Território Mata Sul Pernambucana
Centro Sabiá
Autor
Alexandre Henrique Bezerra Pires - Consultor autônomo
O Centro de Desenvolvimento Agroecológico Sabiá é uma Organização Não Governamental, fundada em 09 de julho de 1993 por agricultores e agricultoras, técnicos e técnicas motivadas pelos desafios políticos, socioeconômicos e ambientais que circundam a agricultura familiar na região Nordeste do Brasil. Para o enfrentamento desses desafios adotou-se os princípios da agroecologia como orientadores político-metodológicos de sua ação. É uma associação civil de direito privado sem finalidades econômicos, de natureza técnico-ecológica e educacional, e tem como missão “Plantar mais vida para um mundo melhor, desenvolvendo a agricultura familiar agroecológica e a cidadania”.
Para cumprir a sua missão, atua pautada pelos seguintes eixos estratégicos, que compõem o seu Planejamento Estratégico Institucional 2009-2011:
1. Fortalecer processos de produção da agricultura familiar para a transição agroecológica, contribuindo para a soberania, à segurança alimentar e nutricional, a melhoria de trabalho e renda das famílias agricultoras e o combate às desigualdades sociais de classe, gênero, raça e geração.
2. Fortalecer o trabalho com grupos de mulheres e comunidades quilombolas na perspectiva de gênero e da geração de trabalho e renda.
3. Juventude protagonizando ações agroecológicas e contribuindo com a melhoria da vida nas dimensões política, social e ambiental no campo.
4. Participação efetiva nos espaços locais, regionais e nacionais de discussão e elaboração de políticas públicas para a agricultura familiar em redes e parcerias.
5. Comunicação promovendo a visibilidade institucional na perspectiva de uma agenda pública que fortaleça a agricultura familiar e a agroecologia.
6. Desenvolvimento institucional organizacional e de gestão fortalecidos a partir de valores sociais e políticos do trabalho.
A prática institucional é de assessoramento aos processos de disseminação da atividade agroflorestal, que são sistemas de produção que imitam a natureza, deixando o solo sempre coberto pela vegetação com grande diversidade de plantas, promovendo o equilíbrio do sistema e reduzindo problemas de pragas e doenças, o que evita o uso de insumos agroquímicos, bem como os processos de erosão. Na agrofloresta, há produção diversificada de boa qualidade ao longo de todo o ano, pois além das culturas sazonais há uma diversidade de árvores frutíferas que produzem em meses diferentes, de modo que quando está acabando a safra de algumas espécies outras estão iniciando seus ciclos produtivos. A agrofloresta depende de fatores como a observação das famílias agricultoras, do planejamento de área que define o que será implantado, das práticas de manejo, do aprendizado como a natureza recupera e recompõe a vegetação nativa.
O Centro Sabiá atua em todo o território nacional, no entanto nas atividades práticas de desenvolvimento local, com destaque para a difusão da agrofloresta, concentra a sua configuração geográfica no Estado de Pernambuco em 47 municípios das regiões da Mata, Agreste e Sertão. Na Zona da Mata, a atuação acontece em sete municípios; no Agreste, em 34, e no Sertão, em seis. Atualmente, um total de 2.000 famílias agricultoras são assessoradas nos processos de produção, beneficiamento e comercialização; bem como 24 associações de agricultores nos processos organizativos e na elaboração, negociação e execução de projetos do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) junto à Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Também são acompanhadas sete feiras agroecológicas, nas quais as famílias comercializam seus produtos diretamente ao consumidor; apoio a implantação e o funcionamento de unidades familiares e comunitárias de beneficiamento da produção; integra a Rede do Algodão Agroecológico do Nordeste, na perspectiva do resgate da cultura do algodão e do comércio justo; assessora o desenvolvimento de Fundos Rotativos Solidários que apóiam a criação de pequenos animais na região do semiárido; acompanha grupos de jovens e mulheres; promove estágios de vivência, para estudantes de escolas técnicas e universidades, em áreas agroflorestais de famílias agricultoras assessoradas.
O Centro Sabiá também possui como estratégia institucional a interação com diversos setores da sociedade civil, na perspectiva de potencializá-la para ser autônoma e participativa, vivendo em harmonia com a natureza e desenvolvendo ações inovadoras e sustentáveis. Essas ações são realizadas junto a jovens, mulheres e homens no âmbito da agricultura familiar, contribuindo com a construção de um modelo de desenvolvimento local sustentável. Nesse sentido, o Centro Sabiá acredita na capacidade de articulação e mobilização política da sociedade civil, fazendo parte da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) (www.agroecologia.org.br), da Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA) (www.asabrasil.org.br), Rede ATER Nordeste (esta rede congrega congrega 13 entidades do Nordeste em torno do debate sobre a construção do conhecimento agroecológico, quais sejam: AS-PTA, Apaeb, Ascoob, Assocene, Repart, Cetra, Centro Sabiá, Caatinga, Diaconia, MOC, Patac, Sasop e Esplar) e da Rede de Agroecologia da Zona da Mata (Rama). Também está presente em conselhos de políticas públicas na perspectiva do controle social e da proposição de políticas na perspectiva do desenvolvimento rural sustentável como é o caso da participação no Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional de Pernambuco (Consea-PE), representando a ASA-PE.
