Ambiente externo

Contexto Contexto

O mundo passa por grandes transformações em todos os setores da economia e da sociedade. A interseção de desafios complexos, como a crise climática, a recuperação da pandemia de covid-19 e os conflitos geopolíticos, tem implicações significativas para os sistemas agroalimentares, para a agricultura nacional e para os mercados dos produtos agropecuários brasileiros, apresentando tanto desafios quanto oportunidades.

No plano doméstico, o Plano Plurianual (PPA), principal instrumento de planejamento de médio prazo do governo federal, já foi renovado para os próximos 4 anos – PPA 2024-2027 (Brasil, 2023f) –, ressaltando o fortalecimento da agropecuária sustentável com agregação de valor, em três programas sob a responsabilidade do Ministério da Agricultura e Pecuária: a) Programa Agropecuária Sustentável; b) Defesa Agropecuária; e c) Pesquisa e Inovação Agropecuária. Além disso, o novo Programa de Aceleração do Crescimento (Novo PAC) (Brasil, 2023a), oficialmente lançado em 2023, prevê investimento de R$ 1,7 trilhão em 4 anos, com previsão de cerca de R$ 1 bilhão direcionado para investimentos em modernização da infraestrutura da Embrapa, trazendo oportunidades para a Empresa.

Em 2023, também foram criados ou retomados programas de governo que envolvem diversos ministérios, direcionados ao desenvolvimento sustentável e ao incremento da prosperidade e do bem-estar da população brasileira, focando na diminuição da insegurança alimentar, no desenvolvimento regional, na geração de emprego e renda e na transição energética. Por exemplo, o Plano de Transformação Ecológica (PTE) (Brasil, 2023e), lançado pelo Ministério da Fazenda, é composto por diversas ações estratégicas de grande relevância para a agricultura e para a pesquisa agropecuária, como a bioeconomia, a transição energética, a economia circular e reforço substancial ao Fundo Nacional Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).

Nesse sentido, com base nas prioridades do governo e em evidências contidas em documentos institucionais, estudos e publicações recentes e, ainda, na coleta de informações e percepções de atores internos e externos, a Embrapa apresenta a atualização do seu VII Plano Diretor da Embrapa (VII PDE). As dimensões analisadas no processo de atualização do VII PDE em 2023 incluíram as transformações globais que impactam os sistemas agroalimentares, seus efeitos nos setores agropecuário, florestal e agroindustrial brasileiros, e o potencial de contribuição da pesquisa e inovação agropecuária pública para o desenvolvimento sustentável.

Panorama atual da agricultura brasileira Panorama atual da agricultura brasileira

A agricultura brasileira é reconhecida como altamente competitiva e geradora de empregos, riqueza, alimentos, fibras e bioenergia para o Brasil e para outros países. Considerado de forma integrada (insumos, produção primária, agroindústrias e agrosserviços), o agronegócio é um dos setores que mais contribui para o crescimento do PIB nacional e que responde por 24,4% (Sumário…, 2023) da soma de todas as riquezas produzidas, 26,9% do total de ocupações (Esalq, 2023a) e 50% do faturamento das exportações brasileiras (Esalq, 2023b), chegou a US$ 82 bilhões no primeiro semestre de 2023 (Sumário…, 2023).

Analisando o desempenho do setor ao longo das últimas décadas, verifica-se que, de 1975 a 2023, a produção de grãos passou de 35,8 milhões de toneladas para cerca de 259 milhões de toneladas, um aumento de 624% (FAO, 2023a). Nesse mesmo período, a produção de carnes passou de 2,9 milhões de toneladas para 30,1 milhões de toneladas, um aumento de 933% (Estados Unidos, 2023). Já a produção brasileira de frutas passou de quase 14 milhões de toneladas para mais de 41 milhões de toneladas, registrando crescimento de 199% entre 1975 e 2023 (IBGE, 2023a). No mesmo período, a produção de pescado aumentou 81% (IBGE, 2023b). O setor florestal aumentou sua produção de lenha e madeira (inclusive para papel e celulose) em 177%, entre 1986 e 2022, com destaque para as espécies dos gêneros Pinus e Eucalyptus (IBGE, 2023c). A cafeicultura aumentou em 68% a sua produção nos últimos 40 anos (IBGE, 2023a). A produção de leite cresceu 4,4 vezes, passando de 7 bilhões de litros em 1975 para quase 35 bilhões de litros em 2022, e a produtividade aumentou 3,4 vezes no mesmo período (IBGE, 2023b).

O aumento da produção permitiu abastecer regularmente o mercado interno, com queda de 41,4% no custo da cesta básica (outubro/2023 em relação a dezembro/1975, na cidade de São Paulo) (Ipeadata, 2023), e dinamizou as exportações, passando-as de US$ 20,6 bilhões em 2000 para US$ 158,9 bilhões em 2022 (Brasil, 2023c). Para 2023, o valor bruto da produção está estimado em aproximadamente R$ 1,15 trilhão, apresentando crescimento em torno de 2,7% em relação ao valor de 2022 (Brasil, 2023d). 

