Manejo Integrado de pragas em lavouras trangênicas (milho Bt)

Conteúdo migrado na íntegra em: 08/12/2021

Autores

Simone Martins Mendes - Embrapa Milho e Sorgo

José Magid Waquil

Paulo Afonso Viana - Embrapa Milho e Sorgo

 

No caso do milho Bt, disponível comercialmente hoje no Brasil, utilizaram-se toxinas com maior especificidade para os lepidópteros-praga (lagartas). Estão liberados para comercialização eventos que expressam diferentes toxinas, como o Yieldgard®, o Herculex® e o Agrisure®, além da combinação desses eventos com outros de tolerância a herbicida. No registro das empresas, as pragas-alvo incluem três espécies: a lagarta-do-cartucho do milho (LCM), Spodoptera frugiperda; a lagarta-da-espiga do milho (LEM), Helicoverpa zea; e a broca da cana-de-açúcar (BCA), Diatraea saccharalis. Entretanto, há dados na literatura indicando também a atividade dessas toxinas sobre a lagarta-elasmo (LEL), Elasmopalpus lignosellus.

Indicações oriundas de usuários de campo relatam a atividade das toxinas do Bt também sobre a lagarta-militar, Mocis latipes. Portanto, os eventos hoje disponíveis no Brasil dão proteção contra as principais espécies de lepidópteros-praga do milho. As toxinas do Bt apresentam alta especificidade, sendo que mesmo dentro do grupo de insetos a atividade de cada toxina é diferenciada. A eficiência para algumas das espécies-alvo é bastante alta e pode dispensar totalmente a aplicação de defensivos. Entretanto, para a LCM, os dados indicam alguma variação na proteção oferecida às plantas.

Portanto, dependendo do híbrido, do evento GM e da intensidade de infestação, pode ser necessário controle complementar. Esta estratégia pode ser, inclusive, útil para o manejo da resistência, pois o controle dos sobreviventes no milho Bt com certeza contribuirá para a redução da seleção de raças resistentes. É importante lembrar que, para a toxina do Bt se tornar ativa, ela precisa ser ingerida pelo inseto; assim, o produtor certamente irá se deparar com algum sintoma de dano nas folhas do milho como, por exemplo, folhas raspadas.


Recomendações

Para a utilização do milho Bt, basta o produtor cumprir duas regras: a de coexistência,
exigida por lei; e a regra do Manejo da Resistência de Inseto (MRI), recomendada pela
Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio).

 

Coexistência

A regra exige o uso de uma bordadura de 100 m isolando as lavouras de milho transgênico das de milho que se deseja manter sem contaminação de transgênico. Alternativamente, pode-se usar uma bordadura de 20 m, desde que sejam semeadas 10 fileiras de milho não-transgênico (igual porte e ciclo do milho transgênico), isolando a área de milho transgênico.

 

Área de refúgio

A recomendação da CTNBio para o manejo da resistência de inseto é a utilização de área de refúgio. Esta recomendação é o resultado do consenso de que o cultivo do milho Bt em grandes áreas resultará na seleção de biótipos das pragas-alvo resistentes às toxinas do Bt.

Obviamente, o monitoramento da infestação das plantas também é importante, pois, dependendo do híbrido utilizado e da intensidade da infestação, o produtor pode precisar adotar medidas de controle complementares. No Brasil, a área de refúgio é a semeadura de 10% da área cultivada com milho Bt, utilizando híbridos não Bt, de iguais porte e ciclo, de preferência o seu similar não Bt. A área de refúgio não deve estar a mais de 800 m de distância das plantas transgênicas. Esta é a distância máxima verificada pela dispersão dos adultos da lagarta-do-cartucho no campo.

Todas as recomendações são no sentido de sincronizar os cruzamentos dos possíveis adultos sobreviventes na área de milho Bt com suscetíveis emergidos na área de refúgio. O refúgio estruturado deve ser desenhado de acordo com a área cultivada com o milho Bt. Para glebas com dimensões acima de 800 m cultivadas com milho Bt, serão necessárias faixas de refúgio internas nas respectivas glebas. Ainda segundo a recomendação da CTNBio, na área de refúgio é permitida a utilização de outros métodos de controle, desde que não sejam utilizados bioinseticidas à base de Bt.


Responsabilidade de execução da área de refúgio e riscos da não adoção

Nas embalagens de sementes de milho Bt, há um contrato através do qual o produtor, ao abri-las, assume a responsabilidade de seguir as normas de coexistência e as de manejo da resistência. Portanto, cabe ao produtor a responsabilidade do uso dessas regras. O principal risco do não uso da área de refúgio está na rápida seleção de raças das pragas-alvo resistentes às toxinas do Bt. Assim, o produtor que não utilizar a prática do manejo da resistência será, sem dúvida, a primeira vítima da quebra da resistência, não obtendo controle das pragas-alvo com os híbridos de milho Bt.

 

Seletividade a organismos não alvo e a inimigos naturais

A especificidade das toxinas do Bt resulta em alta seletividade na sua atividade, agindo apenas nas espécies-alvo. Assim, afeta menos a comunidade dos insetos que utilizam o milho como hospedeiro que a utilização de inseticidas convencionalmente utilizados, por exemplo. Essa seletividade inclui também a comunidade de inimigos naturais, abelhas e outros insetos como pulgões e tripes. Dados mostram que essas toxinas, nas formulações de inseticidas à base de Bt empregadas na agricultura, têm sido consideradas relativamente não tóxicas para abelhas, existindo, inclusive, uma formulação comercial para controle de traça-da-cera em favos de mel. Para predadores, como alguns percevejos e joaninhas, as pesquisas realizadas até o momento indicam ausência de efeito negativo sobre esses insetos.