Entre os dias 15 e 19 de julho, aconteceu em Jaguarari, Semiárido Baiano, o 1º Encontro do Comitê da Rota do Bode, uma articulação entre o Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matrizes Africanas (FONSANPOTMA) e Comunidades Tradicionais Fundo de Pasto, para dialogarem sobre a construção de canais de comercialização de caprinos, de forma a garantir a soberania e segurança alimentar e nutricional para os Povos de Matriz Africana. Esses povos tem em sua cultura alimentar a sacralização dos caprinos e sua carne como a principal fonte de proteína animal consumida. O encontro também teve etapas em Petrolina (PE), e nos municípios de Casa Nova e Juazeiro (BA) e envolveu diferentes instituições governamentais das esferas federal, estadual e municipal, cooperativas, associações e sindicatos rurais. A Embrapa Alimentos e Territórios foi representada pelo Chefe de Pesquisa e Desenvolvimento Ricardo Elesbão e pelo analista Fabrício Bianchini. Também estiveram presentes os pesquisadores Jorge Farias e Lucas Fonseca (Embrapa Caprinos) e Evandro Holanda, representando a Diretoria de Pesquisa e Inovação da Embrapa (DEPI). A “Rota do Bode” é uma articulação realizada pelo FONSANPOTMA, entidade que representa os Povos de Matriz Africana nos diferentes conselhos nacionais, como o CONSEA e o CONDRAF, e busca garantir a segurança alimentar e nutricional dos POTMAs e, prioritariamente, o acesso aos caprinos, atualmente comercializados em péssimas condições sanitárias devido ao transporte inadequado e ilícito, além do alto valor cobrado pelos atravessadores. A pauta principal do encontro foi a construção de um canal de comercialização justa e solidária, que integre as associações das Comunidades Tradicionais Fundo de Pasto da região Semiárida baiana, com as Unidades Territoriais Tradicionais dos Povos de Matriz Africana e Comunidades de Terreiro, presentes em todo o país. A viabilidade da caprinovinocultura na região foi uma das pautas levadas pelo Coletivo Enxame, coletivo político de Juazeiro (BA) que reúne pessoas de diferentes segmentos em pautas como defesa do meio ambiente, educação, cultura, juventude, mulheres e convivência com o semiárido. “O Coletivo Enxame busca contribuir a partir do que compreendemos sobre convivência com o semiárido, no qual entendemos que é viável desenvolver a caprinovinocultura na região sem deixar de se preocupar com a garantia da existência da nossa Caatinga”, afirma a integrante Érica Daiane. “Defendemos que essa Teia venha contemplar de forma democrática todos os povos e comunidades tradicionais”, complementa. Parceria com a Embrapa - As primeiras reuniões da Embrapa com o Fonsanpotma ocorreram em janeiro de 2023, por ocasião do VIII Fórum Social Mundial. Na época, a Embrapa foi convidada para pensar numa estratégia de trabalhar a qualidade de alguns alimentos-chave para os povos e comunidades de matriz africana. Leia a matéria aqui. Para Bianchini, o objetivo da “Rota do Bode é garantir o bem estar dos animais, desde sua criação tradicional e agroecológica em áreas extensivas na Caatinga, ao seu transporte e descanso em veredas, até o seu abate e consumo nas Unidades Territoriais Tradicionais (UTTs), além de garantir o preço justo na perspectiva da sociobioeconomia solidária”, comentou. “Além do suporte ao Comitê, iniciamos uma discussão sobre a possibilidade de formatação de um projeto FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos, ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação) que, a princípio, envolveria também as Embrapas Caprinos, Semiárido e Alimentos e Territórios, além do IRPAA (Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada), a Central da Caatinga, o Governo do Estado da Bahia e Consórcio Nordeste”, afirmou o chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Alimentos e Territórios, Ricardo Elesbão. Carta de Jaguarari - Finalizado de forma coletiva e sob a coordenação de Edson Nogueira - Tata Nganga Dile, na tradição Bantu, representante do FONSANPOTMA, e com o suporte do Coletivo Enxame - o documento final do encontro afirma que está em curso a articulação e implementação de uma Teia Nacional das Rotas do Bode, uma construção coletiva que deve se tornar política pública de Estado. A Carta de Jaguarari afirma que é determinante a participação ativa dos governos com providências e investimentos para o suprimento de demandas específicas, a fim de assegurar que os povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiros