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Embrapa estuda criação de rota turística de base comunitária na região de Palmeira dos Índios
Foto: João Roberto Correia
Equipe do projeto conhecendo a propriedade Monte Alegre, da família do presidente da Coopcam, José Hélio da Silva, em Palmeira dos Índios.
Equipe do projeto Paisagens Alimentares visitou os municípios de Palmeira dos Índios, Igaci, Estrela de Alagoas e Quebrangulo com o objetivo de mapear e investigar o potencial turístico na Serra das Pias, no agreste alagoano.
Entre os dias 11 e 14 de março, a região metropolitana de Palmeira dos Índios, no agreste alagoano, recebeu a visita técnica do projeto Paisagens Alimentares, coordenado pela Embrapa Alimentos e Territórios (AL) e financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). A ação, que contou com a consultoria especializada da Agrosuisse, teve como principal objetivo o levantamento e caracterização da paisagem alimentar local, com um foco na construção de um roteiro turístico que alinhe os sistemas alimentares tradicionais e a rica história dos municípios.
Durante os quatro dias de imersão, uma equipe da Embrapa Alimentos e Territórios (AL), formada pelo pesquisador João Roberto Correia, o analista Fabiano Estanislau e a bolsista Lydayanne Lilás, e da Agrosuisse, com os consultores José Ferreira e João Amorim, percorreu diversos pontos da região, que concentra a Serra das Pias. As visitas se concentraram em comunidades rurais e áreas urbanas, mapeando e analisando os elementos que compõem a paisagem alimentar das cidades de Palmeira dos Índios, Quebrangulo, Igaci e Estrela de Alagoas. Entre os aspectos investigados estão a produção agrícola local, os sistemas de distribuição e comercialização de alimentos, as práticas culinárias tradicionais, bem como os espaços de sociabilidade e memória relacionados à alimentação.
De acordo com o pesquisador João Roberto Correia, a iniciativa visa não apenas promover o conhecimento e valorização dos recursos alimentares da região, mas também explorar seu potencial turístico de forma sustentável e inclusiva. "A região de Palmeira dos Índios possui uma herança gastronômica e cultural riquíssima, que merece ser preservada e compartilhada com visitantes de outros lugares. Por meio do projeto 'Paisagens Alimentares', buscaremos criar em conjunto com os atores regionais um roteiro turístico que não apenas ofereça experiências gastronômicas únicas, mas também conte a história e promova a identidade local", destaca.
A parceria com a Agrosuisse, consultoria reconhecida internacionalmente por sua expertise em turismo rural e gastronomia sustentável, trouxe uma abordagem inovadora e estratégica para o desenvolvimento do roteiro turístico. “Estamos trabalhando há sete anos com o conceito de paisagens alimentares. Nossa intenção é evitar o desaparecimento de sistemas alimentares tradicionais utilizando o cotidiano, o saber-fazer e a história dos agricultores como motor para a promoção do turismo de experiência”, explica o consultor José Ferreira.
Com base nas informações levantadas durante a visita técnica, a equipe pretende elaborar um itinerário que abranja desde visitas a propriedades rurais, áreas de comunidades indígenas e quilombolas até experiências gastronômicas em festividades que valorizam ingredientes regionais e receitas tradicionais.
A expectativa é que, com a implementação do roteiro turístico baseado no conceito de paisagens alimentares, Palmeira dos Índios possa se destacar como um destino gastronômico de relevância nacional, contribuindo para a geração de renda e a valorização do patrimônio cultural e natural local.
Experiências agroecológicas e produtos tradicionais
A região ao redor da Serra das Pias possui uma rica história cultural, com comunidades locais que preservam tradições antigas e oferecem aos visitantes uma imersão na cultura sertaneja do Nordeste brasileiro.
Em Palmeira dos Índios, a equipe teve uma programação extensa. Primeiro, foi realizada uma reunião com agricultores da Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Estado de Alagoas (Coopcam). Atualmente, com 46 cooperados, os agricultores mantêm viva a tradicional produção agroecológica de jabuticaba, desde a década de 1970. A cooperativa produz diversos produtos derivados da fruta, como geleias, compotas e já conta com um fermentado, conhecido como “vinho da jabuticaba”, famoso no Estado.
