Clima

Conteúdo atualizado em: 13/12/2023

Autores

Silvando Carlos Da Silva - Embrapa Arroz e Feijão

Silvio Steinmetz - Embrapa Clima Temperado

Alexandre Bryan Heinemann - Embrapa Arroz e Feijão

 

Para que a cultura do arroz possa expressar seu potencial produtivo, as respostas interativas entre clima e planta precisam ser quantificadas e monitoradas. Para tanto, é de suma importância, conhecer os elementos climáticos, que são obtidos em estações meteorológicas (Figura 1). Os elementos climáticos são definidos como grandezas que quantificam o clima, ao longo dos anos, como, por exemplo, a radiação solar, a temperatura do ar, a precipitação pluvial, o fotoperíodo, dentre outros, os quais exercem grande influência na produção do arroz. 

Foto: Sebastião Araújo
Figura 1. Estação Meteorológica Automática da Embrapa Arroz e Feijão.

 

Fotoperíodo

A duração do dia, definida como o intervalo entre o nascer e o pôr do sol, é conhecida como fotoperíodo. A resposta da planta ao fotoperiodo é denominada fotoperiodismo. Pelo fato de o arroz ser uma planta de dias com curta duração, cerca de 10 horas, há encurtamento de seu ciclo e da antecipação de sua floração. O fotoperíodo ótimo é considerado o comprimento do dia no qual a duração da emergência até a floração é mínima. O fotoperíodo ótimo, para a maioria das cultivares, é entre 9 e 10 horas.

De um modo geral, pode-se dizer que, para as principais regiões produtoras do país, o fotoperíodo não chega a ser um fator limitante, observando-se as épocas recomendadas de semeadura. Isso ocorre porque, no processo de adaptação e/ou criação de novas cultivares, são selecionadas aquelas que apresentam comprimentos de ciclo compatíveis com as características fotoperiódicas da região. Entretanto, o fotoperíodo pode ser um fator limitante quando se pretende produzir arroz fora das épocas tradicionais de cultivo. Atualmente, devido ao longo período de seleção e adaptação, as cultivares de arroz estão se tornando gradualmente insensíveis ao fotoperíodo, podendo ser adaptadas a regiões de altas latitudes, caracterizadas por baixas temperaturas do ar e dias longos durante o período de crescimento da cultura.

 

Temperatura do ar

A temperatura do ar é um dos elementos climáticos de maior importância para o crescimento, o desenvolvimento e a produtividade da cultura do arroz. Cada fase fenológica tem a sua temperatura crítica ótima, mínima e máxima (Tabela 1).

Tabela 1. Temperaturas do ar críticas mínimas, máximas e ótimas para o crescimento e o desenvolvimento do arroz.
1Fonte: Yoshida (1981).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A temperatura ótima para o desenvolvimento do arroz situa-se entre 20 °C e 35 °C. Em geral, a cultura exige temperaturas relativamente elevadas da germinação à maturação, uniformemente crescente até a floração (antese) e decrescente, porém sem abaixamento brusco, após a floração.

As faixas de temperatura ótimas variam de 20 °C a 35 °C para germinação, de 30 °C a 33 °C para a floração e de 20 °C a 25 °C para a maturação.  A planta do arroz não tolera temperaturas baixas nem altas. Entretanto, a sensibilidade da cultura varia, tanto para uma como para a outra, em razão da fase fenológica.

A ocorrência de temperaturas superiores a 35 °C também pode causar esterilidade de espiguetas. A fase mais sensível do arroz a altas temperaturas é a floração. A segunda fase mais sensível é a pré-floração ou, mais especificamente, cerca de 9 dias antes da emissão das panículas. Da mesma forma que para temperaturas baixas, há grandes diferenças entre genótipos quanto à tolerância a temperaturas altas.

Para cultivares insensíveis ao fotoperíodo, assumindo-se um suprimento adequado de água, a duração do período de emergência à floração é determinada fundamentalmente pela temperatura do ar.

Um grande problema, no estado do Rio Grande do Sul, são as baixas temperaturas do ar (“frio”) durante a fase reprodutiva da cultura. Elas podem causar esterilidade de espiguetas se ocorrem durante as fases mais críticas da planta (pré-floração e floração). Observa-se na Figura 2 que existe uma probabilidade de ocorrência de três ou mais dias com temperatura mínima do ar menor ou igual a 15 °C, nos decêndios dos meses de dezembro a março, em oito localidades representativas das principais regiões produtoras do estado. O período de menor risco de ocorrência dessa temperatura compreende os decêndios dos meses de janeiro e fevereiro, e o primeiro decêndio de março, mas há uma variabilidade acentuada entre as localidades.

