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Fungo da Amazônia melhora crescimento e desenvolvimento de soja
Foto: Antônio Carlos Pereira Góes
A floresta amazônica também abriga uma vasta diversidade microbiológica. É uma fonte valiosa de bioprospecção de fungos e de produtos gerados por eles
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Um fungo que ocorre no solo da Floresta Amazônica revelou ser um importante estimulante do desenvolvimento de plantas. Pesquisadores da Embrapa Meio Ambiente (SP) avaliaram mais de mil linhagens do fungo Trichoderma aplicadas em conjunto com duas fontes de fósforo, e constataram que muitas delas promovem o crescimento de plantas de soja. Os resultados foram publicados na revista Scientific Reports do grupo Nature.
O microrganismo solubiliza o fósforo presente no solo, permitindo que esse mineral possa ser absorvido facilmente pela planta. Como consequência, a soja cresce mais rápido e o produtor pode economizar na aplicação desse nutriente. Além da economia ao produtor, seu uso reduz riscos de carreamento do fósforo para corpos d’água, proporcionando sustentabilidade à produção. A descoberta pode dar origem a um biofertilizante, em formato de inoculante, para importantes culturas agrícolas. Os bioinoculantes de Trichoderma são formulados à base de estruturas do fungo, geralmente por esporos. Sua aplicação é por meio do tratamento de sementes ou diretamente aplicado ao solo. São utilizados em diversas culturas de importancia econômica, beneficiando a germinação e o crescimento inicial das plantas.
O uso crescente de fertilizantes minerais tem contribuído para reduzir a saúde do solo, causando contaminação. Assim, os biofertilizantes à base de microrganismos benéficos podem anular esses problemas, e também reduzir os custos de produção.
O produto à base do fungo Trichoderma pode ser aplicado em diferentes culturas agrícolas, desde hortaliças a grandes culturas como soja, milho e feijão. Além do mais, tem o potencial extraordinário de colonizar o sistema radicular e a rizosfera, requisito básico para que o microrganismo se estabeleça e promova o crescimento das plantas, aumentando o suprimento de fósforo.
"Para futuro produtos, a escolha da tecnologia de aplicação do fungo dependerá do desenvolvimento de formulações. Nesse caso, ainda não dispomos de uma formulação padronizada", explica o pesquisador da Embrapa Itamar Melo.
“Temos, sim, um método eficiente de produção de esporos. Linhagens desse fungo, aqui estudadas, esporulam muito rapidamente, entre três e seis dias em meios de cultivo naturais, uma vantagem adicional aos produtos ora disponíveis no mercado. Algumas ações inovadoras quanto ao desenvolvimento de um eficiente biofertilizante seriam potencializar a associação de linhagens da mesma espécie fúngica com funções específicas para promoção do crescimento de plantas, melhoramento da estruturação e saúde do solo e controle de patógenos habitantes do solo."
Trichoderma em livroNo dia 24 de junho, será lançada a publicação Trichoderma – uso na agricultura, editada pelos pesquisadores Maurício Conrado Meyer, da Embrapa Soja (PR); Sérgio Miguel Mazaro, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e Juliano César da Silva (Biotrop). O evento virtual será às 10 horas em forma de webinar e abordará o uso atual e as perspectivas do Trichoderma no Brasil, apresentado pelo pesquisador Wagner Bettiol, da Embrapa Meio Ambiente, e os mecanismos de ação de Trichoderma no controle de doenças de plantas será explicado pelo professor Enrique Monte, da Universidade de Salamanca (Usal), Espanha. Webinar “Trichoderma – uso na agricultura”, dia 24/06, 10h acessar neste endereço. |
A pesquisa
Plantas de soja inoculadas com linhagens selecionadas de Trichoderma foram cultivadas no solo com fosfato de rocha e superfosfato triplo. Os pesquisadores observaram um aumento de mais de 40% na biomassa das plantas inoculadas com o microrganismo. E a eficiência da absorção de fósforo pelas plantas foi elevada em até 141% em comparação ao grupo que não contou com o Trichoderma sp.
A bióloga Laura Bononi, que utilizou a pesquisa em seu doutorado pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq/USP), revela que o fungo foi capaz de produz diferentes ácidos orgânicos durante o processo. “Esses ácidos são importantes para liberar o fósforo retido em óxidos de ferro e alumínio, ou seja, de converter o fosfato presente no ambiente em fosfatos di ou monobásicos, que estão prontamente disponíveis para a absorção”, conta a bióloga, que foi orientada por Melo.
O fósforo exerce funções vitais em todas as fases do desenvolvimento das plantas e sua deficiência pode reduzir o crescimento e a produtividade de muitas culturas agrícolas. Solos ácidos, bastante comuns no Brasil, retêm rapidamente esse mineral aplicado como fertilizante e não o deixam disponível para as plantas. “O uso de microrganismos solubilizadores de fosfato é uma estratégia sustentável e promissora para gerenciar essa deficiência em solos agrícolas”, afirma Melo, ressaltando que essa tecnologia permite aproveitar o uso de diferentes tipos de fosfatos de rochas oriundos de minas brasileiras. Atualmente, esses fosfatos são pouco aplicados como fertilizantes, o que faz o País importar esse insumo.
A importância do fósforo
O cientista explica que o nitrogênio e o fósforo são os nutrientes que mais limitam a produção agrícola e são essenciais no desenvolvimento inicial das plantas. Porém, os solos brasileiros possuem, naturalmente, baixa quantidade desse elemento, o que exige aplicações de fosfato em grandes quantidades. O fósforo está associado a três processos bioquímicos fundamentais: produção de energia, respiração e fotossíntese. Ele também participa de processos enzimáticos e compõem estruturas das células vegetais, como os ácidos nucléicos e as membranas celulares.