Salete de Oliveira, da diretoria da Coopcam, conta que já foram realizadas diversas ações aliando o fruto com atividades turísticas, como intercâmbios em locais com rotas gastronômicas em outros Estados e organização de eventos no município. “Temos um produto de inovação que é o ‘vinho da jabuticaba’ aliada a nossa tradição no plantio e colheita da fruta. Estamos trabalhando para lançar mais sete produtos. Queremos mostrar para os visitantes o que a gente tem e faz com a nossa realidade”, ressalta.
No sítio Monte Alegre da família do presidente da Coopcam, José Hélio da Silva, a equipe pode vivenciar a produção agroecológica que conta com o plantio de diversas frutíferas da região. Também, degustaram um almoço tradicional preparado pelo próprio agricultor e degustaram as frutas colhidas no pé ao andarem pela propriedade.
Outra organização de destaque na região que o grupo visitou foi a Associação de Agricultores Alternativos (Aagra), com sede na cidade de Igaci. Fundada há mais de 30 anos, por um grupo de agricultores familiares preocupados com os impactos ambientais das técnicas convencionais de cultivo, a Aagra tem se dedicado a promover a adoção de métodos ecológicos na agricultura. Desde então, tem trabalhado para educar os agricultores locais sobre a importância da agroecologia, da diversificação de cultivos e do manejo sustentável dos recursos naturais. Durante a visita a equipe conheceu o banco de sementes, a fábrica de tijolos ecológicos, o viveiro agroecológico, área com sistemas agroflorestais (SAFs), o armazém de embalagem e distribuição, um restaurante com capacidade para 500 pessoas.
Também, conheceram o Banco Comunitário “Olhos D’água”, criado em 2015, sendo a primeira prática de finanças solidárias de apoio à economia popular de territórios com baixo índice de desenvolvimento humano de Alagoas. Os cidadãos de Igaci contam com a moeda local ‘Terra’, podendo comercializar seus produtos e serviços e obter crédito a juros mais baixos exercidos no mercado.
“Assim como investimos em práticas sustentáveis na agricultura, queremos apoiar e incentivar um turismo de espírito e alma. Por isso, ele deve ser concebido de maneira que respeite a cultura regional, o bem-viver das pessoas e o meio ambiente em sua plenitude”, destaca a presidente da Aagra, Eunice Jesus.
Já no município de Estrela de Alagoas, a equipe do projeto foi recebida por produtores familiares do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), no Sítio Mendes. No local, também são ofertadas práticas agroecológicas, como banco de sementes crioulas que são catalogadas, guardadas e distribuídas entre os agricultores, um viveiro com hortaliças, uma área com SAFs e produção de derivados de frutas, como compotas e geleias. Para o agricultor Joselton Silva, a região tem potencial para o turismo de base comunitária e de experiência. “Temos uma riqueza de plantas, alimentos e belezas naturais. Com certeza, podemos estruturar roteiros atrativos que beneficiem a população local”.
Povos e comunidades tradicionais
Palmeira dos Índios concentra nove aldeias, onde vivem cerca de 3.500 pessoas da etnia Xucuru-Kariri. Na Terra Indígena Mata da Cafurna, com 117 hectares, os cerca de 400 habitantes se alimentam da pesca, caça, agricultura e mantêm as tradições ancestrais do artesanato, rituais de celebração e espirituais e o uso de plantas medicinais.
No espaço Magia da Terra, a equipe do projeto saboreou um almoço com pratos à base de mandioca, coco e banana, preparado pela multifacetada Koram Xucuru. Além de ser uma das líderes da aldeia, ela é cozinheira, curandeira, técnica em enfermagem e terapeuta holística. O miaí, um mingau tradicional feito de mandioca, coco e ervas, foi a estrela do cardápio e agradou o paladar de todos. “Toda a concepção dos pratos é pensada para que alimente o corpo, a alma e o espírito. Que nutra, cure e sustente a pessoa”, explica.
Com a banana, Koram desenvolveu vários produtos, como a maionese vegana feita com a biomassa da banana verde, além da fruta desidratada, geleias, doces, farinhas e bolos.
Além da alimentação, a aldeia conta com outros atrativos turísticos que proporcionam com que os visitantes experienciem o cotidiano e a vida junto aos indígenas, como caminhadas nas trilhas, uso do rapé, banhos de argila e ervas. A equipe também participou do toré, um ritual com dança circular, em fila ou pares, acompanhada por cantos ao som de maracá.