Entendendo que o estabelecimento de alianças fortalece as iniciativas, o Centro Sabiá mantém parceria na Zona da Mata com a Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Pernambuco (Fetape), Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), Centro das Mulheres do Cabo, Comissão Pastoral da Terra (CPT), Cáritas Regional Nordeste 2, Ceas Rural e com prefeituras, principalmente, por meio das secretarias municipais de educação e de agricultura.
Com ações no âmbito estadual, foi estabelecida uma forte parceria com a ONGs Caatinga (www.caatinga.org.br) e Diaconia (www.diaconia.org.br), em diversos campos de atuação como gestão administrativa e financeira, metodologia de trabalho com agricultores familiares, com jovens rurais especialmente.
O contexto socioeconômico da Zona da Mata Pernambucana convive com as heranças históricas da ainda predominante monocultura da cana-de-açúcar, tendo como resultado um quadro de agravamento das desigualdades socioeconômicas, calcado em vários fatores, entre eles a concentração fundiária, precarização do trabalho assalariado, a alta incidência de doenças, corpos d’água contaminados, redução drástica da cobertura vegetal original e da biodiversidade, com consequente situação de insegurança alimentar, violência generalizada, mais especialmente contra as mulheres e jovens. A estrutura fundiária concentrada resultou ao longo das duas últimas décadas em diversos conflitos agrários. Segundo a Comissão Pastoral da Terra, somente em 2009, havia no estado 27 conflitos de terras, sendo 12 deles na Zona da Mata, envolvendo 2.437 famílias.
A luta pela terra na região vem provocando grandes mudanças na estrutura agrária, com várias áreas de assentamentos rurais, onde a alternativa de produção predominante continua sendo a monocultura da cana-de-açúcar que reforça o quadro acima descrito e coloca como desafio a construção de alternativas para o desenvolvimento sustentável nestas áreas. A assessoria técnica aos agricultores e agricultoras assentados(as) coloca-se como elemento estratégico para dinamizar estes processos de desenvolvimento, no entanto várias fragilidades têm sido identificadas na execução desta política, seja em relação à sua abrangência, continuidade, metodologia e perspectiva de desenvolvimento adotado, que se reflete nas práticas e sistemas de produção implantados e seus impactos na vida das famílias agricultoras e do meio ambiente.
Esta região foi coberta originalmente por uma densa vegetação úmida, Mata Atlântica, de acordo com o Ibama este bioma é a quinta área mais rica em espécies endêmicas do mundo e a área mais ameaçada pela ação humana. Em Pernambuco, a floresta original na região cobria uma área de 56.400 m2 e hoje restam cerca de 2.000 km², que corresponde a menos de 4% da floresta original. Investigações preliminares sugerem que, se forem excluídos os ecossistemas associados como manguezais, restingas, zonas úmidas de altitude, o percentual de floresta ombrófila densa não chega a 2% de sua cobertura original. Restam apenas fragmentos desconectados. Esta redução na área de Mata Atlântica no Estado trouxe impactos diretos no regime de chuvas na região, conservação das nascentes e cursos d’água, proteção de solos e na biodiversidade.
É no contexto de conflitos, que a metodologia utilizada pelo Centro Sabiá, busca envolver todos os sujeitos do núcleo familiar em torno de uma proposta de sistema produtivo a partir da agrofloresta, buscando construir nas atividades de planejamento da propriedade, responsabilidades e participação nos lucros monetários para todos. As atividades de manejo do sistema agroflorestal, de beneficiamento e a comercialização dos produtos, têm demandado uma maior disponibilidade de mão de obra familiar. Essa constatação vem da própria experiência das famílias agricultoras, cujos sistemas produtivos já atingiram altos níveis de produtividade, o que acaba gerando mais oportunidade de trabalho, principalmente para os jovens, e evitando dessa forma os processos de êxodo.
A diversidade produtiva dos sistemas agroflorestais, tem garantido para as famílias agricultoras um bom nível de regularidade na produção, de modo que conseguem ter alimentos durante todo o período do ano. Além de garantir uma alimentação diversificada e permanente, o manejo da agrofloresta também garante a produção de madeira para as necessidades energéticas do sistema de produção, o beneficiamento e a comercializar os produtos in natura o ano inteiro, respeitado o princípio da sazonalidade, mantendo também as condições mínimas para sua manutenção nos mercados, sejam as feiras agroecológicas, a venda na comunidade ou a comercialização no mercado institucional.
Foto: Alexandre Pires, 2011
Figura 1.Colheita da carambola em cultivo agroecológico.
Foto: Alexandre Pires, 2011
Figura 2. Feira Agroecologica de Rio Formoso, PE.
Foto: Alexandre Pires, 2011
Figura 3. Produção de Mudas - Assentamento Amaraji- Rio Formoso