Milho
Zoneamento agropecuário
Autores
Daniel Pereira Guimarães - Embrapa Milho e Sorgo
Luiz Marcelo Aguiar Sans
Elena Charlotte Landau - Embrapa Milho e Sorgo
Zoneamento Agrícola
O plantio de milho na época adequada, embora não tenha nenhum efeito no custo de produção, seguramente afeta o rendimento e, consequentemente, o lucro do agricultor. Para a tomada de decisão quanto à época ideal de plantio, é importante conhecer os fatores de riscos relacionados à produtividade agrícola. O agricultor tem que estar consciente de que a chance de sucesso de seu empreendimento depende de seu planejamento e que este depende de vários elementos, dentre eles os riscos climáticos a que a cultura estará sujeita.
A produtividade do milho depende da ação e interação da cultura com fatores edáficos, climáticos, fisiográficos, bióticos e de manejo. As respostas diferenciadas dos genótipos à variabilidade ambiental, ou seja, à interação entre genótipo e ambiente, significa que os efeitos genotípicos e ambientais não são independentes. Daí a importância de conhecer a época de plantio analisando todo o ciclo da cultura, procurando prever as condições ambientais em todas as suas fases fenológicas.
A grande dificuldade que se encontra é em respeito às variações climáticas. Essas variações imprevisíveis correspondem aos fatores ambientais altamente variáveis, não só espacialmente como de forma temporal (precipitação, temperatura, vento etc). Sabe-se que a interação entre genótipo e ambiente está associada a fatores simples e complexos. Os simples são proporcionados pela diferença de variabilidade entre genótipos nos ambientes. Já os fatores complexos se explicam pela falta de correlação entre os desempenhos do genótipo nos ambientes.
Como se pode observar, é uma tarefa difícil estabelecer a época de plantio para uma dada região sem conhecimento prévio das cultivares a serem plantadas e sem informações sobre as condições ambientais onde se pretende desenvolvê-las. Portanto, a época de semeadura refere-se ao período em que a cultura tem maior probabilidade de se desenvolver em condições edafoclimáticas favoráveis.
No Brasil Central, mais especificamente na região dos Cerrados, embora o cultivo do milho seja feito em diversas condições climáticas, considerando a variabilidade temporal e espacial do clima, pode-se observar que, durante todo o ciclo da cultura, a temperatura é superior a 15ºC e não ocorrem geadas. A temperatura noturna, em alguns locais, é elevada (maior que 24ºC), o que afeta o desempenho das plantas, principalmente no período coincidente com aquele entre o emborrachamento e grãos leitosos, reduzindo a produtividade.
De forma geral, pode-se dizer que, nessa região, a melhor época de semeadura é entre setembro e novembro, dependendo do início das chuvas. A produtividade, geralmente, é mais alta quando as condições do tempo permitem o plantio em outubro. Depois disso há uma redução no ciclo da cultura e queda no rendimento por área. Trabalhos de pesquisa no Brasil Central mostram que, dependendo da cultivar, o atraso do plantio a partir da época mais adequada pode implicar em perdas no rendimento em até 30 kg de milho por hectare por dia.
Obviamente, muitas vezes esse atraso não depende do produtor, por razões diversas. Cabe a ele elaborar seu planejamento de plantio de forma a não atrasá-lo por negligência ou por desconhecimento, pois assim estará perdendo dinheiro e comprometendo seu negócio. Excetuando-se as elevadas altitudes, onde o que determina a época de plantio é a temperatura, no Brasil Central o que define a época de plantio é a distribuição das chuvas. O uso consuntivo de água para o milho durante seu ciclo varia de 500 mm a 800 mm, dependendo das condições climáticas dominantes. A água é absorvida de maneira diferenciada de acordo com o estádio de crescimento e desenvolvimento da cultura.
Vale a pena ressaltar que o déficit hídrico tem influência direta na taxa fotossintética, a qual está diretamente associada à produção de grãos e sua importância varia com o estádio fenológico em que se encontra a planta. Pesquisas mostram que dois dias de estresse hídrico podem reduzir em até 20% a produtividade e que estresses hídricos de quatro a oito dias diminuem a produção em mais de 50%. Considera-se, ainda, que o período que vai da iniciação floral até o desenvolvimento da inflorescência e o período do pendoamento até a maturação são as fases críticas do déficit hídrico. Em resumo, a época de semeadura é determinada em função das condições ambientais (temperatura, distribuição das chuvas e disponibilidade de água do solo) e da cultivar (ciclo, fases da cultura e necessidade térmicas das cultivares). Ainda com respeito ao clima, deve-se levar em consideração a radiação solar e a intensidade e frequência de veranicos nas diferentes fases fenológicas da cultura.
Objetivando estabelecer a época de plantio de milho de sequeiro para as diferentes regiões, foi desenvolvido um estudo para recomendação das épocas de plantio em função dos períodos críticos da cultura a estresse hídrico. Nesse trabalho, além de ser considerado o fator climático precipitação (intensidade e distribuição) e os elementos temperatura e radiação na estimativa da demanda de água pela planta, levaram-se também em consideração aspectos fisiológicos da planta e características físico-hídricas dos solos.