Outro local visitado foi a Comunidade Quilombola Povoado Tabacaria, primeira a ter seu território reconhecido no estado de Alagoas. Situada em meio à beleza natural das serras, a comunidade é composta por descendentes de africanos que fugiram da opressão nas fazendas e estabeleceram-se nessa região. Ao longo dos séculos, eles desenvolveram uma cultura única, preservando tradições e costumes da herança afro-brasileira.
Atualmente, 95 famílias com cerca de 500 pessoas vivem no quilombo tendo a agricultura como a principal fonte de sustento, com plantação de feijão, milho, batata e mandioca. Por meio de mobilizações locais, parcerias com organizações não-governamentais e articulação política, eles têm buscado garantir o reconhecimento de seus direitos territoriais, bem como o acesso a políticas públicas que promovam o desenvolvimento sustentável da comunidade.
Elson Paulino, presidente da Associação da Comunidade Remanescente do Quilombo da Tabacarial, conta que estão trabalhando em um projeto de turismo com base comunitária, envolvendo trilhas ecológicas e festas religiosas, para que os visitantes conheçam a alimentação, a mata e as festividades, como a Festa de Nossa Senhora de Nazaré. “A comunidade está empolgada. É um sonho das pessoas. É a chance de mostrar nossa cultura, da gente elevar nossa autoestima”.
Gestão pública em turismo
As visitas com as prefeituras foram iniciadas em Quebrangulo, nacionalmente conhecido por ser terra de nascimento do escritor Graciliano Ramos. O município reúne uma arquitetura com prédios históricos no centro, além de artesanatos, gastronomia regional e belezas naturais.
A equipe do projeto foi acompanhada pelo secretário municipal de Agricultura, Meio Ambiente, Turismo e Desenvolvimento Econômico, André Ananias, e pela diretora de Cultura, Suely Barbosa. De acordo com os gestores, alguns equipamentos culturais e turísticos estão em processo de estruturação, com a construção de um Hotel Fazenda e a revitalização da Casa de Cultura, onde viveu Graciliano até os quatros anos. “Temos uma culinária muito rica, como a piaba com cuscuz, galinhada, sequilhos e pão de batata doce. O turismo religioso é um dos pontos fortes da cidade. Além disso, historicamente fomos rota de fuga de escravos e contamos com um grupo folclórico reconhecido em Alagoas, o Nega da Costa”, conta Suely.
Em Palmeira dos Índios, a equipe se reuniu com os secretários municipais Cássio Junio da Silva, da Cultura, e Cléa Maria Mascarenhas, do Desenvolvimento Econômico e Turismo. Os gestores pontuaram que o município tem um potencial turístico em três linhas: literário, religioso e de experiência. Porém, o setor ainda precisa de um planejamento com ações integradas e a construção de infraestrutura para oferecer serviços de qualidade aos turistas.
De acordo com Cássio, a ideia de uma rota baseada em paisagens alimentares é muito bem-vinda e irá contribuir para a valorização e visibilidade das identidades regionais. “Existe uma forte relação entre a população indígena, a comunidade quilombola e camponesa, principalmente pelo processo de ocupação e uso da terra”, salienta.
Rotas em construção
Em 2023, cinco localidades de três Estados do Nordeste brasileiro foram selecionadas como potencialidades em turismo sustentável e que envolvem sistemas alimentares tradicionais.
Em Alagoas, as experiências selecionadas contemplam a Serra das Pias, em Palmeira dos Índios, e as riquezas do Rio São Francisco – incluindo os municípios de Olho d’Água do Casado, Delmiro Gouveia e Piranhas. Já em Sergipe, a seleção envolve catadoras de mangabas, marisqueiras, doceiras e beijuzeiras localizadas em Indiaroba e São Cristóvão. Uma comunidade remanescente de quilombolas de Rio Formoso e as marisqueiras de Barra de Sirinhaém, que compartilham o mesmo território de manguezais na Área de Proteção Ambiental (APA) de Guadalupe, em Pernambuco, completam o portfólio.
Além de buscar identificar e construir as rotas turísticas, a equipe do projeto já iniciou ações de capacitação e qualificação dos atores locais envolvidos na cadeia produtiva e turística. A ideia é fortalecer os elos da economia local e promover o desenvolvimento sustentável da região.
Fabiano Estanislau (MTb 453/AC)
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