04/04/16 |   Melhoramento Preventivo

Melhoramento genético se antecipa às ameaças

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Foto: Sebastião José de Araújo

Sebastião José de Araújo -

O sistema de defesa vegetal brasileiro inclui serviços de inteligência territorial com monitoramento das fronteiras do País, análise fitossanitária de material vegetal introduzido em regime de quarentena e pesquisas de melhoramento genético preventivo. Esse último visa ao desenvolvimento antecipado de cultivares resistentes a organismos quarentenários de alto risco para a agricultura brasileira.

Um programa de melhoramento preventivo tem como ponto de partida a identificação de fontes de resistência genética ao organismo quarentenário de alto risco, cuja avaliação é feita a partir dos acessos disponíveis em bancos de germoplasma. O geneticista do Programa Embrapa Labex Estados Unidos Márcio Elias Ferreira explica: "Na avaliação direta, os acessos são inoculados ou infestados com o organismo quarentenário, o que deve ser feito em países onde esse organismo está presente. Na avaliação indireta, os genes de resistência são monitorados pela análise de DNA, o que permite a avaliação em países livres da doença ou da praga".

Os bancos de germoplasma são responsáveis pela conservação da diversidade genética. Neles são depositados acessos oriundos de diversas partes do mundo como garantia de conservação de uma espécie para uso presente e futuro na agricultura. Podem ser encontrados, por exemplo, genes de resistência a patógenos e pragas ou outros associados ao controle de produtividade e qualidade dos alimentos.

Uma vez identificadas as fontes de resistência, iniciam-se as ações de desenvolvimento de estoques genéticos (linhagens, clones, híbridos) resistentes à praga e adaptados às condições de cultivo no Brasil. "O emprego de tecnologia de ponta de análise genômica, como chips de DNA, permite maior rapidez e precisão no desenvolvimento dos estudos", ressalta Ferreira. A tecnologia genômica vem sendo usada no melhoramento preventivo para organismos quarentenários que atacam o arroz, o feijão, a soja e a videira.

Quando os estoques com genes de resistência são desenvolvidos, a validação é feita no exterior por meio da exposição ao organismo quarentenário. São selecionadas estrategicamente instituições em países onde o organismo foi detectado ou não oferece risco para as culturas locais. Lá são feitos testes em condições controladas e no campo. Ferreira ressalta a importância das parcerias para a realização desses estudos: "A colaboração internacional permite aprender com antecedência sobre pragas e doenças de alto risco nas instituições que já possuem grande experiência no assunto. Os testes biológicos (bioensaios) são feitos no exterior para não colocar em risco a agricultura brasileira".

Entre as parcerias internacionais formalizadas pela Embrapa em melhoramento preventivo destaca-se a colaboração com o Serviço de Pesquisa Agrícola dos Estados Unidos (Agricultural Research Service – ARS), focada em seis organismos quarentenários de alto risco para o Brasil (veja infográfico abaixo). Juntamente com Ferreira, cientistas-visitantes da Embrapa e da instituição norte-americana têm se dedicado ao desenvolvimento de tecnologias para obtenção de plantas resistentes a essas pragas com antecedência.

Os estoques genéticos oriundos da parceria estão sendo testados nos Estados Unidos e também em países como Panamá, Colômbia e Chile. No Panamá, por exemplo, estão sendo avaliadas linhagens de arroz com genes de resistência à bactéria quarentenária Xanthomonas oryzae pv oryzae, uma das maiores ameças à cultura do arroz no mundo.

Proteção aos bananais

Na década de 1970, o brasileiro viu praticamente desaparecer de sua mesa uma de suas bananas preferidas, a do tipo maçã, por causa do mal-do-panamá, doença causada pela raça 1 do fungo Fusarium oxysporum f. sp. cubense. Agora, os bananais do País sofrem mais uma ameaça: a raça 4 tropical de Fusarium, também chamada de TR4 (da sigla em inglês Tropical Race 4), está se espalhando pelo mundo.

Segundo os cientistas, sua chegada às Américas é uma questão de tempo. Ela foi identificada nas Filipinas, Taiwan, Indonésia, China e, recentemente, em plantações da África, e pode entrar no Brasil por diferentes vias: solo contaminado carregado em sapatos, ferramentas, mudas de bananeira (aparentemente sadias, mas infectadas com o fungo) e plantas ornamentais, que também podem ser hospedeiras.