A produção de grãos foi projetada em mais de 307 milhões de toneladas em 2032, o que indicaria um aumento de cerca de 48 milhões de toneladas sobre a produção atual do Brasil. Nos próximos 10 anos, estima-se que a produção de carne bovina chegará a cerca de 9 milhões de toneladas e a de carne de frango a 16,6 milhões de toneladas (OECD, 2023).

Outras culturas apresentaram um aumento menor da produção, embora expressivo crescimento das suas produtividades. A produção de arroz cresceu quase 40% entre 1975 e 2022, enquanto seu rendimento aumentou 3,5 vezes no mesmo período. A quantidade produzida de feijão cresceu 25%, e o seu rendimento cresceu duas vezes. Especificamente no caso da mandioca, a quantidade produzida caiu 32%.

Vários desses produtos são gerados em Unidades Familiares de Produção Agrária1. A agricultura familiar representa 78% dos estabelecimentos agropecuários (3,7 milhões), 67% da população ocupada (10 milhões de pessoas), 23% do valor bruto da produção (VBP) (R$ 107 bilhões) e 23% da área (81 milhões de hectares) (IBGE, 2017). Esses produtores são responsáveis pela produção de 70% da mandioca, 64% do leite, 49% da banana, 22% do feijão e 11% do arroz no Brasil. Além disso, representam 74% dos estabelecimentos com aquicultura no País. Em 9,21% dos estabelecimentos agropecuários, é realizada produção extrativista vegetal (IBGE, 2017).

Em termos de gênero, o Censo Agropecuário de 2017 revelou que 1,7 milhão de mulheres estão na gestão ou codireção de propriedades rurais, cerca de 34% do total de estabelecimentos. Em relação à cor ou raça do produtor, 45,43% dos produtores têm cor ou raça branca, 8,37% preta, 0,62% amarela, 44,47% parda e 1,12% indígena (Embrapa, 2022).

Entre os fatores internos do setor agropecuário que foram e continuarão a ser fundamentais para o seu desempenho, destacam-se: boa disponibilidade e distribuição de recursos naturais no território e extensas áreas que podem ser recuperadas para produção agropecuária ou florestal, nos diferentes biomas; políticas públicas de incentivo e apoio ao setor; produtores empreendedores, competentes e resilientes; e tecnologia agropecuária tropical e subtropical desenvolvida e aplicada no País.

Os dados destacam o potencial, o dinamismo e a inserção de segmentos importantes da agricultura brasileira no mercado doméstico e global. Nesse contexto, a identificação contínua de oportunidades e desafios é fundamental para direcionar a estratégia da pesquisa dos atores públicos e privados dos setores agropecuário, aquícola e florestal para os próximos anos.

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1 Unidade Familiar de Produção Agrária (UFPA) – conjunto de indivíduos composto por família que explore uma combinação de fatores de produção, com a finalidade de atender à própria subsistência e à demanda da sociedade por alimentos e por outros bens e serviços, e que resida no estabelecimento ou em local próximo a ele (Brasil, 2017a). 

Grandes transições globais: oportunidades e desafios Grandes transições globais: oportunidades e desafios

Emergência climática

Com o aumento da temperatura global em 1,09 °C até 2020, em comparação ao período pré-industrial (IPCC, 2023), preconiza-se a neutralidade de emissões de CO2 e a forte redução em outros gases de efeito estufa (GEEs), com o objetivo de limitar os efeitos da mudança do clima. O esforço para limitar o aquecimento global induzido pelo homem em linha com o Acordo de Paris exige reduzir emissões cumulativas de CO2 (dióxido de carbono), atingindo pelo menos a neutralidade (zero emissões líquidas de CO2 ), juntamente com fortes reduções em outras emissões de gases com efeito de estufa, em particular o CH4 (metano) até a metade do século (IPCC, 2021).

Análises do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) apontam ainda que países tropicais são mais vulneráveis aos impactos da mudança do clima, enquanto os países de clima temperado poderão incorporar novas áreas agrícolas. Segundo o relatório Mudanças Climáticas e Terra, as atividades agrícolas em regiões tropicais poderão ser severamente afetadas, com a previsão de aquecimento com potencial de resultar no surgimento de condições climáticas sem precedentes até meados e finais do século XXI, caso as emissões antrópicas de GEEs sigam uma tendência média ou superior de elevação (IPCC, 2019).

Com o Acordo de Paris, estabelecido em 2015, países desenvolvidos e em desenvolvimento assumiram compromissos de redução de emissões de GEEs. O conjunto desses compromissos deverá ser alcançado mediante esforços conjuntos da sociedade, envolvendo o setor privado, por meio da mudança de processos produtivos e do suporte ao desenvolvimento científico e tecnológico, com investimentos em pesquisa e novas tecnologias; e a sociedade, por meio da mudança de comportamentos que estimulem e catalisem políticas públicas convergentes com a Agenda 2030 e seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) (OECD, 2018).

Em termos de GEE, a agricultura global é responsável pela emissão de 10,4 Gt CO2 eq (gigatoneladas de dióxido de carbono equivalente), o que corresponde a 18% das emissões totais, ficando atrás dos setores de energia e indústria. O uso da terra, a mudança no uso da terra e a silvicultura são responsáveis por 38%, a fermentação entérica na pecuária por 29%, o cultivo de arroz por 9,6% e a aplicação de fertilizantes sintéticos por 4% das emissões da agricultura (Boehm et al., 2023). 