sejam beneficiados, tanto quanto os/as fornecedores/as dos animais. “Os diversos atores presentes compreenderam que trata-se não apenas de uma política de reparação histórica, mas uma estratégia de garantia da segurança e soberania alimentar e nutricional destes povos, bem como a preservação da tradição, o que inclui seus sistemas alimentares. Nesse sentido, é essencial o engajamento dos diversos povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro, inclusive fortalecendo a criação do FONSANPOTMA nos municípios e regiões”, diz um trecho do documento. Além da Embrapa, o 1º Encontro do Comitê da Rota do Bode contou com a participação dos Ministérios da Igualdade Racial (MIR), da Agricultura (Mapa), do Desenvolvimento Agrário (MDA), do IRPAA, Univasf, CAR e entidades locais. Leia a carta de Jaguarari na íntegra no quadro abaixo: Carta de Jaguarari - Bahia 19 de julho de 2024 Nós, representantes do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana – FONSANPOTMA, dos povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiros, dos Estados da Bahia, Pernambuco, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Distrito Federal, Pará e Amapá, das comunidades tradicionais de Fundo e Fecho de Pasto do Estado da Bahia, de organizações sociais da Bahia e Pernambuco, de mandatos parlamentares, do Consórcio Público Nordeste, das instituições de pesquisa, ensino e de assessoria técnica e extensão rural, do governo do estado da Bahia e do governo federal, nos reunimos para o 1º Encontro do Comitê da Rota do Bode, realizado no período de 15 a 19 de julho de 2024, com atividades nos municípios de Petrolina em Pernambuco, em Casa Nova, Juazeiro e Jaguarari na Bahia. Por iniciativa do FONSANPOTMA, que desde 2023 vem articulando os povos e comunidades tradicionais e buscando parceiros nos âmbitos do Estado brasileiro e da sociedade civil organizada, está em curso a articulação e implementação de uma Teia Nacional das Rotas do Bode, uma importante construção coletiva que deve se tornar política pública de Estado. A partir de atividades como visitas às comunidades tradicionais criadoras de animais, feira de comercialização de caprinos, além de momentos de diálogos com diversos segmentos acima citados, o objetivo principal foi discutir e apontar os caminhos para garantia de caprinos e institucionalização de rotas de comercialização destes animais para várias regiões do país com vistas a garantir a segurança alimentar e nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana (POTMA) e de comunidades de terreiros. Por consequência, esta ação fortalece a caprinocultura nas comunidades tradicionais, especialmente Fundo de Pasto, que já tem nessa prática sua principal fonte de renda. Durante toda a programação foi pautado o debate acerca da viabilidade desta Rota, que visa impulsionar a venda e o transporte desses animais para todo o Brasil, garantindo que cheguem nas Unidades Territoriais Tradicionais (UTT) vivos, saudáveis e com segurança, mediante garantia das condições necessárias para o conforto e bem estar animal. Para tanto, é determinante a participação ativa dos governos com providências e investimentos para o suprimento de demandas específicas tratadas ao longo deste evento, o que poderá, só assim, assegurar que os povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiros sejam beneficiados, tanto quanto os/as fornecedores/as dos animais. Os diversos atores presentes compreenderam que trata-se não apenas de uma política de reparação histórica, mas uma estratégia de garantia da segurança e soberania alimentar e nutricional destes povos, bem como a preservação da tradição, o que inclui seus sistemas alimentares. Nesse sentido, é essencial o engajamento dos diversos povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro, inclusive fortalecendo a criação do FONSANPOTMA nos municípios e regiões. Para viabilizar a Rota, é necessário o envolvimento dos diversos sujeitos, com as devidas responsabilidades, visando: Convivência com os diferentes biomas e Fortalecimento da Produção Não haverá bode se não houver Caatinga em pé, assim como demais biomas onde também se cria esses animais. É preciso garantia da terra, territórios e territorialidades, bem como políticas de incentivo à preservação dos biomas, defesa do Rio São Francisco e seus afluentes, assim como os demais rios nas diferentes regiões do país. Desta forma, é necessário fomentar