Artigo - Batalha dos nomes: Por que a castanha produzida na Amazônia tem tantos nomes?
Patricia da Costa, Embrapa Meio Ambiente
Lúcia Helena de Oliveira Wadt, Embrapa Rondônia
Kátia Emídio da Silva, Embrapa Amazônia Ocidental
A castanha, fruto da árvore majestosa de nome científico Bertholletia excelsa Bonpl., é um dos maiores tesouros da sociobiodiversidade da Amazônia. Alimento conhecido por diversas denominações: castanha-do-pará, castanha-do-brasil, castanha-da-amazônia, entre outras. Mas, afinal, qual seria o nome mais apropriado?
A discussão sobre o nome desta castanha ganhou destaque no início de 2025, quando o ator manauara Adanilo participou do programa É de Casa, da Rede Globo. Durante sua participação, ele preparou uma tradicional tapioca caboquinha – prato típico da culinária amazonense que leva queijo coalho, tucumã e banana-da-terra, além de goma de tapioca com castanha picada ou ralada – e referiu-se ao ingrediente como "castanha-da-amazônia". A apresentadora Talitha Morete interveio, destacando que no Sudeste a castanha é conhecida como "castanha-do-pará". A polêmica se espalhou nas redes sociais, ganhando força quando a ex-BBB paraense Alane Dias defendeu o nome "castanha-do-pará".
Nome popular versus nomenclatura oficial
O fato é que, no campo dos nomes populares, não existe um único termo "correto". A diversidade de nomes reflete aspectos históricos, culturais e identitários das regiões onde a castanha é consumida. Contudo, no âmbito comercial, a denominação mais comumente adotada é "castanha-do-brasil", definida a partir do Decreto Federal nº 51.209, de 18 de agosto de 1961, que tratou da classificação e fiscalização da exportação do produto.
Historicamente, o termo "castanha-do-pará" surgiu porque, durante o período colonial e início do Império, a antiga província do Grão-Pará era o principal centro de exportação do produto. Os primeiros embarques para a Europa, no século XVII, partiam do porto de Belém, capital da província, consolidando o uso desse nome.
Já o nome "castanha-do-brasil" foi adotado oficialmente a partir da década de 1960. A mudança visava padronizar a nomenclatura para fins técnico-científicos e alinhar o nome brasileiro à terminologia internacional, onde o fruto já era amplamente conhecido como Brazil nut. Essa padronização buscava destacar a origem brasileira e facilitar o comércio global.
Identidade regional e inclusão
A ampla distribuição da espécie pela Amazônia brasileira e outros países sul-americanos tem motivado a busca por uma denominação mais abrangente. O uso dos termos "castanheira-da-amazônia" para a árvore e "castanha-da-amazônia" tem sido defendido tanto pela comunidade científica, quanto por produtores locais, por refletir melhor a origem e a importância do produto para a região.
A pesquisadora Patricia da Costa da Embrapa Meio Ambiente (Jaguariúna, SP), destaca que a castanheira ocorre em diversos estados da Amazônia brasileira, como Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia e Roraima, além de estar presente em outros países amazônicos, como Bolívia, Peru, Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana Francesa. “No Brasil, o Amazonas se destaca como o maior produtor, conforme estatísticas oficiais do IBGE para o ano de 2023. Brasil e Bolívia produzem volumes bastante similares (IDESAM, 2022), mas, desde 1998/1999 a Bolívia superou o Brasil como maior exportador de amêndoas dessa castanha” afirma Patricia.
A pesquisadora Kátia Emídio da Embrapa Amazônia Ocidental, localizada em Manaus (AM), reforça: “O nome castanha-da-amazônia representa melhor a sua ampla ocorrência na Amazônia, considerando outros países”.
Anteriormente, já houve iniciativas de alteração e padronização do nome “castanha-da-amazônia”. Durante a Terceira Convenção Mundial de Frutos Secos comercial, promovida em Manaus, em 1992, com a participação de mais de 300 empresários, convencionou-se adotar o nome que reforça a origem amazônica do produto. No entanto, a força do nome "castanha-do-brasil" no mercado internacional impediu a mudança de se consolidar.
Demonstrando a importância da questão para a região, a Assembleia Legislativa do Amazonas recebeu o PL nº 913/2024, de autoria do deputado Sinésio Campos (PT), que propõe a adoção da denominação "castanha-da-amazônia" para os produtos e derivados da castanheira no estado. Essa iniciativa busca valorizar a produção local e fortalecer a identidade amazônica.
A pesquisadora Lúcia Wadt da Embrapa Rondônia (Porto Velho, RO), em parceria com o Observatório da Castanha-da-Amazônia (OCA) e com o apoio do projeto NewCast – Novas soluções tecnológicas e ferramentas para agregação de valor à cadeia produtiva da castanha-da-amazônia, está conduzindo uma revisão das normativas relacionadas à nomenclatura e aos padrões de qualidade da castanha.
Em consulta recente com agentes da cadeia produtiva, o nome "castanha-do-brasil" foi o mais votado para a padronização comercial. “Essa discussão foi difícil e complexa porque existe um sentimento e uma percepção de que ‘castanha-da-amazônia’ é o nome mais inclusivo. No entanto, quando se analisa mundialmente a identidade da nossa castanha, o nome ‘castanha-do-brasil’ se destaca por estar consolidado internacionalmente como Brazil nut. Há um receio de que a mudança para ‘castanha-da-amazônia’ – que no inglês seria Amazon nut – possa gerar confusão entre os consumidores. De fato, essa questão permanece sem resolução”, afirma Lúcia Wadt.
A história da castanha da Amazônia é rica e multifacetada, entrelaçando aspectos culturais, históricos e comerciais. Apesar dos debates em torno de sua nomenclatura, o que realmente importa é reconhecer a relevância desse fruto para a sociobioeconomia, cultura e biodiversidade da Amazônia – e para o mundo.
Para mais informações sobre a história e a nomenclatura da castanha-da-amazônia, confira o livro da Embrapa: "Castanha da Amazônia," clicando aqui.
NewCast
O projeto NewCast, sob a liderança da pesquisadora Patrícia da Costa da Embrapa Meio Ambiente, tem como objetivo fortalecer a cadeia produtiva da castanha-da-amazônia, contribuindo para o desenvolvimento sustentável da região e promovendo a sociobiodiversidade inclusiva. A iniciativa busca superar desafios na produção, melhorar a qualidade do produto, ampliar a base produtiva, valorizar a castanha no mercado e fortalecer as comunidades extrativistas.
Participam do projeto sete Unidades da Embrapa na Amazônia (Acre, Amapá, Roraima, Rondônia, Agrossilvipastorial, Amazônia Ocidental e Amazônia Oriental) e três no Sudeste (Pecuária Sudeste, Instrumentação e Meio Ambiente). As comunidades parceiras e beneficiárias diretas incluem associações de duas Reservas Extrativistas (Resex) federais: Rio Cajari (Amapá) e Baixo Rio Branco-Jauaperi (Roraima/Amazonas); além de duas Terras Indígenas: Rio Branco (Rondônia) e WaiWái (Roraima).
Iniciado em 2024, o NewCast terá duração de três anos e conta com financiamento da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
Embrapa Meio Ambiente
Contatos para a imprensa
meio-ambiente.imprensa@embrapa.br
Telefone: (19) 3311.2611
Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/