Outrossim, a agricultura tem papel fundamental no apoio ao cumprimento dos compromissos assumidos de adaptação aos impactos negativos da mudança do clima e descarbonização da economia (Brasil, 2023b). Os desafios estabelecidos pelo Brasil, em sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês) revisada, demandarão do setor agrícola investimentos consistentes em adaptação aos impactos negativos da mudança do clima consorciados com planos estratégicos e sistemáticos de descarbonização da produção, os quais resultem em aumento de eficiência, competitividade e adequação às normas nacionais de proteção ambiental.

O investimento em ciência, tecnologia e inovação é essencial diante das necessidades: mais capacidade adaptativa e resiliência às flutuações do clima, e menos emissão de GEEs; alta rastreabilidade dos produtos e processos; e atenção primária ao ambiente e potenciais impactos diretos e indiretos associados à atividade produtiva. Iniciativa relevante de estratégia convergente entre sustentabilidade e mitigação de emissões com interface transversal entre setores da economia é a Política Nacional de Biocombustíveis (Renovabio), Lei nº 13.576, de 26 de dezembro de 2017 (Brasil, 2017b), que institui um inovador instrumento de mercado de Créditos de Descarbonização (CBIOs) transacionado na Bolsa de Valores. A Renovabio visa promover a descarbonização dos sistemas produtivos e gerar renda adicional para os produtores.

Como parte dos compromissos assumidos no Acordo de Paris, o Brasil atualizou as metas do Plano ABC+ do Ministério da Agricultura e Pecuária e estima-se que investimentos em pesquisa e inovação serão estratégicos para apoiar esse desafio. Para o período 2021 a 2030, o objetivo é ampliar as práticas para recuperação de pastagens degradadas em 30 milhões de hectares (Mha), o sistema de plantio direto em 12,5 Mha, a integração lavoura-pecuária-floresta em 10 Mha e as florestas plantadas em 4 Mha, entre outras (Brasil, 2021b). Se alcançadas, as metas serão responsáveis pela mitigação de um total de 1.076 milhões de Mg CO2 eq.

Deve-se observar, entretanto, que, para a implementação de sistemas de produção sustentáveis, é necessário incentivar boas práticas de produção agropecuária, não só para reduzir as emissões de GEEs, mas também para conservar os recursos naturais (solos, água, biodiversidade e florestas naturais), garantindo a produção futura. O combate à erosão, a recuperação de solos degradados e a manutenção dos mananciais de água, das florestas naturais e da biodiversidade são prioridades que devem nortear as ações dos produtores rurais e são diretrizes de políticas públicas e acordos globais, com destaque para a Agenda 2030 e os 17 ODS (Nações Unidas, 2023c).

Os seis biomas brasileiros (Amazônia, Caatinga, Cerra- do, Mata Atlântica, Pampa e Pantanal) demandam estudos e ações específicas, levando em consideração que são interligados e interdependentes. Destaca-se a Amazônia, em razão da sua dimensão e das oportunidades para o desenvolvimento da agricultura sustentável, os serviços ecossistêmicos relacionados à floresta e o potencial da sociobioeconomia. A atenção das organizações ambientais e da opinião pública nacional e internacional aos desmatamentos e queimadas ilegais demanda ações de inteligência, articulação e comunicação, de modo a garantir a preservação dos recursos naturais e não comprometer as futuras exportações agrícolas ou os serviços ecossistêmicos da floresta. Tecnologias e conhecimentos são fatores essenciais para promover o desenvolvimento sustentável da região, fomentando uma bioeconomia sustentável e inclusiva e, principalmente, o aproveitamento dos recursos autóctones regionais.

Em relação ao uso de bioinsumos como alternativa aos insumos de origem fóssil, a meta estabelecida visa aumentar em 13 Mha a área de sua aplicação, tanto para melhorar a fertilidade do solo e fixar nitrogênio, quanto para proteção de plantas contra pragas e doenças.

De fato, o valor total do mercado brasileiro de biodefensivos, a preços pagos pelos produtores, foi estimado em R$ 3,3 bilhões para a safra 2021/2022, um crescimento de 219% em relação a 2019/2020. Analistas do mercado, como o Instituto Croplifebrasil, apontam a expectativa de avanço estratégico em técnicas de controle biológico com projeção da S&P Global para 2030, com um volume de negócios na casa dos R$ 17 bilhões (Croplife, 2023). Os bioinsumos são produtos essenciais como alternativas aos produtos derivados de fontes fósseis, pois promovem a adaptação das culturas às mudanças climáticas e contribuem para a redução das emissões de gases de efeito estufa. Esses produtos devem ser integrados em práticas certificadas e remuneradas, que devem incluir créditos de carbono.

