Colheita

Conteúdo migrado na íntegra em: 29/09/2021

Autor

Jose Geraldo da Silva - Embrapa Arroz e Feijão

 

A colheita é uma das etapas mais importantes do processo de produção do arroz irrigado e, quando conduzida de forma inadequada, acarreta perda de grãos e compromete os esforços e os investimentos dedicados à cultura.

Uma colheita de boa qualidade é obtida quando são tomados alguns cuidados, desde o preparo do solo até o momento da ceifa e trilha das plantas. O tamanho da lavoura deve ser planejado de acordo com a capacidade de realização da colheita disponível na propriedade, em termos de mão de obra, colhedoras e secadores, entre outros. O teor de umidade dos grãos no momento da colheita deve ser o mais adequado, pois ele interfere no rendimento de grãos inteiros, no beneficiamento e na perda de produção. A colheita em períodos chuvosos pode acarretar perdas por acamamento das plantas, debulha e depreciação do produto. A presença de muitas plantas daninhas na lavoura afeta o desempenho das máquinas de colheita, pois causa embuchamento, além de elas competirem com a cultura do arroz por luz, água e nutrientes. Por tudo isso, a colheita é uma operação complexa que depende de muitos fatores para ser realizada com sucesso.

Época de colheita

A época adequada de colheita corresponde à fase de maturação do arroz, em que se obtém maior rendimento de grãos inteiros no beneficiamento e menor perda de grãos no campo. Tanto colheitas antecipadas como tardias afetam o rendimento industrial das cultivares de arroz, mas algumas podem ser mais exigentes quanto à época adequada de colheita.

Quando o arroz é colhido com alto teor de umidade, a produção é prejudicada pela ocorrência de muitos grãos imaturos, gessados e malformados, que se quebram facilmente durante as fases de beneficiamento, descasque e polimento. Por sua vez, se a colheita for feita tardiamente, com baixo teor de umidade nos grãos, ocorrem perdas por desprendimento natural dos grãos e acamamento das plantas, e a qualidade industrial do produto também é afetada pela redução do rendimento de grãos inteiros no beneficiamento. Esse efeito pode ser mais severo se ocorrer orvalho, alta umidade relativa do ar e, principalmente, períodos alternados de chuva e sol intenso, pois os grãos se trincam antes de serem beneficiados. Dessa forma, a principal causa de quebra de grãos está relacionada com a sua reidratação, mais especificamente quando a umidade está abaixo de um ponto crítico que se situa em torno de 15%.

De maneira geral, para obter maior rendimento de inteiros, recomenda-se colher o arroz com teor de umidade entre 18% e 23%. Na falta de aparelhos para determinar o teor de umidade dos grãos, o produtor pode se basear na mudança de cor das glumelas (cascas) e considerar como ideal quando dois terços dos grãos da panícula estiverem maduros. Apertar os grãos pode também ser um indicativo útil: se amassar, ainda está imaturo; e, se quebrar, está no ponto de colheita.

Métodos de colheita

Os métodos de colheita do arroz irrigado são os seguintes: manual, semimecanizado e mecanizado.

Colheita manual - A colheita manual requer cerca de 10 dias de trabalho de um homem para ceifar 1 ha de plantas. Esse método é muito comum nas pequenas lavouras. Além da ceifa, que normalmente é feita com cutelo, as outras operações, como o recolhimento e a trilha, são realizadas manualmente. À medida que as plantas vão sendo cortadas em pequenos feixes, são amontoadas transversalmente sobre os colmos decepados, de modo que as panículas não fiquem em contato com o solo e permaneçam expostas ao sol. Os feixes devem ser colocados no mesmo sentido, para facilitar seu recolhimento e transporte para o local da trilha. A trilha é realizada em jirau de madeira, caixotes ou bancas, e consiste em golpear as panículas até o desprendimento dos grãos.

Colheita semimecanizada Nesse método, pelo menos uma das etapas do processo é feita manualmente. Geralmente, o corte e o recolhimento das plantas de arroz são feitos manualmente, e a trilha mecanicamente, usando trilhadoras estacionárias.

Colheita mecanizada - Na colheita mecanizada, empregam-se diversos modelos e tipos de máquinas, desde as de pequeno porte tracionadas por trator, até as colhedoras automotrizes. Essas máquinas realizam, em sequência, as operações de ceifa das plantas e trilha, separação, limpeza e armazenamento dos grãos a granel ou em sacaria.

Máquinas para colheita

A colheita pode ser realizada por diversos tipos de máquinas, desde as de pequeno porte, tracionadas por trator, até as colhedoras automotrizes, dotadas de plataforma de colheita de grande extensão que alcança 7,5 m de largura ou até mais. As colhedoras realizam, em sequência, as operações de corte das plantas, recolhimento, trilha e limpeza dos grãos.

