fenoxaprop-p-ethyl | Podium S | 0,05+0,05 | 1,0 | POS | II | III | |
Fluazifop-p-butyl | Fusilade 250 EW | 0,125-0,188 | 0,5-0,75 | POS | III | II | |
Trifluralin | Premerlin 600 EC | 0,534-1,068 | 0,9-4,0 | PRE/PPI | I | II | |
Trifularina Nortox | 0,546-1,092 | 1,2-2,4 | PPI | II | II |
1/ Alguns dos produtos têm boa ação em ambos os grupos de plantas;
2/ Ler e seguir as instruções dos rótulos. A inclusão ou exclusão de um produto depende da validade de registro dele junto ao MAPA;
3/ PPI: pré-plantio incorporado entre 5 e 10 cm; PRÉ: pré-emergência; PÓS: pós-emergência;
4/ Classe I - Extremamente tóxico, Classe II - Altamente tóxico, Classe III - Mediamente Tóxico e Classe IV - Pouco ou muito pouco tóxico;
5/ Classe I - Altamente perigoso, Classe II - Muito perigoso, Classe III - Perigoso e Classe IV - Pouco Perigoso.
Fonte: Agrofit (2011) e Rodrigues e Almeida (2011).
Tabela 2. Susceptibilidade de algumas espécies de plantas daninhas aos herbicidas registrados para a cultura da cenoura.
Espécie | Herbicida1/ | ||||||
Nome comum | Nome científico | 12/ | 2 | 3 | 4 | 5 | 6 |
Leiteiro | Euphorbia heterophylla | T | T | T | T | T | T |
Ançarinha-branca | Chenopodium album | S | S | T | T | T | T |
Apaga-fogo | Alternanthera tenella | M | M | T | T | T | T |
Azevém | Lolium multiflorum | S | M | S | S | S | S |
Beldroega | Portulaca oleracea | M | S | T | T | T | T |
Botão-de-ouro | Galinsoga parviflora | T | S | T | T | T | T |
Capim-amargoso | Digitaria insularis | S | S | S | S | S | S |
Capim-arroz | Echinochloa crusgalli | S | M | S | S | S | S |
Capim-carrapicho | Cenchrus echinatus | S | T | S | S | - | S |
Capim-colchão | Digitaria horizontalis | S | - | S | S | S | S |
Capim-coloninho | Echinochloa colonum | M | T | S | S | S | S |
Capim-colonião | Panicum maximum | S | T | S | S | - | S |
Capim-favorito | Rhynchelytrum repens | A | T | S | S | - | - |
Capim-Kikuyo | Pennisetum clandestinum | T | - | - | - | - | S |
Capim-marmelada | Brachiaria plantaginea | S | T | S | S | S | S |
Capim-maçambará | Sorghum halepense | S | T | S | S | - | S |
Capim-oferecido | Pennisetum setosum | S | T | S | S | - | S |
Capim-pé-de-galinha | Eleusine indica | S | M | S | S | S | S |
Capim-rabo-de-raposa | Setaria geniculata | S | T | S | S | - | S |
Caruru | Amaranthus hybridus var. paniculatus | M | S | T | T | T | T |
Carrapicho-de-carneiro | Acanthospermum hispidum | T | M | T | T | T | T |
Carrapicho-rasteiro | Acanthospermum australe | T | M | T | T | T | T |
Corda-de-viola | Ipomoea triloba | T | T | T | T | T | T |
Erva-de-santa-maria | Chenopodium ambrosioides | M | S | T | T | T | T |
Falsa-serralha | Oxalis latifolia | T | M | T | T | T | T |
Fedegoso | Commelina benghalensis | T | M | T | T | T | T |
Grama-seda | Cyperus rotundus | T | T | S | S | - | S |
Guanxuma | Cyperus esculentus | T | M | T | T | T | T |
Joá-bravo | Sonchus oleraceus | T | T | T | T | T | T |
Joá-de-capote | Richardia brasiliensis | T | M | T | T | T | T |
Maria-pretinha | Bidens pilosa | T | M | T | T | T | T |
Mentrasto | Raphanus raphanistrum | T | S | T | T | T | T |
Mentruz | Sinapis arvensis | M | M | T | T | T | T |
Mostarda | Lepidium virginicum | M | - | T | T | T | T |
Nabiça | Ageratum conyzoides | T | M | T | T | T | T |
Picão-preto | Solanum americanum | T | M | T | T | T | T |
Poaia-branca | Nicandra physaloides | S | M | T | T | T | T |
Serralha | Solanum sisymbriifolium | T | M | T | T | T | T |
Tiririca-amarela | Sida rhombifolia | T | T | T | T | - | M |
Tiririca-roxa | Cynodon dactylon | T | T | T | T | - | T |
Trapoeraba | Senna obtusifolia | T | M | T | T | - | T |
Trevo | Emilia fosbergii | M | T | T | T | T | T |
1/T: Tolerante; S: Susceptível; M: Moderadamente susceptível; -: sem informação.
2/A suscetibilidade das plantas daninhas aos herbicidas pode variar conforme a modalidade de aplicação e estádio de desenvolvimento das espécies. De forma geral, deve-se evitar a aplicação de herbicidas em plantas em estádio avançado de desenvolvimento por apresentarem maior tolerância aos herbicidas. 1: trifluralin; 2: linuron; 3: clethodim; 4: fenoxaprop-p-ethyl; 5: clethodim+fenoxaprop-p-ethyl; 6: fluazifop-p-butyl.
Fonte: Adaptado de Lorenzi (2006).