A crise climática traz ainda o alerta para o aparecimento de novas doenças, e grande parte delas são zoonoses transmissíveis entre seres humanos e animais. A última década proporcionou importantes lições sobre doenças, inclusive pandemias, e sobre seus impactos na saúde do planeta. Como concepção inovadora em saúde global, a Saúde Única (One Health) busca a integração entre as dimensões de saúde humana, animal, vegetal e ambiental, reconhecendo a indissociabilidade entre elas (World Health Organization, 2021). Isso é particularmente relevante para o entendimento e a compreensão dos vetores de emergência de doenças e da funcionalidade do equilíbrio ecológico, bem como para a dinâmica de perigos biológicos, químicos e físicos, e os eventos de transbordamento. A agenda de Saúde Única engloba a concepção, elaboração, desenvolvimento e implementação de políticas públicas e privadas integradas e eficazes para prevenir, responder e controlar doenças.

Essa agenda traz desafios e oportunidades para a pesquisa agropecuária no que concerne ao monitoramento de doenças zoofitossanitárias e ao desenvolvimento de métodos e produtos para prevenção, controle ou eliminação de tais doenças. Um outro grande desafio é a manutenção e conservação da biodiversidade e de outros ativos naturais que devem ser mais bem caracterizados e protegidos, como as fontes de água e a qualidade do solo. O avanço das atividades humanas tem contribuído para a alteração dos ecossistemas em todo o mundo e, consequentemente, para a perda de espécies e ativos naturais. A biodiversidade é uma fonte importante para o desenvolvimento de muitos produtos e serviços ecossistêmicos. Por exemplo, muitas espécies podem ser estudadas e utilizadas na produção de bioinsumos, sejam biofertilizantes, biopesticidas ou inoculantes. É ainda fundamental na manutenção da variabilidade genética de culturas e na estabilidade e no equilíbrio dos ecossistemas, devendo haver interesse especial na coleta, caracterização e conservação das espécies biológicas, quer em condições in situ quer ex situ ou on farm e em bancos de germoplasma.

Uma das iniciativas importantes para a conservação da biodiversidade refere-se aos pagamentos por serviços ambientais (PSA). No Brasil, com a aprovação da Política Nacional de Pagamentos por Serviços Ambientais (Brasil, 2021a), as iniciativas de PSA tendem a ganhar impulso e vão demandar levantamento, sistematização e modelagens de informações relacionadas aos serviços ambientais e ecossistêmicos.

 

Métricas e indicadores para o desenvolvimento sustentável

O volume de dados gerado está em crescimento em todos os setores da economia. Na agricultura, a organização de dados e informações e a elaboração de métricas e modelos que considerem os aspectos ambientais, sociais e econômicos terão importância estratégica no desafio de manutenção e abertura de mercados para os produtos brasileiros. Serão igualmente importantes para que políticas públicas sejam direcionadas e monitoradas, e também para que o Brasil seja capaz de reportar e demonstrar para o mundo suas estratégias para o atendimento aos Acordos Globais de Clima, Biodiversidade, entre outros. A demanda por metodologias para monitoramento das reduções das emissões de GEEs na agropecuária e por instrumentos e metodologias MRV (mensurável, relatável e verificável), por exemplo, é crescente. Surgem também iniciativas de comprovação e comunicação dos indicadores, como selos de sustentabilidade e processos e certificados de rastreabilidade. A avaliação do ciclo de vida indica a pegada de carbono ou a pegada hídrica de um determinado produto ou processo produtivo, agregando informações que serão usadas nas decisões dos consumidores e mercados. No âmbito dos recursos naturais, a grande massa de dados atualmente disponível aliada a uma crescente capacidade analítica permitem conhecer, caracterizar e avaliar a biodiversidade, o solo, a água doce, os oceanos e o clima com novas perspectivas. Os resultados dessas análises podem ser usados para aprimorar o conhecimento e as transformações em curso nos ecossistemas dos quais as sociedades dependem. Dados e indicadores consistentes também são importantes para o avanço da Agenda  ASG (aspectos ambientais, sociais e de governança; ESG em inglês) nas empresas e organizações, porque promovem modelos de negócios que valorizam questões ambientais, sociais e de governança, de forma holística. É uma resposta à crescente conscientização global sobre os desafios enfrentados pela sociedade e pelo meio ambiente, e passam a definir o valor de mercado das empresas, as certificações, o acesso a investimentos e a seguros. O cumprimento dessa agenda reconhece que, além do desempenho financeiro imediato, o bem-estar social e a proteção ambiental são cruciais para o sucesso a longo prazo das empresas públicas e privadas. 

 

Transição dos sistemas alimentares

O sistema alimentar inclui os recursos relacionados aos insumos, à produção, ao transporte, às indústrias de processamento e manufatura, ao varejo e ao consumo de alimentos, bem como os seus impactos no meio ambiente, na saúde e na sociedade (Nações Unidas, 2021). Trata-se, portanto, de uma visão sistêmica e que abarca a complexidade da produção de alimentos no mundo, com ação de diversos atores de forma organizada e engajada. Além disso, a conexão entre sistemas alimentares e mudanças climáticas está bastante clara, e a crise agravada pela pandemia mostrou que o mundo não pode manter os atuais padrões de produção e consumo de alimentos. O Brasil, como um país continental, megabiodiverso e um dos maiores produtores e exportadores mundiais de alimentos, precisa ter protagonismo nas discussões e ações relacionadas à transformação dos sistemas alimentares.