Reflorestamento/Recaatingamento/Agrocaatinga, recuperação de área degradadas, educação contextualizada, valorização das mulheres e juventudes dos povos e comunidades tradicionais, medidas de adaptação às mudanças climáticas, promoção da Convivência com o Semiárido, políticas de assessoria técnica contextualizada e contínua e acesso à tecnologias apropriadas à região, enfrentamento ao atual modelo de exploração dos bens naturais em curso do Nordeste, no Semiárido e no Brasil. A compreensão da água como bem e não recurso hídrico deve ser premissa fundamental. É necessário assegurar tecnologias e práticas de uso e reuso racional da água, aproveitamento da água da chuva na agropecuária, bem como investimentos em ações de revitalização de nascentes, rios, além do cuidado com a água subterrânea. A regularização fundiária é uma demanda urgente no campo e nas cidades, uma vez que também implica na ocupação justa e legalizada dos territórios, o que é necessário para manutenção das tradições. Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) A Rota do Bode relaciona-se com diferentes Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, em especial o ODS 1 (Erradicação da pobreza) ODS 2 (Combate à Fome e Agricultura Sustentável), ODS 10 (Redução das desigualdades), ODS 12 (Consumo e Produção Responsável), ODS 13 (Ação Contra Mudança Global do Clima) e ODS 18 (Promoção da Igualdade Racial). Para além disso, fortalece as dinâmicas locais e territoriais de produção da existência rural, evitando o êxodo e inchaço das periferias, assegurando a sucessão dos povos e comunidades tradicionais, engajamento das juventudes, bem como contribui com garantia da tradição dos povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro para gerações futuras. Valorização dos Sistemas Agrícolas Tradicionais e sistemas agroalimentares tradicionais É inegável que os povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro contribuem significativamente com a economia do país. Seus rituais e ações cotidianas exigem investimentos que são custeados pelos/as próprios/as adeptos/as. Neste aspecto, o reconhecimento e a valorização dos sistemas agrícolas e sistemas agroalimentares tradicionais (agricultura familiar) de diferentes territórios do país, torna-se uma necessidade premente. Para tanto, os/as produtores/as familiares e os povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro devem ter garantidos os princípios de uma alimentação adequada, fundamentado na oferta de alimentos de qualidade e em condições de uso e consumo em diversas regiões do país. Neste propósito, será importante ações voltadas para o reconhecimento e valorização dos territórios e de estratégias de diversificação para fortalecer a produção e propiciar aos consumidores/as diferentes opções de abastecimento. Faz-se necessário, portanto, um mapeamento nacional que consolide um diagnóstico da produção de caprinos em cada região do país, de modo que assegure que não haja apenas uma Rota do Bode mas diversas, formando assim uma Teia Nacional de Rotas, respeitando as potencialidades e particularidades territoriais. A diversificação dos mercados Os processos de comercialização dos animais devem ser implementados a partir de estudos sobre mercados. Para tanto, será preciso envolver cooperativas, associações, produtores/as, juventudes tradicionais e diferentes esferas do Estado brasileiro com atuação nos territórios, assegurando aos criadores/as e público receptor maior segurança financeira, bem como qualidade dos animais. Neste sentido, assume-se uma concepção de mercados plurais e de natureza institucional vinculadas às questões peculiares de cada espaço nacional. Para tanto, espera-se favorecer diferentes experiências de construção social de mercados como um fator de ampliar os processos de reprodução social das famílias envolvidas na Política que viabilize a Teia das Rotas do Bode. É possível ainda enxergar potencialidades que promovem integração social e econômica, a exemplo do turismo comunitário e educação, atraindo visitantes interessados/as em conhecer experiências culturais autênticas e assim gerando economia e renda para os territórios. Política Fiscal e Órgãos de controle Não se pode conceber esta Teia Nacional das Rotas do Bode sem a garantia de uma ação governamental que viabilize uma política fiscal baseada na isenção dos impostos ou que subsidie a logística necessária para realização dos roteiros, considerando as fronteiras entre os