28/10/15 |   Segurança alimentar, nutrição e saúde

Do laboratório para a mesa: como os recursos genéticos podem contribuir para a inovação da gastronomia

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Foto: Fernanda Diniz

Fernanda Diniz - Da esquerda para direita: Irajá Antunes, Maria Beatriz Dal Pont e Laura Rosano

Da esquerda para direita: Irajá Antunes, Maria Beatriz Dal Pont e Laura Rosano

Gastrônomos e cientistas se unem para investir em estudos sobre a biodiversidade, de forma a incorporar novos produtos à alimentação.

Se, por um lado, a população brasileira pode se orgulhar do fato de morar em um país detentor de uma das maiores biodiversidades do planeta, por outro convive diariamente com uma alimentação pouco variada e quase que totalmente dependente de espécies exóticas (cerca de 80% dos alimentos que consumimos todos os dias são oriundos de outros países). Para tentar reverter essa situação, gastrônomos e cientistas investem em pesquisas para conhecer melhor a biodiversidade brasileira e incorporá-la à nossa alimentação. Esse foi o tema da mesa-redonda "O uso de recursos genéticos como inovação na gastronomia" realizada hoje (28/10) pela manhã durante o 10º Simpósio de Recursos Genéticos para a América Latina e o Caribe, que contou com a participação de duas gastrônomas - uma do Uruguai (Laura Rosano) e outra do Brasil (Maria Beatriz Dal Pont) – e do pesquisador da Embrapa Clima Temperado Irajá Antunes.

Em comum, eles mantêm a curiosidade e o interesse constante na coleta e identificação de novos ingredientes para inovar na gastronomia, em prol de uma alimentação mais rica e variada. Mas, mais do que isso, eles buscam um objetivo, que já é quase um ideal: investir no conhecimento e conservação de recursos genéticos, de forma a incorporar elementos da biodiversidade na gastronomia de seus países, criando uma identidade cultural, que possa ser herdada pelas gerações futuras.

Frutas nativas e identidade gastronômica

Uma identidade gastronômica. Assim, a chef Laura Rosano, proprietária do restaurante Verde Oliva, em Canelones, no Uruguai, define o objetivo de sua busca constante por frutos nativos do Uruguai que possam ser incorporados à gastronomia daquele país.

Frutos como o arazá (também conhecido como goiaba amazônica) que pode ser vermelho ou amarelo; o guaviyú (fruta do bosque cultivada pelos índios uruguaios); a pitanga e o guayabo (goiaba maçã) já compõem o cardápio do Verde Oliva.

A curiosidade e o interesse de Laura pelos frutos nativos uruguaios resultaram numa publicação que oferece mais detalhes sobre cada um deles, incluindo origem e teor nutricional, além de receitas. O livro "Recetario de frutos nativos Del Uruguay" está disponível no link: http://www.verdeoliva.org/documento/recetario4.pdf

Outra preocupação da chef é repassar esse conhecimento a crianças de escolas públicas do Uruguai para que o conhecimento se propague e nunca se perca.

Gastronomia gaúcha

Já a gastrônoma Maria Beatriz Dal Pont, proprietária da Amada Cozinha, em Caxias do Sul, RS, junto com sua filha, ingressou tarde na nova profissão. Professora universitária aposentada, Beatriz se formou em gastronomia e, desde que descobriu essa nova paixão, incorporou também um novo ingrediente às suas receitas: a paixão pela história da região sul, fortemente marcada pela imigração italiana.

Além de escrever em três revistas de gastronomia e ter três livros publicados, a chef gaúcha mantém dois projetos constantes: o "Cozinha, cultura e gosto", no qual divulga as influências da cultura na culinária local e o "Conversas harmônicas", que conta com palestras de especialistas para disseminação de novos sabores.

Para Beatriz, o galeto, por exemplo, é muito mais do que um prato tradicional da região sul, é um "patrimônio material". Por isso, ela se esforça para disseminar os conhecimentos culturais que existem por trás da comida.

Sementes crioulas: do campo à mesa

A participação do pesquisador Irajá Antunes nesse contexto é oferecer a ciência como aliada dos gastrônomos e da sociedade em geral. Para isso, há anos se dedica a pesquisas de coleta, caracterização e conservação de sementes crioulas da nossa biodiversidade.

Segundo ele, a aprovação da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, e do Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PLANAPO), em 2013, pelo governo federal, deu ao Brasil uma posição de destaque nesse cenário, sendo inclusive modelo para outros países. Um dos resultados positivos do Planapo é regulamentar o acesso de agricultores organizados aos recursos genéticos conservados em mais de 100 bancos mantidos pela Embrapa em suas unidades de pesquisa distribuídas por quase todos os estados da Federação.

Mas, ainda é preciso fazer muito mais, especialmente para proteger e estimular os guardiões da biodiversidade. "São eles que possuem o conhecimento sobre os recursos genéticos", enfatiza Irajá, lembrando que atrás de cada semente crioula, existe um guardião. Nesse sentido, ele aponta três estratégias fundamentais: valorização das sementes locais, realização de feiras de sementes e promoção de feiras agroecológicas.

Assim como a chef uruguaia, Irajá também considera fundamental repassar as informações sobre conservação e uso sustentável da biodiversidade para estudantes e outros públicos. "Por isso, hoje investimos na formação dos guardiões mirins e em contatos constantes com comunidades de agricultores tradicionais. Além de conhecerem a importância da conservação de recursos genéticos para a segurança alimentar, o público atua como multiplicador.

Fernanda Diniz (MTB 4685/89)
Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia

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