Embora exista uma grande quantidade de fósforo no solo, sua baixa disponibilidade para as plantas é um dos principais obstáculos à produtividade agrícola. As lavouras só conseguem absorver entre 10% e 40% do total do mineral aplicado ao solo. Esse fenômeno é devido a um alto grau de reatividade que ocorre entre o fósforo e os constituintes do solo, causando a fixação do mineral ou a sua precipitação com as partículas do solo, tornando-o indisponível para a absorção das plantas. Milho, soja e cana-de-açúcar são as culturas que recebem a maior parte dos fertilizantes fosfatados empregados no Brasil.
Amazônia, celeiro de espécies
Além da vasta biodiversidade vegetal e animal, a Floresta Amazônica também abriga uma vasta diversidade microbiológica. Os fungos, em especial, participam do constante processo de degradação da biomassa gerada no bioma, o que faz da Amazônia uma fonte valiosa de bioprospecção desses microrganismos e de produtos gerados por eles.
A aplicação de microrganismos como biofertilizantes é uma abordagem promissora para auxiliar na produção agrícola. Essas aplicações contribuíram para o crescimento de várias espécies de culturas, aumentaram a biomassa das plantas e o conteúdo total de fósforo e participaram da ciclagem de fósforo sem afetar o meio ambiente. No ano passado, o Brasil lançou seu primeiro inoculante voltado a solubilizar o fósforo. Fruto de parceria entre Embrapa e a empresa Bioma, o BiomaPhos resulta da ação de duas bactérias e é voltado à cultura do milho.
Os solos agrícolas e de pastagem são compostos por comunidades maiores desses microrganismos envolvidos na disponibilidade de fósforo. Eles são essenciais para fornecer o nutriente que é retido no solo para as plantas por meio dos processos de mineralização e solubilização. Os fungos têm vantagem sobre as bactérias pois conseguem manter um agregado no solo proporcionado pelo crescimento de suas hifas (filamentos). Dessa forma, ele auxilia a planta na aquisição de nutrientes, água e protege do ataque de fitopatógenos.
Trichoderma para controlar o mofo-branco em soja
Entre as várias espécies presentes na natureza, o Trichoderma harzianum é a mais comumente empregada no controle biológico de doenças de plantas, prevalecendo em restos vegetais em várias regiões geográficas. “O Trichoderma tem importante mecanismo de ação sobre patógenos que atacam culturas agrícolas importantes como Fusarium spp. (podridão vermelha da raiz), Sclerotinia sclerotiorum (mofo-branco) e Rhizoctonia solani (podridão radicular)”, explica o pesquisador Maurício Meyer, da Embrapa Soja.
A Embrapa estima que aproximadamente dez milhões de hectares de cultivo de soja estejam infestados pelo fungo Sclerotinia sclerotiorum, que provoca o mofo-branco (foto à direita). Essa doença se manifesta com maior severidade em anos chuvosos, temperatura amena e constante umidade do solo. A principal forma de infecção das plantas pelo fungo ocorre preferencialmente nas pétalas de soja, que servem de substrato para o fungo no início da infecção, antes de atingir hastes e pecíolos. A doença atrapalha o desenvolvimento da planta e reduz produtividade.
O Trichoderma tem sido empregado com sucesso como agente de controle biológico do Sclerotinia na soja. Para isso, é necessário um condicionamento de solo para promover o máximo de colonização pelo Trichoderma e, assim, reduzir o potencial da doença na área.
Meyer ressalta que o controle biológico é importante, pois somente a adoção do controle químico não é suficiente para um bom manejo do mofo-branco na sojicultura, é necessário a integração de práticas. “Temos que considerar que mesmo com a maior eficiência de controle químico, ainda ocorre produção de inóculo. Por isso, as demais medidas de manejo devem ser adotadas em conjunto, para inviabilizar a manutenção do fungo durante a entressafra”, explica.
O pesquisador reforça a importância do condicionamento de solo pelo sistema de semeadura direta sobre palha de gramíneas. “A palhada funciona como filtro, evitando que os esporos de S. sclerotiorum atinjam as plantas de soja e iniciem a infecção. Outros benefícios da palhada sobre o solo são o aumento da matéria orgânica, que serve de substrato para o Trichoderma, e a manutenção de umidade e redução da temperatura superficial do solo, condições fundamentais para o estabelecimento do agente de controle biológico”, destaca.
O fungo
As cepas de Trichoderma têm sido um dos fungos mais estudados para melhorar a produção e o desenvolvimento de várias espécies de culturas, principalmente devido à sua capacidade para associações simbióticas e de controle de doenças das raízes.
Trichoderma é comumente estudado para o controle de fitopatógenos e como biofertilizante, uma vez que está envolvido na colonização da rizosfera, na produção de substâncias antifúngicas e de fitohormônios, atributos que o tornam um dos mais bem sucedidos agentes de biocontrole de doenças de plantas.
Ele tem um papel crucial na hidrólise da matéria orgânica do solo, principalmente a celulose, melhorando sua estruturação. Além disso, é de fácil isolamento, de crescimento rápido e capaz de se desenvolver em diferentes substratos, e de produzir uma grande quantidade de metabólitos, como antibióticos e auxinas.
Fotos: Neide Furukawa e André Minitti (plantação de soja), Maurício Meyer (mofo-branco) e Laura Bononi
Cristina Tordin (MTb 28.499/SP)
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