estados, as distâncias e condições das rodovias, as adversidades do clima, etc. Do mesmo modo, exige uma articulação entre os diversos órgãos de controle do Estado, de forma a operar uma ação de fiscalização necessária em toda a Rota, pensando no bem estar animal e na segurança de todas as partes envolvidas. Logística A sanidade animal é um elemento central para que a Teia das Rotas do Bode sejam uma experiência exitosa. Assim, um dos desafios centrais é a definição de todas as ações necessárias para assegurar o translado dos animais, tais como: as veredas de descanso, a alimentação, os veículos (mecânica, seguridade), profissionais envolvidos/as. Para isso, é necessário um estudo de todos os mecanismos indispensáveis em cada território por onde essas rotas serão constituídas. Portanto, a partir dos apontamos acima elencados, firmamos a instituição de um Comitê para construção de uma Teia Nacional das Rotas do Bode, substituindo a proposição de uma Rota do Bode específica. Alguns caminhos foram definidos para que esta Teia Nacional possa se materializar e assim beneficiar os povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro, as comunidades tradicionais fundos de pasto, quilombolas e a sociedade em geral. Jaguarari - Bahia, 19 de julho de 2024 Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana - FONSANPOTMA Ministério da Igualdade Racial - MIR Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar Consórcio Público Nordeste Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional - CAR/ Secretaria de Desenvolvimento Rural/ Governo do Estado da Bahia Casa Civil/Governo do Estado da Bahia Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada - IRPAA Prefeitura Municipal de Jaguarari/ Secretaria de Agricultura/ Secretaria de Desenvolvimento Econômico/ Secretaria de Governo/ Secretaria de Desenvolvimento Social Instituto de Desenvolvimento Social e Agrário do Semiárido - Idesa Cooperativa Agropecuária Familiar de Canudos, Uauá e Curaçá - Coopercuc Cooperativa Nacional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana - COOPTMA Cooperativa Agropecuária Familiar Sertão Forte de Casa Nova e região - Cooaf Cooperativa de Produção e Comercialização da Agricultura Familiar da Bahia - Coompab Instituto Matriz Central de Cooperativas da Caatinga - Central da Caatinga Articulação Estadual de Fundo e Fecho de Pasto Central de Associações de Fundo e Fecho de Pasto de Senhor do Bonfim - CAFFP Comissão dos Presidentes Estaduais dos Conseas - CPCE Central das Associações da Agricultura Familiar do município de Andorinha, do Território Piemonte Norte do Itapicuru, e dos municípios de Itiúba, Monte Santo e Uauá - CAAFATIPINI Coletivo Enxame - Juazeiro/BA Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado da Bahia - Fetag-BA Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional de Pernambuco Conselho Municipal de Desenvolvimento Sustentável - CMDS Colegiado de Desenvolvimento Territorial Sustentável do Piemonte Norte do Itapicuru - CODETER Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Agricultura Familiar - Sintraf Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Agricultura Familiar do estado da Bahia - Fetraf Consea Nacional - CP7 Ilê Asé Omin Kayodè - Juazeiro/BA Terreiro Afro Axé Banda Le Kongo - Juazeiro/BA Ilê Odé axé Opô Inle - DF Ilê Asà Oba Osè Inã - SP Ilê Xangô de cachoeiras - Jaguarari/BA Nzo Atim Obatalocy - Contagem/MG Ilê D’Asé Ig’Balè Fundeguilê - AP Ilê Yaba Omi/Instituto Afro-brasileiro e Cultural Ilê Yaba Omi - ACIYOMI - PA Quilombo dos Camarás - Camaragibe/PE Terreito Bate Folha - Salvador/BA Ilê Axé Odé Wewe Atirador - Cachoeira/BA Ilê Axé Omim IbainD’Mm - Cachoeira/BA Ilê Axé Ota lomir - Cachoeira/BA Ass Boninfá - Salvador/BA Terreiro Dia Inkiss Mameto Kayangô - Arembepe/BA Ilê Axé Omi Nici T.T.T Filhos - Parafuso/BA Ilê Axé Oyá Ina Fureneji - Barra do Jacuípe/BA Ilê Olwa Ojo Afefé - Abrantes/BA Centro Territorial de Educação Profissional do Piemonte Norte do Itapicuru - Ceteb PNI
Foto: Divulgação
Entre os dias 15 e 19 de julho, aconteceu em Jaguarari, Semiárido Baiano, o 1º Encontro do Comitê da Rota do Bode, uma articulação entre o Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matrizes Africanas (FONSANPOTMA) e Comunidades Tradicionais Fundo de Pasto, para dialogarem sobre a construção de canais de comercialização de caprinos, de forma a garantir a soberania e segurança alimentar e nutricional para os Povos de Matriz Africana.
