Precisão para a cana-de-açúcar
Ganhar agilidade e, principalmente, precisão na engenharia genética da cana-de-açúcar, cultura que tem papel relevante tanto na cadeia de alimentos quanto para a segurança energética do Brasil – essa é a proposta dos pesquisadores da Embrapa Agroenergia. Em 2015, a biomassa da cana foi responsável pela geração de 16,9% de toda a energia consumida no País, principalmente na forma de etanol e eletricidade gerada com a queima do bagaço.
Com o uso da engenharia genética e técnicas convencionais, pesquisadores desse centro de pesquisa já desenvolveram uma cana transgênica tolerante à seca, que está em fase de avaliação a campo, e estão trabalhando em outra variedade capaz de crescer de forma eficiente em solos com alto teor de alumínio. O protocolo de transformação genética gerado nesses trabalhos, agora, servirá de base para o desenvolvimento de novas características nas plantas, utilizando a tecnologia CRISPR/Cas9 .
O pesquisador Hugo Bruno Corrêa Molinari explica que um sistema de transformação genética bem estabelecido da espécie com que se vai trabalhar é um dos pré-requisitos para o uso da CRISPR/Cas9, uma evolução das técnicas de modificação genética. “É uma transformação genética com precisão”, resume. Mas há uma diferença importante, já que nenhum dos elementos utilizados para promover a modificação permanece no genoma das plantas: “Nem a enzima, nem qualquer outro elemento utilizado para a transformação ficam presentes.” Por isso, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos tem considerado não geneticamente modificadas as variedades de plantas obtidas por essa técnica.
A precisão é justamente a grande vantagem apontada por Molinari no uso da CRISPR/Cas9. Com a metodologia convencional, o DNA portador das características desejadas (DNA doador) é inserido na planta que se quer modificar, mas não há como direcioná-lo para a região exata do genoma em que ele precisa ficar. O que se faz, então, é repetir o processo muitas vezes, gerando, frequentemente, milhares de indivíduos. Os cientistas, então, observam o comportamento de cada um deles para identificar e selecionar aquele que apresenta a característica que se pretendia adicionar sem perder o desempenho que a planta já tinha.
“Adotar a tecnologia CRISPR é adicionar uma espécie de localizador ao processo, que leva a enzima Cas9 e o DNA doador até o local exato do cromossomo exato em que ele precisa ficar. A Cas9 é uma enzima que faz ‘cortes’ no DNA da planta, provocando uma mutação que inativa um gene indesejado, ou abrindo caminho para a entrada de um DNA doador”, explica Molinari.
Contudo, a fim de indicar à CRISPR para onde levar a enzima e o DNA doador, é preciso conhecer (e muito bem!) o genoma do organismo ao qual se pretende conferir uma nova característica. É essencial conhecer muito bem o gene que governa o comportamento que se quer modificar. A CRISPR/Cas9 não constitui uma nova técnica que dispensa o conhecimento e as metodologias desenvolvidas até então para modificação genética. “Todas as expertises que hoje existem serão aproveitadas e será necessário um domínio ainda maior do que se está fazendo. É uma evolução da técnica!”, ressalta.
No caso da cana-de-açúcar, essa necessidade de conhecimento limita a aplicação da tecnologia CRISPR/Cas9. Diferente de milho e soja, por exemplo, a planta ainda não tem o sequenciamento completo de seu genoma disponível. Ainda assim, os pesquisadores conseguiram, nos poucos genes cujas sequências já foram decifradas, características importantes que podem ser modificadas com essa técnica de precisão.
Mas a tarefa não deve ser fácil. Enquanto em boa parte das plantas há apenas um par de cada gene, na cana há seis pares. Ou seja, para conferir à planta a característica desejada, será preciso fazer a mesma modificação em cada um deles. O desafio é grande, mas Molinari acredita que vale a pena. Muitas propriedades desejáveis às culturas agrícolas, especialmente no atual cenário de mudanças climáticas, não são encontradas em mutações naturais que viabilizem programa de melhoramento clássico, por cruzamentos. A engenharia genética com a CRISPR/Cas9 surge, então, como técnica poderosa. “Temos oportunidade de, com precisão cirúrgica, modificar exatamente aquela característica que é alvo do estudo. É uma ferramenta muito interessante, porque temos a precisão a nosso favor”, defende o pesquisador da Embrapa Agroenergia.
Vivian Chies
Embrapa Agroenergia
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