As colhedoras de arroz colhem e trilham as plantas numa única operação. As máquinas especiais para terrenos de baixa sustentação, como os de lavouras irrigadas, são equipadas com pneus arrozeiros ou com pneus duplos, de maior superfície de contato com o solo, ou com rodados de esteiras. São caracterizadas por possuírem mecanismos de corte e alimentação de plantas; trilha; separação; limpeza; transporte e armazenamento de grãos e de outros componentes especiais para garantir adequada operação nas variadas condições de cultivo, como em várzeas.

Para colher com eficiência o arroz irrigado, deve-se:

  • Equipar a colhedora com rodados especiais (pneus em dupla, arrozeiro ou esteira) para operar nos terrenos de baixa sustentação.
  • Controlar a velocidade do molinete para ser ligeiramente superior à velocidade de avanço da máquina, de forma a puxar as plantas ceifadas para dentro da máquina.
  • Usar cilindro trilhador de dentes com rotação entre 500 rpm e 700 rpm.
  • Regular adequadamente a abertura entre o côncavo e o cilindro trilhador de plantas, para obter máxima eficiência na trilha e mínimo dano e perda de grãos.
  • Evitar velocidades de operação excessivas, já que isso aumenta, substancialmente, as perdas.

O mecanismo convencional que ceifa e recolhe as plantas é a plataforma de corte. Pelo fato de ceifar os colmos abaixo das panículas e distante do solo, a plataforma indicada para o arroz é a rígida, sem movimento de flexão na barra de corte. A plataforma possui separadores de fileiras de plantas, que dividem longitudinalmente a área de colheita, correspondente a uma passada de máquina, do resto da lavoura; molinete que recolhe as plantas puxando-as contra a barra ceifadora de navalhas serrilhadas; condutor helicoidal (caracol) ou esteira de borracha (draper) para transportar as plantas para o canal alimentador do sistema de trilha. A relação entre as velocidades do molinete e de deslocamento da máquina colhedora deve ser inferior a 1,25, para minimizar perdas de grãos na plataforma. Cerca de 70% das perdas na colheita do arroz são devidas à plataforma de corte.

O mecanismo de trilha das colhedoras recebe as plantas da plataforma de corte e realiza o desprendimento e a separação dos grãos. Basicamente são três mecanismos: 1) trilhador tangencial (convencional), composto por cilindro e côncavo de dentes e sistema de separação dos grãos da palha por saca-palhas; 2) trilhador axial, composto por rotor axial, que realiza a trilha e a separação dos grãos; e 3) trilhador híbrido, composto de cilindro e côncavo tangenciais de dentes e sistema de separação dos grãos da palha por rotor axial. A velocidade tangencial do cilindro trilhador deve variar de 20 m a 25 m por segundo, de acordo com o teor de umidade dos grãos, e a velocidade rotacional de 500 rpm a 700 rpm

Nas colhedoras (convencional e híbrida) que utilizam cilindro e côncavo tangenciais de dentes, mais de 90% dos grãos são separados da palha no ato da trilha. As demais frações de grãos são separadas da palha pelo saca-palha (colhedora convencional) ou pelo separador axial rotativo (colhedora híbrida). Os três mecanismos apresentam diferentes capacidades de manipulação de plantas o que pode interferir na velocidade de colheita e, consequentemente, no desempenho operacional da colhedora.

Nas colhedoras convencionais, as plantas, após serem trilhadas, são conduzidas para o mecanismo de separação, composto pelo batedor traseiro, extensão do côncavo, saca-palha e cortinas. O batedor traseiro bate as palhas pela segunda vez contra a extensão do côncavo e, em seguida, as distribui sobre o sacapalha para a separação final dos grãos remanescentes. As cortinas auxiliam na uniformização do material sobre o saca-palha, que descarrega os grãos sobre uma bandeja coletora e a palha sobre o terreno, em leira. Para evitar a formação de leira, que sempre prejudica as operações mecanizadas futuras, as colhedoras de arroz devem ser equipadas com espalhador de palhas.

Nas colhedoras híbridas, a separação dos grãos da palha é feita por meio de rotor, em substituição ao saca-palha. A máquina dispensa o saca-palha convencional, provido de calhas com movimento alternativo, e utiliza rotores helicoidais para efetuar a separação por movimentos rotativos de compressão e expansão da palha, fazendo com que os grãos misturados à palha se desloquem para a superfície do côncavo e, daí, para a seção de limpeza da colhedora. Na presença dos rotores de separação, que também auxiliam na trilha das plantas, o cilindro tangencial pode ser regulado para ficar mais distante do côncavo, deixando a trilha menos agressiva. Normalmente, o uso dos rotores permite reduzir a velocidade rotacional do cilindro tangencial durante a colheita, elevar a capacidade de manipulação das plantas trilhadas, melhorar a eficácia da separação de grãos da palhada, danificar menos grãos de arroz e propiciar maior rendimento operacional da colhedora.