Esses povos tem em sua cultura alimentar a sacralização dos caprinos e sua carne como a principal fonte de proteína animal consumida. O encontro também teve etapas em Petrolina (PE), e nos municípios de Casa Nova e Juazeiro (BA) e envolveu diferentes instituições governamentais das esferas federal, estadual e municipal, cooperativas, associações e sindicatos rurais.
A Embrapa Alimentos e Territórios foi representada pelo Chefe de Pesquisa e Desenvolvimento Ricardo Elesbão e pelo analista Fabrício Bianchini. Também estiveram presentes os pesquisadores Jorge Farias e Lucas Fonseca (Embrapa Caprinos) e Evandro Holanda, representando a Diretoria de Pesquisa e Inovação da Embrapa (DEPI).
A “Rota do Bode” é uma articulação realizada pelo FONSANPOTMA, entidade que representa os Povos de Matriz Africana nos diferentes conselhos nacionais, como o CONSEA e o CONDRAF, e busca garantir a segurança alimentar e nutricional dos POTMAs e, prioritariamente, o acesso aos caprinos, atualmente comercializados em péssimas condições sanitárias devido ao transporte inadequado e ilícito, além do alto valor cobrado pelos atravessadores.
A pauta principal do encontro foi a construção de um canal de comercialização justa e solidária, que integre as associações das Comunidades Tradicionais Fundo de Pasto da região Semiárida baiana, com as Unidades Territoriais Tradicionais dos Povos de Matriz Africana e Comunidades de Terreiro, presentes em todo o país.
A viabilidade da caprinovinocultura na região foi uma das pautas levadas pelo Coletivo Enxame, coletivo político de Juazeiro (BA) que reúne pessoas de diferentes segmentos em pautas como defesa do meio ambiente, educação, cultura, juventude, mulheres e convivência com o semiárido.
“O Coletivo Enxame busca contribuir a partir do que compreendemos sobre convivência com o semiárido, no qual entendemos que é viável desenvolver a caprinovinocultura na região sem deixar de se preocupar com a garantia da existência da nossa Caatinga”, afirma a integrante Érica Daiane. “Defendemos que essa Teia venha contemplar de forma democrática todos os povos e comunidades tradicionais”, complementa.
Parceria com a Embrapa - As primeiras reuniões da Embrapa com o Fonsanpotma ocorreram em janeiro de 2023, por ocasião do VIII Fórum Social Mundial. Na época, a Embrapa foi convidada para pensar numa estratégia de trabalhar a qualidade de alguns alimentos-chave para os povos e comunidades de matriz africana.
Leia a matéria aqui.
Para Bianchini, o objetivo da “Rota do Bode é garantir o bem estar dos animais, desde sua criação tradicional e agroecológica em áreas extensivas na Caatinga, ao seu transporte e descanso em veredas, até o seu abate e consumo nas Unidades Territoriais Tradicionais (UTTs), além de garantir o preço justo na perspectiva da sociobioeconomia solidária”, comentou.
“Além do suporte ao Comitê, iniciamos uma discussão sobre a possibilidade de formatação de um projeto FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos, ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação) que, a princípio, envolveria também as Embrapas Caprinos, Semiárido e Alimentos e Territórios, além do IRPAA (Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada), a Central da Caatinga, o Governo do Estado da Bahia e Consórcio Nordeste”, afirmou o chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Alimentos e Territórios, Ricardo Elesbão.
Carta de Jaguarari - Finalizado de forma coletiva e sob a coordenação de Edson Nogueira - Tata Nganga Dile, na tradição Bantu, representante do FONSANPOTMA, e com o suporte do Coletivo Enxame - o documento final do encontro afirma que está em curso a articulação e implementação de uma Teia Nacional das Rotas do Bode, uma construção coletiva que deve se tornar política pública de Estado.
A Carta de Jaguarari afirma que é determinante a participação ativa dos governos com providências e investimentos para o suprimento de demandas específicas, a fim de assegurar que os povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiros sejam beneficiados, tanto quanto os/as fornecedores/as dos animais.
