03/12/15 |

Cooperação prevê avanços tecnológicos no cultivo protegido de hortaliças

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Foto: Ítalo Guedes

Ítalo Guedes - Cultivo protegido de morango na Coreia do Sul

Cultivo protegido de morango na Coreia do Sul

Um projeto de cooperação técnica celebrado entre a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e o Rural Development Administration (RDA), instituto de pesquisa agropecuária da Coreia do Sul, vem permitindo o intercâmbio de conhecimentos e experiências entre pesquisadores dos dois países a partir de reuniões e visitas técnicas. Com foco em produção vegetal em sistema de cultivo protegido, especificamente hortaliças, o projeto resultou na transferência de um software experimental voltado à modelagem das estruturas.

Desenvolvido pela equipe do pesquisador Ryu Hee-Reyong, engenheiro de estruturas da Instituto de Pesquisa em Horticultura Protegida do RDA, o software GH Modeler apresenta diversos parâmetros que, quando definidos pelo usuário, processam análises de desempenho da estrutura de cultivo protegido em relação a diferentes condições de estresses ambientais. "O software é um grande trunfo para o avanço das pesquisas no Brasil porque, além de projetar o desenho das estufas, ele indica os melhores materiais para cada modelo de estrutura", avalia o pesquisador Ítalo Guedes, líder do projeto de cooperação técnica.
 
A densidade e a composição do plástico utilizado, bem como a configuração da estrutura, interferem no desempenho das plantas cultivadas e, por tal motivo, merecem atenção na fase de planejamento do ambiente protegido. No Brasil, utiliza-se basicamente o polietileno de baixa densidade, enquanto na Coreia do Sul a definição do plástico é baseada em estudos de incidência de luz solar nas regiões produtoras. "A partir da experiência deles, podemos concluir que não é pertinente utilizar o mesmo plástico nas condições do Planalto Central e da Amazônia, visto que os índices de luminosidade são contrastantes. Se a mesma configuração de estrutura é utilizada de norte a sul do país, é evidente que alguma região está subutilizando o potencial do sistema produtivo", observa o pesquisador. Devido à baixa latitude, os sul-coreanos adotam plásticos que permitem maior entrada de luz, mas que, ao mesmo tempo, são resistentes para suportar as fortes nevascas e os ventos típicos da região. 
 
Outro objetivo da cooperação técnica, que tem vigência estimada até 2016, é promover a utilização de técnicas de baixo gasto de energia para o controle da temperatura nas estruturas de cultivo protegido do Brasil. Medidas simples como aumentar a altura da cumeeira podem diminuir a temperatura interna das estufas, uma vez que o ar quente se desloca para cima e não fica próximo às culturas. Os pesquisadores concluíram que, para as regiões mais quentes, as estruturas devem ter saídas de ar e, pelo menos, 4 metros de altura ao invés da medida convencional de 2,5 a 3 metros de altura. Ar condicionado, por exemplo, não é uma opção porque, além de encarecer o custo de produção, também seria mais danoso ao meio ambiente. 
 
"Nas visitas técnicas ao RDA, observamos inúmeras soluções criativas e baratas para diminuição da temperatura interna como o uso de tintas laváveis, à base de cal, no plástico das estruturas durante os períodos de maior luminosidade", relata Guedes, ao destacar também algumas soluções automatizadas como sensores de temperatura e controles de sombreamento. Por sinal, na Coreia do Sul, o investimento em tecnologias de automação e outras soluções computadorizadas não somente contribuiu para o aperfeiçoamento da agricultura protegida, como também facilitou a fixação dos jovens nas atividades agropecuárias. 
 
Além de fortalecer a sucessão no campo, o cultivo protegido tem uma importância estratégica para a segurança alimentar dos sul-coreanos, tanto que a contrapartida brasileira na cooperação técnica reside na avaliação das soluções tecnológicas em condições tropicais porque eles acreditam que, com o advento das mudanças climáticas, algumas regiões do país - especialmente a ilha de Jeju, localizada ao sul da península - ficarão mais suscetíveis aos extremos de temperatura e precipitação. Para eles, interessa a experiência da Embrapa com agricultura tropical, principalmente para obter respostas sobre como conduzir o cultivo protegido de hortaliças em um cenário futuro de aquecimento global.
 
Segurança alimentar e sustentabilidade
 
Diante de eventos climáticos extremos, o cultivo protegido pode contribuir para a regularidade da oferta de alimentos. Em relação às hortaliças, que são culturas sensíveis, esse sistema pode ganhar protagonismo justamente por assegurar a produção em qualquer época do ano e em regiões com condições ambientais desfavoráveis, tais como: alta umidade, vento excessivo, grande incidência de pragas, entre outros. 
 
Com o intuito de aprimorar as práticas agrícolas específicas desse sistema produtivo, os pesquisadores brasileiros pretendem, a partir do software GH Modeler, desenvolver o protótipo de uma estrutura para cultivo protegido que seja adaptada às regiões mais tropicais do Brasil. Para atender esse e outros objetivos, foi formulado o arranjo de projetos "Inovações Tecnológicas para a Produção Agrícola Sustentável em Ambiente Protegido", apelidado de Agriproteg. 
 