Figura 2. Probabilidade de ocorrência de três ou mais dias com temperatura mínima do ar menor ou igual 15 ºC, para o estado do Rio Grande do Sul, nos meses de dezembro, janeiro, fevereiro e março, nas localidades de Bagé (Bag), Jaguarão (Jag ), Pelotas (Pel), Rio Grande (RG), Santana do Livramento (SL), Santa Vitória do Palmar (SVP), São Borja (SBj) e Uruguaiana (Urug) RS.
Fonte: Steinmetz et al. (2001) 

 

A espacialização dos dados (Figura 3) mostrou que, nos meses de dezembro e março, a maioria das localidades enquadra-se nas classes mais altas de dias com temperatura menor ou igual a 15 °C (Figuras 3A e 3D). Por sua vez, em janeiro e fevereiro, predominam as classes mais baixas de dias com temperatura menor ou igual a 15 °C (Figuras 2A e 2B). Esses dados refletem a diferença na temperatura mínima do ar das distintas regiões produtoras de arroz irrigado no Rio Grande do Sul.

Figura 3. Mapeamento da média de dias por ano com temperaturas mínimas do ar menores ou iguais a 15 ºC, nos meses de dezembro (a), janeiro (b), fevereiro (c) e março (d), nas principais regiões produtoras de arroz irrigado no estado do Rio Grande do Sul.
Fonte: Steinmetz; Almeida (2012)

 

Para as épocas normais de semeadura, na região dos Cerrados, em princípio, não ocorre influência negativa acentuada das baixas temperaturas, porque na maioria das localidades, a temperatura média das mínimas nos meses de janeiro e fevereiro, período que geralmente coincide com o estádio reprodutivo da cultura, é superior a 17 °C. Entretanto, nas localidades de maior altitude, é possível que haja alguma influência desse elemento climático.

No município de Formoso do Araguaia, estado do Tocantins, latitude 11°47'49''S e longitude 49°31'44''W, o elemento climático de maior importância é a temperatura do ar, que apresenta valores mínimos acima de 16 °C, e o desenvolvimento do arroz é forte. Entretanto, a temperatura máxima do ar, no período de agosto a outubro, apresenta valores superiores a 35 °C. Índices térmicos semelhantes a esse podem, dependendo da fase de desenvolvimento da cultura, trazer alguma consequência negativa na produtividade de grãos. Se isto ocorrer na fase de floração, por exemplo, poderá haver um aumento sensível na esterilidade de espiguetas.

Outros efeitos da alta temperatura no cultivo do arroz é o aumento do centro branco nos grãos, tornando-os menos resistentes ao polimento. Isso diminui a qualidade do grão com reduções na massa, no ciclo vegetativo da cultura e na taxa de translocação de matéria seca. Como efeito indireto, as altas temperaturas do ar podem levar a uma redução na quantidade de ferro disponível no solo, causando deficiência desse micronutriente na cultura do arroz de terras altas.

Temperatura da água e do solo

Para uma boa germinação, é preciso que o solo apresente valores de temperatura iguais ou superiores a 20 °C. No caso de uma temperatura superior a 35 °C, recomenda-se irrigação de uma pequena lâmina de água para diminuir os valores desse elemento climático.

Na fase inicial de crescimento da planta, a temperatura da água afeta diretamente as gemas que estão sob a água e são responsáveis ​​pelo desenvolvimento das folhas, perfilhos e panículas. Já nas fases seguintes, de crescimento e alongamento, a planta terá o seu desenvolvimento afetado tanto pela temperatura da água quanto pela temperatura do ar. Vale lembrar que, na maioria dos casos, a temperatura da água é superior a temperatura do ar pelo fato de o ambiente regido pela água absorver muito mais energia. Nesse caso, a água de irrigação deve ser renovada à medida que a temperatura da água ultrapasse 40 °C.

No estado do Tocantins, a semeadura deve ocorrer no início do período chuvoso, ou seja, no mês de outubro, estendendo-se até 20 de dezembro, o que favorece a germinação das sementes e o estabelecimento da cultura. Nas semeaduras mais tardias, as chuvas podem dificultar a operação de plantio. Além disso, quanto mais se retarda a semeadura, maior é a probabilidade de ocorrência de brusone, devido às condições climáticas.