O maior de todos os desafios para a sociedade brasileira é diminuir o número de pessoas que sofrem de insegurança alimentar ou má nutrição no País. No período de 2020 a 2022, 10,1 milhões de brasileiros estavam em situação de fome, enquanto outros 21,1 milhões estavam em condições de insegurança alimentar grave, o que significa a falta de comida durante um dia ou mais. No total, 33,2 milhões de pessoas encontravam-se em situação de insegurança alimentar grave ou de desnutrição severa (FAO, 2023b).

Esse desafio está expresso no Objetivo 2: “Fome Zero”, dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, que preconiza “acabar com todas as formas de fome e desnutrição até 2030, garantindo que todas as pessoas – especialmente as crianças – tenham alimentos suficientes e nutritivos durante todo o ano” (Nações Unidas, 2023a).

Para garantir a segurança alimentar em todas as suas dimensões, respeitando-se as preferências alimentares e especificidades dos territóFoto: monticellllo (AdobeStock) rios, além de políticas públicas direcionadas a mitigar a insegurança alimentar, é preciso haver inovações que promovam aumento da produtividade, redução de custos de produção, controle de pragas e doenças, resiliência e adaptação às mudanças do clima, redução de perdas e desperdícios de alimentos, além de produção de alimentos seguros, nutritivos e diversificados para dietas saudáveis.

Um desafio relevante é reduzir o custo da cesta básica de alimentos para as famílias, objetivo que tem sido alcançado nos últimos 50 anos, em parte, pelas contribuições da pesquisa agropecuária. É preciso levar em consideração as possibilidades de redução de custos logísticos das cadeias de ciclo curto de produção/distribuição e redes agroalimentares de abastecimento, particularmente em áreas urbanas e periurbanas, que podem ser importantes na redução de desigualdades econômicas de áreas densamente habitadas, especialmente aquelas com risco de segurança alimentar e nutricional.

Sob a perspectiva do nexo alimentação-nutrição-saúde, o alimento deve prover, além da quantidade de calorias necessárias à manutenção da saúde, nutrientes balanceados para os diversos sistemas do organismo humano, promovendo a combinação de macro e micronutrientes adequada às necessidades e ao bem-estar de cada fase da vida dos indivíduos. Nesse aspecto, as pesquisas deverão se apoiar nas áreas de nutrigenômica e nutrigenética, enfatizando, também, o desenvolvimento de alimentos e dietas de baixo custo, utilizando partes de matérias-primas que atualmente não são aproveitadas e outros resíduos da produção e do processamento. A pesquisa científica pode contribuir para prover alimentos com composição enriquecida em nutrientes essenciais (biofortificados) e desenvolver alternativas para acompanhar as tendências de mercado de produtos alternativos à carne (plant-based e insetos) e novas fontes de proteínas vegetais com alto valor proteico (feijões, grão-de-bico e pulses em geral).

O crescimento de nichos de consumo de algas e produtos cultivados em biorreatores e impressos em 3D gera novas oportunidades de pesquisa e de negócios. Ainda, outras formas de produção que utilizam menos água e solo, tais como a agricultura urbana, cultivos protegidos, hidropônicos e aeropônicos, e agricultura em novos espaços e condições (cultivos/criações verticais e indoors, agricultura espacial), também merecem a atenção da pesquisa. Será importante aproveitar oportunidades de parcerias com associações profissionais (medicina, nutrição e outras), como as indústrias farmacêutica e de alimentos, de suplementos alimentares e de rações animais, buscando maior interface entre tecnologias e produtos para a saúde humana e os sistemas alimentares correlatos. Além disso, deverão ser realizados estudos que valorizem as raízes populares e o patrimônio alimentar e cultural regional, definindo certificações de qualidade, indicações geográficas e denominação de origem.

Também em conformidade com anseios de uma parcela dos consumidores e o crescimento previsto do mercado global de alimentos e bebidas orgânicos, a pesquisa deverá intensificar os trabalhos com agricultura orgânica e agroecológica. Esses sistemas não só podem fornecer alimentos livres de agrotóxicos, mas também têm o potencial de fortalecer a atividade de produtores familiares ou pequenos produtores. Além disso, podem facilitar a formação de arranjos periurbanos que encurtam os circuitos de produção- -consumo, promovendo a sustentabilidade.

Como forma de agregação de valor, é necessário promover o fortalecimento de agroindústrias, em todas as escalas de produção, buscando, ao mesmo tempo, o aproveitamento integral das matérias-primas e a geração de empregos e de renda nos locais em que elas são obtidas. A agroindustrialização é um vetor ímpar para valorização das vocações locais e regionais e estabelecimento de mercados nacionais e internacionais que podem gerar valor monetário substancial, sendo decisivos para o fortalecimento das bioeconomias regionais.

Esforços deverão ser intensificados para a realização de estudos visando ao conhecimento e ao aproveitamento sustentável de componentes da sociobiodiversidade brasileira para a consolidação de cadeias produtivas regionais com potencial para a inclusão socioprodutiva das comunidades locais, bem como para alcance de novos mercados, a exemplo das cadeias produtivas do açaí, do cacau e de outros produtos amazônicos.

