16/06/20 |   Agricultura familiar  Florestas e silvicultura  Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação  Produção vegetal  Transferência de Tecnologia  Gestão ambiental e territorial

Cepal escolhe projeto da Embrapa entre os mais transformadores para a sustentabilidade

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Foto: Sabrina Gaspar

Sabrina Gaspar - Sistemas agroflorestais estão entre as tecnologias previstas no Projeto Tipitamba

Sistemas agroflorestais estão entre as tecnologias previstas no Projeto Tipitamba

  • Iniciado em 1991, Projeto Tipitamba transfere tecnologias para que agricultores familiares  na Amazônia atuem com sustentabilidade e melhorem a renda.

  • Trabalho é participativo e une saberes científicos e tradicionais

  • Capaz de modificar vidas e paisagens, Tipitamba é reconhecido pela Cepal entre os de maior potencial transformador.

  • Projeto evitou queimadas e desmatamentos antes praticados pela atividade agrícola familiar.

  • Trabalho se alinha aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável do Milênio, criados pela Organização das Nações Unidas.

Um projeto desenvolvido na região amazônica pela Embrapa há quase três décadas foi selecionado entre os de maior potencial para impulsionar a sustentabilidade ambiental no País. O Tipitamba, voltado a orientar produtores familiares a adotar práticas sustentáveis, está entre as 15 propostas selecionadas pelo Big Push Ambiental no Brasil da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), braço da Organização das Nações Unidas (ONU). Com isso, o trabalho passou a compor a publicação “Investimentos transformadores para um estilo de desenvolvimento sustentável: estudos de casos de grande impulso (Big Push) para a sustentabilidade no Brasil”.

O Tipitamba nasceu em 1991 propondo viabilizar um futuro sustentável aos produtores familiares da Amazônia, por meio do manejo sustentável da mata secundária, a capoeira, no preparo da área para plantio e no pousio. Essa vegetação deu nome ao projeto. Tipitamba, na língua dos índios Tyriós, significa vegetação secundária, exatamente as áreas que eram tradicionalmente derrubadas e queimadas para o plantio, principalmente, das culturas de mandioca.

Além de ambientalmente mais sustentáveis, as tecnologias passadas aos produtores familiares se mostraram mais rentáveis que os métodos anteriores, melhorando a qualidade de vida dessas populações. As ações do Tipitamba envolvem transferência de tecnologias voltadas a recuperação de áreas alteradas, redução do uso de agrotóxicos, transição produtiva agroecológica, sistemas agroflorestais, diversificação da produção agrícola, segurança e soberania alimentar, melhoria da renda, mitigação dos impactos ambientais e o compartilhamento de conhecimento entre todos os atores envolvidos.

29 anos de transformação participativa

O projeto teve início quando a Embrapa Amazônia Oriental (PA) assinou uma cooperação técnico-cientifica com as universidades alemãs de Göttingen e de Bonn por meio do programa Studies of Human Impact on Forest and Floodplains in the Tropics (Shift).  Ao longo dos anos, o Tipitamba transformou-se em uma rede mantendo o objetivo de propor alternativas tecnológicas, socioeconômicas e ambientalmente sustentáveis para a agricultura familiar amazônica. 

A pesquisadora da Embrapa Tatiana Sá, uma das idealizadoras do projeto, se emocionou com a seleção e considera que o reconhecimento se deu por causa de seu pioneirismo e pela trajetória continuada. “Nossa atuação aborda, ao longo dos anos, em caráter multidisciplinar e interdisciplinar, temas associados às diversas dimensões da sustentabilidade, como a formação de pessoal, em vários níveis, e a preocupação com formulação e aplicação de políticas públicas”, explica a cientista.

O artigo científico que permitiu à experiência paraense figurar entre os 15 mais do Big Push Sustentabilidade da Cepal foi intitulado “Projeto Tipitamba – Transformando paisagens e compartilhando conhecimento na Amazônia”. “Esse resumo diz muito sobre a própria evolução e transformação do projeto,” lembra o pesquisador Osvaldo Kato.