“Os diversos atores presentes compreenderam que trata-se não apenas de uma política de reparação histórica, mas uma estratégia de garantia da segurança e soberania alimentar e nutricional destes povos, bem como a preservação da tradição, o que inclui seus sistemas alimentares. Nesse sentido, é essencial o engajamento dos diversos povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro, inclusive fortalecendo a criação do FONSANPOTMA nos municípios e regiões”, diz um trecho do documento.
Além da Embrapa, o 1º Encontro do Comitê da Rota do Bode contou com a participação dos Ministérios da Igualdade Racial (MIR), da Agricultura (Mapa), do Desenvolvimento Agrário (MDA), do IRPAA, Univasf, CAR e entidades locais.
Leia a carta de Jaguarari na íntegra no quadro abaixo:
Carta de Jaguarari - Bahia 19 de julho de 2024 Nós, representantes do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana – FONSANPOTMA, dos povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiros, dos Estados da Bahia, Pernambuco, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Distrito Federal, Pará e Amapá, das comunidades tradicionais de Fundo e Fecho de Pasto do Estado da Bahia, de organizações sociais da Bahia e Pernambuco, de mandatos parlamentares, do Consórcio Público Nordeste, das instituições de pesquisa, ensino e de assessoria técnica e extensão rural, do governo do estado da Bahia e do governo federal, nos reunimos para o 1º Encontro do Comitê da Rota do Bode, realizado no período de 15 a 19 de julho de 2024, com atividades nos municípios de Petrolina em Pernambuco, em Casa Nova, Juazeiro e Jaguarari na Bahia. Por iniciativa do FONSANPOTMA, que desde 2023 vem articulando os povos e comunidades tradicionais e buscando parceiros nos âmbitos do Estado brasileiro e da sociedade civil organizada, está em curso a articulação e implementação de uma Teia Nacional das Rotas do Bode, uma importante construção coletiva que deve se tornar política pública de Estado. A partir de atividades como visitas às comunidades tradicionais criadoras de animais, feira de comercialização de caprinos, além de momentos de diálogos com diversos segmentos acima citados, o objetivo principal foi discutir e apontar os caminhos para garantia de caprinos e institucionalização de rotas de comercialização destes animais para várias regiões do país com vistas a garantir a segurança alimentar e nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana (POTMA) e de comunidades de terreiros. Por consequência, esta ação fortalece a caprinocultura nas comunidades tradicionais, especialmente Fundo de Pasto, que já tem nessa prática sua principal fonte de renda. Durante toda a programação foi pautado o debate acerca da viabilidade desta Rota, que visa impulsionar a venda e o transporte desses animais para todo o Brasil, garantindo que cheguem nas Unidades Territoriais Tradicionais (UTT) vivos, saudáveis e com segurança, mediante garantia das condições necessárias para o conforto e bem estar animal. Para tanto, é determinante a participação ativa dos governos com providências e investimentos para o suprimento de demandas específicas tratadas ao longo deste evento, o que poderá, só assim, assegurar que os povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiros sejam beneficiados, tanto quanto os/as fornecedores/as dos animais. Os diversos atores presentes compreenderam que trata-se não apenas de uma política de reparação histórica, mas uma estratégia de garantia da segurança e soberania alimentar e nutricional destes povos, bem como a preservação da tradição, o que inclui seus sistemas alimentares. Nesse sentido, é essencial o engajamento dos diversos povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro, inclusive fortalecendo a criação do FONSANPOTMA nos municípios e regiões. Para viabilizar a Rota, é necessário o envolvimento dos diversos sujeitos, com as devidas responsabilidades, visando: Convivência com os diferentes biomas e Fortalecimento da Produção Não haverá bode se não houver Caatinga em pé, assim como demais biomas onde também se cria esses animais. É preciso garantia da terra, territórios e territorialidades, bem como políticas de incentivo à preservação dos biomas, defesa do Rio São Francisco e seus afluentes, assim como os demais rios nas diferentes regiões do país. Desta forma, é necessário fomentar Reflorestamento/Recaatingamento/Agrocaatinga, recuperação