As baixas temperaturas do solo no início do período de semeadura é um problema crítico do cultivo do arroz irrigado no Rio Grande do Sul, durante o mês de setembro até meados de outubro, dependendo da região. Essa condição climática pode retardar a emergência das plântulas em mais de 20 dias nas cultivares mais sensíveis e afetar a população inicial de plantas

Radiação solar

A radiação solar de onda curta que atinge a superfície da terra, também conhecida como radiação global, é formada por dois componentes: a radiação direta, radiação global que não interagiu com a atmosfera, e radiação difusa, radiação da radiação global que interagiu com os constituintes da atmosfera e foi irradiada em todas as direções. A proporção da radiação difusa em relação à global é máxima nos instantes seguintes ao nascer e ao pôr do sol e nos dias completamente nublados, quando toda a radiação global é difusa.

No processo de fotossíntese, as plantas utilizam apenas uma fração da radiação incidente, no comprimento de onda entre 0,4 µm e 0,7 µm, denominada de radiação fotossinteticamente ativa (RFA). A RFA pode ser considerada como sendo de aproximadamente 50% da radiação global incidente. Sombreamento durante a fase vegetativa tem pouca influência sobre a produtividade e seus componentes. A produtividade é fortemente influenciada, entretanto, quando o sombreamento ocorre durante as fases reprodutiva e de maturação, o que reduz, respectivamente, o número de espiguetas por panícula e porcentagem de grãos.

A exigência de radiação solar pela cultura do arroz varia de uma fase fenológica para a outra, e as fases reprodutiva e de maturação são as mais importantes. Há relação linear positiva entre a radiação solar nessas fases e a produtividade de grãos de arroz irrigado. Em termos práticos, esse período ocorre entre três semanas antes e três semanas depois do início da floração.

Pela análise da disponibilidade de radiação solar durante o ciclo da cultura do arroz de terras altas, em distintas regiões produtoras do Brasil verifica-se que os níveis mais altos ocorrem em localidades situadas na região Sul, que apresenta dias mais longos, e os mais baixos em localidades da região Norte, devido ao fato de os dias serem mais curtos do que na região Sul. Nas localidades das demais regiões, os valores são intermediários.

Uma avaliação preliminar sobre a quantidade média de energia solar disponível nas distintas regiões produtoras de arroz do país sugere que, em princípio, esse não seria um fator limitante para os níveis de produtividade nos diferentes sistemas de cultivo. Entretanto, ele pode tornar-se limitante quando se pretende obter níveis de produtividade próximos do potencial, que são bem superiores aos obtidos em condições de lavoura.

Precipitação pluvial

As características do regime pluvial expressas pela quantidade e distribuição das chuvas durante o ciclo da planta de sequeiro são os fatores mais limitantes na produção de grãos. A localidade de Santo Antônio de Goiás, no estado de Goiás, apresenta um regime pluvial característico da região dos Cerrados. Do total anual de 1.463 mm, cerca de 90% ocorrem no período de outubro a abril. De maio a setembro ocorre uma estação seca bem definida com índices de pluviosidade muito baixos.

Em algumas regiões produtoras de arroz de terras altas, em particular na região dos Cerrados, é comum a ocorrência de estiagens, denominadas de veranicos, durante a estação chuvosa. Em geral, esses períodos de estiagens são caracterizados por alta demanda evaporativa do ar, altos níveis de radiação solar e temperaturas elevadas.

Devido à irregularidade na distribuição pluvial, o risco climático, que é caracterizado pela quantidade de água disponível no solo para as culturas, é acentuado em função da diminuição frequente na quantidade de água. Muitas vezes, essa irregularidade pluvial é representada por períodos sem chuva que duram de 5 a 35 dias, e pode provocar redução na produtividade de grãos. Entretanto, acredita-se que o efeito negativo causado pela diminuição de água pode ser minimizado, conhecendo-se as características pluviais de cada região e o comportamento das culturas em suas distintas fases fenológicas, ou seja, semeando naqueles períodos em que a probabilidade de diminuição da precipitação pluvial é menor durante, principalmente, a fase de florescimento - enchimento de grãos. Dependendo da idade da planta, os efeitos negativos devido ao estresse hídrico podem ser variáveis.

Caso o estresse hídrico ocorra durante a fase vegetativa, poderá haver redução na altura da planta, no número de perfilhos e na área foliar; entretanto, a planta pode recuperar-se, se as necessidades hídricas forem supridas em tempo de permitir que a floração não seja afetada. Por sua vez, se o estresse ocorrer durante o período reprodutivo, de nada adiantará suprir as necessidades hídricas nas fases seguintes, pois o efeito é irreversível. As quebras na produtividade de grãos são especialmente acentuadas quando o estresse hídrico ocorre durante o florescimento, já que é nesse estádio em que são afetados os processos relacionados ao desenvolvimento reprodutivo, o que resulta em esterilidade de espiguetas.