“O aprendizado é que é possível viver essa transformação, com trabalhos de longa duração, promovendo ações de desenvolvimento territorial sustentável para pequenas e médias propriedades na Amazônia. Tipitamba é a prova de que o sonho da sustentabilidade é realizável”, enfatiza Kato. 

A mudança responsável pelo sucesso do programa, de acordo com o cientista, é a valorização do conhecimento do agricultor, o que possibilita que ele seja o agente da transformação. “De produtor para produtor, com a pesquisa atuando como mediadora, sistematizando processos e tecnologias, é mais fácil fazer a inovação chegar aos produtores e ser aceita por eles”, pondera o pesquisador, ressaltando que a participação do produtor continua sendo uma das características mais fortes do projeto.

Autores do artigo

Participaram da elaboração do paper sobre o projeto: Osvaldo Ryohei Kato, Anna Christina Roffé Borges, Célia Maria Calandrini de Azevedo, Débora Veiga Aragão, Grimoaldo Bandeira de Matos, Lucilda Maria Sousa de Matos, Maurício Kadooka Shimizu, Steel Silva Vasconcelos e Tatiana Deane de Abreu Sá.

A seleção

Foram inscritas 131 experiências e projetos. Destes, 66 foram selecionados e incluídos no Repositório de casos sobre o Big Push para a Sustentabilidade no Brasil. Além de figurar nesse grupo, o projeto desenvolvido pela Embrapa ainda se classificou entre os 15 estudos de casos mais transformadores.

De acordo com a Cepal, para integrar essa última lista, os projetos precisavam comprovar indicadores reportados nas dimensões social, econômica e ambiental, além de se submeterem à análise dos vínculos do caso estudado com o Big Push para a Sustentabilidade e com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Foram escolhidos trabalhos que apresentam uma abordagem renovada para apoiar os países da região na construção de estilos de desenvolvimento mais sustentáveis e baseados na coordenação de políticas de promoção de investimentos transformadores. “Unindo teoria e prática, esses casos ilustram as amplas possibilidades para a realização de investimentos sustentáveis em várias práticas e tecnologias sustentáveis (desde sistemas agroflorestais até o desenvolvimento da indústria eólica) e por meio de uma rica pluralidade de medidas, políticas, arranjos de governança, fontes de financiamento e escalas de atuação”, ressalta o texto oficial da Cepal.

 

Vidas e paisagens transformadas

Luciano Braga Rocha, agricultor familiar e técnico agrícola de 38 anos, ainda era um menino quando acompanhava a dura lida do pai, Elias Pinto Braga, no sítio de 25 hectares, no município de Igarapé-açu, nordeste do Pará. Todos os anos, ele via o pai derrubar a capoeira e tocar fogo para plantar mandioca, feijão e milho. Trabalho penoso que exauria o chefe da família, mas também a terra, que ficava menos produtiva e menos verde.

A mudança começou a ocorrer quando em meados da década de 1990 pesquisadores da Embrapa chegaram à região propondo uma mudança no modo tradicional de cultivo da terra. No princípio, Rocha lembra que a família desconfiou e demorou a aceitar a ideia de “plantar pau”, como chamavam o plantio de árvores, e não mais queimar a capoeira para fazer as roças. Aos poucos e com muita conversa, foram transformando e adaptando o modo de fazer, aliando as novas tecnologias que eram propostas pelos pesquisadores ao estilo de vida e cultivo tradicional da região. 

O fogo deu lugar ao corte e à trituração da vegetação para a limpeza das áreas de plantio. Mudas de espécies florestais e frutíferas, já conhecidas e até comuns nos quitais ao redor das casas, foram enfileiradas no terreno que antes só recebia as culturais anuais, que também continuaram lá. Só que o feijão, o milho e a mandioca passaram a ser consorciados com uma variedade de espécies.

Passados quase 30 anos, a propriedade se transformou em modelo e vitrine para os vizinhos e hoje colhe uma diversidade de produtos, que vão de frutas, horta, farinha e grãos até pequenos animais. O verde voltou ao sítio, assim como melhorou a qualidade de vida e renda da família Rocha.

Fotos: Ronaldo Rosa

 

 

Kélem Cabral (MTb 1981/PA)
Embrapa Amazônia Oriental

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