de área degradadas, educação contextualizada, valorização das mulheres e juventudes dos povos e comunidades tradicionais, medidas de adaptação às mudanças climáticas, promoção da Convivência com o Semiárido, políticas de assessoria técnica contextualizada e contínua e acesso à tecnologias apropriadas à região, enfrentamento ao atual modelo de exploração dos bens naturais em curso do Nordeste, no Semiárido e no Brasil. A compreensão da água como bem e não recurso hídrico deve ser premissa fundamental. É necessário assegurar tecnologias e práticas de uso e reuso racional da água, aproveitamento da água da chuva na agropecuária, bem como investimentos em ações de revitalização de nascentes, rios, além do cuidado com a água subterrânea. A regularização fundiária é uma demanda urgente no campo e nas cidades, uma vez que também implica na ocupação justa e legalizada dos territórios, o que é necessário para manutenção das tradições. Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) A Rota do Bode relaciona-se com diferentes Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, em especial o ODS 1 (Erradicação da pobreza) ODS 2 (Combate à Fome e Agricultura Sustentável), ODS 10 (Redução das desigualdades), ODS 12 (Consumo e Produção Responsável), ODS 13 (Ação Contra Mudança Global do Clima) e ODS 18 (Promoção da Igualdade Racial). Para além disso, fortalece as dinâmicas locais e territoriais de produção da existência rural, evitando o êxodo e inchaço das periferias, assegurando a sucessão dos povos e comunidades tradicionais, engajamento das juventudes, bem como contribui com garantia da tradição dos povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro para gerações futuras. Valorização dos Sistemas Agrícolas Tradicionais e sistemas agroalimentares tradicionais É inegável que os povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro contribuem significativamente com a economia do país. Seus rituais e ações cotidianas exigem investimentos que são custeados pelos/as próprios/as adeptos/as. Neste aspecto, o reconhecimento e a valorização dos sistemas agrícolas e sistemas agroalimentares tradicionais (agricultura familiar) de diferentes territórios do país, torna-se uma necessidade premente. Para tanto, os/as produtores/as familiares e os povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro devem ter garantidos os princípios de uma alimentação adequada, fundamentado na oferta de alimentos de qualidade e em condições de uso e consumo em diversas regiões do país. Neste propósito, será importante ações voltadas para o reconhecimento e valorização dos territórios e de estratégias de diversificação para fortalecer a produção e propiciar aos consumidores/as diferentes opções de abastecimento. Faz-se necessário, portanto, um mapeamento nacional que consolide um diagnóstico da produção de caprinos em cada região do país, de modo que assegure que não haja apenas uma Rota do Bode mas diversas, formando assim uma Teia Nacional de Rotas, respeitando as potencialidades e particularidades territoriais. A diversificação dos mercados Os processos de comercialização dos animais devem ser implementados a partir de estudos sobre mercados. Para tanto, será preciso envolver cooperativas, associações, produtores/as, juventudes tradicionais e diferentes esferas do Estado brasileiro com atuação nos territórios, assegurando aos criadores/as e público receptor maior segurança financeira, bem como qualidade dos animais. Neste sentido, assume-se uma concepção de mercados plurais e de natureza institucional vinculadas às questões peculiares de cada espaço nacional. Para tanto, espera-se favorecer diferentes experiências de construção social de mercados como um fator de ampliar os processos de reprodução social das famílias envolvidas na Política que viabilize a Teia das Rotas do Bode. É possível ainda enxergar potencialidades que promovem integração social e econômica, a exemplo do turismo comunitário e educação, atraindo visitantes interessados/as em conhecer experiências culturais autênticas e assim gerando economia e renda para os territórios. Política Fiscal e Órgãos de controle Não se pode conceber esta Teia Nacional das Rotas do Bode sem a garantia de uma ação governamental que viabilize uma política fiscal baseada na isenção dos impostos ou que subsidie a logística necessária para realização dos