Agricultura e Meio Ambiente
Principais voçorocas
Autores
Heloisa Ferreira Filizola - Embrapa Meio Ambiente
Marco Antonio Ferreira Gomes - Embrapa Meio Ambiente
René Boulet (in memoriam) - Institut de Recherche pour le Développement
O desenvolvimento dos processos erosivos é geralmente atribuído a mudanças ambientais induzidas pelas atividades humanas. Sulcos, ravinas e voçorocas presentes em grande parte do território brasileiro geralmente estão associados ao uso do solo, ao substrato geológico, ao tipo de solo, ao relevo e às características climáticas e hidrológicas. Trabalhos em desenvolvimento em áreas próximas às nascentes do Rio Araguaia, nos Estados de Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, têm mostrado que, com o incremento da agropecuária a partir dos anos 70, os processos erosivos lineares, em especial aqueles de grande porte, têm aumentado de maneira considerável e que até agora não foi possível encontrar soluções duradouras e de baixo custo para a estabilização das voçorocas existentes, já que os processos de gênese e evolução das mesmas são ainda pouco conhecidos.
Foto: René Boulet
Figura 1. Evolução da Voçoroca Chitolina.
Foi mapeado 196 erosões lineares de grande porte em uma área de 90 X 100km, nas nascentes do Rio Araguaia. Destas, a maior parte evoluiu de maneira gradativa e sua gênese e evolução estão ligadas ao uso inadequado do solo. Nas fotos aéreas de 1964 e de 1977, não foi observada nenhuma voçoroca ou ravina de grande porte na região, o que significa que elas apareceram com o desenvolvimento agropecuário.
Foto: Renato Moreira
Figura 2. Localização de voçorocas e ravinas de grande porte (em vermelho), nas nascentes
do Rio Araguaia.
Um trabalho desenvolvido em parceria com a Fundação Emas, nas áreas das nascentes do Rio Araguaia, permitiu que se tomasse contato com o problema e tivesse maior conhecimento das grandes erosões lineares da região, das quais algumas serão apresentadas aqui, a título de exemplos.
Voçoroca Olho d’Água: comporta dois braços, muito compridos e profundos. No braço direito, com mais de 800m de extensão e 30m de profundidade, o solo, na extremidade da cabeceira, é arenoso com até 1,90m de profundidade e argilo-arenoso a partir de 2,50m. Na margem esquerda deste braço, a textura é argilo-arenosa desde 20 a 60 cm de profundidade. Na margem da direita, a textura é arenosa. No braço da esquerda, com mais de 500m de extensão, a margem esquerda é argilo-arenosa desde 20 cm de profundidade e sobre várias centenas de metros de extensão a partir da cabeceira.
Isso parece mostrar que a textura não tem influência determinante sobre o crescimento longitudinal destas voçorocas e que são outros os principais fatores atuantes. As paredes da voçoroca não mostram cicatrizes de desmoronamentos recentes, dando a impressão que a voçoroca Olho d’Água está praticamente parada. Por outro lado, um morador do local conta que, no momento da abertura do braço da esquerda da Olho d’Água em 1983, sua casa foi invadida por 50 cm de lama, indício de uma gênese catastrófica.
Na Fazenda Roda Viva existe uma grande voçoroca (> 400m de extensão), instalada num material muito arenoso, denominado localmente de areia. Na cabeceira desta voçoroca existia uma ravina profunda que foi fechada na estação de seca do ano de 2000. Em março de 2001, foi observado que a ravina não estava se reconstituindo, mas a voçoroca continua funcional, alargando-se, já que a saída do lençol provoca o desmoronamento das paredes sob o efeito do piping e das águas de escoamento superficial.
Na Fazenda Morro Limpo, foram observadas várias voçorocas que correspondem ao modelo clássico. Começam por uma ravina profunda de 3 a 4 metros onde o papel das águas superficiais - desmoronamento do topo das paredes - é bastante perceptível. Foram construídas curvas de nível à montante da cabeceira das ravinas, que são refeitas a cada dois anos. Em uma das ravinas, foi construída uma barragem de terra que parece segurá-la. Mais à jusante pode-se observar a passagem da ravina à voçoroca por causa da saída do lençol no fundo da voçoroca. Lá, o problema da contenção muda por causa da intervenção do lençol. Foi feita uma barragem que foi destruída porque a água do lençol freático desestabilizou sua base.
Foto: Heloisa Filizola
Figura 3. Passagem de uma raviana a voçoroca
Na Fazenda da Empresa Sementes Granada existe uma grande e profunda voçoroca instalada num material arenoso a areno-argiloso. Segundo um dos proprietários, existia inicialmente uma nascente que abastecia uma pequena represa onde havia uma roda de água. Em 1988, chuvas muito fortes derrubaram a represa e a roda de água foi colocada diretamente na nascente. Desenvolveu-se, então, uma voçoroca que progrediu 300 metros em 60 dias. Na estação seca de 1990, foi construída uma grande barragem para conter a voçoroca. A barragem estourou em agosto do mesmo ano, ainda na estação seca, o que mostra que foi o lençol freático e não as chuvas, o responsável pela destruição da barragem. Após o acidente, foram construídas curvas de nível altas ao redor da voçoroca.
Foto: Heloisa Filizola
Figura 4. Vista parcial da voçoroca Granada.