Nas colhedoras axiais, o rotor trilhador realiza sequencialmente as operações de trilha em sua parte anterior e a separação dos grãos em sua parte posterior.

Na Figura 1, estão apresentados os esquemas de mecanismos de separação das colhedoras por saca-palha e por rotor das colhedoras convencional, axial e híbrida.

Figura 1. Mecanismos de separação das colhedoras por saca-palha e por rotor.

 

Os grãos separados pelo côncavo e o saca-palha ou pelos rotores, mais algumas impurezas leves, são reunidos na bandeja coletora da máquina e daí seguem para a unidade de limpeza, composta de peneira superior, extensão da retrilha, peneira inferior e ventilador. A peneira superior realiza a pré-limpeza dos grãos que caem na peneira inferior. A extensão da retrilha, posicionada na extremidade da peneira superior, retém os grãos não trilhados, enquanto a peneira inferior faz a limpeza final dos grãos. O ventilador joga o vento nas peneiras e auxilia na eliminação, por diferença de densidade, das impurezas dos grãos. Os grãos limpos são transportados por condutores helicoidais e por correntes elevadoras para o tanque graneleiro ou para a plataforma de ensacamento de grãos, enquanto os grãos não trilhados, recolhidos pela extensão da retrilha, são enviados para a unidade de trilha da colhedora para serem retrilhados.

Regulagem e manutenção da colhedora

É possível obter maior rendimento operacional com custo menor, se forem seguidas as instruções contidas no manual do operador, que acompanha a colhedora, e, assim, efetuar a regulagem adequada dos mecanismos externos e internos da máquina. Deve-se atentar, principalmente, para o seu estado de conservação e sua manutenção, ao verificar se há navalhas defeituosas, falta de peças integrantes do molinete e outras irregularidades nos mecanismos de trilha, separação e limpeza dos grãos. A velocidade do molinete deve ser suficiente para puxar as plantas para o interior da máquina, devendo ser até 25% superior à velocidade de deslocamento da colhedora. Operar a colhedora com velocidade excessiva de trabalho predispõe a máquina a desgastes prematuros e a inúmeros riscos de acidentes.

Quando o arroz estiver acamado, a velocidade de deslocamento da colhedora deve ser reduzida e o molinete deve estar regulado na menor altura e mais avançado em relação às navalhas de corte. A colheita realizada no sentido do acamamento é mais eficiente e, por isso, às vezes torna-se necessário colher em uma só direção, apesar de haver redução do rendimento diário da operação.

Para o bom desempenho do sistema de trilha, a colhedora deve ser equipada com cilindro trilhador de dedos, operado na velocidade entre 16 m e 25 m por segundo. A abertura entre cilindro trilhador e côncavo deve ser adequada, a fim de trilhar com eficácia as panículas e minimizar o descascamento de grãos. Uma boa regulagem dos mecanismos de separação e limpeza dos grãos, como as peneiras e o ventilador, é de fundamental importância para se obter um produto de qualidade e com baixo percentual de perdas de grãos.

Perdas de grãos na lavoura

As perdas acontecem em duas etapas distintas: antes e durante a colheita. Antes da colheita, os fatores responsáveis pelas perdas são os seguintes: desprendimento natural dos grãos; acamamento ocasionado pela cultivar; adubação nitrogenada excessiva e estandes de plantas densos; ataque de pássaros; excesso de chuvas; ação de ventos; veranico prolongado e danos causados por doenças e insetos.

Durante a colheita manual, as perdas de grãos são causadas pela ação do operador, pela ferramenta de corte e pela exposição das plantas ceifadas ao tempo e ao ataque de insetos e pássaros. Ainda, ocorrem perdas na trilha por causa do teor de umidade inadequado dos grãos e do volume excessivo dos feixes trilhados por vez.

Na colheita mecanizada, as perdas são provocadas pelos mecanismos externos e internos da colhedora. As perdas de origem externa são devidas à ação mecânica da plataforma de corte e do molinete recolhedor nas plantas; e as internas ocorrem pela ação do cilindro trilhador, pelo saca-palha e pelas peneiras.

Determinação das perdas de grãos

A perda total de arroz é feita numa só avaliação, após a operação da colhedora, conforme o seguinte procedimento:

  • Demarcar num talhão colhido pelo menos quatro áreas escolhidas ao acaso, de 1 m2, de forma que o lado maior da área seja equivalente à largura de colheita da máquina (Figura 2).
  •  Recolher todos os grãos na área demarcada, inclusive aqueles presos às ramificações da panícula.
  •  Determinar a perda de grãos utilizando a Equação 1.