Especificamente na Amazônia, entre 2017 e 2019, foram exportados 64 produtos oriundos de extrativismo florestal não madeireiro, de sistemas agroflorestais, de pesca e piscicultura e de hortifruticultura tropical, gerando receita anual de aproximadamente US$ 298 milhões, uma parcela ainda pequena (0,17%) quando se considera a movimentação mundial desses mesmos produtos (Coslovsky, 2021).

Uma outra vertente relevante é o aumento da escala de produção e a agregação de valor a cadeias produtivas bem organizadas, como as de carnes, laranja, soja e açúcar, que operam em escalas globais e contribuem para a segurança alimentar mundial. A tendência é a mesma para outras cadeias, como a do leite, da celulose, das frutas e outras em que o País experimenta acentuado crescimento. É importante considerar que o aumento da eficiência acarreta, potencialmente, a produção de excedentes de vários produtos agrícolas, o que, por sua vez, requer empenho do governo na manutenção da presença do produto brasileiro nos mercados externos, assim como na busca contínua por abrir novos espaços para destinação de tais produtos. Em relação à pesquisa e inovação, esse ambiente de negócios impõe preocupação constante no intuito de assegurar o atendimento de exigências cada vez maiores de qualidade do que é ofertado, considerando a segurança dos alimentos, a responsabilidade social e os aspectos ambientais associados aos sistemas de produção.

Relacionado a essa transição dos sistemas alimentares, há também um importante desafio para o País, que é o da inclusão socioprodutiva e diz respeito ao número de estabelecimentos com acesso restrito à tecnologia, ao crédito, à assistência técnica e aos mercados. Em grande parte, esses estabelecimentos compõem o contingente afetado pela pobreza rural no Brasil, cujos grupos mais vulneráveis são formados por mulheres, povos originários, comunidades tradicionais e uma parcela dos agricultores familiares. Em relação ao uso de tecnologias, 10% das propriedades rurais familiares com produção utilizam irrigação, 13% fazem correção do solo e 42% utilizam adubação (IBGE, 2017). Em relação ao acesso às tecnologias digitais, apenas 33% têm acesso à internet. Além disso, somente 18% recebem assistência técnica, o que representa um importante desafio ao setor.

Quando se apresentam os dados do Censo Agropecuário 2017 por estratificação de renda e participação no valor bruto da produção (VBP) dos estabelecimentos agropecuários – considerando três estratificações: extrema pobreza, baixa renda e média e alta renda –, os números mostram um cenário de forte concentração da renda e da produção. Enquanto 69% dos estabelecimentos classificados como em situação de extrema pobreza são responsáveis por apenas 4% do VBP e os 22% de baixa renda são responsáveis por 11% do VBP, os 9% de média e alta renda são responsáveis por 85% do VBP (Favareto et al., 2022).

Para enfrentar os desafios de inclusão socioprodutiva, é necessário considerar a heterogeneidade de situações existentes no País. Além disso, é fundamental que, aliados aos esforços para inclusão produtiva, haja outros que garantam a satisfação das necessidades básicas de saúde, infraestrutura e alimentação. Ao se ampliar o tema para inclusão socioprodutiva, pretende-se considerar não apenas o fortalecimento das capacidades econômicas e capacitação, mas as demais dimensões sociais, ambientais e características de cada local. Os desafios enfrentados nas áreas rurais demandam trabalho conjunto e coordenado entre diferentes áreas, instituições e atores e adaptado às necessidades e problemas regionais, territoriais e locais.

 

Transição energética

A crise energética em curso, a intensificação da emergência climática e as crescentes incertezas políticas em todo o mundo têm aumentado a pressão para acelerar a transição de uma matriz que utiliza fontes de energia com base em combustíveis fósseis para uma de base em fontes renováveis, em um esforço de reduzir as emissões de carbono. Como parte desse ambiente cada vez mais complexo e interconectado, a agricultura e todos os setores envolvidos na geração de produtos e na prestação de serviços a ela relacionados terão relevante participação na transição energética e na descarbonização dos meios de produção brasileiros.

O Brasil tem matriz energética diferenciada de todos os outros países no que se refere à utilização de fontes renováveis. Em nosso país, 47,4% da energia utilizada é obtida de fontes renováveis, enquanto no restante do mundo esse valor é, em média, de 14%. De acordo com o Balanço Energético Nacional (Empresa de Pesquisa Energética, 2022), em 2022, a energia gerada a partir da cana-de-açúcar (etanol e eletricidade) representou 15,4% de toda a energia consumida no Brasil, seguida pela energia gerada por hidrelétricas, que contribuiu com 12,5%. Por sua vez, a energia proveniente de lenha e carvão vegetal representou 9% do total, enquanto a energia de fontes renováveis como lixívia, biodiesel e biogás contribuiu com 7%. A energia eólica e solar representaram 2,3% e 1,2%, respectivamente.