A partir de parcerias com empresas e universidades, o arranjo também visa a utilização de plásticos biodegradáveis, com maior durabilidade e menor impacto no ambiente, e o desenvolvimento de soluções que permitam o cultivo de hortaliças ao redor de grandes centros urbanos, de tal forma que as distâncias entre as áreas de produção e de consumo sejam encurtadas. "A produção em áreas urbanas e periurbanas pode garantir maior qualidade para o alimento, que será consumido logo após a colheita, e menor custo para o agricultor, já que os gastos com transporte e combustível serão reduzidos", analisa o pesquisador Marcos Braga, gestor do arranjo de projetos. 
 
Distâncias menores ainda implicam em redução das perdas de hortaliças, um grande problema ambiental visto que os insumos utilizados para produzir os alimentos, como água e nutrientes, estão cada vez mais escassos. "Hoje, por exemplo, o Norte e o Nordeste importam grande parte das hortaliças de estados de outras regiões do Brasil como São Paulo e Distrito Federal. As longas distâncias percorridas em caminhões sem refrigeração resultam em menor qualidade sensorial e durabilidade e, até mesmo, na perda do alimento", problematiza o pesquisador Ítalo Guedes, ao sinalizar que o cultivo protegido nas áreas metropolitanas de Manaus, Belém, São Luís e Teresina seria muito vantajoso em termos de economia e de segurança alimentar para essas regiões.
 
Do ponto de vista da sustentabilidade, pode-se também creditar na conta do cultivo protegido a diminuição das aplicações de produtos químicos, uma vez que o ambiente isolado dificulta a ocorrência de pragas e doenças. Grande parte das estruturas de cultivo protegido no Brasil é composta por plástico na parte superior e telados nas laterais, funcionando como um abrigo contra chuva ("rain shelter") e contra insetos. Além da redução de insumos químicos, há considerável economia de água no cultivo protegido em virtude da menor evapotranspiração. "Estudos realizados com melão, nas condições do Cerrado brasileiro, indicaram uma redução de 30 a 40% na demanda hídrica da cultura quando em ambiente protegido", quantifica Braga, que imagina que esse percentual se reflete também em outras olerícolas.
 
Investimento x valor agregado
 
O cultivo protegido permite que os agricultores ofereçam ao mercado produtos com boa qualidade visual em períodos de baixa oferta e elevada cotação dos preços, contribuindo para uma boa rentabilidade, o que justifica o investimento com as estruturas protegidas. Hortaliças como tomate e pimentão, por exemplo, possuem alto valor agregado e asseguram um bom retorno financeiro para o agricultor. Com a possibilidade de se produzir ao longo de todo o ano, independentemente das condições ambientais, diminui-se a sazonalidade de preços e o efeito sobre os índices de inflação.
 
No Distrito Federal, o cultivo protegido teve um impacto muito positivo na cultura do morango. "Há cinco anos, a produção de morango acontecia somente de junho a outubro. Atualmente, com o uso de túneis baixos é possível produzir o ano todo, mesmo nos meses de chuva", conta o agrônomo Antônio Dantas, coordenador de olericultura da Emater/DF, ao acrescentar que a extensão rural está incentivando o uso de túneis também para as folhosas e para as brássicas, culturas que sofrem com o desabastecimento nos períodos chuvosos.
 
Estimada em 70 hectares, a área de cultivo protegido no Distrito Federal cresce a cada ano, principalmente para as culturas de tomate e pimentão. "Para o produtor, um hectare de tomate custa cerca de 60 mil reais. É um investimento alto para ficar sujeito às intempéries climáticas. Por isso, o cultivo protegido desponta como uma tecnologia interessante para garantir estabilidade na produção e na renda do agricultor", opina Dantas, para quem a oferta de mais produtos na entressafra também é boa para a sociedade, visto que a curva de variação de preço fica mais atenuada.  
 
Manter competitivo o preço das hortaliças cultivadas em ambiente protegido é um fator importante, principalmente em um país que precisa incentivar o consumo desses alimentos. "Calcula-se que, hoje, o brasileiro consome, em média, 30 quilos de hortaliças por ano. Se comparar com o consumo sul-coreano, que está na casa de 170 quilos por habitante por ano, o Brasil tem um longo caminho a percorrer", sinaliza o pesquisador Ítalo Guedes. 
 
Em termos de área, também há muito espaço para crescer. O Comitê Brasileiro de Desenvolvimento e Aplicação de Plásticos na Agricultura (Cobapla) estima que, hoje, o Brasil possui cerca de 30 mil hectares de cultivo protegido, sendo o País com a maior área nesse sistema na América do Sul. Não há dados oficiais sobre a área de cultivo protegido de hortaliças, mas, em 2007, o Serviço Brasileiro de Respostas Técnicas (SBRT) publicou um dossiê técnico onde a estimativa ficava em torno de dois mil hectares, cultivados predominantemente com pimentão, tomate, pepino e alface. No mundo, a adoção cresceu 400% nas últimas duas décadas, passando de 700 mil hectares para 3,7 milhões. O cultivo protegido, que tem potencial para dobrar a produtividade alcançada em campo aberto, desponta como uma tecnologia capaz de conciliar produtividade e qualidade em tempos de condições ambientais potencialmente estressantes que tendem a comprometer a produção de hortaliças. 

Anelise Macedo (MTB 2.749/DF)
Embrapa Hortaliças

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