P = 10. M                                                                       Equação 1

em que:

P = perda de grãos, em kg/ha.

M = massa dos grãos, em gramas, perdidos na área de 1 m².

 

Figura 2. Exemplos de dimensões da área de coleta de perdas em função do tamanho da plataforma de corte da colhedora de arroz.

 

As perdas também podem ser estimadas pela contagem do número de grãos na área amostrada de 1 m² e expressas em quilograma por hectare conforme a Tabela 1. Ainda, pode-se estimar a perda sem pesar e sem contar os grãos, usando o medidor volumétrico (Figura 3), que possui escala específica para o arroz.

Tabela 1. Perda mínima e máxima do arroz conforme a quantidade de grãos encontrada numa área de coleta de 1 m² numa lavoura após a colheita.
*Considerou-se 2,58 g e 3,56 g como massa mínima e máxima de 100 sementes. Fonte: Fonseca & Silva (1996).

 

Figura 3. Medidor volumétrico de perdas de grãos de arroz.

Foto: José Geraldo da Silva

 

Determinação da perda parcial de grãos

Determinar as perdas parciais de grãos serve para identificar a origem delas, se são provenientes da plataforma de corte, do saca-palha ou das peneiras da colhedora. A Figura 4 apresenta os pontos de coleta de perdas na colheita mecanizada.

 

Figura 4. Pontos de coletas de grãos perdidos por uma colhedora.

Ilustração: Sebastião Araújo

 

Os procedimentos para estimar a perda parcial de grãos são os seguintes:

Perda na plataforma de corte

  • Parar a colhedora durante a colheita, em local representativo da lavoura, e desligar os mecanismos da plataforma de corte.
  • Levantar a plataforma de corte e recuar a máquina por uma distância equivalente ao seu comprimento.
  • Demarcar uma área de 1 m2, à frente dos rastros deixados pelos pneus da colhedora.
  • Recolher os grãos perdidos na área demarcada.
  • Determinar a perda (kg/ha) usando a Equação 1, descrita anteriormente.
  • Repetir esse procedimento em quatro locais, ao acaso, da lavoura.

Perda no saca-palha

  • Usar uma armação de madeira e pano, tipo maca, com dimensões apropriadas para coletar o material proveniente de 1 m² de lavoura.
  • Posicionar a armação na lavoura e esperar pela passagem da colhedora.
  • Com a armação, coletar somente a descarga do saca-palha.
  • Separar os grãos da palha e pesá-los.
  • Calcular a perda, em kg/ha, utilizando a Equação 1.

Perda nas peneiras

Usar o mesmo procedimento descrito para perda no saca-palha. Com a mesma armação, faz-se, ao mesmo tempo, a coleta dos grãos provenientes das descargas das peneiras e do saca-palha. Uma vez determinada a massa dos grãos perdidos no saca-palha, obtém-se, por diferença, a massa dos grãos perdidos pelas peneiras.

A perda devida aos mecanismos internos pode também ser quantificada subtraindo-se da perda total as perdas encontradas na plataforma de corte da colhedora.

Como evitar perdas

  • Horário de colheita - Evitar que a colheita se realize no momento em que os grãos se encontrarem umedecidos pelo orvalho. Caso ocorra chuva, deve-se esperar que o arroz seque, caso contrário, pode haver obstrução na colhedora.
  • Teor de umidade dos grãos - Para a maioria das cultivares de arroz, o teor de umidade ideal dos grãos para serem colhidos deve situar-se entre 18% e 23%.
  • Regulagem e manutenção da colhedora - Seguir as orientações contidas no manual do operador das colhedoras e realizar as regulagens e a operação da máquina de acordo com as condições da lavoura. É imprescindível a substituição ou a reparação de componentes desgastados da colhedora para se ter bom desempenho e maior vida útil de trabalho da máquina.

 

Veja também

SILVA, J.G. da; CUSTÓDIO, D. P. Colheita. In: BORÉM, A.; RANGEL, P. H. N. (Ed.). Arroz do plantio à colheita. Viçosa, MG, 2015: Ed. UFV, 2015. P 220-242.

SILVA, J.G. da; OLIVEIRA, M.G.C.; SOARES, D.M.; PEREIRA, R.M. Passos para a construção de três trilhadoras de arroz. Embrapa Arroz e Feijão, 2011. 41p.

FONSECA, J. R.; SILVA, J. G. da. Levantamento de perdas de grãos na colheita mecanizada do arroz de sequeiro. Goiânia: EMBRAPA-CNPAF, 1996. 3 p. (EMBRAPA-CNPAF. Comunicado técnico, 34).