Especificamente quanto às matérias-primas para geração de biocombustíveis, a pesquisa agropecuária tem buscado, por meio de melhoramento genético convencional ou biotecnológico (incluindo a edição gênica), aumentar a produtividade de biomassas para produção de etanol de primeira geração, como cana-de-açúcar, sorgo sacarino e milho, e de etanol de segunda geração, como capim elefante, sorgo energia e resíduos agroindustriais. Novas matérias-primas poderão ser estudadas e introduzidas na cadeia produtiva do etanol, citando--se o trigo, o triticale e outros cereais, a cana-do-reino, o bambu, o agave e outras espécies ricas em açúcares, amidos ou celulose. Para a produção de biodiesel, além das matérias-primas já utilizadas e que são objeto de estudos para aumento de produtividade e adaptação a diferentes ambientes produtivos, como a soja, o dendê e a canola, há novas fontes de óleos vegetais a serem exploradas, como camelina, carinata, macaúba, licuri, babaçu e outras provenientes da rica biodiversidade brasileira.

Com a perspectiva de aumento da utilização dos biocombustíveis etanol e biodiesel nas misturas com os combustíveis fósseis automotivos, haverá necessidade de incrementar a produção desses biocombustíveis, justificando a busca por matérias-primas de interesse e aplicação regionais. Isso também deverá acontecer para suprir a utilização desses mesmos produtos na fabricação de combustíveis avançados, como o bioquerosene de aviação e o biodiesel marítimo, e mesmo na produção de hidrogênio de baixo carbono e diesel renovável, chamados de “verdes”.

Ademais, a utilização de matérias-primas diferentes da cana-de-açúcar para a produção de etanol permitirá a disponibilização de maior quantidade de açúcares – sacarose, glicose e frutose – para os mercados interno e externo, lembrando as múltiplas utilizações que esses produtos têm nas indústrias alimentícias, farmacêuticas, de produtos dietéticos, entre outras. Da mesma forma, se a pesquisa obtiver outras oleaginosas que possam 17 ser utilizadas para a fabricação de biodiesel, parte da soja que atualmente é utilizada para esse fim será liberada, aumentando o volume desse produto que pode ser direcionado para o mercado externo, potencializando a obtenção de divisas internacionais.

Ainda pensando em estudos que levem ao aumento de fontes energéticas renováveis utilizadas no Brasil, diversas espécies florestais podem ser utilizadas para energia, a exemplo do eucalipto e do pínus, ou transformadas em carvão vegetal. Novas matérias-primas podem ter importância regional para abastecer grandes consumidores de energia fóssil, como os setores siderúrgico, metalúrgico e cimenteiro, bem como para substituir o carvão mineral em usinas termelétricas e outras instalações industriais. Tais matérias-primas podem ser produzidas em sistemas florestais, agroflorestais ou de integração lavoura-pecuária-floresta ou de recuperação de áreas degradadas. A pesquisa agropecuária poderá desenvolver e aprimorar sistemas desse tipo, não só para atender às demandas do Programa ABC+ (Brasil, 2023b), mas também para estabelecer parceria com associações setoriais ou mesmo empresas privadas que almejam diminuir a respectiva “pegada de carbono”.

Com a possibilidade de uso da energia elétrica gerada na propriedade e da comercialização do excedente [Resolução Normativa nº 482, de 2012, da Agência Nacional de Energia Elétrica (2012)], a pesquisa agropecuária pode criar alternativas para a integração de fontes energéticas tanto para pequenos quanto para grandes produtores, permitindo-lhes alcançar autonomia de energia pelo menos em parte de suas atividades. Nessa linha, existem os sistemas integrados de pecuária e cana-de-açúcar, em que o bagaço pode ser utilizado para queima ou para alimentação animal, e a utilização de resíduos vegetais e animais para a produção de biogás utilizado em geradores elétricos. Da mesma forma, outras fontes de energia, como a hídrica, eólica e solar, podem ser utilizadas nas atividades produtivas ou exportadas para a rede de distribuição.

Outros campos de conhecimento em que a pesquisa agropecuária terá importante contribuição são no desenvolvimento e na melhoria de processos produtivos e no aproveitamento de subprodutos e resíduos. No primeiro caso, podem-se incentivar as parcerias com a iniciativa privada para estudos envolvendo as novas matérias-primas, em situações que permitam estimular a produção local ou regional de biocombustíveis ou produtos derivados dos processos desenvolvidos. Há também a possibilidade da utilização do gás carbônico que vier a ser capturado a partir de tecnologias CCUS (Captura, Utilização e Armazenamento de Carbono, na sigla em inglês), que serão implantadas por diversas empresas ou consórcios nacionais ou multinacionais.

No aproveitamento de subprodutos e resíduos, devem-se explorar as possibilidades de modelos de produção em que se maximiza o aproveitamento das matérias-primas e da energia nelas contidas. A economia circular é conceituada como “um modelo de produção e consumo que envolve o compartilhamento, o arrendamento, a reutilização, o reparo, a reforma e a reciclagem de materiais e produtos existentes o maior tempo possível”. Dessa forma, o ciclo de vida dos produtos é estendido (Parlamento Europeu, 2023). De maneira geral, a economia circular preconiza o aproveitamento integral das matérias-primas e o conceito se aplica a todas as cadeias produtivas, com a diminuição expressiva da quantidade de resíduos depositados em aterros sanitários, processados em estações de tratamento ou dispostos de outras formas no meio ambiente. Um componente importante da economia circular é a digestão anaeróbica para produção de biogás e biometano e de biofertilizantes em diversas situações de cadeias produtivas animais e vegetais. Além disso, destaca-se a utilização desses produtos em substituição aos combustíveis e fertilizantes de origem fóssil.