roteiros, considerando as fronteiras entre os estados, as distâncias e condições das rodovias, as adversidades do clima, etc. Do mesmo modo, exige uma articulação entre os diversos órgãos de controle do Estado, de forma a operar uma ação de fiscalização necessária em toda a Rota, pensando no bem estar animal e na segurança de todas as partes envolvidas. Logística A sanidade animal é um elemento central para que a Teia das Rotas do Bode sejam uma experiência exitosa. Assim, um dos desafios centrais é a definição de todas as ações necessárias para assegurar o translado dos animais, tais como: as veredas de descanso, a alimentação, os veículos (mecânica, seguridade), profissionais envolvidos/as. Para isso, é necessário um estudo de todos os mecanismos indispensáveis em cada território por onde essas rotas serão constituídas. Portanto, a partir dos apontamos acima elencados, firmamos a instituição de um Comitê para construção de uma Teia Nacional das Rotas do Bode, substituindo a proposição de uma Rota do Bode específica. Alguns caminhos foram definidos para que esta Teia Nacional possa se materializar e assim beneficiar os povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro, as comunidades tradicionais fundos de pasto, quilombolas e a sociedade em geral. Jaguarari - Bahia, 19 de julho de 2024 - Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana - FONSANPOTMA
- Ministério da Igualdade Racial - MIR
- Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar
- Consórcio Público Nordeste
- Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa
- Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional - CAR/ Secretaria de Desenvolvimento Rural/ Governo do Estado da Bahia
- Casa Civil/Governo do Estado da Bahia
- Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada - IRPAA
- Prefeitura Municipal de Jaguarari/ Secretaria de Agricultura/ Secretaria de Desenvolvimento Econômico/ Secretaria de Governo/ Secretaria de Desenvolvimento Social
- Instituto de Desenvolvimento Social e Agrário do Semiárido - Idesa
- Cooperativa Agropecuária Familiar de Canudos, Uauá e Curaçá - Coopercuc
- Cooperativa Nacional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana - COOPTMA
- Cooperativa Agropecuária Familiar Sertão Forte de Casa Nova e região - Cooaf
- Cooperativa de Produção e Comercialização da Agricultura Familiar da Bahia - Coompab
- Instituto Matriz
- Central de Cooperativas da Caatinga - Central da Caatinga
- Articulação Estadual de Fundo e Fecho de Pasto
- Central de Associações de Fundo e Fecho de Pasto de Senhor do Bonfim - CAFFP
- Comissão dos Presidentes Estaduais dos Conseas - CPCE
- Central das Associações da Agricultura Familiar do município de Andorinha, do Território Piemonte Norte do Itapicuru, e dos municípios de Itiúba, Monte Santo e Uauá - CAAFATIPINI
- Coletivo Enxame - Juazeiro/BA
- Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado da Bahia - Fetag-BA
- Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional de Pernambuco
- Conselho Municipal de Desenvolvimento Sustentável - CMDS
- Colegiado de Desenvolvimento Territorial Sustentável do Piemonte Norte do Itapicuru - CODETER
- Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Agricultura Familiar - Sintraf
- Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Agricultura Familiar do estado da Bahia - Fetraf
- Consea Nacional - CP7
- Ilê Asé Omin Kayodè - Juazeiro/BA
- Terreiro Afro Axé Banda Le Kongo - Juazeiro/BA
- Ilê Odé axé Opô Inle - DF
- Ilê Asà Oba Osè Inã - SP
- Ilê Xangô de cachoeiras - Jaguarari/BA
- Nzo Atim Obatalocy - Contagem/MG
- Ilê D’Asé Ig’Balè Fundeguilê - AP
- Ilê Yaba Omi/Instituto Afro-brasileiro e Cultural Ilê Yaba Omi - ACIYOMI - PA
- Quilombo dos Camarás - Camaragibe/PE
- Terreito Bate Folha - Salvador/BA
- Ilê Axé Odé Wewe Atirador - Cachoeira/BA
- Ilê Axé Omim IbainD’Mm - Cachoeira/BA
- Ilê Axé Ota lomir - Cachoeira/BA
- Ass Boninfá - Salvador/BA
- Terreiro Dia Inkiss Mameto Kayangô - Arembepe/BA
- Ilê Axé Omi Nici T.T.T Filhos - Parafuso/BA
- Ilê Axé Oyá Ina Fureneji - Barra do Jacuípe/BA
- Ilê Olwa Ojo Afefé - Abrantes/BA
- Centro Territorial de Educação Profissional do Piemonte Norte do Itapicuru - Ceteb PNI
|
Irene Santana (MTb 11.354/DF)
Embrapa Alimentos e Territórios
Contatos para a imprensa
imprensa.alimentos.territorios@embrapa.br
Telefone: (82) 99331-3989
Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/