O milho safrinha, que é plantado além dos limites dos Cerrados, não tem um período pré-fixado para seu plantio como o milho de safra normal, que é plantado no início das chuvas. É uma cultura desenvolvida de janeiro a abril, normalmente após a soja precoce e, em alguns locais, após o cultivo do milho de verão ou do feijão das águas. Por ser plantado no final da época recomendada, o milho safrinha tem sua produtividade bastante afetada pelo regime de chuvas e por fortes limitações de radiação solar e temperatura na fase final de seu ciclo. Além disso, como o milho safrinha é plantado após uma cultura de verão, a sua data de plantio depende da época do plantio dessa cultura antecessora e de seu ciclo. Assim, o planejamento do milho safrinha começa com a cultura de verão, visando liberar a área o mais cedo possível. Quanto mais tarde for o plantio, menor será o potencial e maior o risco de perdas por adversidades climáticas (seca e/ou geadas). Isso a torna uma cultura de alto risco, uma vez que a estação chuvosa encontra-se no fim, o que proporciona uma variabilidade espacial e temporal muito grande e, como consequência, uma variabilidade de produção.
Na safrinha, além do potencial de produção ser reduzido, há alto risco de frustação de safras, baixo investimento na cultura e, consequentemente, baixa produtividade. As necessidades de garantir a segurança alimentar da população do país e a potencialidade da agricultura brasileira para a geração de excedentes exportáveis levaram o governo a criar, em 1973, o Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro).
Implantado pelo Governo Federal, objetiva garantir a atividade dos produtores rurais quando os custos investidos em seus empreendimentos forem prejudicados por fenômenos naturais adversos, pragas e doenças. Entretanto, a continuidade do Programa em sua proposta original foi inviabilizada pelas altas taxas de sinistralidades, coberturas de perdas duvidosas, metodologia autuária inadequada e falta de recursos públicos para o programa. Esses fatores resultaram na falta de interesse das companhias seguradoras em investir na atividade agrícola e que somente foram contornados com a adoção de metodologias atuariais adequadas à complexidade do risco agrícola e a adoção de técnicas para a redução dos riscos de perdas na atividade agrícola.
A partir de uma parceria entre a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), foi implantado, por parte do Ministério, o Projeto de Redução de Riscos Climáticos na Agricultura a partir de outubro de 1995, o qual se constituiu no primeiro passo para a concretização do Zoneamento Agrícola no Brasil. A indução do uso de tecnologias proporcionadas pelo zoneamento de risco climático, a indicação de cultivares e o plantio direto passaram a orientar o Proagro.
Com o zoneamento, o Proagro passou a atuar com uma tabela atuarial diferenciada e tornou-se um forte instrumento de política agrícola do Governo Federal. A queda dos índices de perdas agrícolas e a rentabilidade positiva desde a implantação do zoneamento agrícola são os pontos forte do programa. A partir de decisões do Conselho Monetário Nacional, o Banco Central do Brasil baixou resoluções instituindo alíquotas diferenciais de adesão ao Proagro para produtores rurais que aderissem ao Zoneamento Agrícola. Para milho de sequeiro, a alíquota foi reduzida de 7% para 3,9%. Para os produtores do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), a alíquota foi única de 2% para todas as culturas contempladas no zoneamento. Houve uma redução da alíquota do adicional das lavouras de milho em 1% para os produtores que adotassem a técnica do plantio direto. As instruções normativas e as portarias do zoneamento encontram-se no site do Mapa.
O que é o zoneamento de riscos climáticos para a cultura do milho? É a integração de modelos de simulação de crescimento e desenvolvimento da cultura, base de dados de clima e solo, técnicas de análise de decisão e ferramentas de geoprocessamento. O sucesso alcançado pelo zoneamento deve ser creditado à qualidade cientifica dos trabalhos que deram sustentação ao modelo e à competência e vontade política das autoridades responsáveis pela sua implementação operacional. Foi um meio de colocar o conhecimento cientifico à disposição dos usuários. Integrando política de crédito e seguridade, orientações sobre períodos de semeadura por município, cultura/cultivar e tipo de solo, tem evitado as principais adversidades climáticas e possibilitado substancial redução no elevado percentual de perdas, anteriormente observados na agricultura brasileira.
O zoneamento pode ser visto também como uma bem sucedida experiência de aplicação de tecnologias fundamentadas em estudos agrometeorológicos. Uma vez que nenhum projeto ou programa pode alcançar seus objetivos sem acompanhamento e monitoramento de sua operacionalização, a partir de 1966 passou a ter o monitoramento das operações securitárias do Proagro no âmbito do zoneamento agrícola. Esse monitoramento mostrou, de imediato, os seguintes resultados: redução das solicitações de coberturas por eventos climáticos sinistrantes; inibição e redução drástica de solicitações fraudulentas; disponibilização de informações sistematizadas que viabilizam aperfeiçoamento constante do zoneamento e diminuição do aportes de recursos financeiros do Tesouro Nacional na cobertura de perdas agrícolas.
Dentre os benefícios advindos com a introdução do Zoneamento Agrícola para o setor agropecuário brasileiro, observam-se os resultados relativos à diminuição das perdas provocadas por eventos climáticos, aumento da produtividade das lavouras e recuperação do Proagro. Trata-se de processo dinâmico que, além de contemplar novas cultivares, prevê a inclusão de novas tecnologias, a atualização de informações climáticas e pedológicas e a caracterização agronômica de novos cultivares.
Os novos avanços do Zoneamento Agrícola incluem a criação do Sistema Agritempo de Monitoramento Agrometeorológico do Brasil (www.agritempo.gov.br), a sofisticação dos processos de modelagem das interações clima x planta x solos, os estudos de previsão de safra e a avaliação dos impactos das mudanças climáticas globais sobre as culturas agrícolas. Consultas sobre o Zoneamento Agrícola, em nível de cultura / município, podem ser efetuadas no site do Agritempo ou nas portarias do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (http://www.agricultura.gov.br).