A pesquisa agropecuária poderá ainda contribuir para o desenvolvimento de modelos de planejamento que permitam minimizar, e até mesmo eliminar, a possível competição Com a no uso do solo e de outros recursos para a produção de alimentos e de biocombustíveis. A análise da realidade brasileira com seus múltiplos aspectos e a implementação de soluções específicas para cada situação regional poderão levar ao aumento da eficiência econômica e ambiental na obtenção conjunta dos produtos destinados à alimentação humana e animal e dos biocombustíveis, com a ampliação do conceito de biorrefinarias e de processamento integrado das matérias-primas e utilização produtiva dos subprodutos e dos resíduos, no contexto da circularidade.

Transformação digital

A transformação digital pode ser definida, numa perspectiva mais ampla, como um processo de mudança fundamental na sociedade e nas diferentes indústrias pela utilização de tecnologias digitais (Agarwal et al., 2010; Majchrzak et al., 2016). No âmbito organizacional, Hess et al. (2016) sugerem que as empresas devem encontrar maneiras de inovar e criar estratégias que considerem a transformação digital como uma forma de impulsionar e melhorar seu desempenho operacional. Vial (2021), após uma extensa revisão da literatura, considerou a transformação digital como um processo que visa melhorar uma entidade pela mudança significativa, combinando informação, computação, comunicação e conectividade. 

É dentro desse contexto amplo que está inserido o processo de transformação digital da agricultura, que se refere ao uso de tecnologias digitais para otimizar as práticas agrícolas e os serviços, desde a gestão até a distribuição ao consumidor final. Os objetivos são aumentar a eficiência A internet das coisas é utilizada na integração de dispositivos conectados à internet para monitorar e controlar equipamentos agrícolas, colheitas e a produtividade, reduzir os custos, promover a sustentabilidade e acessar mercados, entre outros. Para que esses objetivos sejam alcançados, será preciso ampliar significativamente a conectividade no campo e promover a capacitação de produtores e demais elos das cadeias, de modo a não aumentar o hiato já existente entre pequenos e grandes produtores. Segundo o Censo Agropecuário de 2017 (IBGE, 2017), cerca de 70% dos estabelecimentos rurais do País ainda não possuíam nenhum tipo de conexão com a internet.

As oportunidades de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) surgem no uso de sensores, drones e satélites para coleta de dados de condições de solo, clima, desenvolvimento das plantas e dos animais, identificação de pragas e doenças para uma gestão mais precisa das operações agrícolas. A agricultura de precisão se apoia no uso de GPS, automação e análise de dados para otimizar o uso de recursos, como água, fertilizantes e pesticidas, reduzindo custos e minimizando o impacto ambiental.

A internet das coisas é utilizada na integração de dispositivos conectados à internet para monitorar e controlar equipamentos agrícolas, colheitas e animais, baseando a tomada de decisões em dados em tempo real. Máquinas e robôs autônomos são utilizados no plantio, na colheita e na manutenção, aumentando a eficiência e mitigando a escassez de mão de obra. Os produtores têm diversos aplicativos disponíveis para apoiar a gestão das atividades agropecuárias. Concomitantemente, o sistema de assistência técnica e extensão rural do País caminha para o uso intensivo de canais digitais.

Ao mesmo tempo em que impacta a agricultura, a evolução tecnológica na transformação digital também abre novas perspectivas para o desempenho de ações de PD&I. Nesse mesmo contexto, a adoção de ferramentas de ciência de dados amplia a capacidade de qualificar os dados e resultados de pesquisa e melhora o potencial analítico, de modo a permitir interpretar, organizar e processar grandes volumes de dados a partir de informações existentes.

Diante disso, destaca-se que as discussões sobre a transformação digital vão além daquelas relacionadas à conectividade ou automação de atividades da agricultura no meio real. Elas também estão relacionadas às transformações na forma como o conhecimento é produzido e aplicado no campo. Referem-se a uma necessidade de repensar as formas e os meios de articular, colaborar e conduzir a atividade de pesquisa, assim como as formas e os meios de comunicação e valoração do conhecimento técnico-científico, a fim de gerar inovação e impacto, com a agilidade e efetividade requeridas em um mundo contemporâneo pós-pandemia.

Essa transformação na forma de produzir conhecimento e tecnologia requer importantes investimentos em infraestrutura de tecnologia da informação e em recursos humanos (capacitações e contratações) e ampla revisão e melhoria dos processos organizacionais, com consequente mudança de cultura organizacional. Trata-se, portanto, de uma ação estratégica, que depende de decisões e ações de curto e médio prazo para gerar os resultados esperados no médio e no longo prazo. Consequentemente, reforça-se a importância de incorporar, de forma robusta, a transformação das formas de fazer pesquisa e transferência de tecnologias. A inclusão dos empregados na era digital depende de programa de capacitação continuada, planejada e de investimentos no capital intelectual da Embrapa, potencializando a inteligência coletiva para o aumento da eficiência e da efetividade institucional.