22/12/15 |   Biotecnologia e biossegurança

Enzimas: a chave da biotecnologia

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Os microrganismos são os principais produtores de enzimas, como amilases,  lipases e proteases. Existem reações químicas que só são possíveis na presença de enzimas, pois são catalisadores biológicos, que participam da decomposição de macromoléculas de gorduras, amidos e  proteínas, por exemplo.

Há cerca de trinta anos, um grupo de pesquisadores da Embrapa Agroindústria de Alimentos propõe-se a identificar, catalogar e preservar microrganismos produtores de enzimas de interesse industrial. As linhagens foram isoladas e selecionadas a partir de amostras de solo, água e outras fontes da natureza. 

A Coleção de Microrganismos de Interesse da Indústria de Alimentos e Agroenergia (CMIIAA), mantida naquela Unidade de pesquisa, abrange 230 microrganismos e cresce a cada ano. Muitas linhagens passaram por processos de modificação genética clássica, visando a aumentar seu potencial de expressão de metabólitos importantes, principalmente as enzimas extracelulares. As culturas microbianas selecionadas são armazenadas utilizando dois métodos de preservação: em solo por ultracongelamento a -80°C e em ágar pelo método de Castellani em refrigerador a 4°C.

Um microrganismo para ser utilizado na produção de enzimas deve ser, preferencialmente, seguro sob o ponto de vista biológico (status GRAS – generally recognized as safe); apresentar elevada capacidade de síntese e excreção da enzima; suportar condições ambientais adversas relacionadas com a pressão osmótica, a temperatura e a força iônica do meio; e ser tolerante à presença de substâncias tóxicas, que podem ser geradas no processo de tratamento da matéria-prima ou pelo próprio metabolismo celular. Além disso, somente é aceito para ser incluído  o material biológico que tiver autorização de coleta pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis  (Ibama) e acesso pelo Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN). A Coleção é Fiel Depositária do Patrimônio Genético junto ao CGEN e tem como curadora a pesquisadora Janine Passos Lima da Silva, também responsável pelo Laboratório de Microbiologia da Embrapa Agroindústria de Alimentos.

A seleção dos microrganismos é, portanto, bastante criteriosa e encontrar um novo produtor de enzimas é um desafio constante enfrentado pelos pesquisadores. "Há microrganismos nos mais diversos habitats e, com o avanço científico, quase todos já estão mapeados e catalogados. Por isso, vários cientistas vão  a  lugares longínquos, como a Antártida e outros, à procura de novas linhagens. Uma nova espécie descoberta pode representar um grande avanço para a ciência, pois há uma expectativa muito grande na prospecção de novas substâncias produzidas pelo metabolismo microbiano e, consequentemente, de novas aplicações industriais", comenta Edmar Penha, pesquisador do Laboratório de Bioprocessos da Unidade.

Enquanto não vão a lugares remotos, os pesquisadores da Embrapa trabalham com técnicas de mutação genética clássica, que geram novas cepas, a partir das linhagens de microrganismos modificados da Coleção. "É preciso testar o potencial de produção de enzimas de cada uma delas em diversas condições nutricionais e ambientais, para evidenciar alterações positivas. É um trabalho exaustivo", conta Edmar Penha. Esses estudos relacionados à produção e ao uso das enzimas, como a escolha do meio de cultivo, das condições de fermentação e tipos de reatores; bem como estudo de variáveis que conduzam à otimização do processo de produção e imobilização das enzimas podem levar muitos anos. "Dedicamos uma vida inteira  ao estudo e desenvolvimento científico, mas o sucesso pode ou não acontecer. Isso é próprio da ciência", pondera o pesquisador Edmar Penha.

Tecnologia limpa
A aplicação de enzimas é uma alternativa aos processos químicos convencionais por se tratar de uma tecnologia mais limpa, que consome pouca energia e gera mínimo impacto ambiental. Com base nesse conceito, em 1996, o grupo liderado à época pela pesquisadora aposentada Sônia Couri registrou a patente "Extração enzimática do óleo de soja". Esse processo possibilita a obtenção do óleo de soja com qualidade superior ao do processo que utiliza solvente orgânico. Além disso, o extrato não solúvel (isento de solvente orgânico), um subproduto desse processo, após secagem a vácuo, pode ser usado na alimentação humana, para fabricação de pães e bolos. Os ensaios realizados por meio dessa  tecnologia utilizaram  enzimas produzidas por microrganismos isolados, melhorados e testados pela equipe de pesquisa ao longo de vários anos; entretanto os resultados ainda não estão sendo aplicados pela indústria. "Há um longo caminho a seguir até se atingir resultados, produtos ou processos que possam chegar ao mercado", afirma Leda Gottschalk, pesquisadora do Laboratório de Bioprocessos da Embrapa Agroindústria de Alimentos.

Os processos enzimáticos representam ainda uma fronteira de conhecimento pouco explorada pela indústria. A expectativa é que as enzimas exerçam, em um futuro próximo, um papel fundamental e transformador na indústria alimentícia, especialmente em processos de produção de margarinas, óleos comestíveis e produtos lácteos com características nutricionais e funcionais desejáveis. "As enzimas já são aplicadas nos processos de panificação para melhorar a textura da massa e intensificar o aroma dos produtos; na produção de leite sem lactose; na maturação dos queijos para modificação do seu aroma e textura; e no processamento de carnes e peixes, para desengordurar ossos usados na produção de gelatina", explica a pesquisadora Leda Gottschalk.

O Brasil ainda não possui indústrias nacionais que produzam enzimas para fins comerciais, por isso todas são adquiridas de multinacionais. Contudo, já existe na Embrapa e em universidades brasileiras o know how de produção, preservação, recuperação e purificação de enzimas, embora muitas vezes em escala de laboratório. "As pesquisas nessa área devem continuar avançando, pois são estratégicas para o desenvolvimento da biotecnologia no nosso país", conclui o pesquisador Edmar Penha. 

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Catálogo da coleção de microrganismos de interesse da indústria de alimentos e agroenergia

Aline Bastos
Embrapa Agroindústria de Alimentos

Arte: Luciana Fernandes
Embrapa Meio Norte

Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/

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