Devido à ameaça iminente, pesquisadores da Embrapa já identificaram fontes de resistência ao TR4, abrindo perspectivas para obtenção de cultivares resistentes. "Em nossa coleção de germoplasma, alguns materiais foram identificados como resistentes. Estamos fazendo cruzamentos há mais de dois anos. Então é possível que tenhamos soluções", conta Edson Perito Amorim, pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura, líder do Programa de Melhoramento Genético da Bananeira.

O estudo está sendo feito em parceria com instituições de pesquisa de países onde a doença está presente, como a Universidade de Queensland, na Austrália, e a Academia de Ciência de Guangdong, na China, e ainda em locais que possam trabalhar com o patógeno sem riscos, como a Universidade de Wageningen, na Holanda. Com esses apoios, foram concluídos trabalhos para desenvolvimento de um método de diagnóstico específico para o TR4 e validadas metodologias para seleção de materiais resistentes. Outros trabalhos buscam elaborar técnicas de manejo para combater um eventual surto da doença no País.

Esse tipo de estudo se mostrou eficiente quando  a epidemia da sigatoka-negra da bananeira ameaçava chegar ao Brasil. Nos anos 1980, quando a doença já havia sido detectada na América Central e em alguns países da América do Sul, a Embrapa Mandioca e Fruticultura desenvolvia pesquisas relacionadas ao tema. Naquela época, foram enviados para a Costa Rica genótipos melhorados de bananeiras para serem avaliados quanto à resistência à sigatoka-negra, conta o fitopatologista Luadir Gasparotto, que, com o fitopatologista José Clério Pereira, ambos pesquisadores da Embrapa Amazônia Ocidental, integraram a equipe que constatou a doença no Brasil em 1998, com os primeiros registros de ocorrência nos municípios amazonenses de Tabatinga e Benjamin Constant.

O homem que salvou o café brasileiro

Um dos mais bem-sucedidos trabalhos de pesquisa preventiva salvou a cafeicultura brasileira na década de 1970, graças à sensibilidade de um visionário, o geneticista Alcides Carvalho (foto), do Instituto Agronômico (IAC), em Campinas (SP). No início dos anos 1960, Carvalho se debruçou sobre uma doença que só chegaria ao Brasil dez anos depois, a ferrugem do cafeeiro.

Causada por um fungo que amarela as folhas da planta, a doença impunha perdas em torno de 50% da produção cafeeira em outros países. Para os cientistas do IAC, era uma questão de tempo para o mal chegar à cidade, o que seria facilitado pela presença do aeroporto internacional de Viracopos.

A estratégia de Carvalho foi realizar cruzamentos entre espécies de café canéfora e arábica, a fim de transferir a resistência da primeira à segunda. Por motivos de segurança, os híbridos desenvolvidos tinham de ser testados fora do País. Para isso, o pesquisador contou com a colaboração do Centro de Investigação das Ferrugens do Cafeeiro, em Oeiras, Portugal, onde os melhores materiais foram selecionados.

Em 1970, quando a ferrugem chegou ao Brasil, a pesquisa já tinha um híbrido resistente desenvolvido e pronto para ser multiplicado. A antecipação poupou o País de um prejuízo gigantesco em uma época em que o café era o principal produto da carteira nacional de exportações. A grande maioria dos cafeeiros atuais das lavouras brasileiras tem parte de seu DNA gerada nos trabalhos de Alcides Carvalho. Merecidamente, o centro de pesquisa em café do IAC recebeu o seu nome.

Prejuízo bilionário

O impacto do ingresso de um organismo quarentenário é ilustrado por patógenos como o Phakopsora pachyrhizi, agente causal da ferrugem da soja, que foi introduzido no Brasil recentemente, causando grandes prejuízos econômicos, sociais e ambientais. A existência de organismo quarentenário no território submete os produtos agrícolas brasileiros a barreiras fitossanitárias impostas por parceiros comerciais, que podem interferir nas exportações e gerar um panorama de difícil reversão. Os prejuízos diretos e indiretos podem ser enormes. No caso da ferrugem da soja, em dez anos, ultrapassa US$ 25 bilhões.

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Rose Lane César
Secretaria de Comunicação da Embrapa - Secom

Colaboração: Síglia Souza
Embrapa Amazônia Ocidental

Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/

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