Fisiologia

Conteúdo atualizado em: 29/11/2023

Autor

Agostinho Dirceu Didonet - Embrapa Arroz e Feijão

 

O entendimento e a compreensão das reações que se manifestam no crescimento e desenvolvimento que a planta do feijoeiro apresenta como resposta aos diferentes ambientes em que é cultivado é importante para a sustentabilidade da produção. Independentemente do hábito de crescimento, do ciclo, da cor do grão e do tipo de planta, esta interação com o ambiente que ocorre nos diferentes sistemas de cultivo e em diferentes condições de manejo, são imprescindíveis para que o rendimento potencial seja obtido. Entende-se como crescimento a acumulação de massa seca (matéria seca, fitomassa ou biomassa) pela planta. Já o desenvolvimento é definido como sendo as transformações que se refletem nas diferentes fases fenológicas pelo qual a planta passa ao longo do tempo cronológico de sua existência (ciclo). Duas fases características e bem diferenciadas da fenologia do feijoeiro são a fase vegetativa e a fase reprodutiva, que podem ser observadas facilmente nas plantas em condições de cultivo, devido a ausência e presença de estruturas reprodutivas.

O período vegetativo se caracteriza pelo investimento dos recursos da planta do feijoeiro na formação de biomassa para captação de luz, portanto estrutura foliar, e para formação de estruturas necessárias para aquisição de água e nutrientes. Caso haja excesso e/ou favorecimento ao investimento de uma das estruturas em relação a outra, o desequilíbrio irá se manifestar em fases fenológicas posteriores. Por exemplo, havendo privilégio no investimento da biomassa em estruturas vegetativas da parte aérea, quer seja por excesso de nutrientes, ou por "procura" de luminosidade, certamente haverá menor investimento em biomassa radicular, que poderá ser crucial em momentos posteriores de deficiência hídrica, ou deficiência de nutrientes.

O grão de feijão é constituído basicamente de carboidratos e fibras (entre 60 a 70% de sua composição) e proteínas (entre 16 a 30% de sua composição). Tais produtos são originados basicamente da habilidade que a planta tem de incorporar CO2 e gerar cadeias carbônicas, os fotoassimilados. A capacidade líquida que a planta possui de incorporar biomassa é determinada pela taxa fotossintética, ou seja a relação entre incorporação e liberação de CO2.

A grande maioria dos estudos que determinaram as taxas fotossintéticas do feijão consideram que as mesmas não são limitantes para que as plantas obtenham seu potencial de produtividade de grãos. Essas taxas normalmente são avaliadas por unidade de área de folha (AF - área foliar) em condições consideradas ótimas. Taxas que podem ser bem diferentes quando se considera a área foliar por unidade de área de solo (IAF - Índice de Área Foliar) em condições normais de crescimento das plantas na lavoura.

Nem todas as folhas do feijoeiro estão aptas para executar incorporação liquida de CO2 com consequente produção e acúmulo de carboidratos (açúcares, fotoassimilados) e biomassa. Algumas não recebem quantidades adequadas de luz devido a sua localização no dossel. Outras ainda não se expandiram o suficiente (entre 30 a 60% do seu tamanho final) para serem consideradas maduras e exportadoras de fotoassimilados.

As taxas máximas de atividade fotossintética do dossel ocorrem quando as plantas iniciam o período reprodutivo. Neste ponto a captação de energia luminosa (radiação solar) deve ser máxima, e geralmente coincidente com o maior IAF. No início da fase reprodutiva a planta necessita investir na formação de estruturas reprodutivas e também na manutenção e aumento da área foliar capaz de promover taxas fotossintéticas líquidas positivas, isto é, incorporar matéria seca (Figura 1).

Figura 1. Translocação de fotoassimiliados na planta de feijão por ocasião do início do período reprodutivo.

 

Para a manutenção de taxas fotossintéticas elevadas, e em consequência alta produtividade, é preciso que as plantas do dossel capturem a maior quantidade possível de radiação solar pelas folhas que estão maduras. Estas em geral se localizam na parte intermediária da planta, uma vez que na parte superior ainda existem folhas em crescimento, e nas partes inferiores as folhas são sombreadas. Se a soma das taxas fotossintéticas de toda as plantas for positiva, há aumento de biomassa das plantas individuais, ao passo que se a taxa for negativa a planta pode até perder biomassa.

Normalmente o IAF ótimo das principais cultivares de feijão para que a taxa fotossintética seja máxima com um mínimo de auto-sombreamento está em torno de 3 a 4,5 avaliado no início do período reprodutivo. O tempo de duração desta área foliar capaz de realizar taxas de fotossíntese líquida positiva, definirá a produtividade de grãos.

Qualquer estresse biótico ou abiótico que possa causar redução no IAF, afetará o potencial de rendimento da cultura do feijoeiro. Variedades de ciclo indeterminado e prostradas, podem ter uma grande “mistura” de estruturas vegetativas e reprodutivas ocorrendo ao mesmo tempo, diferentemente de variedades de ciclo determinado, em que esta "mistura" aparentemente é menor. No geral, as folhas superiores que recebem maior radiação solar são ainda imaturas e, portanto, possuem taxas fotossintéticas negativas, sendo importadoras de fotoassimilados. Além disso, podem sombrear parcial ou totalmente as folhas maduras inferiores, resultando em menores taxas fotossintéticas líquidas positivas da planta e, por conseguinte do dossel, afetando diretamente a produtividade.

O período mais crítico para a definição do rendimento de grãos do feijoeiro é o tempo cronológico e a condição em que ocorre a transição entre a fase vegetativa e reprodutiva. Neste tempo há a definição do número de vagens e de grãos por vagem que ocorre entre alguns dias antes e após o florescimento. Somente será possível avaliar as mudanças na acumulação de biomassa que ocorrem nas plantas em função do tempo mediante uma adequada análise do crescimento.

No feijoeiro, planta C3 típica, a mobilização de fotoassimilados, água e nutrientes principalmente N, ocorre a partir da "fonte" mais próxima (folhas), caso esta tenha capacidade de suprir adequadamente a demanda. Quando na fase de enchimento de grãos, que é fortemente demandante de N para acumulação de proteínas, nem sempre as fontes mais próximas conseguem suprir, ao menos momentaneamente, toda a demanda. Nesse caso, há então a competição e a mobilização de N de outras fontes mais próximas (folhas de outros entrenós mais distantes), exercendo-se assim a "dominância" na competição exercida pela maior capacidade de demanda (força do dreno). A dominância na capacidade de mobilização dos drenos no feijoeiro, depende muito do momento em que ela é estabelecida. As primeiras vagens com os primeiros grãos em formação, exercem preferência na competição por nutrientes com as demais vagens e grãos que são formados em sequência. Esta é a razão pelo qual as primeiras vagens do feijoeiro de hábito indeterminado, do terço inferior da planta, serão sempre mais desenvolvidas e com grãos mais "cheios" em comparação com as vagens do terço mediano e superior da planta. Essa desuniformidade será tanto maior quanto maior for o grau de indeterminação da planta. Nas plantas de hábito determinado todas as vagens e grãos se desenvolvem com menor defasagem entre elas, tendo, portanto, maior uniformidade.